terça-feira, 16 de outubro de 2012

Hamlet


À moda da casa

"Hamlet" ganha sotaque brasileiro em montagem do diretor Ron Daniels com Thiago Lacerda
Lenise Pinheiro/Folhapress
Cenas da montagem do diretor Ronald Daniels para "Hamlet"; Thiago Lacerda
Cenas da montagem do diretor Ronald Daniels para "Hamlet"; Thiago Lacerda


GABRIELA MELLÃO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Esqueça que "Hamlet" é a obra-prima de Shakespeare. Apague da memória que este é provavelmente o texto mais encenado da história. Também desconsidere o fato de que o personagem-título talvez seja o mais estudado da literatura mundial.
Ron Daniels busca fazer de sua nova montagem, que estreia nesta sexta em São Paulo, um "Hamlet" inaugural.
"Trabalhei para que as pessoas tenham a sensação de estarem diante de 'Hamlet' pela primeira vez", diz o diretor à Folha.
Se há um brasileiro que pode se aventurar por tal disparate é Ron Daniels, considerado um especialista em Shakespeare, que contabiliza mais de três dezenas de obras do bardo no currículo.
Sua trajetória artística se inicia como ator no Teatro Oficina, de Zé Celso, mas foi como diretor, e em Londres, que ganhou destaque mundial.
Daniels foi encenador da Royal Shakespeare Company durante 15 anos e em 1980 tornou-se diretor-associado da tradicional companhia.
Sinônimo de Shakespeare no mundo, o grupo, cuja sede se situa em Stratford-upon-Avon, cidade natal do bardo, é um dos mais prestigiados da Inglaterra.
Dedica-se sobretudo à montagem dos textos do autor inglês, mantendo plateias e artistas contemporâneos em diálogo com sua obra.
O diretor quer despertar no espectador a sensação de que "Hamlet" foi escrito por um dramaturgo brasileiro.
Seu Shakespeare é, conforme define o brasileiro, "verdadeiramente moderno, brasileiro e autêntico".
Sob as batutas de Daniels e na pele de Thiago Lacerda, Hamlet renasce Rameléti, contracenando com Antonio Petrin, Selma Egrei, Roney Facchini e outros 11 atores cujos personagens também parecem possuir passaporte brasileiro.
Tradutor da obra ao lado de Marcos Daud, o diretor rejeita a linguagem pomposa dos textos shakespearianos. Nada de rebuscamentos ou de "pentâmetro iâmbico", ou seja, a métrica constituída por versos compostos por cinco pares de sílabas, cujas intensidades se alternam.
"Shakespeare não escrevia suas peças só para as elites, e a linguagem do seu teatro não era para ser entendida apenas pelos intelectuais. As palavras que Shakespeare usava vinham da língua do povo", diz Daniels.
Segundo o diretor John Barton, da Royal Shakespeare Company, o "pentâmetro iâmbico" era uma forma natural e gostosa de falar inglês durante o período elisabetano.
Daniels se serve dessa definição para seu "Hamlet". "Traduzi o texto buscando uma forma natural e gostosa de falar o português", explica.
Ressalta, entretanto, que tal escolha não compromete a poesia da obra. Segundo ele, o lirismo de Shakespeare não está nos versos, mas no conteúdo da peça.
Para Daniels, "o que será revelado na boca do ator, sem mistificação, é o conteúdo mais profundo da fala". "Ela nos conduz ao encontro direto com o personagem em toda a sua humanidade e com todas as suas contradições."
HAMLET
QUANDO sex. e sáb., às 21h, dom., às 19h; até 16/12
ONDE Tuca (r. Monte Alegre, 1.024, tel. 0/xx/11/3670-8342)
QUANTO R$ 40 (sex.), R$ 60 (sáb.) e R$ 50 (dom.)
CLASSIFICAÇÃO 14 anos


Thiago Lacerda vive Hamlet existencialista
Ator aceitou convite após saber que Ron Daniels seria o diretor de montagem sobre menino em busca da verdade
Galã conta que já se preparava havia tempo para atuar em texto de Shakespeare, mas não imaginava viver Hamlet
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
"Hamlet" é a maior empreitada da carreira de Thiago Lacerda. Não pela extravagância que é viver o personagem. Tampouco pelos superlativos usados para definir a obra shakespeariana. A grande ousadia, segundo o ator, é atingir a essencialidade do texto.
"A montagem busca simplicidade, algo que só se conquista com a maturidade e a experiência de um diretor como Daniels", diz Lacerda.
Segundo Ron Daniels, seu mérito é ater-se às palavras de Shakespeare. "Tudo o que fiz na vida me leva a este 'Hamlet'. Precisei apenas me entregar ao texto. De tão maravilhoso, é quase como se ele não precisasse de nós. Temos que nos ausentar", diz Daniels.
O ator conta que já pensava havia tempos em exercitar-se numa obra de Shakespeare, autor que define como "a maior fonte dramática da história". Não imaginou começar com sua obra-prima.
Entretanto aceitou de prontidão o convite do cenógrafo e idealizador do projeto, Ruy Cortez, para protagonizar "Hamlet" quando soube que Ron Daniels assinaria a montagem, após mais de uma década longe dos palcos do país -sua última encenação no Brasil foi "Rei Lear", em 2000, com Raul Cortez.
Lacerda embarca na tragédia não como o príncipe dinamarquês que anseia vingar o pai assassinado, personagem que é encenado no mundo todo ao longo de mais de cinco séculos, mas como um menino em busca da verdade.
"Daniels me fez ver que esta é a verdadeira trajetória de Hamlet. Ele é um garoto perdido e doente de algo que desconhece e não sabe para onde deve seguir", diz o ator.
Segundo o diretor, sua doença é a mesma de toda a sociedade: o apodrecimento moral da humanidade. Ela é gerada por homens corruptos regidos por ambições desmedidas, entre outros valores deturpados.
Daniels define Hamlet como existencialista. "Ele se questiona mais do que qualquer personagem shakespeariano. Quer descobrir quem é, onde está e, de quebra, nos faz perceber quem somos."
Não é a primeira vez que Lacerda elege um texto existencialista para interpretar. Em 2008, o ator protagonizou "Calígula", clássico do escritor Albert Camus, sob direção de Gabriel Villela.
"É curioso perceber este meu movimento. Foi uma trajetória involuntária, mas me faz pensar que eu também talvez seja um existencialista", conta. (GABRIELA MELLÃO)

