ZERO HORA - 16/01/2013
Peguei
um táxi rumo ao aeroporto e antes mesmo de percorrer cem metros percebi
que o motorista estava com sua atenção voltada para qualquer outro
lugar, menos para o que acontecia diante do volante, já que enviou uma
mensagem pelo celular em meio ao trânsito.
Resolvida sua
emergência, recolocou o aparelho no bolso da camisa e, quando achei que
iríamos tranquilos até o nosso destino, ele começou a procurar algo no
porta-luvas, primeiro só através do tato, mirando em frente enquanto
dirigia, até que resolveu dar uma espiada lá dentro. Foi quando se deu o
estrondo. Nossa, que susto. Metade do carro estava em cima da calçada.
Por sorte, não havia um poste e tampouco algum pedestre caminhando por
ali.
Ele subiu o cordão e estourou os dois pneus do lado
direito, o dianteiro e o traseiro. Mal havia começado seu turno de
trabalho e o dia, para ele, já estava perdido. Saí do veículo, pedi para
retirar minha mala, e ele, avexado com a situação, providenciou outro
táxi para me levar ao aeroporto – mas cobrou a corrida até ali, e
paguei, porque me deu pena daquele mané, mesmo ele tendo feito tanta
gente correr risco sem necessidade. O que ele procurava de tão
importante naquele porta-luvas que não poderia esperar um sinal fechar?
Mané.
Ao dirigir, estamos constantemente sendo atraídos por
coisas diversas: a bolsa que caiu do banco durante uma travada, a troca
da faixa de música, o cabelo que está sobre os olhos e o retrovisor
ajuda a ajeitar, o cartaz de promoção em frente ao supermercado, o
isqueiro perdido no porta-luvas – ah, o porta-luvas. Tudo convida a um
segundo fatal de distração.
Eu faço muito disso também. Não há
quem consiga guiar vidrado, rígido, sem piscar nem virar o pescoço um
segundinho. Digo mais: eu nem deveria dar carona para pessoas que vejo
pouco e que exigem atualização da conversa durante o trajeto, pois isso
também me tira a concentração. E não me aponte o dedo, somos muitos:
outro dia fui levada a passear por uma amiga que não via há anos,
tínhamos milhões de assuntos pendentes e, enquanto conversávamos, ela
cometeu um bom número de barbeiragens. Ao chegarmos a sua casa, assumiu:
“Sou boa pilota só quando estou sozinha”. Nem precisava explicar. Almas
gêmeas.
Se você também está se reconhecendo, anote: somos todos
manés. Podemos causar acidentes sérios, podemos matar e morrer só
porque demos uma espiada para checar se havia luz na janela do
apartamento de um amigo e não percebemos que o motorista da frente freou
de repente. Bum.
Estando com o carro em movimento, nada de
celular, nada de passar batom, nada de juntar o que caiu no chão, nada
de espiar a vizinhança, nada de procurar bobagens no porta-luvas, nada
de conferir vitrines com o olho espichado, nada de paquerar quem está
caminhando na calçada. Dois pneus furados são uma chatice, mas o taxista
deveria comemorar o saldo daquela sua distração, e eu também. Basta um
segundo, e o “em frente” pode deixar de existir.
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