quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Ibama facilitou licença de projeto em ilha de Santos

FOLHA DE SÃO PAULO

Complexo investigado pela PF obteve aval sem atender a pedidos técnicos
Empreendimento de R$ 2 bi é de interesse de ex-senador; instituto afirma que mudanças reduziram desmate
MARIO CESAR CARVALHOJOSÉ ERNESTO CREDENDIODE SÃO PAULOO Ibama ignorou parecer de seu corpo técnico e concedeu uma licença em outubro deste ano para a construção de um complexo portuário na ilha de Bagres, no porto de Santos, no litoral paulista.
O principal interessado no empreendimento de Bagres, de R$ 2 bilhões, é o ex-senador Gilberto Miranda, acusado pela Polícia Federal na Operação Porto Seguro de pagar propina para obter pareceres favoráveis para ocupar duas ilhas no litoral paulista -a de Bagres e a de Cabras.
Miranda foi denunciado à Justiça sob suspeita de corrupção ativa, acusado de pagar propina a uma ex-superintendente da SPU (Secretaria do Patrimônio da União) para usar a ilha de Bagres. O advogado dele já disse repetidas vezes que não comenta sua defesa na imprensa.
As indicações de como as recomendações técnicas foram deixadas de lado aparecem em documentos obtidos pela Folha sobre o processo de licenciamento ambiental do complexo portuário.
Num parecer técnico de 30 de maio deste ano, quatro analistas ambientais do Ibama em Brasília dizem que "não é possível analisar a viabilidade ambiental do empreendimento sem levar em consideração os impactos decorrentes da instalação" de um outro projeto, um terminal portuário chamado Brites.
Como o porto da ilha de Bagres e o terminal são vizinhos e usam a mesma estrada de acesso, os técnicos fizeram três recomendações:
1) Mudar a configuração dos dois empreendimentos;
2) Fazer um "novo levantamento de impactos que considere as sinergias" das duas ocupações;
3) Medidas de compensação "compatíveis" com os dois projetos.
Só um novo estudo ambiental sobre os dois projetos levaria um ano para ser concluído, segundo técnicos ouvidos pela reportagem.
Cinco meses depois, porém, a empresa do projeto, a SPE (São Paulo Empreendimentos Portuários), obteve a licença provisória para criar o porto de R$ 2 bilhões.
Houve mudança no layout -uma das três exigências dos técnicos do Ibama. A área foi reduzida de 139,4 para 126,4 hectares, o que provocou redução na área de desmate, de aterro e de dragagem, de acordo com o Ibama.
Não há, entretanto, notícias dos estudos pedidos e das medidas compensatórias.
ÁREA DE PROTEÇÃO
A preocupação dos técnicos do Ibama com a soma dos impactos deve-se ao porte dos dois projetos em Santos.
O complexo portuário da ilha de Bagres tinha originalmente 139 hectares (o equivalente a 139 campos de futebol), numa área de proteção permanente, com mata atlântica e manguezal.
O terminal Brites é ainda maior: tem 190 hectares (ou 190 campos de futebol) numa área classificada pelo Ministério do Meio Ambiente como de "importância extremamente alta para a conservação da biodiversidade".
É também o ponto de pouso de aves migratórias. O projeto, de R$ 1,5 bilhão, é da Triunfo Participações.
Em junho passado, menos de um mês após os pedidos dos técnicos, o Ibama realizou uma reunião com os dois grupos para discutir a interação dos empreendimentos.
O instituto não registrou o encontro em ata. Em setembro, foram pedidos novos esclarecimentos -e, no mês seguinte, a licença foi dada.
O Ministério Público Federal está investigando os procedimentos de licenciamento do projeto de Bagres. Uma das razões é a velocidade com que o processo tramitou no órgão federal.
Segundo a Polícia Federal, há indícios de que o grupo denunciado na Operação Porto Seguro tenha atuado no Ibama para licenciar o projeto.
Folha solicitou à SPE os estudos técnicos que embasaram a licença, mas não obteve resposta. A assessoria da Triunfo apresentou à Folha o protocolo de um estudo sobre a sinergia dos dois projetos. O projeto de Brites não está sob investigação da PF.

    OUTRO LADO
    Tramitação legal foi obedecida, afirma instituto
    DE SÃO PAULOO Ibama afirma que toda a tramitação cronológica e legal do licenciamento do projeto de Bagres foi seguida e que ainda há tempo, nas demais licenças futuras (principalmente a de instalação do empreendimento), para que todos os pontos sejam rediscutidos, caso haja dúvidas a respeito do processo.
    Segundo o Ibama, a reunião ocorrida entre órgãos de governo e representantes dos projetos de Bagres e Brites gerou mudanças no projeto.
    Em setembro, afirma o Ibama, foram solicitados mais esclarecimentos sobre a infraestrutura necessária à operação do empreendimento, porque havia dúvidas sobre questões como fornecimento de energia e acesso ao local.
    O Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) ainda reafirmou que, a pedido dos técnicos do órgão, foi feita uma mudança no layout do projeto, com redução de 13 hectares do tamanho do empreendimento.
    Este rearranjo de layout teve como consequência direta a minimização da supressão de vegetação, aterro e volume de dragagem.
    Um novo documento, com dados complementares, foi anexado ao processo em outubro, segundo o Ibama.
    EXIGÊNCIAS LEGAIS
    Houve somente uma audiência pública para discutir o caso, realizada numa sexta-feira à noite. Sobre isso, o órgão diz que, como os municípios afetados são próximos, um evento seria suficiente.
    O poder de definir quantas audiências são necessárias é do Ibama, mas grupos com mais de 50 pessoas podem requisitar um maior número.
    A SPE (Secretaria Especial de Portos) não quis se pronunciar sobre o projeto, mas afirma que seguiu todas as exigências legais determinadas pelo Ibama.
    O ex-senador Gilberto Miranda não foi localizado. O advogado dele, Cláudio Pimentel, já disse repetidas vezes que não comenta a investigação da PF na imprensa.

      Quadrinhos

      FOLHA DE SÃO PAULO

      CHICLETE COM BANANA      ANGELI
      ANGELI
      PIRATAS DO TIETÊ      LAERTE

      LAERTE
      DAIQUIRI      CACO GALHARDO
      CACO GALHARDO
      NÍQUEL NÁUSEA      FERNANDO GONSALES

      FERNANDO GONSALES
      MUNDO MONSTRO      ADÃO ITURRUSGARAI

      ADÃO ITURRUSGARAI
      BIFALAND, A CIDADE MALDITA      ALLAN SIEBER
      ALLAN SIEBER
      MALVADOS      ANDRÉ DAHMER

      ANDRÉ DAHMER
      GARFIELD      JIM DAVIS
      JIM DAVIS

      HORA DO CAFÉ      ALVES

      ALVES

      Frei Betto - Feliz ano novo‏

      A verdadeira felicidade consiste em canalizar o desejo para dentro de si e, a partir de valores, imprimir sentido à existência 

      Frei Betto
      Estado de Minas: 26/12/2012 
      or que desejar feliz ano novo se há tanta infelicidade à nossa volta? Será feliz o próximo ano para afegãos e palestinos, e os soldados usamericanos sob ordens de um governo imperialista que qualifica de “justas” guerras de ocupações genocidas? Serão felizes as crianças africanas reduzidas a esqueletos de olhos perplexos pela tortura da fome? Seremos todos felizes conscientes dos fracassos de Copenhague, que salvam a lucratividade e comprometem a sustentabilidade?