TELEVISÃO - OUTRO CANAL

KEILA JIMENEZ keila.jimenez@grupofolha.com.br /folha.com/outrocanal

Sobrinho de Hebe planeja programa semanal no SBT
Não se passou nem um mês da morte de Hebe Camargo e já circula no SBT um projeto que pretende recuperar os melhores momentos dos mais de 20 anos da apresentadora na emissora.
Encabeçada pelo sobrinho e empresário da loira, Cláudio Pessutti, a ideia é colocar no ar um apanhado semanal ou minutos diários com trechos das melhores entrevistas e performances de Hebe no canal.
A apresentadora, que morreu no último dia 29, vítima de um câncer, chegou a assinar dias antes um contrato para voltar a ser funcionária do SBT.
Visto por alguns como homenagem, o projeto de melhores momentos de Hebe enfrenta rejeição de parte da direção da emissora, que considera a ideia de muito mau gosto.
Isso sem contar os diretores que já têm certeza que Silvio Santos não aprovará o programa, pois ele sempre deixou claro que não gosta de nada relacionado à morte na emissora.
Um exemplo disso foi a exibição de alguns episódios da série "Meu Cunhado", em 2005, logo após a morte do comediante Ronald Golias. Silvio não aceitou bem a proposta e logo pediu para retirar a atração do ar.
Procurado, o sobrinho de Hebe Camargo não retornou às ligações da coluna.
PIPOCA
Divulgação
Longe da TV, o galã Rodrigo Santoro segue no cinema, desta vez, fazendo dublagem no longa "Uma História de Amor e Fúria", animação de Luiz Bolognesi
Policial Sucesso no "Pânico" na época em que o programa ainda estava na RedeTV!, Marcos Heredia, conhecido como Zina, voltou a render audiência, só que à Record.
Policial 2 A nova prisão do rapaz, que é dependente químico, tomou conta dos noticiários da rede e ganhou espaço no "Domingo Espetacular" de anteontem. Zina, que foi preso por roubar uma garrafa de cachaça, está sem contrato com a Rede TV! e vendeu tudo o que ganhou do "Pânico".
Real A vida do músico John Legend vai virar uma série de humor, na Fox.
Contramão Apesar das notícias de que há muita gente interessada na compra da RedeTV!, Marcelo Carvalho, vice-presidente da emissora, segue negando a venda.
O NÚMERO É...
"The Voice Brasil" alcançou recorde de audiência anteontem na Globo: registrou 17 pontos de ibope. Cada ponto equivale a 60 mil domicílios na Grande SP.
Circo A volta do palhaço Bozo está programada para janeiro de 2013 no SBT. A atração irá ao ar aos sábados de manhã.
Inspiração Quem viu o roteiro de "Salve Jorge", próxima novela das 21h da Globo, diz que a trama principal é muito similar a do filme "Busca Implacável" (2008), com Liam Neeson.
Inspiração 2 No longa-metragem, Liam faz um policial honesto que tem uma filha sequestrada por uma rede internacional de sequestros e prostituição.

Coletânea reúne cartas de amor de Pessoa


Coletânea reúne cartas de amor de Pessoa - Isabel Coutinho - 
Livro lançado em Portugal resgata a correspondência íntima do poeta com a jovem Ofélia Queiroz, sua namorada
Obra, que ganha edição ampliada no Brasil em 2013, traz detalhes inéditos de relação que foi tida como platônica

