domingo, 22 de março de 2015

ROBERTO CARLOS - ROBERT PLANT

BH recebe nesta semana a visita de dois reis em seus respectivos domínios, a MPB e o rock


Mariana Peixoto
Estado de Minas: 22/03/2015 



Um abismo separa Roberto Carlos e Robert Plant. Não há como transpor o universo que habita o maior ídolo popular brasileiro daquele em que vive o cantor que ficou conhecido como vocalista de uma das bandas mais importantes da história do rock, grupo que alicerçou o heavy metal.

Mas não deixa de ser curiosa a vinda dos dois Robertos na mesma semana a Belo Horizonte: o Plant se apresenta na quinta-feira, no Chevrolet Hall, e o Carlos faz show no sábado, no Mineirinho.

Deitado no berço esplêndido que o acolheu há cinco décadas, Roberto Carlos, de 73 anos, vai fazer exatamente o que faz há pelo menos 20. No caso de Robert Plant, 66, o show é uma incógnita. Recusando-se incansavelmente a ceder ao apelo de Jimmy Page de voltar com o Led Zeppelin, o cantor e compositor prefere dar asas à nova produção, que bebe na música étnica.

O público de Roberto Carlos sabe o que pode esperar. Um show que começa com Emoções e termina com Jesus Cristo e suas indefectíveis rosas. A cada nova apresentação, o ritual se repete. Senhoras e senhores, com seus filhos e netos, batem continência e emocionam-se, como se fosse a primeira vez.

Já boa parte, na verdade, a imensa maioria, da plateia de Robert Plant vai vê-lo por causa do Led Zeppelin, que ele deve executar com algum comedimento e novos arranjos, para frustração de muitos pais e filhos.

Roberto Carlos chega a BH após uma pequena turnê pelo interior de Minas: já se apresentou em Governador Valadares e Ipatinga, vai na terça a Montes Claros e na quinta a Divinópolis. Um dos cabeças de chave da quarta edição brasileira do festival Lollapalooza, Plant, antes de tocar no evento paulistano, sábado, se apresenta no Rio (terça) e em BH.

O brasileiro se apresenta com orquestra regida por Eduardo Lages, seu maestro desde o fim da década de 1970. O inglês vem à capital mineira com a Sensational Space Shifters, grupo que montou em 2012 com músicos de diversas nacionalidades.

O EP Esse cara sou eu, com quatro faixas, lançado em dezembro de 2012, é o trabalho mais recente de Roberto a trazer inéditas. A balada romântica que dá título ao trabalho, música-tema dos protagonistas do folhetim global Salve Jorge, vendeu em apenas três semanas um milhão de cópias.

Dois anos após assumir sua nova banda, Plant lançou um trabalho com ela: o álbum lullaby and...The Ceaseless Roar, que veio a público em setembro. Depois de anos vivendo nos EUA, Plant retornou à Grã-Bretanha. Nas 11 faixas, consegue unir o melhor dos mundos: o blues americano com o folk inglês e mais uma pitada de música marroquina.

O show mais recente de Roberto em BH foi há quase dois anos, no Mineirinho de sempre. Como veio por aqui logo na ressaca da explosão de Esse cara sou eu, houve até algumas novidades no repertório. Além desta, ainda cantou outra inédita, Furdúncio, a tentativa do Rei se aproximar das batidas eletrônicas, resultando num funk melody que também entrou em trilha de novela.

Plant debutou por aqui em outubro de 2012 para uma plateia de 10 mil pessoas no Expominas – o show desta semana será para a metade disto, dada a capacidade do Chevrolet Hall. Surpreendeu por apresentar oito canções do Zep, de um total de 15 no show. E foi surpreendido pela recepção da ruidosa plateia. “Não sou mais um cara jovem. Então, é uma surpresa quando faço certas coisas pela primeira vez.”

Senhores de seus respectivos reinos, os dois Robertos, a despeito da passagem do tempo e das incontáveis guerras, continuam imbatíveis. Cabe ao público escolher em qual das batalhas entrar.
 (RC/DIVULGAÇÃO)

Roberto Carlos
Show sábado, às 21h, no Mineirinho (Av. Antônio Abrahão Caram, 1.000, Pampulha, (31) 4003-1212). Ingressos: Arquibancada: R$ 120 e R$ 60 (meia); VIP lateral: R$ 170; VIP azul numerado: R$ 460.