      O que é felicidade? Aristóteles assinalou: é o bem maior a que todos almejamos. E meu confrade Tomás de Aquino alertou: mesmo ao praticarmos o mal. De Hitler a madre Teresa de Calcutá, todos buscam, em tudo que fazem, a própria felicidade. 
      A diferença reside na equação egoísmo/altruísmo. Hitler pensava em suas hediondas ambições de poder. Madre Teresa, na felicidade daqueles que Frantz Fanon denominou “condenados da Terra”.

      A felicidade, o bem mais ambicionado, não figura nas ofertas do mercado. Não se pode comprá-la, há que conquistá-la. A publicidade empenha-se em nos convencer de que ela resulta da soma dos prazeres. Para Roland Barthes, o prazer é “a grande aventura do desejo”.

      Estimulado pela propaganda, nosso desejo exila-se nos objetos de consumo. Vestir essa grife, possuir aquele carro, morar nesse condomínio de luxo – reza a publicidade – nos fará felizes.

      Desejar feliz ano novo é esperar que o outro seja feliz. E desejar que também faça os outros felizes? O pecuarista que não banca assistência médico-hospitalar para seus peões e gasta fortunas com veterinários de seu rebanho, espera que o próximo tenha também um feliz ano novo?

      Na contramão do consumismo, Jung dava razão a São João da Cruz: o desejo busca sim a felicidade, “a vida em plenitude” manifestada por Jesus, mas ela não se encontra nos bens finitos ofertados pelo mercado. Como enfatizava o professor Milton Santos, acha-se nos bens infinitos.

      A arte da verdadeira felicidade consiste em canalizar o desejo para dentro de si e, a partir da subjetividade impregnada de valores, imprimir sentido à existência. Assim, consegue-se ser feliz mesmo quando há sofrimento. Trata-se de uma aventura espiritual. Ser capaz de garimpar as várias camadas que encobrem o nosso ego.

      Porém, ao mergulhar nas obscuras sendas da vida interior, guiados pela fé e/ou pela meditação, tropeçamos nas próprias emoções, em especial naquelas que traem a nossa razão: somos ofensivos com quem amamos; rudes com quem nos trata com delicadeza; egoístas com quem é generoso; prepotentes com quem nos acolhe em solícita gratuidade.
      Se logramos mergulhar mais fundo, além da razão egótica e dos sentimentos possessivos, então nos aproximamos da fonte da felicidade escondida atrás do ego. Ao percorrer as veredas abissais que nos conduzem a ela, os momentos de alegria se consubstanciam em estado de espírito. Como no amor.

      Feliz ano novo é, portanto, um voto de emulação espiritual. Claro, muitas outras conquistas podem nos dar prazer e alegre sensação de vitória. Mas não são o suficiente para nos fazer felizes. Melhor seria um mundo sem miséria, desigualdade, degradação ambiental, políticos corruptos!

      Essa infeliz realidade que nos circunda, e da qual somos responsáveis por opção ou omissão, constitui um gritante apelo para nos engajarmos na busca de “outros mundos possíveis”. Contudo, ainda não será o feliz ano novo.

      O ano será novo se, em nós e à nossa volta, superarmos o velho. E velho é tudo aquilo que já não contribui para tornar a felicidade um direito de todos. À luz de um novo marco civilizatório há que superar o modelo desenvolvimentista-consumista e introduzir, no lugar do PIB, a FIB (Felicidade Interna Bruta), fundada na economia solidária e sustentável.

      Se o novo se faz advento em nossa vida espiritual, então com certeza teremos, sem milagres ou mágicas, um feliz ano novo, ainda que o mundo prossiga conflitivo; a crueldade travestida de doces princípios; e o ódio disfarçado de discurso amoroso. A diferença é que estaremos conscientes de que, para ter um Feliz Ano-Novo, é preciso abraçar um processo ressurrecional: engravidar-se de si mesmo, virar-se pelo avesso e deixar o pessimismo para dias melhores.

      Fernando Brant - Que brinquem os meninos‏

      O que continua valendo são as manhãs em que a meninada faz algazarra em torno dos presentes
       

      Fernando Brant
      Estado de Minas: 26/12/2012 
      Hesito entre espichar-me no sofá ouvindo as coisas do Moacyr Santos ou tomar um café expresso sem açúcar. Fico com os dois. O lombo assado, farofa, arroz e feijão, tudo caseiro, trouxeram-me enorme preguiça. Olhos fechados e ouvidos atentos, concentro-me, na véspera de mais um Natal, em buscar ideias novas ou antigas na memória e na imaginação. O resultado, agora que acabei de acordar, saberei agora. Colhi algo nesse rápido cochilo? Na cozinha prepara-se um lombo de bacalhau gadhus morua para o almoço de amanhã.

      Para quem é bacalhau serve, dizia-se em tempos passados, quando o peixe norueguês era servido em qualquer casa, acompanhado de chuchu, em dias comuns. Quem realmente merecesse o afeto e a admiração dos pais era recebido com iguarias mais finas e trabalhosas da cozinha mineira. Mesmo porque nas primeiras lembranças que tenho de bacalhau, nos armazéns de minha infância, os peixes salgados ficavam expostos e todos os que entravam para comprar tiravam uma lasquinha e levavam à boca. Aquele sal vive firme em minha lembrança. Na mesa, ele não tinha essa importância de hoje. Não competia com o jogo, pedaço do peito do frango, carne branca, que servia para uma disputa entre os irmãos para saber quem ficaria com a parte maior do ossinho assado. Mas, em matéria de manjar, sem contar as sobremesas que minha mãe fazia aos domingos e dias de festa, nada batia as simples e saborosas sardinhas à milanesa preparadas sempre às sextas-feiras, logo depois da feira semanal. Ao contrário de hoje, bacalhau, conhecendo várias formas de degustá-lo, naquele tempo não valia uma mexerica carioca ou uma maçã nacional bem ácidas.

      No Natal, o que valia, e continua valendo, são as manhãs em que a meninada faz algazarra em torno dos presentes recebidos. Bonecas, bicicletas, jogos. Para os pequenos era o encantamento e isso continua existindo, pelos menos com os que convivo. Irmãos mais velhos, pais e avós têm de expulsar ou adiar o sono para se integrar na festança infantil. É o que vale o ano cheio de trabalho e amolações. É o que compensa o mundo injusto e cruel, a renitente violência dos poderosos e suas guerras.

