Quando um texto definitivo for escrito, o
papel atribuído ao venezuelano contrastará com o descrito nas crônicas
implicantes do tempo em que viveu
Estado de Minas: 07/03/2013
Durante os 14 anos
em que exerceu o poder na Venezuela, e mesmo antes, Hugo Chávez foi
demonizado pelo liberalismo ocidental. Sua figura atípica, seu estilo
atrevido e sua liderança insólita desconcertavam os adversários.
Irritavam e inquietavam. Com absoluta falta de cerimônia ele era chamado
de caudilho, déspota, ditador. Agora que ele se foi, o rascunho começa
dar lugar ao texto da história, e os adjetivos cedem lugar a algumas
verdades, como o fato de que nunca exerceu um dia de poder que não tenha
sido legitimado pelo voto popular. Sua morte física deve permitir
também a melhor compreensão de seu papel na construção da atualidade
política do continente e do mundo.
A morte abranda ódios e
paixões, favorece a mais justa reflexão e aclara os contextos do
passado, no que pese a obscurantista reação de um líder do Partido
Republicano americano, que celebrou sua morte dizendo que já ia tarde,
contrastando com a civilidade da oposição venezuelana.
Quando o
texto definitivo da história for escrito, Chávez não surgirá como santo
ou como infalível, o que não era, mas sua importância e o significado de
sua liderança contrastarão com as crônicas implicantes do tempo em que
viveu. Quando Chávez foi eleito pela primeira vez, em 1998, era lembrado
o tempo todo pelo fato de ter participado de uma fracassada tentativa
de golpe, com ideário nacionalista e reformador, em 1992. O governo
venezuelano estava desmoralizado, mas o neoliberalismo reinava
inconteste, fechando as portas para os países pobres e periféricos. Isso
não justifica o ato, mas realça a ousadia política de desafiar o
consenso. O mundo seguia nessa marcha quando ele tomou posse pela
primeira vez, em 1999. O fim da socialismo soviético, a queda do Muro de
Berlim e a crise no paraíso cubano não deixavam espaço para utopias.
Estavam arquivados discursos sobre revolução, transformação, soberania,
integração latino-americana, justiça social. Muito antes de todos os
presidentes progressistas do continente que viriam a ser eleitos, como
Lula, Néstor Kirchner (Argentina), Evo Morales (Bolívia) e José Mujica
(Uruguai), Chávez começou a reabilitar essas utopias e a implementar
políticas desenvolvimentistas e de cunho social. Ele era uma espécie de
produto da resistência ao neoliberalismo, e não das lutas
revolucionárias, como Fidel. Era algo novo, chamado de velho.
O
estilo confrontador e a linguagem áspera têm a ver com o contexto da
mudança política na Venezuela. Aqui, e mesmo no Chile e na Argentina,
houve uma transição. Lá houve uma ruptura com o antigo sistema
oligárquico, mesmo que pelo voto, depois da quartelada de 1992. A
economia estava deprimida e a pobreza assolava o país. O dinheiro do
petróleo, drenado para as oligarquias e para o exterior, passa a ser
usado para financiar políticas sociais. A reforma agrária é realizada e
provoca reações. Diversos setores da economia são estatizados, acirrando
o conflito com algumas empresas de comunicação, o que culmina com a não
renovação da concessão da RCTV. Chávez firma acordos para fornecer
petróleo a preços subsidiados aos países da Aliança Bolivariana, como
Cuba e Nicarágua. Sua liderança transcende à Venezuela. Governantes como
Morales e Rafael Correa, do Equador, são eleitos com seu decisivo
apoio. Entende que a economia venezuelana não irá longe no mundo global
se não aprofundar relações com o Brasil e a Argentina, especialmente.
Pleiteia e consegue o ingresso do país no Mercosul. Com Lula, foi um dos
artífices da União das Nações Sul-Americanas (Unasur).
Seu
legado inclui a erradicação do analfabetismo, a redução da pobreza em
37%, o aumento da renda e do emprego, a melhora indiscutível nos
serviços sociais. E, mais que tudo, o protagonismo político do povo que
agora o chora.
A pergunta que paira sobre seus funerais é a
respeito da sobrevivência do chavismo em sua ausência. Seu vice, Nicolás
Maduro, que ele apontou como herdeiro, disputará a eleição com o
opositor do ano passado, Henrique Caprilles, dentro de 30 dias. A emoção
e o sentimento de orfandade ainda serão intensos, favorecendo Maduro.
Ele não é Chávez, mas poderá – ou não – construir a própria liderança.
Como fez Dilma, criatura de Lula. Mas, ainda que a oposição vença, a
Venezuela moldada por Chávez jamais voltará a ser o país elitista e
iníquo do pré-chavismo.
Para o Brasil, nenhuma situação deve
trazer grandes mudanças no relacionamento bilateral, mesmo não havendo
mais a camaradagem que havia entre Lula e Chávez, herdada por Dilma. A
Venezuela hoje tem um novo peso político no continente e representa um
grande mercado de consumo para o Brasil, afora outros interesses comuns
que tornam a relação bilateral estratégica para os dois países.
No passo eleitoral
Segue a valsa da eleição antecipada, para todos os partidos do baile.
O
senador Aécio Neves (PSDB-MG) vai a São Paulo no dia 25, para uma
conversa olho no olho com o governador Geraldo Alckmin, que ainda não
saiu do conforto palaciano para apoiá-lo. Fernando Henrique media o
encontro.
O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), quase
não dormiu na noite de anteontem. Os últimos interlocutores saíram de
sua suíte num hotel brasiliense depois das duas e meia da manhã. Ele
veio a Brasília para a solenidade de ontem, em que a presidente
distribuiu bondades a prefeitos e governadores, e atendeu uma parte da
longa fila de pedidos de conversas.
Os governadores e prefeitos
receberam na segunda-feira o chamado do Planalto para a festa de
bondades de ontem. “Foi uma agradável surpresa. Nunca a prefeitura de
Porto Alegre foi tão bem tratada pelo governo federal”, saiu dizendo o
prefeito José Fortunatti (PDT). Ele e os demais. Ninguém saiu de mãos
abanando.
Nenhum comentário:
Postar um comentário