Nascimento:
19 de abril de 1941 em Cachoeiro do Itapemirim

Início:

Em 1957, no Rio de Janeiro, com o grupo The Sputniks, que tinha como integrante Tim Maia

Primeiro sucesso:

Em 1963, com o compacto Splish splash/Parei na contramão. A segunda canção inauguraria sua parceria com Erasmo Carlos

Polêmicas:

É uma coleção. A mais conhecida delas é sobre biografias não autorizadas. Em 2006, Roberto proibiu, por meio de ação judicial, a circulação de Roberto Carlos em detalhes, de Paulo César de Araújo. O escritor voltou à carga no ano passado, publicando O réu e o Rei, que conta todo o processo. Roberto também é um dos nomes fortes do movimento Procure Saber.

O que não faz:

Ao longo dos anos, parou de cantar algumas músicas (Negro gato, É proibido fumar), trocou a letra de outras (É preciso saber viver). Culpa do transtorno obsessivo compulsivo (TOC). O tratamento o fez voltar a cantar as “proibidas”. Menos uma, até agora: Quero que vá tudo para o inferno.

Influências:

João Gilberto, a quem imitou sem dó em seu álbum de estreia, Louco por você (1961), que acabou renegando. Até chegar ao ponto de se tornar único, Roberto bebeu na fonte das guarânias (o tom anasalado veio de Anísio Silva), na fase Jovem Guarda, bebeu descaradamente do rock inglês e teve como fontes Johnny Alf e Tito Madi.

Números:

Com 58 discos lançados no Brasil e 100 no exterior, o cantor soma 100 milhões de discos vendidos. É autor de 500 canções, a maior parte delas em parceria com Erasmo.
 (FADEL SENNA/AFP PHOTO)

Robert Plant
Show quinta-feira, às 21h20, no Chevrolet Hall (Av. Nossa Senhora do Carmo, 230, Savassi, (31) 4003-5588). Abertura com St.Vincent. Ingressos: 4 º lote: R$ 320 e R$ 160 (meia).

Nascimento:

20 de agosto de 1948 em
West Bromwich

Início:
Plant tinha 16 anos quando começou a chamar a atenção com apresentações em pubs ingleses. Antes de entrar no Led Zeppelin, em 1968, participou de algumas bandas, como a Band of Joy, que ele reativou no início desta década. Sua estreia em disco foi em compacto em 1966.

Primeiro sucesso:

Gravado em 30 horas pouco após a formação da banda, o primeiro álbum, Led Zeppelin, chegou no início de 1969 aos EUA. Rapidamente, a banda entrou no Top Ten.

Polêmicas:

Stairway to heaven teria sido um plágio de Taurus, música instrumental da banda Spirit, que dividiu palco com o Zep no fim dos anos 1960. O guitarrista Randy California reivindicou a autoria várias vezes. Como ele morreu em 1997, a história só voltou à tona em 2014, graças a um advogado.

O que não faz:

Cantar com o Led Zeppelin.
A última vez foi em 2007.

Influências:

O canto agudo e a voz rasgada, com larga extensão, foram desenvolvidos a partir de bluesmen como Otis Rush, Bukka White e Robert Johnson. Adicione ainda uma pitada de Elvis. A despeito das referências, a interpretação de Plant é só dele. Fez escola, influenciando Freddie Mercury, Axl Rose e Kurt Cobain.

Números:

 A venda da discografia do Led Zeppelin gira em torno de 300 milhões de cópias. O álbum mais vendido é o de 1971, o chamado Led Zeppelin IV, que reúne Black dog, Rock and roll, Stairway to heaven e Going
to California.