      Olho para as caras de governantes de Brasília e de todos os lugares e não consigo enxergar neles nenhum traço de meninos, que, pela lógica do tempo, devem ter sido. Não é necessário citar nomes, eles são múltiplos e se reproduzem. Mas faça essa experiência. Concentre o olhar na imagem de alguns desses que estão por aí, mentindo e se aproveitando da inocência e ignorância da população. No máximo eles cuidam dos seus, o que não os redime. Se meninos foram, eram, sem botar as mães no meio, uns absolutos filhos da p....

      Charge - Angeli

      FOLHA DE SÃO PAULO
      Charge

      Marcos Coimbra - 2012 na política: a oposição‏

      Para piorar, precisa lidar com seus radicais, que, no afã de derrotar o PT, se dispõem a tudo, até mesmo a colocar gasolina na fogueira 

      Marcos Coimbra
      Estado de Minas: 26/12/2012 
      Considerando que o governo chega ao fim do ano batendo recordes de popularidade e que os candidatos do PT lideram com folga as pesquisas a respeito da próxima eleição presidencial, não se pode dizer que o saldo de 2012 seja bom para a oposição. 

      Ainda mais se levarmos em conta o resultado da eleição municipal. Nela, os três principais partidos oposicionistas encolheram, atingindo seu pior desempenho histórico. Ficaram reduzidos à metade dos prefeitos que elegeram em 2000.  

      Com isso, arriscam-se a ver suas bancadas no Congresso diminuir ainda mais. Haviam ido mal em 2010, fazendo 108 deputados – equivalentes a apenas 21% da Câmara –, e podem piorar, com uma base municipal mais limitada. 

      A realidade de dezembro contrasta com as expectativas que o conjunto da oposição tinha no primeiro semestre. Toda ela, seja nos partidos, nas instituições, na mídia ou na sociedade, apostava em vitórias em municípios-chave – especialmente em São Paulo – e no desgaste do PT em função do julgamento do mensalão. 

      Pelos seus cálculos, a esta altura, Serra seria prefeito e estariam elevadas as chances de uma candidatura tucana na sucessão de Dilma. 

      Nem uma, nem outra coisa se confirmaram.

      Seria possível dizer que o melhor que aconteceu à oposição foi a derrota de Serra. Ela abriu, finalmente, o caminho para a renovação no PSDB. Seu subproduto foi a formalização de Aécio Neves como liderança nacional peessedebista. 

      O problema, para os adversários do “lulopetismo”, é que uma candidatura competitiva não fica pronta de um dia para o outro. Como mostram as pesquisas, Aécio tem pela frente o imenso desafio de tentar fazer, em pouco mais de um ano e meio, o que não pôde na hora adequada.

      Permanece fundamentalmente desconhecido pela vasta maioria do eleitorado.

      Na mais recente pesquisa do Datafolha, realizada no início do mês, seu melhor número são os 14% que alcança contra Dilma e Marina Silva. Nesse cenário, a presidente obtém 57%, amplamente suficientes para ganhar no primeiro turno, e Marina fica com 18%. 

      O que esses dados fazem é manter aberta a porta para Serra. Os segmentos da oposição que desconfiam de Aécio – seja por não considerá-lo “duro” o bastante para brigar com o PT, seja por temer seu desempenho fora de Minas Gerais – não vão querer que o paulista se aposente tão cedo. 

      Ou seja: mesmo derrotado e aparentemente fora de combate, a oposição permanece presa a Serra e ao que ele representa. 

      Esse “vai, mas não vai” em relação ao nome com que marchará para a eleição de 2014 se repete no plano programático. Também nele, a oposição se confunde e embaralha as pernas. 

      Hoje, seu discurso se assenta em um tripé: a “valorização da herança de Fernando Henrique”, a “diferenciação ética em relação ao PT” e a “crítica à capacidade gerencial de Dilma”. 

      Fácil de falar, difícil de convencer. Nos três aspectos, ela tem que persuadir a maioria da população, que está convicta do inverso. 

      As pessoas comparam desfavoravelmente FHC – e seu governo – a Lula e Dilma. Não deixam de admirá-lo por desconhecimento, mas por conhecê-lo. 

      Não acham que, nos governos petistas, a corrupção tenha se tornado um problema que antes inexistia. Nas pesquisas, afirmam que ele era tão grande – ou maior – no passado. 

      Estão satisfeitas com o jeito de Dilma e o modo como ela se comporta na Presidência. No abstrato, talvez concordem que “poderíamos estar melhor”. Mas com quem, concretamente, se os tucanos já estiveram lá e decepcionaram? 

      Ainda indefinida quanto a nomes e frente ao problema de ter de conquistar o país para teses de aceitação problemática, o horizonte é complicado para a oposição institucional. 

      Para piorar, precisa lidar com seus radicais, que, no afã de derrotar o PT, se dispõem a tudo, até mesmo a colocar gasolina na fogueira. O mesmo tipo de gente que, no passado, foi às portas das casernas pedir a intervenção dos militares – ou de quem quer que se ofereça como “salvador da pátria”.

      Para especialistas, país tem uma dívida a ser paga à população afrodescendente - Max Milliano Melo‏

      Diversas pesquisas mostram que problemas como desemprego, baixa escolaridade e violência atingem de forma muito mais intensa os brasileiros negros que os brancos. Para especialistas, país tem uma dívida a ser paga à população afrodescendente 

      Max Milliano Melo
      Estado de Minas: 26/12/2012 

      Brasília – Dois países ocupam uma mesma e imensa porção da América do Sul. Um deles, o Brasil branco, é mais escolarizado, sofre menos com o desemprego e sua população tem renda maior que a do Brasil negro, onde apenas 4% dos habitantes concluíram o ensino superior e a pobreza extrema afeta muito mais pessoas. Apesar de essas duas nações terem, aparentemente, as mesmas condições de cuidar de suas populações, o Brasil negro ainda sofre com as consequências de um fenômeno cruel que deixou em enorme desvantagem: a escravidão. Os quase 400 anos em que negros eram encarados como simples mercadorias, animais de trabalho sem direitos, cavaram um abismo entre os dois Brasis, que precisam agora encontrar o caminho da reconciliação para que todos, independentemente dos traços físicos ou da cor da pele, possam ser, simplesmente, brasileiros.

      Não faltam dados que mostram como os afrodescendentes são colocados na rabeira do espectro social. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em 2003, 8,4% dos negros encontravam-se em condições de extrema pobreza, enquanto entre os brancos esse índice era de 3,2%. Embora mulheres e homens negros representem 44,7% dos brasileiros, eles somam 68% dos 10% mais pobres no país. À medida que se avança em direção aos grupos mais ricos, ocorre um “branqueamento” da população, até que a presença negra seja reduzida a 13% do 1% mais rico.