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE LISBOA
Quando o heterônimo Álvaro de Campos escreve, em 1935, o poema "Todas as Cartas de Amor São Ridículas", Fernando Pessoa já não namorava Ofélia Queiroz.
"Quem me dera no tempo em que escrevia/ Sem dar por isso/ Cartas de amor/ Ridículas.", diz o poema. "A verdade é que hoje/ As minhas memórias/ Dessas cartas de amor/ É que são/ Ridículas."
Pela primeira vez, nas livrarias portuguesas, encontram-se as cartas de amor de Fernando Pessoa (1888-1935) e de Ofélia Queiroz (1900-1991) reunidas em uma única edição e obedecendo a um critério cronológico.
É uma edição da Assírio & Alvim (R$ 67,40, 368 págs., importado, na Livraria Cultura) e traz novidades. Além da inclusão de parágrafos omitidos na primeira edição das cartas de Ofélia, o livro inclui duas cartas inéditas da namorada de Pessoa.
Em 2013, como parte da programação do Ano de Portugal no Brasil, a obra será editada em nova versão pela brasileira Capivara. "O nosso livro sairá em maio com cerca de 170 cartas a mais e apresentará as cartas de Pessoa em fac-símile", disse àFolha a editora Bia Corrêa do Lago.
Até a publicação da edição brasileira, a edição organizada pela acadêmica Manuela Parreira da Silva é a mais completa reunião das cartas trocadas entre o poeta e Ofélia.
Em Portugal as cartas do poeta foram publicadas pela primeira vez em 1978, e as de sua amada ganharam uma edição em 1996.
Bia lembra que no prefácio dessa edição dos anos 1990 se dizia "que apenas 110 das 276 cartas enviadas por Ofélia estavam transcritas". A edição brasileira terá as cartas que faltam nas edições portuguesas e que pertencem a seu marido, o colecionador Pedro Corrêa do Lago.
APAIXONADOS
Foi em novembro de 1919 que se conheceram, quando Ofélia tornou-se, aos 19 anos, secretária do escritório Félix, Valladas & Freitas, onde o autor de "Mensagem" trabalhava como tradutor comercial.
Foram trocando bilhetinhos até que em janeiro do ano seguinte, durante uma falta de luz no escritório, o escritor se declarou, citando "Hamlet", contará ela mais tarde.
Nesta edição estão as 51 cartas que Pessoa escreveu a Ofélia Queiroz, entre março e novembro de 1920 (na primeira fase do namoro) e entre setembro de 1929 e janeiro de 1930 (na segunda fase).
"Os altos e baixos do 'enredo', as oscilações de humor, os ritmos 'cardiográficos' tornam-se, por assim dizer, mais fáceis de detectar numa edição como esta", acredita a organizadora.
O casal marca encontros secretos, fala de problemas de saúde. E muitas vezes demonstra ciúmes.
Os dois brincam e falam como se fossem crianças, e Ofélia entra no jogo dos heterônimos do poeta.
Pessoa, no entanto, nunca quis ir à casa dela nem conhecer os seus familiares e também nunca falou da namorada à sua família.
Na carta que o escritor lhe envia para acabar com o namoro, em novembro de 1920, pergunta se ela prefere que ele devolva as cartas acrescentando que preferia conservá-las "como memória viva de um passado morto".
Após o hiato de nove anos entre a primeira e a segunda fase do namoro, os dois voltam a corresponder-se por causa da fotografia que Pessoa lhe envia, tirada em 1929 num estabelecimento de bebidas de Lisboa, com um trocadilho na dedicatória: "Em flagrante delitro".
MEMÓRIAS ÍNTIMAS
Tanto as cartas de Fernando Pessoa como as de Ofélia pertencem, neste momento, a colecionadores.
Por isso, a organizadora teve acesso a fotocópias dos originais, postas à sua disposição pelos herdeiros. As duas cartas inéditas incluídas na edição portuguesa, escritas por Ofélia em julho de 1920, faziam parte do conjunto.
"O motivo da não inclusão na primeira edição foi por vontade dos familiares de Ofélia. Creio que queriam preservar sua memória e evitar que a vida íntima da jovem fosse exposta. Interpretaram talvez erradamente as duas cartas e, por isso, preferiram que não fossem publicadas", explica a pesquisadora.
Em uma dessas cartas, Ofélia diz a Fernando que lhe escreve da cama, de onde não se consegue levantar por estar doente.
Fala de uma "misteriosa doença", e percebe-se que estará relacionada com seu período menstrual, tema ainda tabu na época. No final, ela pede que Pessoa rasgue a carta, coisa que ele nunca fez.
Passaram-se cerca de 15 anos, e a sobrinha-neta de Ofélia, com quem Manuela Parreira da Silva diz ter mantido uma excelente troca de ideias, achou que não fazia mais sentido não torná-las de conhecimento público.
"Afinal, elas tratam apenas de assuntos femininos, que o pudor de uma jovem de 20 anos impedia, naquela época, de abordar mais abertamente", explica a pesquisadora portuguesa.
Lidas sem confronto com as da sua destinatária, as cartas de Pessoa pareceram a muita gente "meros exercícios literários", o que explicará a ideia que se perpetuou de que o namoro entre os dois seria apenas platônico.
"Quando Fernando Pessoa escreve, a certa altura, que lembra com saudades da época em que 'caçava pombos', alguns leitores apressados imaginaram que se tratava de uma desconversa do autor, de uma brincadeira para provocar a sua namorada", diz Parreira da Silva.
"Mas, ao conhecer-se a resposta de Ofélia, percebeu-se que, pelo menos, ela entrava na brincadeira, manifestando uma falsa perplexidade."
A leitura cruzada de outras cartas confirma que Pessoa se referia aos seios da jovem, os "pombinhos" sobre os quais, em outro momento, diz deitar a sua cabeça.
Em outra carta, Pessoa escreve: "Queria ir, ao mesmo tempo", à Índia e a Pombal.
"Se Pombal se torna agora uma metáfora transparente, a Índia permanece velada, sugerindo, obviamente, um outro 'lugar' menos acessível", explica a investigadora.
Na correspondência do casal há outras referências, sobretudo de Ofélia, aos beijos e carícias trocados pelos dois e ao sentimento de júbilo e, às vezes, de saudade que essa recordação lhe provoca.
"Não creio, no entanto, que tenha havido entre os dois uma intimidade maior do que essa", conclui.
"Enfim, foi, sem sombra de dúvida, um namoro comum, que irrita os que imaginavam que Fernando Pessoa tenha sido um homem incapaz de se relacionar com uma mulher. A verdade é que essas cartas reencontram um Fernando Pessoa como um homem muito normal, dentro da extrema anormalidade de ser um grande poeta", acredita a especialista.