 Igual e diferente 

  Enquanto o brasileiro Roberto Carlos chega aos 73 anos mantendo a marca de 'não mudar', o britânico Robert Plant procura se reinventar desde a entrada no Led Zeppelin, há 47 anos

Mariana Peixoto

Roberto Carlos se apresenta no Mineirinho, em 2013 (Tulio Santos/EM/D.A Press)
Roberto Carlos se apresenta no Mineirinho, em 2013

Robert Plant se apresenta no festival Eurockeennes, na França, em 2014 (SEBASTIEN BOZON/AFP PHOTO
)
Robert Plant se apresenta no festival Eurockeennes, na França, em 2014


Ao longo das décadas de 1970 e 1980, o pesquisador e historiador baiano Paulo Cesar de Araújo assistiu a todas as temporadas anuais de Roberto Carlos. Ele o viu no Canecão, a histórica casa de shows carioca, vestido de palhaço em show criado pela dupla Miele e Ronaldo Bôscoli em 1978. Também não perdeu, no mesmo cenário, a temporada de Detalhes  (1987), em que o Rei trocava de roupas em pleno palco, para interpretar canções de fases mais antigas de sua carreira, como a Jovem Guarda.

“Roberto Carlos é um gigante no palco, em disco, na televisão. Por isso ele é um artista maior. É bom em tudo”, afirma Paulo Cesar, lembrando que, quando da chegada da TV no Brasil, houve artistas do rádio que não sobreviveram à tela. “E mesmo sendo bom em tudo, Roberto é um artista do palco, que ele começa a frequentar desde que entra num auditório, aos 9 anos.”

Paulo Cesar já soma 25 anos de dedicação a Roberto Carlos. Começou em 1990 sua pesquisa, que resultou na biografia Roberto Carlos em detalhes, lançada em dezembro de 2006. Roberto entrou com ação contra Paulo Cesar. Caso notório da problemática que cerca a publicação de biografias não autorizadas no país, a obra foi proibida, após decisão judicial envolvendo o cantor, o biógrafo e a editora Planeta, em fevereiro de 2007. Onze mil exemplares foram recolhidos das livrarias na época.

No ano passado, o biógrafo lançou O réu e o Rei (Cia. das Letras), sobre os bastidores de uma disputa que está chegando a uma década. Paulo Cesar espera que uma decisão no Supremo Tribunal Federal possibilite a liberação de seu livro. “Não tem mais cabimento essa proibição. Só lamento o próprio Roberto não tomar essa iniciativa. Como um artista vai, aos 73 anos, carregar a pecha de censor? Isto depois de uma carreira tão linda.”

Há tempos criticado por não se reinventar, Roberto transformou em letra e música (Fera ferida) sua decisão de não mudar. Já para o britânico Plant, a solução é mudar sempre. Sua discografia solo tem início em 1982, dois anos após a dissolução do Zep. Plant já lançou uma dúzia de álbuns, com diferentes formações, desde então.

“A obra solo dele contribui para o desenvolvimento da música popular. É uma tentativa de sofisticar a música atual, onde não existem novos gênios à altura dos grandes do passado, com poucas exceções, como Thom Yorke, do Radiohead”, afirma o jornalista e crítico carioca Jamari França.

Para o jornalista e escritor carioca André Barcinski, a ousadia de Plant vem desde a época do Led Zeppelin. “Foi uma das primeiras bandas do hard rock a ter influência de música indiana, africana. Como estudiosos da música de outros lugares, essa extensão foi natural tanto no trabalho do Page quanto do Plant. Só que o vocalista levou isso mais a sério.”

Independentemente do formato em que se apresenta, Plant terá sempre, na opinião dos dois jornalistas, um lugar no pódio da história do rock. “Seu timbre privilegiado, de grande alcance, serviu de inspiração para milhares de roqueiros. E em termos muscais, o Led influenciou mais do que Beatles ou Rolling Stones, devido ao talento de seus músicos”, afirma França.

Já Barcinski chama a atenção para as características do canto de Plant, que o fazem único. “Ele tentou fazer do rock algo mais dramático. O Led Zeppelin sempre foi influenciado por blueseiros antigos. Só que o vocal do Plant tem uma inflexão teatral. Ouvindo as músicas, percebe-se que ele está ou sofrendo ou apaixonado. Ao adicionar um pouco de drama, ele contribuiu para que a banda se tornasse tão popular.”

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