      O rendimento médio de uma mulher negra é a metade do de um homem branco. Um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) mostrou que o desemprego entre os brancos brasileiros era de 5,3% em 2005. O percentual entre os homens negros, no mesmo período, era de 8,1% e saltava para 14,1% entre as negras.

      Segundo Irina Bokova, diretora-geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), a delicada realidade que vivem as comunidades de ascendência africana em todo o mundo é uma ameaça à própria sobrevivência da humanidade. “Em muitas regiões, a luta contra o racismo e a discriminação segue como um enorme desafio a ser enfrentado nas suas mais diferentes manifestações”, diz. 


      “Esses flagelos minam as nossas sociedades, exacerbando desigualdades e divisões em todas as regiões do planeta”, completa.

      Educação e violência No Brasil, o problema começa no nascimento e acompanha as crianças negras na escola. Um estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) baseado no Censo 2010 mostrou que apenas 4% dos brasileiros negros completaram o ensino superior. De acordo com o mesmo levantamento, 56,8% dos afrodescendentes do país com mais de 10 anos não completaram o ensino fundamental. Um levantamento inédito feito com base na edição de 2011 do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) revelou que, mesmo nas escolas privadas, onde supostamente não haveria diferenças, brancos e negros têm desempenhos diferentes, com o primeiro grupo apresentando, em média, 3% mais acertos que o segundo. Entre os brancos de escola privada e os negros de escola pública, existe um abismo ainda maior de 21% no índice de respostas certas na prova.

      Uma série de fatores sociais influenciam nesses resultados. Afrodescendentes têm menor apoio em casa e nos estabelecimentos de ensino para prosseguirem seus estudos. Nessa parcela da população, apenas 2,1% das mães e 2,8% dos pais têm ensino médio completo. “Outro problema alarmante é a violência. As estatísticas mostram que, a cada três assassinados no Brasil, dois são negros”, aponta Nelson Inocêncio, coordenador do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (Neab), da Universidade de Brasília. “No Distrito Federal, quarto no ranking da violência contra os negros, a cada oito assassinados, sete são negros”, acrescenta. 

      Os dados citados por Inocêncio são do Mapa da violência, pesquisa divulgada no início deste mês pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Social, do governo federal. Na Paraíba, onde a situação é mais grave, esse índice chega a 40 negros mortos para cada branco. Em segundo e terceiro lugar, aparecem Alagoas e Pernambuco. “Infelizmente, entre os policiais brasileiros, persiste uma imagem de que o negro antes de mais nada é suspeito. E, quando a vítima é afrodescendente, existe uma espécie de condescendência, há sempre uma explicação, um atenuante”, afirma o pesquisador da UnB.

      Lei x realidade Há ainda muitas outras formas de violência contra essa parcela de brasileiros. Pelo menos 3,5 mil comunidades quilombolas reivindicam o direito à terra onde vivem. Os ataques a terreiros de candomblé, umbanda e outras religiões de matriz são constantemente relatados. Demonstrações de racismo são denunciadas pela imprensa. 

      “O Brasil tem leis boas voltadas para a proteção da comunidade negra. Qualquer jurista que analisar a letra fria de nossa legislação elogiará o país. Há leis que tornam o racismo crime inafiançável. É um equívoco dizer que o Brasil não tem ações de proteção das comunidades negras. O grande problema é a aplicação. Vivemos em um país onde a lei está muito distante da realidade”, prossegue Inocêncio.

      O presidente da Fundação Palmares, Eloi Mendes, acredita que o país precisa encarar essas feridas ainda abertas e promover um grande processo de reconciliação nacional para que a dívida de mais de 400 anos de escravidão possa finalmente ser paga. “Trata-se de avançar enquanto nação. Sem rancor, sem mágoa”, defende. Para ele, é preciso ter consciência de que a história negra é a história de todos, e que os problemas ligados a essa parcela da população também são responsabilidade de todos. “Meu maior sonho é que a memória produza um resultado positivo na mente de políticos e das demais pessoas, resultando na promoção da igualdade”, diz.

      Escavações revelam taberna e palafitas do 'velho Pinheiros' - Jairo Marques

      FOLHA DE SÃO PAULO

      Obras de revitalização do bairro levaram à descoberta de sítio arqueológico
      Para pesquisadores, construções e objetos mostram região como ponto estratégico para viajantes do século 19
      JAIRO MARQUESDE SÃO PAULOA história da formação e da ocupação urbana de Pinheiros e da zona oeste de São Paulo está ganhando contornos inéditos com as escavações arqueológicas no largo da Batata, hoje em sua segunda fase.
      Foram descobertos 30 mil objetos do século 19 e até estacas de palafitas, pois a área era altamente alagável no passado. Elas foram achadas neste ano e surpreenderam os pesquisadores.
      Desde 2007, a região do largo da Batata passa por obras de requalificação -que fazem parte da Operação Urbana Faria Lima, criada em 1995, para transformar a área em polo de escritórios.
      O Sítio Arqueológico Pinheiros 1 começou a ser explorado após ordem do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), em 2009, após os primeiros objetos serem localizados.
      As estruturas descobertas agora aparecem em um terceiro nível de escavação. O primeiro é de casas da década de 1960, quando o bairro sofreu uma explosão urbana.
      "As escavações revelaram estacas de madeiras, as palafitas, que talvez visualmente não digam muito para as pessoas, mas trazem enorme contribuição histórica, diz o arqueólogo Juliano Meneghello, coordenador do trabalho.
      TABERNA
      Na primeira fase dos trabalhos, em 2010, a equipe liderada pelo arqueólogo Plácido Cali conseguiu mapear objetos como xícaras, canecas, sopeiras e outras louças, além de garrafas e potes de cerâmica do século 19, vindos principalmente da Inglaterra.
      A análise dos objetos ajuda a entender melhor, de acordo com pesquisadores, como Pinheiros foi habitado e sua importância já nas décadas finais do século 19. Um relatório para o Iphan aponta, por exemplo, que foi achada uma espécie de taberna.
      "Com o material que coletamos é possível mostrar que ali houve um ponto estratégico para pessoas que saíam do centro da cidade e rumavam para Sorocaba ou para o sul do Estado", afirma Cali.
      A segunda fase, tocada pela empresa A Lasca Arqueologia, começou em maio deste ano, após 17 meses sem escavações por causa de entraves burocráticos.
      De lá para cá, outros 50 mil resquícios de objetos foram colhidos -em sua maioria, do começo do século 20.
      Os trabalhos arqueológicos devem se estender até o meio do ano que vem, pelo menos.
      Também foram descobertos trilhos e dormentes de bonde -que circulava pela rua Teodoro Sampaio. Cerca de 80 metros deles vão ficar expostos em uma praça que ainda está sendo construída.