FRASE
"Não faz sentido que as cartas não sejam publicadas em conjunto. É na alternância das vozes e dos silêncios que se estabelecem ou se tecem as relações do casal"
MANUELA PARREIRA DA SILVA
pesquisadora portuguesa

Poeta deixou os sentimentos em segundo plano
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE LISBOA

Ofélia Queiroz não queria se tornar "um estorvo" para seu grande amor, queria proporcionar a Fernando Pessoa "uma vida alegre, toda de carinho e felicidade" para que ele pudesse se dedicar à sua vida de literatura.
Foi isto que ela escreveu em uma carta de 30 de setembro de 1929, depois de o poeta, no dia anterior, lhe ter enviado uma carta em que explicava que para realizar a sua obra literária precisava de sossego e de um certo isolamento.
Ainda que tudo o mais na vida de Pessoa tivesse, para ele, interesse secundário, Manuela Parreira da Silva, que desde 1987 estuda o espólio do escritor, considera que a leitura sequencial da correspondência entre os dois evidencia menos platonismo que se imaginava.
"É preciso que todos, que lidam comigo, se convençam de que sou assim, e que exigir-me os sentimentos, aliás dignos, de um homem vulgar e banal, é como exigir-me que tenha olhos azuis e cabelo louro", escreve Pessoa.
Mais à frente assegura à amada que gosta "mesmo muito da Ofelinha" e que, se um dia viesse a se casar, seria com ela.
De fato, Fernando Pessoa nunca se casou. (IC)

Os 80 anos de Portella


CARLOS HEITOR CONY

Os 80 anos de Portella

RIO DE JANEIRO - "'Não sou ministro. Estou ministro.' A frase, pronunciada pelo então ministro da Educação, em sua simplicidade radical ficou sendo uma das melhores expressões do velhíssimo problema que tenta definir a relação do intelectual com o poder. Pronunciou-a, em causa própria, Eduardo Portella, que aceitara o cargo num momento em que a morte da ditadura e a abertura política eram consideradas iminentes.
O tema (cultura e poder) frequenta sua obra de ensaísta e crítico de literatura. Um de seus livros, publicado pela Tempo Brasileiro, editora que fundou e até hoje dirige, tem o título de "O Intelectual e o Poder".
Nele, o ensaio "O renascimento da utopia" desenvolve magistralmente aquela frase pronunciada num momento de sua biografia:
'E daí também a necessidade de o intelectual guardar, como arma não tão secreta, o trunfo da insubmissão.
A alternativa da insubordinação deve recuperar o ser do estar. Até porque nós só temos o que podemos perder; o que não podemos perder nos tem'.
Baiano, formado em Recife, onde conviveu com Gilberto Freyre, Portella fez estudos na Espanha, quando foi aluno de Dámaso Alonso e Carlos Bousoño; mais tarde, na Itália, onde recebeu aulas de Ungaretti; e de Bataillon, no Collège de France e na Sorbonne, tornando-se, assim, o crítico mais bem equipado de sua geração. Portella construiu uma sólida reputação não apenas na crítica da literatura, mas nos assuntos brasileiros em geral."
O texto acima foi escrito há mais de dez anos, quando do lançamento de mais um livro de sua famosa série "Dimensões". Estamos agora comemorando os seus 80 anos, com bela exposição na Academia Brasileira de Letras sobre sua vida e obra. Além de ser das mais brilhantes, sua trajetória pessoal e literária dá dimensão cultural ao nosso tempo.


Medo de crescer

Rosely Sayão 

A criança tem emoções contraditórias ao sentir que vai ganhar mais autonomia, na faixa dos sete anos

A mãe de um garoto de sete anos está preocupada porque, nos últimos meses, ele anda medroso. Tem medo do escuro, de monstros, de andar sozinho pela casa. Nem mesmo ao banheiro ele consegue ir sozinho.
Ela achava que os "medos bobos", como os chama, não teriam mais força com a chegada dos sete anos.
Já outra mãe, cuja filha tem a mesma idade do garoto acima citado, anda é muito irritada com a menina. "Parece adolescente!", diz ela. Desobedece, faz birras sem o menor sentido, só quer fazer o que quer e na hora que quer, anda respondona e chegou, inclusive, a xingar a mãe com um palavrão. A mãe diz que sabe que a filha desconhece o sentido do que falou, mas, mesmo assim, ficou muito brava com a atitude dela.
Os desabafos dessas mães podem nos servir de guia para uma conversa a respeito dessa idade: os sete anos, um pouco menos ou um pouco mais, de acordo com cada criança.
Nos primeiros anos de vida da criança, ela tem uma grande dependência dos pais ou de seus substitutos.
Vamos tomar como exemplo a relação da criança pequena com sua mãe. É um apego enorme e recíproco, não é mesmo?
Isso porque o vínculo criado entre ambas é o responsável pelo desenvolvimento da criança, por sua segurança, por sua identidade etc.
Ou seja, é essa relação que, mesmo à distância, permite à criança explorar o mundo, se conhecer e se reconhecer como participante de um grupo, que é a sua família.
Nesse período, os pais representam para a criança sua proteção, sua defesa, sua garantia de que ela pode viver e experimentar o que quiser. Ficar longe dos pais apenas é possível se a criança sente que quem a recebe conta com a confiança deles.
A partir dos seis anos, mais ou menos, a criança começa a perceber, pelo andamento da vida, que vai começar a crescer. E, mesmo que intuitivamente, pressente que crescer significará se afastar de sua mãe, de seus pais.
Isso pode provocar sentimentos contraditórios: entusiasmo e -por que não?- medo, revolta.
Entusiasmo porque crescer significa ganhar autonomia, mais vida. Medo porque isso significa perder a proteção, a defesa, a garantia de que tudo ficará bem.
É por isso que muitos pais enfrentam momentos de crise com seus filhos dessa faixa de idade. Tudo o que essas crianças precisam é sentir que seus pais continuarão ali, ao seu lado.
Não são medos bobos o que as crianças dessa idade sentem. Esses temores podem ser traduzidos em um dos que o garoto do primeiro exemplo expressa ao pé da letra: medo de ficar sozinho, ou seja, sem seus pais.
A rebeldia, por outro lado, não tem nada de adolescente. É braveza: a criança sabe que os pais se afastarão dela para que ela comece a andar com as próprias pernas.
Toda mãe lembra dos primeiros passos dos seus filhos: hesitantes, desequilibrados, sem harmonia. E assim será também agora, com os primeiros passos de outra ordem.
É preciso que os pais sinalizem aos filhos que eles continuam por ali, estimulando esses passos. Os primeiros podem ser acompanhados, apoiados, apenas para oferecer tranquilidade para que, em seguida, os filhos possam continuar sozinhos.
O que não vale é ampará-los antes que caiam ou impedir que caminhem. Não foi assim com os primeiros passos reais, não deve ser assim com essa nova fase. E sempre é bom lembrar: crescer dói, mas é preciso.

ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha)

A bela velhice


A bela velhice
Há uma geração que está rejeitando estereótipos e criando novos significados para o envelhecimento

No livro "A Velhice", Simone de Beauvoir, após descrever o dramático quadro do processo de envelhecimento, aponta um possível caminho para a construção de uma "bela velhice": ter um projeto de vida.
No Brasil, temos vários exemplos de "belos velhos": Caetano Veloso, Gilberto Gil, Ney Matogrosso, Chico Buarque, Marieta Severo, Rita Lee, entre outros.
Duvido que alguém consiga enxergar neles, que já chegaram ou estão chegando aos 70 anos, um retrato negativo do envelhecimento. São típicos exemplos de pessoas chamadas "ageless" ou sem idade.
Fazem parte de uma geração que não aceitará o imperativo: "Seja um velho!" ou qualquer outro rótulo que sempre contestaram.
São de uma geração que transformou comportamentos e valores de homens e mulheres, que tornou a sexualidade mais livre e prazerosa, que inventou diferentes arranjos amorosos e conjugais, que legitimou novas formas de família e que ampliou as possibilidades de ser mãe, pai, avô e avó.
Esses "belos velhos" inventaram um lugar especial no mundo e se reinventam permanentemente.
Continuam cantando, dançando, criando, amando, brincando, trabalhando, transgredindo tabus etc. Não se aposentaram de si mesmos, recusaram as regras que os obrigariam a se comportarem como velhos. Não se tornaram invisíveis, apagados, infelizes, doentes, deprimidos.
Eles, como tantos outros "belos velhos" que tenho pesquisado, estão rejeitando os estereótipos e criando novas possibilidades e significados para o envelhecimento.
Em 2011, após assistir quatro vezes ao mesmo show de Paul McCartney, perguntei a um amigo de 72 anos: "Por que ele, aos 69 anos, faz um show de quase três horas, cantando, tocando e dançando sem parar, se o público ficaria satisfeito se ele fizesse um show de uma hora?". Ele respondeu sorrindo: "Porque ele tem tesão no que faz".
O título do meu livro "Coroas" é uma forma de militância lúdica na luta contra os preconceitos que cercam o envelhecimento. Tenho investido em revelar aspectos positivos e belos da velhice, sem deixar de discutir os aspectos negativos.
Como diz a música de Arnaldo Antunes, "Que preto, que branco, que índio o quê?/Somos o que somos: inclassificáveis". Acredito que podemos ousar um pouco mais e cantar: "Que jovem, que adulto, que velho o quê?/ Somos o que somos: inclassificáveis".

MIRIAN GOLDENBERG é antropóloga, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro e autora de "Corpo, Envelhecimento e Felicidade" (Ed. Civilização Brasileira)
OUTRAS IDEIAS
MIRIAN GOLDENBERG -mailto:miriangoldenberg@uol.com.br

