domingo, 19 de janeiro de 2014

MARTHA MEDEIROS - Topless

Zero Hora 19/01/2014

Nos primeiros dias do ano foi organizada uma manifestação no Rio de Janeiro a favor do topless, mas, para desapontamento geral, teve adesão de algumas poucas gatas pingadas e o assunto não evoluiu.

Brasil, país da liberalidade, do Carnaval, das popozudas, das mulheres-fruta, da globeleza, do fio dental e demais manifestações de culto ao corpo (sem que nada disso altere a paz familiar), proíbe o topless na beira da praia. Um contrassenso? É, mas explica-se.

O Brasil é permissivo quando o assunto é sexo. De letras de música a comerciais de tevê, aqui quase tudo tem apelo erótico e tudo bem, aceitamos a lascívia como traço de caráter. Seios de fora é uma representação da nossa identidade, da nossa latinidade, das nossas raízes – desde que associada, de forma sutil ou não, à malandragem, à sacanagem, à libido. Por incrível que pareça, é mais chocante ver uma mulher amamentando seu bebê dentro de um ônibus do que arregaçando a camiseta e mostrando os peitos em frente às câmeras num estádio de futebol. Esta será candidata à musa. Ela pode. Mas o gesto maternal sugere indecência.

A amamentação em lugares públicos não é uma atitude sexual, portanto, é algo que perturba, que está fora do nosso contexto. Com o topless se dá o mesmo. Uma mulher com os seios de fora à luz do dia, em volta dos filhos, tomando mate gelado? É atentado ao pudor.

Topless não é um ato de exibicionismo, e sim uma atitude naturalista. Na Europa, basta despontar o primeiro raio de sol para a população tirar a roupa, inclusive nos parques. Em Munique, homens e mulheres dos oito aos 80 anos se reúnem no Englischer Garten, tiram toda a roupa – toda – e ficam lendo seu livrinho numa boa, com a pureza de um recém-nascido. Ninguém sai batendo fotos, salivando com cara de tarado ou marcando encontros atrás da moita. Desde a loira escultural até a senhora pelancuda, todos têm sua privacidade respeitada.

À beira mar o topless é ainda mais comum. Muitas mulheres dispensam o sutiã, não importa o estado de conservação de suas mamas. Fazem isso porque é mais confortável e também para ganhar um bronzeado uniforme, sem as marcas do biquíni. Particularmente, acho mais bonito usar as duas peças, mas não é de estética que se está falando. É do direito que uma pessoa tem de vestir-se (ou, no caso, despir-se) como bem entender, desde que num ambiente propício e sem agredir quem está a sua volta.

Aqui, na novela das nove, homens disputam para ver o “bigodinho” (depilação da virilha) de uma colega de trabalho, e o povo acha a maior graça, mas topless é perversão. Dançamos na boquinha da garrafa, mas não toleramos a liberdade de costumes. E como não se muda a mentalidade de um país por decreto, fazer topless sem estardalhaço ficará para uma próxima encarnação.

Affonso Romano de Sant'Anna-Lembrando Juan Gelman‏

Lembrando Juan Gelman
Affonso Romano de Sant'Anna
Estado de Minas: 19/01/2014

O poeta Juan Gelman e a neta, Macarena (Miguel Rojo/AFP - 21/3/12)
O poeta Juan Gelman e a neta, Macarena

Mexo em meus guardados e encontro estas anotações feitas em 2000 sobre Juan Gelman, poeta-mártir da ditadura no Cone Sul:

“Esta sua estória é já roteiro para um filme” – disse ao poeta Juan Gelman naquela conversa no aeroporto de Oaxaca (México), ao final do Encontro de Poetas do Mundo Latino.
Triste. Patético filme, é verdade. Mas emblemático daqueles anos de chumbo e sangue em torno de 1960, 1970 e 1980, quando Brasil, Chile, Argentina e Uruguai institucionalizaram a violência ditatorial. Por aí, diz-se, “desapareceram” 30 mil pessoas.