        ANÁLISE SÍTIO ARQUEOLÓGICO
        No novo Pinheiros, as raízes do bairro encontram seu futuro
        Escavação de sítio arqueológico atrasa revitalização, mas é um ganho para a cidade
        FERNANDO SERAPIÃOESPECIAL PARA A FOLHA
        É IRÔNICO: NA CIDADE QUE NÃO TEM MEMÓRIA, A MUDANÇA DE PINHEIROS É ATRAPALHADA POR SEU PASSADO
        Há uma década, a Prefeitura de São Paulo organizou um concurso de arquitetura para reorganizar o largo da Batata. Nas entrelinhas, a ideia era rearranjar o sistema viário da região, preparando-a para uma drástica mudança de uso.
        Potencializada por uma operação urbana e pela chegada do metrô, a verticalização não emplacava na região, que resistia graças à força do comércio popular, ao arruamento confuso e ao caótico terminal de ônibus.
        Mas legislação e mercado imobiliário entendem Pinheiros como extensão natural da Faria Lima, com torres de escritórios e serviços -sai o camelô, entra o engravatado.
        O concurso foi vencido pela equipe de Tito Livio Frascino e as obras demoraram cinco anos para começar. Mas ninguém previu o inevitável: ao escavar o coração do bairro mais antigo de São Paulo, era muito provável encontrar material arqueológico.
        Pinheiros foi fundado oficialmente em 1560 -e há pistas de que ali já existisse uma aldeia indígena. No final do século 16, habitavam a região cerca de 600 índios.
        Após ataques de etnias rivais, incêndios da igreja, briga entre jesuítas e beneditinos etc., a localidade entrou em decadência e transformou-se em um local de parada de viajantes que saíam de São Paulo rumo ao Sul do país.
        A provável explicação é a geografia: naquele trecho, o rio Pinheiros era mais estreito, facilitando a travessia; com a alta do rio, havia necessidade de pernoitar.
        A descoberta do sítio arqueológico é importante e a velocidade da escavação não é pautada pela vida cotidiana. A demora prejudica, por exemplo, os comerciantes, que desde 2007 aguardam o fim. Infelizmente, não existem instrumentos para compensar as perdas econômicas.
        Quem ganha é a cidade e o cidadão, que poderão conhecer um pouco mais sobre sua história. É irônico pensar que, na cidade que não tem memória, a maior mudança da existência de Pinheiros seja atrapalhada por vestígios de seu passado.

          TV PAGA


          Estado de Minas:26/12/2012

          Viva a natureza!
          Autor de obras que ajudaram a popularizar a flora nativa brasileira – seus 23 livros ultrapassaram a marca de 1 milhão de exemplares vendidos –, o engenheiro-agrônomo Harri Lorenzi é o convidado do episódio especial de Um pé de quê?, que vai ao ar hoje, às 22h, no canal Futura. Regina Casé conversou com Lorenzi em Nova Odessa (SP), onde fica o Jardim Botânico Plantarum, fundado e mantido por ele para abrigar plantas e árvores do cerrado e da mata atlântica.

          Viva reprisa A terra 
          dos meninos pelados

          No canal Viva, às 23h15, será reprisada a minissérie A terra dos meninos pelados, especial de quatro capítulos baseado 
          na obra homônima do escritor Graciliano Ramos. A trama conta a história de Raimundo, um menino diferente de 
          todos os outros por ter um olho preto, o outro azul e a cabeça calva. Ele viaja e descobre uma terra encantada onde os garotos são como ele. Suas aventuras são pontuadas por canções interpretadas por Paulinho Moska, Skank, Pato Fu, Gabriel, O Pensador, Pedro Luís e a Parede, Fernanda Abreu, Detonautas, Lenine e Zélia Duncan.

          GNT faz entrevista 
          com Leonardo Boff
          Outro programa de entrevistas que merece destaque hoje é o Viver com fé, às 20h, no canal GNT. O teólogo Leonardo Boff é convidado, falando sobre amor e tudo que aprendeu e viveu. Ele foi frade Franciscano, professor universitário, autor de mais de 90 livros publicados no mundo todo e, o mais importante: nunca deixou de ser um homem preocupado e atuante para com o bem-estar de toda a humanidade. 

          Muitas alternativas 
          no pacote de filmes
          Em 13 curtas, um grupo de cineastas nascidos ou radicados na Alemanha faz um panorama pessoal da situação política e social do país em Alemanha 09, cartaz da Mostra Internacional de Cinema na Cultura, às 22h. No mesmo horário, o assinante tem mais 12 opções: Embarque imediato, no Canal Brasil; Tropa de elite, na TNT; Bastardos inglórios, no Space; Millennium – Os homens que não amavam as mulheres, na HBO; Além da vida, no Max HD; Roubo nas alturas, no Telecine Premium; Não me abandone jamais, no Telecine Touch; Estrada a para Perdição, no FX; Uma noite fora de série, na Fox; 
          O incrível Hulk, no Megapix; O Besouro Verde, no Max Prime; e Memphis Belle – A fortaleza, no TCM. Outras atrações da programação: Um tiro que não deu certo, às 21h, no Comedy Central; e The Spirit – O filme, às 21h, no AXN.

          Paralamas falam da 
          ponte com os latinos
          Por falar em música, os Paralamas do Sucesso são os entrevistados de Eric Nepomuceno na edição de hoje de Sangue latino, às 21h30, no Canal Brasil, num papo sobre crença espiritual, sonhos e a música como cura para a dor, além da proximidade da banda com o público argentino. Já às 23h30, no programa Update, do canal Glitz, Sabrina Parlatore conversa com Nando Reis sobre seu novo álbum, Sei, e a vida pessoal e artística.