Quando é justo sacrificar um animal?
Conheça as novas regras da eutanásia de bichos e as críticas das entidades de proteção
Eduardo Knapp/Folhapress
A veterinária Miriam com seu Mingau, que escapou de ser sacrificado; à frente, Radar, seu paciente
A veterinária Miriam com seu Mingau, que escapou de ser sacrificado; à frente, Radar, seu paciente
JULIANA CUNHA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
No dicionário dos homens, eutanásia é aquele ato generoso de proporcionar morte sem dor para quem sofre de uma doença incurável. No mundo animal, a palavra ganha sentido mais elástico: é estendida para casos em que o dono do bicho doente não pode pagar o tratamento.
Esse é o ponto mais polêmico entre as novas regras definidas pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária. A entidade revisou sua normatização sobre eutanásia e emitiu uma nova resolução, que vem sendo criticada por entidades de proteção.
O documento inclui novos métodos para o sacrifício e retira da lista procedimentos de risco como o choque elétrico sem anestesia prévia.
Até aí, tudo bem. O problema é que o veterinário fica autorizado a matar animais produtivos doentes e cujo tratamento represente custos incompatíveis com a atividade ou com os recursos do proprietário. Trocando em miúdos: donos de animais de fazenda enfermos podem optar pela morte mesmo que ela possa ser evitada com cuidado médico.
"A nova regra veio para regularizar a situação de trabalhadores rurais que não podem gastar o valor de cinco vacas para tratar um único animal com a perna quebrada, visto que não possuem recursos", diz Marcelo Weinstein Teixeira, da Comissão de Ética, Bioética e Bem-Estar Animal do Conselho.
Para a empresária e protetora de gatos Eunice Lima, 42, a nova regra é desumana. "O fazendeiro tem que colocar em sua planilha de custos que os bichos também adoecem e precisam de tratamento. Não existe isso de matar só porque é caro cuidar", diz.
"O conselho não atentou para o fato de que a eutanásia deve ser praticada em benefício do animal, não de seu proprietário", diz Vanice Orlandi, presidente da Uipa (União Internacional Protetora dos Animais). Segundo ela, que é advogada, o texto da nova resolução não condiz com a legislação que protege os animais, abrindo brecha para o sacrifício de "pets" por motivo financeiro.
"A resolução autoriza o sacrifício quando o tratamento tiver custos incompatíveis com a atividade que o animal desempenha ou com os recursos do dono. Cães e gatos não estão excluídos, uma vez que a resolução dispõe sobre a eutanásia de animais, sem fazer distinção entre os que são destinados ao abate e à companhia doméstica", afima.
Segundo a entidade dos veterinários, quem tem bichos de estimação não pode recorrer à eutanásia só porque o tratamento é caro. "Quem não pode pagar deve buscar os hospitais universitários, os poucos hospitais veterinários públicos ou as ONGs", diz Benedito Fortes de Arruda, presidente do Conselho Federal de Medicina Veterinária.
SARNA E CONJUNTIVITE
Mas Orlandi, da Uipa, critica ainda a autorização para sacrificar animais que constituírem ameaça à saúde pública. "Sarna pode ser considerada ameaça, até conjuntivite é ameaça", afirma. Na visão dela, o texto deveria deixar claro que a eutanásia só é aceitável quando o bicho tem doença incurável.
"A nova resolução é um consenso entre os veterinários. Ninguém está falando em matar animais saudáveis, a regra vale apenas para os doentes que representam alto custo. Tratar uma vaca não é como cuidar de um gato dentro de casa", diz Fortes.
Para Rosângela Ribeiro, veterinária e gerente de programas da WSPA (World Society for the Protection of Animals), outra falha da resolução é autorizar que pessoas sem diploma pratiquem eutanásia desde que assistidas por profissional da área.
"Esse é um procedimento delicado que pode gerar dor."
Teixeira rebate explicando o propósito da nova regra: "Em casos de epidemia, quando é necessário sacrificar um rebanho inteiro, o veterinário pode receber ajuda de pessoas treinadas desde que ele se responsabilize".
No ano que vem, o Conselho Federal de Medicina Veterinária deve publicar um guia de métodos e boas práticas feito com o Ministério da Ciência e Tecnologia para orientar os profissionais sobre as técnicas de eutanásia. Segundo Teixeira, o método mais seguro, hoje, é a injeção de um anestésico potente.
É justamente com injeção letal que é feita a eutanásia no Centro de Controle de Zoonoses de São Paulo. O órgão informa que sacrificou 912 cães e 103 gatos no primeiro semestre. "São animais removidos da rua, que já chegam ao centro sem condições de serem tratados", afirma Telma Rocha, subgerente de Vigilância e Controle de Animais Domésticos do órgão.
DECISÃO TRAUMÁTICA
Sacrificar animal doméstico é uma decisão traumática. Muita gente desiste de ter bichos depois da experiência.
Em fevereiro de 2008, o gato Calvin, de seis anos, estava com 70% de sua função renal comprometida. Fazia xixi pela casa e emagrecia a olhos vistos, quando a dona, a advogada Camila Sesana, 38, decidiu sacrificá-lo.
"Nunca vou esquecer o suspirinho que ele deu quando o anestésico entrou. Foi um dos dias mais pesados da minha vida", diz. "Mesmo sem hipótese de melhora, foi atordoante me ver na posição de definir o fim da vida dele."
Aos dez anos, a cocker spaniel Bruna ficou cega. Este ano, aos 15, foi operada de uma inflamação no útero. "Dois meses após a cirurgia ela enfraqueceu e não levantava para nada", conta a engenheira ambiental Paula Ferreira, 24.
Um dia, Bruna desmaiou no banho e foi levada ao veterinário: a inflamação no útero se espalhou. Nova operação foi desaconselhada por conta da idade da cadela.
"Conversamos na família e decidimos que o melhor era deixá-la descansar", diz Paula. Hoje, seus pais discutem se terão ou não outro bicho.
Aos 15 anos, a engenheria civil Ana Carolina Paulino, 30, ganhou um bichinho de 1,90 m, o cavalo Dakar, criado na chácara onde ela morava, no Tocantins.
Aos 17 anos, Ana levou Dakar para uma cavalgada. Caíram num buraco tampado pelo mato e Dakar feriu uma vértebra lombar. O cavalo chegou a andar até o caminhão que iria levá-lo de volta à chácara e foi examinado por um veterinário. Ao chegar, tropeçou na saída, na rampa do caminhão. A vértebra que estava fissurada se quebrou.
"Não foi possível fazer nada. Aplicamos anti-inflamatórios e analgésicos, mas a dor dele era visível", diz Ana Paula. Os pais e o veterinário decidiram sacrificar o bicho. Já ela não aceitava a ideia.
"Eles marcaram a data, mas, no dia, não deixei. Fizeram a eutanásia quando eu saí para prestar vestibular." Ana se mudou para cursar a faculdade e conta que nunca mais conseguiu voltar à chácara ou andar a cavalo.
Por ano, 4 milhões de cães e gatos sofrem eutanásia nos EUA
40% das casas americanas têm pelo menos 1 cão de estimação
FONTES: ASPCA (SOCIEDADE AMERICANA DE PREVENÇÃO À CRUELDADE CONTRA ANIMAIS); APPA (ASSOCIAÇÃO AMERICANA DA INDÚSTRIA DE PRODUTOS PARA ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO)
912 cães e 103 gatos foram sacrificados no Centro de Controle de Zoonoses da cidade de São Paulo durante o primeiro semestre de 2012
FONTE: TELMA ROCHA, SUBGERENTE DE VIGILÂNCIA E CONTROLE DE ANIMAIS DOMÉSTICOS DO CENTRO DE CONTROLE DE ZOONOSES DE SÃO PAULO
Nos EUA, há 84,7 milhões de gatos e 78,2 milhões de cães
O custo médio para criar um pet nos EUA é U$ 700 por ano (R$ 1.424)
Fontes: ASPCA (sociedade americana de prevenção à crueldade contra animais); APPA (associação americana da indústria de produtos para animais de estimação)