Havia estado com Gelman alguns anos antes em outro festival de poesia, não sei se na Colômbia ou na Costa Rica. Ele já era um personagem não só emblemático, mas trágico e lírico, de nossas ditaduras recentes. Agora, no claustro do convento barroco de São Domingos, no crepúsculo dessa cidade colonial mexicana, diante do público sentado sob os arcos dos corredores, dizíamos poemas. E Gelman, justamente homenageado, revelava que foi a partir de Oaxaca, há um ano, que ganhou força o movimento internacional para localizar e recuperar sua neta, cujos pais foram aniquilados pelos militares argentinos e uruguaios.

No aeroporto, talvez porque sendo o aeroporto espaço de partida e isso lhe possibilitasse breve ou nenhuma resposta, perguntei a Gelman: “E como ficou a estória de sua neta?”. O avião se atrasou e a conversa se prolongou, prolongou-se como só se prolonga nossa perplexidade diante da estupidez humana ou, ao contrário, de nossa alma diante da esperança.

No fim do livro Notas, escrito em 1979, Gelman dizia: “El 26 de agosto de 1976 mi hijo Marcelo Ariel y su mujer Claudia, encinta, fueran secuestrados en Buenos Aires por un comando militar. El hijo de ambos nació y murió en el campo de concentración. Como en decenas de miles de otros casos, la dictadura militar reconoció oficialmente a estos ‘desaparecidos’. Habló de ‘los ausentes para siempre’. Hasta que no vea sus cadávares o a sus asesinos, nunca los daré por muertos”.

Marcelo, o filho de Gelman, foi um dos oito cadávares com um tiro na nuca largados dentro de caixotes e latões cheios de pedra nos arredores de Buenos Aires. Essa insólita mercadoria chamou a atenção de outros setores da repressão e dos próprios coveiros por várias razões. Entre elas, porque um dos cadáveres era o de uma mulher grávida. E esta, em vez de um tiro na nuca, levara um tiro no ventre.

Os coveiros, mesmo acostumados às variantes da morte, não esqueceram aquilo. E quando, anos depois, iniciaram-se as investigações, puderam indicar onde os corpos estavam clandestinamente sepultados. Gelman, então, narra que foi fundamental a colaboração da memória de vizinhos, de ex-terroristas e até mesmo de alguns considerados traidores para que se retraçasse o percurso da fatalidade. Um verdadeiro quebra-cabeças, ao melhor estilo romanesco policial. Por isso falei de roteiro cinematográfico, aludindo a como foram se aglutinando informações, por exemplo, de prisioneiros que ouviam o choro de um bebê na cela ao lado, a data em que isso ocorreu, a passagem por ali da nora de Gelman até os recentes exames de DNA, que confirmaram tudo.

O policial que adotou a recém-nascida morreu há pouco. Sua esposa não teve filhos e, aos 48 anos, recebeu aquele presente dos céus. Ou do inferno. Pergunto, então, já convertido em repórter, sobre essa mulher que adotou a garota. Ela entendeu a nova situação melhor do que se esperava. Desenvolveu-se entre ela e a segunda mulher de Gelman, a psicanalista Mara, uma relação de confiança. Pergunto pela menina, hoje uma jovem de 23 anos. Não deve ser fácil, a essa altura da vida, levar um solavanco desses. Não apenas pelo fato em si, já desestabilizador, mas porque seu avô é uma personalidade internacional e o fato extrapolou os limites domésticos.

Leio um poema de Gelman chamado “La economia es una ciencia”:

“ En el decenio que siguió a la crisis/ se notó la declinación del coeficiente de ternura/ en todos los países considerados/ o sea/ tu país/ mi país/ los países que crecían entre tu alma e mi alma de repente”.

TeVê

Tv paga

Estado de Minas: 19/01/2014



 (TV Cultura/Divulgacao  )

Boas ações No episódio de hoje de Conexões urbanas, às 22h30, no canal GNT, José Junior vai mostrar como funciona o Instituto Nacional do Câncer, no Rio, além de apresentar os trabalhos voluntários desenvolvidos nas enfermarias pediátricas, como leitura, estudo e também um pouco de diversão como forma de amenizar o período de internação dos pacientes.