          Antonio Prata

          FOLHA DE SÃO PAULO

          O futuro é coisa do passado
          Cheguei ao meu destino duas horas e meia antes de partir e até hoje não consigo pensar em outra coisa
          Dez dias atrás aconteceu a coisa mais incrível da minha vida. Não, não me refiro ao bicampeonato mundial do Sport Club Corinthians Paulista -um fato esplêndido, decerto, mas que de incrível não tem nada; a vitória era óbvia e evidente como a lua brilhar no negrume da noite ou o sol raiar ao fim da madrugada.
          O absurdo se deu na volta do Japão para Chicago, onde, a caminho do Brasil, parei para visitar uns amigos. Eis que peguei um avião em Tóquio às nove horas da manhã de segunda-feira e aterrissei nos Estados Unidos às seis e meia da manhã de... segunda-feira. Sim, meus caros: cheguei ao meu destino duas horas e meia antes de partir e até hoje não consigo pensar em outra coisa.
          Ok, eu sei que há uma explicação racional para minha pequena viagem no tempo: calhou de eu e o planeta estarmos indo pro mesmo lado e de eu voar mais depressa, de modo que cheguei ao mundo um pouquinho antes dele próprio. Mas entender racionalmente um fenômeno não diminui o seu mistério - e aí estão o amor, a morte e a batata frita sabor pizza para provarem o que eu digo.
          Cruzar um oceano e pousar noutro continente antes de ter partido é tão estranho que nem meu celular, uma máquina que dispõe de mais capacidade de processamento do que todo o programa Apolo, conseguiu entender. Quando liguei o telefone em Chicago ele me informou, em sua tela luminosa e obscura, claramente atordoado com os dados ilógicos que sua lógica impecável o obrigava a exibir: "20:30 PM, Yesterday". Não sei de onde o smart(sic)phone tirou o "20:30 PM", mas o "Yesterday" estava corretíssimo, uma vez que em Tóquio um dia havia se passado, mas eu, furando o tempo como quem fura uma onda, não havia passado com ele.
          Impressionante que não tenhamos, até hoje, aproveitado as inúmeras possibilidades que esse truque metaf"ú"sico abre para a humanidade. Por exemplo: eternizar o presente. Por exemplo: não envelhecer. Por exemplo: não morrer. Vamos convencer já nossos 7 bilhões de semelhantes a engajarem-se numa marcha global para a direita, e, orientando os pilotos a irem um pouco mais devagar do que o meu, ficaremos parados num hoje eterno. Sugiro partirmos num sábado à noite: a vida será um sábado que nunca verá a aproximação opressiva de domingo, não sentirá o hálito azedo da segunda.
          O leitor acha perda de tempo congelar a história entre cervejas e pistas de dança? Ok. Que pegue o Boeing dos CDFs numa segunda de manhã e na segunda permanecerá, até o fim de seus dias -diria eu, se os dias tivessem fim nesta jornada atemporal. E quando quisermos descansar, seja da balada ou da labuta, é só descer num aeroporto, dormir algumas noites e tomar um avião domingo à tarde, para no domingo ficar, de pantufas, ad infinitum.
          O lema da humanidade, de Genghis Khan a Cabral, dos Bandeirantes aos colonos norte-americanos, foi "Go west!". É chegada a hora de inverter este vetor. "Go east, young man! Go east!" é o bordão do futuro. Ou melhor, do presente, pois futuro é coisa do passado, da época em que o sol raiava ao fim da madrugada, iluminando-nos rumo ao inexorável crepúsculo de nossos dias. Inexorável? Não mais. Compremos os tickets e sejamos felizes para sempre.

          Vacina de HPV impõe desafios ao governo

          FOLHA DE SÃO PAULO

          Imunização contra vírus sexualmente transmissível será dada a pré-adolescentes, o que pode incomodar os pais
          Dois tipos de vacina concorrem pela escolha do governo; empresas devem apresentar propostas até janeiro
          JOHANNA NUBLATDE BRASÍLIAO governo brasileiro tem alguns desafios a resolver antes de oferecer na rede pública a vacina contra o HPV.
          Por exemplo, o tipo de vacina a ser dada e a estratégia para ganhar a adesão de pelo menos 3 milhões de meninas na pré-adolescência.
          Esperado para 2012, o anúncio da nova vacina, que pode proteger contra verrugas e o vírus ligado ao câncer de colo uterino e outros, deve levar ainda um tempo.
          Pouco antes do Natal, os laboratórios interessados em produzir a vacina e vendê-la para o Ministério da Saúde receberam um chamamento para apresentar novas propostas até o fim de janeiro.
          Há duas vacinas na competição: uma oferece proteção contra dois tipos do vírus ligados ao câncer; outra protege contra esses e outros dois tipos causadores das verrugas. Nos dois casos, a produção será feita em um laboratório público, que receberá transferência de tecnologia de uma empresa estrangeira.
          Segundo Jarbas Barbosa, secretário de Vigilância em Saúde do ministério, a pasta considerou limitadas as propostas já feitas ao governo.
          Além dos preços, o ministério quer detalhes sobre o volume de investimentos nos laboratórios brasileiros que cada proposta demandará.
          Escolhida a vacina, há uma estratégia a ser delineada.
          O martelo não está batido, mas o Programa Nacional de Imunizações trabalha com a perspectiva de vacinar meninas de dez e 11 anos no primeiro ano e, depois, as de dez anos. Para ter impacto epidemiológico, a adesão precisa ser de, pelo menos, 70%.
          Segundo o secretário, será preciso explicar bem a necessidade da vacina. "Algumas mães podem resistir, por parecer que a gente está achando que a filha dela vai ter atividade sexual."
          Barbosa diz que, para ser mais eficaz, a vacina deve ser tomada antes do contato da menina com o vírus, o que pode ocorrer mesmo com a relação sexual incompleta. "Estudos mostram que, a partir dos 13 anos, 30% já têm alguma atividade sexual."
          O tema da sexualidade que cerca a vacina foi alvo de bastante debate nos EUA. Para Renato Kfouri, presidente da Sbim (Associação Brasileira de Imunizações), esse é um problema superável. Ele lembra, porém, que vacinar o adolescente não é tarefa simples e compara com a imunização contra hepatite B, dada na rede pública há 14 anos.
          "A cobertura é de 100% para quem tem até 14 anos [e tomou a vacina quando criança]. Mas, de 14 a 29 anos, a cobertura pode chegar a 40%. As pessoas não foram vacinadas na infância e não comparecem ao posto por falta de informação, recomendação e conscientização", explica.
          Apesar disso, Kfouri defende a inclusão da vacina do HPV. "O impacto na prevenção do câncer é enorme."


          FRASE
          "Estudos mostram que, a partir dos 13 anos, 30% [das meninas] já têm alguma atividade sexual"


          Especialistas querem incluir escola no debate
          DE BRASÍLIAEspecialistas afirmam que, para uma vacina como a do HPV (vírus sexualmente transmissível), é mais que necessário incluir a escola no debate. No Ministério da Saúde, há quem fale na necessidade de mobilizar as igrejas.
          Uma pesquisa feita em Barretos (SP) entre 2010 e 2011 procurou medir a aceitação dessa vacina dentro das escolas. A imunização foi oferecida a 1.500 meninas do 5º e do 6º ano das escolas públicas e privadas.
          A aceitação foi superior a 90%, diz José Humberto Fregnani, diretor científico do Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital de Câncer de Barretos.
          Os pais que rejeitaram a vacinação alegaram medo dos efeitos colaterais ou disseram que as meninas eram novas para a vacina e para a discussão sobre sua sexualidade.
          Apesar dos anúncios veiculados nos meios de comunicação sobre o tema, grande parte das famílias soube da vacina por meio das crianças, que tiveram palestras.
          A MSD, empresa que vende a vacina quadrivalente e apoiou o projeto em Barretos, afirmou que cabe ao ministério definir sua estratégia, mas se disse disposta a trabalhar pela implementação efetiva.
          Já a GSK, que vende a bivalente, se diz preparada para atender às demandas do governo.