INJEÇÃO LETAL
Como é feita a eutanásia
Quem está com um animal doente e acha que ele precisa ser sacrificado pode recorrer a um veterinário particular ou ao Centro de Controle de Zoonoses
No Centro de Zoonoses, o procedimento custa R$ 19,30 para cães e R$ 17,50 para gatos
O animal deve passar por uma avaliação clínica que ateste a presença de uma doença incurável e que traga sofrimento para ele ou ameaça à saúde dos donos
O Centro de Zoonoses não aceita que a avaliação médica seja feita por um veterinário externo
É feita uma sedação com tranquilizante seguida de anestesia geral. Se houver necessidade, pode ser aplicada uma medicação para interrupção dos batimentos cardíacos
Sacrificar animais sem orientação do veterinário ou sem anestesia é crime mesmo que fique provado que o bicho estava doente
Fontes: Telma Rocha, subgerente de Vigilância e Controle de Animais Domésticos do Centro de Controle de Zoonoses de São Paulo e Marcelo Weinstein Teixeira, da Comissão de Ética, Bioética e Bem-Estar Animal do Conselho Federal de Medicina Veterinária

DEPOIMENTO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
"Eu estava atendendo um cão na clínica onde trabalho quando me apareceu uma criadora com um filhote ferido. Criadora não é bem o termo, era uma leiga que resolveu ganhar uns trocados em cima da cadela 'lhasa apso' de dez meses que tinha.
Uma cadela dessa idade ainda é adolescente, não deveria procriar. Mas procriou. Quando veio a ninhada, a mãe ficou perdida e mordeu a patinha do filhote junto com a placenta. A criadora achou que o filhote ficaria manco, defeituoso para o propósito dela, que era vendê-lo. Chegou pedindo uma eutanásia. Que absurdo! Ela não queria nem saber qual era o problema, o nível da sequela. Disse que não tinha dinheiro, mas não tinha interesse naquela vida.
Oferecemos um tratamento gratuito, mas nem assim ela quis. Daria trabalho. Terminei ficando com o filhote. Hoje é o meu Mingau. Fez duas cirurgias, tem três anos, arrasta um pouco a patinha mordida e é um amor.
Ainda vemos casos de pessoas que abandonam cachorros no "pet shop". Há donos que pedem por eutanásias injustas só porque o cachorro está doente e dando trabalho. Tem gente que acha que veterinário é obrigado a cuidar de graça de qualquer animal.
Mesmo assim, sou otimista. Tenho 15 anos de carreira e esses casos acontecem cada vez menos. Aos poucos, as pessoas estão tomando responsabilidade pelos animais que criam."
Miriam Caramico, 36, veterinária


DEPOIMENTO
'Isso de não querer sofrer por causa de bicho não funciona'
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
"Pipoca tinha a maior energia do mundo e virou um zumbi. Aos 17 anos, teve um problema grave de coluna.
A doença piorou repentinamente: ele já não conseguia erguer as patas traseiras. Andava se arrastando. Parecia que tinha caído uma pecinha do esqueleto que sustentava as patas. Fazia cara de dor, chorava baixinho.
Com remédios e analgésicos, em cinco dias voltou a andar. Ficou feliz. Era como se o cachorro da gente tivesse voltado. Mas as patas voltaram a cair 20 dias depois.
Aí virou história de teimosia. A veterinária passou mais remédios, ele não reagiu. Continuamos o tratamento por oito semanas.
Quando vi que não tinha jeito, perguntei quais eram as opções. Ele poderia andar numa daquelas cadeirinhas de roda que a gente vê alguns cachorros usando na rua ou ser sacrificado. Ela recomendava a segunda opção. Pipoca estava idoso, os músculos iriam atrofiar na cadeira.
Demoramos para decidir. Minha filha ficou inconsolável. Por um tempo pensei que não pegaria outro bicho, mas há dois anos minha filha trouxe a Tequila da rua, eu aceitei. Pensei que não era justo deixar a cadelinha na rua só para não sofrer depois.
Essa história de não querer sofrer não funciona. Nunca funcionou com gente, imagina se funcionaria com bicho."
R$ 410 é o custo médio para tratar um cachorro com a pata quebrada. O valor chega a R$ 1.500 caso ele precise ser operado
R$ 300 é o preço de um tratamento de sarna
R$ 2.000 é o valor médio que os donos precisam desembolçar para tratar um câncer
Fernanda Bernardo, 42, dona de casa que tem sete gatos e um cachorro


Teor de sódio varia mais de dez vezes entre marcas de alimentos


Teor de sódio varia mais de dez vezes entre marcas de alimentos
Dado é de estudo da Anvisa; erro levou agência a retificar dadosJOHANNA NUBLAT