Barraco Depois de uma segunda temporada tumultuada, a série Dance moms chega à fase de lavar a roupa suja. Abby e as mães vão ter uma conversa franca e direta, no episódio inédito que vai ao ar hoje, às 20h30, no canal Bio. Sem filtros e sem censura, todas vão ter a chance de dizer o que pensam e vão sobrar sinceridade e muita reclamação.

Criminosas Se uma série se despede, outra está chegando. Estreia hoje, às 21h, no Investigação Discovery, o programa Bonitinhas e perigosas, com dois episódios exibidos em sequência. A atração reúne histórias de mulheres bonitas e atraentes que não medem “esforços” para conseguir o que querem. Para isso mentem, roubam e até matam.

Enlatados

Mariana Peixoto - mariana.peixoto@uai.com.br


Para rir com inteligência
Fazer comédia é uma arte, ainda mais quando ela foge do óbvio. A HBO estreia sexta-feira duas produções impecáveis do gênero. Às 21h começa a quarta e última temporada da comédia dramática The big C. Laura Linney é a professora Cathy Jamison, que muda radicalmente sua vida ao descobrir que tem um câncer. Até agora, cada temporada da série analisou uma fase de sua relação com a perspectiva da morte. Neste ano, o foco será como a família Jamison aceita a realidade e a gravidade do melanoma estágio quatro, sempre com humor, apesar de todo o drama da situação. Na sequência, às 21h30, Don Cheadle volta à cena em House of lies, agora em seu terceiro ano como um nada convencional (e de ética bem duvidosa) consultor de Nova York.

Star wars –Depois de Stephen Hawking, The big bang theory vai receber James Earl Jones e Carrie Fischer. A voz de Darth Vader e a princesa Leia, ídolos dos nerds da série, vão interpretar a si mesmos.

Inéditos –O Universal Channel volta a exibir episódios inéditos de suas principais séries. Entre os destaques estão as participações de Nia Vardalos em Law & order: SVU (terça-feira, às 23h) e de Kyle MacLachlan em The good wife (quinta-feira, às 23h).

Guerra Fria – Com horário ingrato (domingo, às 10h), e dublada, The americans – Rede de espionagem chega ao fim hoje no FX. O segundo ano da produção, sobre um casal de espiões soviéticos que vive nos Estados Unidos durante a Guerra Fria, volta ao ar em fevereiro na TV americana.

Terror – A versão para a TV do livro O bebê de Rosemary, adaptado para o cinema em 1968, já tem sua protagonista. O nome de Zoe Saldana (Star trek, Colombiana) foi anunciado pelos produtores da série. Na trama, um jovem casal nova-iorquino passa a enfrentar um drama com a chegada de seu primeiro filho.


Caras & Bocas
Interino



 (SBT/Divulgação)


Cafezinho requentado

Sucesso quando de sua exibição em 12001, a novela Café com aroma de mulher retorna amanhã à programação do SBT/Alterosa. Vai ocupar a faixa das 14h30, substituindo Maria do Bairro, que chega ao fim na terça-feira. Produção da RCN Televisión colombiana, o folhetim tem como protagonista a atriz Margarita Rosa de Francisco (foto), que faz o papel de uma trabalhadora do campo com o curioso nome de Gaivota, que se apaixona pelo fazendeiro Sebastião Vallejo Cortez, maior produtor de café da região, interpretado pelo brasileiro Guy Ecker.

Marília Gabriela em  dose dupla na telinha

A atriz Irene Ravache é a convidada de hoje do programa Marília Gabriela entrevista, às 22h, no canal GNT (TV paga). No bate-papo elas conversam sobre a carreira no teatro e na televisão, premiações e muito mais. Já no SBT/Alterosa, à meia-noite, o De frente com Gabi apresenta entrevista inédita com o padre Fábio de Melo, que além de sacerdote, cantor e compositor, é também professor, graduado em filosofia e teologia, pós-graduado em educação, escritor e apresentador de televisão.

Glória Perez assina  nova série da Globo

Prestes a estrear mais uma série, A teia (dia 28), a Globo já está de olho em uma nova produção para a faixa das 22h. Dupla identidade é o nome da série que Glória Perez escreve para o canal. Em 13 capítulos, a trama deve revelar a rotina de um assassino em série. A data da estreia ainda não foi definida.