            EUA dão sinal verde a salmão transgênico

            FOLHA DE SÃO PAULO

            Relatório de agência reguladora afirma que o peixe não causará impacto ambiental
            Aquabounty Technologies/Associated Press
            Imagem da Aquabounty mostra dois salmões da mesma idade; o de trás, transgênico, cresce duas vezes mais rápido
            Imagem da Aquabounty mostra dois salmões da mesma idade; o de trás, transgênico, cresce duas vezes mais rápido
            DAS AGÊNCIAS DE NOTÍCIASA FDA (agência que regula remédios e alimentos nos EUA) afirmou que um salmão transgênico que cresce duas vezes mais rápido que o normal não causaria grande impacto ambiental, o que abre caminho para a aprovação do primeiro animal geneticamente modificado para ser consumido por humanos.
            A agência ainda fará uma consulta pública sobre o tema, mas especialistas veem a declaração como o último passo antes da aprovação.
            Em 2010, a FDA afirmou que o peixe era seguro como alimento, mas não tomou outras medidas desde então.
            Empresários da Aquabounty, que produz o peixe, especulam que o governo tem prorrogado qualquer ação por pressão de grupos que se opõem aos transgênicos.
            Críticos, que chamam o salmão de "frankenpeixe", temem que ele possa causar alergias ou até dizimar a população natural de salmões se a variedade transgênica procriar na natureza -sem contar os questionamentos éticos envolvidos.
            A empresa, que já gastou mais de US$ 67 milhões para desenvolver o peixe, afirma que há medidas protetoras contra problemas ambientais -uma delas é que só seriam criadas fêmeas estéreis, ainda que uma pequena porcentagem pudesse se reproduzir.
            O peixe transgênico recebeu um gene de hormônio do crescimento do salmão do Pacífico, que é mantido "funcionando" o ano inteiro por meio de um gene de um peixe similar a uma enguia. A combinação permite que o salmão chegue ao peso ideal para venda em 18 meses em vez de três anos.
            Ainda não está claro, porém, se o público aprovará o peixe, caso a FDA dê seu aval.
            Se o salmão entrar no mercado, os consumidores podem nem saber que estão comprando peixe transgênico, já que o produto não seria acompanhado de qualquer aviso caso seja decido que ele tem as mesmas propriedades do convencional.
            A empresa diz que o novo salmão é similar ao "normal" em sabor, cor e textura.


              Temperatura na Antártida sobe mais que a média global
              Dados podem ajudar a entender papel do continente no aumento do nível do mar
              DA REUTERSO oeste da Antártida está esquentando em um ritmo que é o dobro do estimado anteriormente, segundo estudo publicado nesta semana na "Nature Geoscience".
              A média anual de temperaturas na estação de pesquisa Byrd, no oeste do continente, aumentou 2,4 º C desde a década de 1950, um dos crescimentos mais rápidos do planeta e três vezes mais veloz que a média global, segundo a pesquisa.
              O achado dá força ao temor de que a camada de gelo esteja sujeita a derretimento. O oeste da Antártida contém gelo suficiente para aumentar o nível do mar em 3,3 metros se um dia derretesse, um processo que pode levar séculos.
              "A porção ocidental da camada de gelo está sofrendo quase o dobro do aquecimento estimado antes", diz nota publicada pela Universidade Ohio State sobre o estudo liderado pelo professor de geografia David Bromwich.
              Segundo a universidade, o aquecimento levanta preocupação sobre a contribuição futura da Antártida no aumento do nível do mar. No último século, os oceanos avançaram cerca de 20 cm.
              Um painel de especialistas da ONU prevê que o nível do mar aumentará entre 18 e 59 cm neste século ou até mais, caso o degelo da Groenlândia e da Antártida se acelere.
              GELEIRAS
              O aumento nas temperaturas no oeste do continente é comparável ao que ocorreu na península Antártica, ao norte. Muitas plataformas de gelo entraram em colapso ao redor da Antártida nos últimos anos e, uma vez que as plataformas se quebram, as geleiras por trás sofrem deslizamentos mais rápido, aumentando o nível do mar.
              Os cientistas dizem que já houve um derretimento esparso das camadas de gelo no oeste do continente em 2005.
              "Um aumento contínuo das temperaturas no verão poderia levar a episódios de derretimento mais extensos e frequentes", dizem os pesquisadores, que refizeram o registro de temperatura no oeste da Antártida desde 1958, com a ajuda de simulações feitas por computador.

                FBI investigou ação do Ocupe Wall Street

                FOLHA DE SÃO PAULO


                Movimento de protesto contra desigualdade de renda e setor financeiro foi alvo de força-tarefa antiterror nos EUA
                Grupo de direitos civis critica o uso de informações recolhidas de pessoas que agiam dentro da legislação
                MICHAEL S. SCHMIDTCOLIN MOYNIHANDO “THE NEW YORK TIMES”O FBI, a polícia federal dos EUA, usou agentes de combate a terrorismo para investigar o movimento Ocupe Wall Street, segundo documentos divulgados recentemente.
                Em setembro de 2011, um agente de uma força-tarefa antiterrorismo do FBI em Nova York notificou funcionários do Museu das Finanças Americanas e do Federal Hall que "os edifícios haviam sido identificados como pontos de interesse para o Ocupe Wall Street".
                Isso ocorreu na mesma época em que os ativistas montaram acampamento no parque Zuccotti, no sul de Manhattan, desencadeando uma série de protestos ao redor dos EUA e levando a desigualdade de renda para o centro dos debates no país.
                Nos meses seguintes, agentes do FBI em todo o país se envolveram rotineiramente em troca de informações sobre o movimento com empresários, polícias locais e universidades.
                Um memorando de outubro de 2011 da agência do FBI em Jacksonville, na Flórida, era intitulado "Assunto: Administração do Programa de Terroristas Domésticos" e afirmava que agentes discutiram eventos do movimento e sua disseminação.
                O comunicado dizia que os agentes deveriam entrar em contato com os ativistas para verificar se pessoas que participavam dos atos tinham "tendências violentas".
                O medo do FBI era que o Ocupe poderia ser um canal para "um criminoso solitário explorando o movimento por razões ligadas à insatisfação geral com o governo".
                Desde os ataques de 11 de de setembro de 2001, o FBI é alvo de críticas por usar agentes da divisão antiterrorismo para monitorar organizações ambientais ou grupos de protesto contra crueldade com animais e pobreza.
                A divulgação dos documentos do FBI ocorre pouco mais de um ano depois de a polícia ter expulsado os manifestantes do parque Zuccotti, em novembro de 2011. Em outras cidades americanas, policiais fizeram o mesmo com ativistas do grupo.
                Os documentos foram obtidos pela Parceria pelo Fundo de Justiça Civil, uma organização de direitos civis de Washington, por meio de um pedido de divulgação invocando a Lei de Liberdade de Informação.
                Muitos trechos dos documentos foram rasurados pelo FBI para impedir leitura de partes tidas como estratégicas. Os documentos mostram quão profundamente envolvidas as autoridades americanas estavam no monitoramento do Ocupe.
                Em um memorando de agosto de 2011, o escritório do FBI em NY se reuniu com funcionários da Bolsa de Valores para discutir "o protesto anarquista intitulado Ocupe Wall Street".
                "Numerosos incidentes ocorreram no passado mostrando tentativas de grupos anarquistas de atrapalhar ou impedir o funcionamento de distritos financeiros."
                "O FBI reconhece o direito de indivíduos e grupos se engajarem em atividades protegidas pela Constituição", disse o porta-voz do FBI Paul Bresson. "O FBI é obrigado a investigar qualquer alegação séria de violência, mas não abrimos investigações baseadas apenas em atividades ligadas à Primeira Emenda (de liberdade de expressão)".
                Segundo Mara Verheyden-Hilliard, diretora-executiva do Parceria, os documentos mostram que o FBI agiu de maneira imprópria ao colher informações sobre americanos envolvidos em atividades lícitas.
                "São informações sobre ações baseadas no direito de livre expressão das pessoas, e essas informações serão armazenadas em bancos de dados, e não se sabe quando ou como serão usadas", declarou ela.