DE BRASÍLIA
Uma marca de queijo minas frescal pode ter 14,4 vezes a quantidade de sódio do seu concorrente. Disparidades como essa também existem entre marcas de queijo parmesão e de ricota fresca.
É o que indica um monitoramento feito pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) com 26 produtos à venda entre 2010 e 2011.
O estudo aponta índices altos de sódio nos alimentos processados, que podem elevar a dieta do brasileiro a acima do máximo recomendado de 5 g de sal por dia. Estima-se que o consumo médio no país seja de 12 g por dia de sal.
Ontem, a agência chegou a informar que 200 ml de bebidas lácteas, como achocolatados prontos, tinham 93% do sódio que uma pessoa deve ingerir no dia.
Questionada pela Folha sobre a discrepância com rótulos disponíveis no mercado, a agência confirmou o dado e disse que, possivelmente, os rótulos estavam errados. No fim do dia, a Anvisa disse que havia errado e divulgado um número equivalente a dez vezes o real.
Assim, um copo da bebida à base de leite com sabor artificial tem 10% do máximo de sódio recomendado.
Os derivados do leite, assim como os embutidos, são os próximos produtos que devem entrar nos acordos do governo com a indústria para a redução voluntária do sódio.
A indústria se comprometeu a reduzir, a partir deste ano e nos próximos, percentuais de sódio em pães, bolos, maionese, macarrão instantâneo, entre outros.
O monitoramento divulgado mostra que, já em 2010 e 2011, a média de sódio em salgadinhos de milho e batata palha estava abaixo da meta fixada para o fim de 2012.
A Anvisa pretende avaliar em 2013 o cumprimento das metas. Para a agência, a disparidade entre as marcas (não reveladas no estudo) indica que a indústria tem tecnologia para produzir um alimento mais saudável.

HC testa atendimento psiquiátrico on-line


HC testa atendimento psiquiátrico on-line
Pesquisa do Instituto de Psiquiatria vai avaliar consultas por videoconferência para tratar pacientes com depressão
Estudo britânico demonstrou que as sessões à distância são tão eficazes quanto as presenciais
Avener Prado/Folhapress
A assistente comercial Daniela Gonzaga, 28, de São Paulo, que faz terapia online com dois psicólogos
A assistente comercial Daniela Gonzaga, 28, de São Paulo, que faz terapia online com dois psicólogos
CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO
O Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo (IPq) testará, pela primeira vez, o tratamento de pacientes deprimidos por meio de consultas por videoconferência pela internet.
Os cem pacientes selecionados vão ser divididos, aleatoriamente, em dois grupos. Metade receberá o atendimento convencional (medicação e consultas de 20 minutos, uma vez por mês, no ambulatório do IPq).
Os outros 50 serão atendidos virtualmente (consultas mensais de 20 minutos pela internet) e receberão a medicação por motoboy. O tratamento vai durar um ano. Os interessados podem se inscrever pelo e-mail agendamento.ipq@gmail.com.
Segundo a psicóloga Ines Hungerbuehler, pesquisadora do Laboratório de Neurociências do IPq, o objetivo é verificar se o atendimento psiquiátrico virtual é tão eficaz quanto o presencial.
"Será uma forma de ampliar o acesso e a eficácia do acompanhamento do paciente crônico e, ao mesmo tempo, liberar o ambulatório para os casos agudos, que realmente precisam de um contato presencial."
O CFM (Conselho Federal de Medicina) veta consultas on-line -exceto quando fazem parte de pesquisas.
REINO UNIDO
Um estudo recente feito com dados de 36 mil pacientes do Reino Unido concluiu que terapia à distância é tão eficaz quanto a sessão no consultório. Foram comparados os resultados de pessoas atendidas por psicólogos à distância (por telefone ou Skype) com quem fez as sessões cara a cara.
A eficácia das duas modalidades só foi diferente para quem tinha problemas mais graves (depressão severa e fobias) e idosos. O custo da terapia on-line foi 36% menor.
Segundo o psicólogo Peter Jones, da Universidade de Cambridge, a terapia à distância facilita o acesso a serviços de saúde mental de pessoas com limitações de tempo, transporte ou com deficiências físicas. O estudo foi publicado na revista científica "PLoS One".
A partir do achado, o governo inglês começou a testar técnicas de treinamento para que psicólogos da rede pública façam o atendimento à distância.
No Brasil, o Conselho Federal de Psicologia baixou, em junho, novas regras para a interação à distância entre psicólogos e pacientes. As normas, que entram em vigor em janeiro, aumentaram de dez para 20 o número máximo de sessões pela internet.
Oficialmente, as sessões psicológicas por e-mail, MSN ou Skype são permitidas só para aconselhamento.
O atendimento psicoterápico, sem limite de consultas, precisa ser presencial -exceto para fins de pesquisa.
Mas oito psicólogos afirmaram à Folha que já fazem psicoterapia à distância.
Humberto Verona, presidente do Conselho Federal de Psicologia, reconhece que a permissão necessita ser revista. "Precisamos acompanhar a tecnologia. Mas temos que resolver muitas questões ainda em aberto na terapia on-line, como a manutenção do vínculo com o paciente."
Falta formação específica para terapia à distância
DE SÃO PAULO
A falta de capacitação de psicólogos é um dos principais entraves à expansão da terapia on-line, segundo especialistas.
"Muitos acham que é fácil, que é só transportar a experiência da clínica para o on-line. Mas isso é um engano", diz Rosa Farah, coordenadora do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática da PUC.
Segundo Milene Rosenthal, do site Psicolink, que reúne 40 psicólogos, o profissional também deve atentar para a segurança das informações. O site cobra R$ 65 por consulta.
A assistente comercial Daniela Gonzaga, 28, faz terapia on-line com dois psicólogos. "Um para me orientar sobre questões profissionais e o outro, para um problema familiar." Ela aprovou o atendimento. "Na segunda sessão, já consegui resolver um problema com a minha mãe."
Para Daniela, a facilidade de receber um atendimento sem sair de casa e o preço "mais em conta" são as principais vantagens da terapia on-line