Bad boy do rock nacional, o vocalista
Chorão foi um dos porta-vozes dos jovens dos anos 90. Seu repertório
mesclou rap, hardcore, ska, reggae e letras românticas, influenciando
várias bandas e atraindo fãs no século 21
Eduardo Tristão Girão
Estado de Minas: 08/03/2013
Talvez soe exagerado falar no legado de
Chorão, cantor e compositor da banda Charlie Brown Jr., que morreu esta
semana. Mas não há como ignorar: a sonoridade forjada por ele à frente
do grupo paulista se tornou uma das faces do rock brasileiro na virada
dos anos 1990 e, consequentemente, influenciou uma série de bandas
surgidas desde então.
Preferências e antipatias à parte, o
polêmico vocalista soube arrebatar o público jovem ao unir seu discurso à
mistura benfeita de rock, hardcore, ska, reggae e rap. Para isso, hits
não faltaram. E, logo no primeiro disco, Transpiração contínua
prolongada (1997), foram pelo menos cinco: O coro vai comê!, Proibida
pra mim (Grazon), Tudo que ela gosta de escutar, Quinta-feira e Gimme o
anel. Depois vieram sucessos que garantiram a presença da banda de
Chorão na mídia e em festivais pelo Brasil, como Zóio de lula, Te levar
(tema de abertura da novelinha Malhação), Não é sério, Não uso sapato e
Hoje eu acordei feliz.
Ao lado de bandas como Raimundos, Chico
Science & Nação Zumbi e Planet Hemp, Charlie Brown Jr. ajudou não
apenas a manter vivo o rock brasileiro na década de 1990, mas também a
renová-lo. O sucesso da estética baseada em variadas vertentes musicais
abriu espaço para novos grupos, enquanto Chorão consolidava estilo
próprio ao microfone, reforçando a imagem de skatista bad boy.
Curiosamente, foi dos raros cantores daquela nova cena a falar de amor.
Uma de suas canções românticas fez sucesso até na voz de Zeca Baleiro.
“Nunca
negamos a influência do Charlie Brown Jr. Comparavam o Detonautas com o
grupo e dizíamos que ele foi uma inspiração. Depois, amadurecemos e
desenvolvemos a nossa própria personalidade. O Charlie Brown Jr. sempre
foi banda de grande performance, mas, particularmente, eu me
identificava muito com as letras, as ideias e as mensagens que o Chorão
passava. Aquela banda era cultuada mesmo nos momentos em que a mídia
ignorou o rock. Um genuíno e benfeito rock em português”, analisa Tico
Santa Cruz, vocalista do Detonautas, grupo formado em 1997.
Bandas
criadas depois disso, como Fresno, Forfun e NX Zero, são a prova de
quanto a música de Chorão é relevante. “No começo da nossa banda, ele me
influenciou muito e tem influência até hoje. Mais tarde, viramos
amigos. Ele conheceu meus pais, ficamos próximos”, conta Diego Ferrero,
vocalista do NX Zero. Lucas Silveira, vocalista e guitarrista do Fresno,
diz que Charlie Brown Jr. e Raimundos eram as únicas histórias de
sucesso quando formou sua banda. “No primeiro show do Fresno, tinha
covers do Charlie Brown Jr. A gente curtia muito mesmo”, relembra.
EM BH
“Chorão
era o dia e a noite, o pico e o vale. Muito polêmico. Com seu
temperamento explosivo, podia ser um cara agressivo em certos momentos,
mas tinha um coração enorme e lealdade difícil de se ver. Tinha também
facilidade de compor e construir melodias. Tudo muito claro, com a
linguagem do jovem e, ao mesmo tempo, muito poético”, afirma Luiz Felipe
Barreto Perez, diretor da produtora Plural. Ele organizou várias
edições do festival Pop Rock Brasil, em Belo Horizonte. Charlie Brown
Jr. participou de cerca de seis edições. Em novembro do ano passado,
Chorão fez seu último show em BH. Os ingressos para a apresentação no
Chevrolet Hall se esgotaram.
Perez conta que os dois se tornaram
amigos. “Conheci Chorão quando ele e a banda vieram pela primeira vez a
Belo Horizonte, pouco depois de lançar o disco de estreia. Ninguém os
conhecia. Produzi o evento no Lapa Multshow, com Tihuana e O Surto na
mesma noite. Veio todo mundo em apenas um ônibus, uma confusão danada. O
show fracassou, não teve público. Criei afinidade com ele de cara, e me
lembro de tê-lo levado ao Shopping Cidade para comprar uma touca”.
A
banda sempre foi considerada headline no Pop Rock, afirma o produtor.
“Sempre colocávamos o Charlie Brown para tocar o mais tarde possível,
para segurar o público”, revela Luiz. A propósito, ele estava no show do
grupo em 2002, no Mineirão, quando a plateia destruiu parte do piso
sobre o gramado e começou a atirar pedaços de madeira, ferindo
espectadores. “O Chorão me ajudou a pedir às pessoas que parassem de
fazer aquilo. Como ele era um ícone da rebeldia, acho que tiveram mais
respeito e o acataram”, relembra Perez.
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