                  Entrevista Javier Solana

                  FOLHA DE SÃO PAULO

                  Crise deve resultar em uma geração perdida na Espanha
                  Ex-chanceler europeu diz que 'pântano geracional' afetará economia do país; para ele, grupo g20 deve ser mais atuante
                  ÉRICA FRAGADE SÃO PAULO
                  A crise europeia pode produzir uma geração perdida na Espanha: "Há um risco enorme de que os eventos atuais impeçam uma inteira geração de realizar seu potencial". O diagnóstico é de Javier Solana, ex-chanceler espanhol e da União Europeia.
                  Para Solana, que também já foi secretário-geral da Otan, os líderes europeus precisam adotar com urgência políticas que promovam o crescimento econômico.
                  Solana esteve em São Paulo no fim de novembro para participar de uma conferência sobre a importância das grandes regiões metropolitanas para o comércio global, promovida pelo Brookings Institution e pelo JP Morgan.
                  Leia os principais trechos da entrevista dele (atualmente, presidente do ESADE Center for Global Economy and Geopolitics) à Folha.
                  -
                  Folha - Desde a crise global os governos se tornaram mais realistas, mais interessados em resolver seus problemas do que em perseguir uma agenda global. Como mudar isso?
                  Javier Solana -A crise econômica e a consequente conscientização sobre o grau de interdependência têm inspirado um ressurgimento do nacionalismo ao redor do mundo. Mas nos esconder dentro de nossas conchas ou introduzir medidas protecionistas não resolverá os problemas atuais.
                  Ao contrário, estou convencido de que a solução está nas oportunidades oferecidas pela maior abertura ao mercado global. Os riscos inerentes a essas ações podem ser mitigados em fóruns como a OMC.
                  Apesar dos recentes acordos em relação à Grécia, parece que a crise está longe de ser resolvida. Como o sr. avalia a ação dos líderes europeus?
                  Vamos ser claros: a crise tem sido um verdadeiro tranco para todos. Nenhum país estava totalmente preparado para as mudanças e situações dramáticas dos últimos anos.
                  Mas, considerando a dificuldade extrema da situação, acho que os líderes europeus responderam tão bem quanto podiam.
                  O desafio atual para a União Europeia é incorporar as causas e repercussões dos eventos econômicos extraordinários em formulação e ação política. Isso vai requerer movimentos corajosos e visionários por parte dos líderes europeus, e espero que essas ações se materializem.
                  A Espanha enfrenta taxas de desemprego muito elevadas. Por quanto tempo essa situação pode ser mantida sem resvalar em levantes sociais?
                  Meu país, a Espanha, está de fato sentindo o peso elevado da crise. Mas é também um país forte e muito desenvolvido, que é apoiado por uma rede de laços sociais densa. Essa rede robusta garante que as necessidades básicas sejam cobertas, especialmente nesta situação dramática de desemprego exorbitante.
                  O maior problema é um iminente pântano geracional: há um risco enorme que os eventos atuais impeçam uma inteira geração de realizar seu potencial.
                  E embora isso pareça um problema em nível individual, na verdade seu efeito será sentido em uma escala nacional. É imperativo que sejam tomadas atitudes para evitar uma geração perdida.
                  A Espanha está na direção correta para sair da crise?
                  Como a Espanha é um membro pleno da União Europeia, eu acredito que a solução para sua saída da crise tem de ser uma solução europeia. A grande pergunta, no entanto, é como migrar de políticas de austeridade para políticas que irão estimular o crescimento.
                  Embora a austeridade seja um ingrediente essencial, ela não consegue nos tirar sozinha da crise. Apenas o crescimento econômico pode nos fazer mover para cima e para frente. É fundamental que nos dediquemos a encontrar programas e políticas que promoverão o crescimento.
                  A crise fez com que o G20 tivesse papel proeminente na economia. Como o sr. avalia o desempenho desse grupo?
                  Concordo que o G20 teve um papel importante nessa crise. Nos estágios iniciais, os membros do fórum reagiram rapidamente e de forma determinada para evitar uma recessão global. Mas, depois dos encontros iniciais, parte desse ímpeto foi, infelizmente, perdido. O grupo encontrou dificuldade em coordenar políticas de crescimento, o que é uma pena.
                  Mas eu ainda acredito na promessa do G20. O papel forte desempenhado pelos países emergentes nesse fórum corresponde ao seu lugar na economia global.
                  O sr. acredita que o Ocidente deveria armar os rebeldes sírios ou promover alguma intervenção no país?
                  A situação na Síria é dramática e deplorável. A cada dia, fica mais claro que o conflito não pode continuar para sempre. Mais cedo ou mais tarde, o presidente (Bashar) Assad terá de reconhecer que não pode mais governar o país e, quanto antes ele admita isso, melhor.
                  No meio tempo, no entanto, é muito lamentável que a comunidade internacional não tenha sido capaz de cuidar dessa situação. Tem se mostrado impossível construir uma base de legitimidade para uma ação internacional. O impasse no Conselho de Segurança da ONU é revelador: ressalta as enormes e, algumas vezes, aparentemente intransponíveis dificuldades de governar um mundo cada vez mais multipolar.
                  Como o sr. avalia a estratégia na guerra do Afeganistão? A Otan pode deixar o país sem criar um vácuo de segurança?
                  A Otan está no Afeganistão há mais de dez anos, muito dedicada à sua missão em um país extremamente desafiador. Essa área é reconhecida por sua geografia excepcionalmente difícil e seus vizinhos muito complexos. Acho que é crucial que o Afeganistão coloque foco nos seus problemas internos. Depois de anos de ajuda internacional sob muitas formas, o país e seus líderes precisam entender que ajuda não é uma fonte eterna.


                  RAIO-X: JAVIER SOLANA, 70
                  NOME
                  Francisco Javier Solana de Madariaga
                  FORMAÇÃO
                  Doutor em física (Universidade Autônoma de Madri)
                  CARREIRA
                  Filiado ao PSOE (socialistas), foi chefe da diplomacia da União Europeia de 1999 a 2009