Em pauta a volta às  aulas da garotada

Entrar na escola sem traumas, trocar de colégio sem dramas e encarar a volta às aulas sem reclamação. Estes são os temas de hoje do Papo de mãe, que vai ao ar hoje, às 15h30, na TV Brasil (canal 65 UHF).As apresentadoras Mariana Kotscho e Roberta Manreza recebem a psicopedagoga Maria Irene Maluf e a especialista em educação financeira Cássia D'Aquino. Letícia Bragaglia e Fernanda De Luca conduzem as reportagens do programa.

Thiago Rodrigues vai  além do horizonte

Um dos protagonistas da novela Além do horizonte, da Globo, o ator Thiago Rodrigues criou a rede social Trippics com os parceiros Bruno de Luca, Octavio Magalhães, Bruno Maquiera e João Paulo Pimentel. A Trippics é direcionada aos viajantes que buscam conhecimento sobre lugares, dividir suas experiências, dar e receber dicas e conhecer pessoas durante as viagens. Ficou curioso? Então acesse o site trippics.com.

Garota Penetra recebe  inscrições até dia 31

Termina dia 31 o prazo de inscrições para o concurso Garota Penetra do Sexy Hot (TV paga). As candidatas deve ter beleza, bom humor e muito sex appeal. A produção do canal vai selecionar seis candidatas, e a partir daí é o público quem decide, votando na sua preferida. A vencedora fará um ensaio sensual e participações em alguns episódios do programa Penetra, exibido nas noites de sábado. Saiba mais acessando o site www.garotapenetra.com.br.

Milton Neves relembra o que viu nos mundiais
 (Rede Bandeirantes/Divulgação)

Os jornalistas Mário Marinho e Silvio Natacci estão lançando o livro Milton Neves conta nossos mundiais (Editora Nova Leitura, 224 páginas, R$ 49,99). Como indica o título, a publicação recorda a conquista dos Mundiais pela ótica do também jornalista Milton Neves, que apresenta o Terceiro tempo, nas noites de domingo, na Bandeirantes. Milton Neves (foto) é mineiro de Muzambinho, como vive repetindo em seu programa na TV.

Tereza Cruvinel - Sob a montanha

Dilma vai a Davos tentar mudar percepções negativas sobre a economia brasileira. Terá que ser convincente


Estado de Minas: 19/01/2014


Neste fim de semana, a presidente Dilma Rousseff pretendia avançar na preparação das duas falas que fará no Fórum Econômico Mundial de Davos, na sexta-feira, dia 24. Uma delas, aberta ao público. Outra, reservada, com inscrições já esgotadas. Em ambas, Dilma tentará mudar percepções externas negativas que se adensaram ao longo de seu governo, sobre um Brasil que “bombou” no cenário externo durante a era Lula. Sob Dilma e os reflexos da crise mundial, o crescimento encolheu, a inflação subiu, vieram as críticas à política fiscal, a um suposto estatismo intervencionista da presidente e à baixa competitividade do país. Finalmente, ao azedume de algumas publicações estrangeiras, somaram-se ameaças das agências de risco, de retirar do país o distintivo “grau de investimento”. Dilma acha que tem bons argumentos para desconstruir o que seus auxiliares chamam de “percepções falsas” sobre o Brasil.

Muito antes de projetar-se como sede da reunião anual dos grandes do mundo, a bucólica cidadela sob os cumes nevados dos Alpes suíços fez fama como cenário de A montanha mágica, um dos livros prediletos de Dilma, que valeu a Thomas Mann o Prêmio Nobel de Literatura em 1929. Naquele mesmo ano, Davos foi palco de um duelo intelectual entre dois gigantes da filosofia do século passado, o existencialista Martin Heidegger e o cartesiano Ernst Cassirer. A vocação telúrica para a reflexão deve ter pesado na escolha do lugar como sede do que, desde 1969, ali reúne estadistas, políticos, empresários e executivos globais, investidores, economistas e pensadores em geral para debater a situação e os rumos do mundo.

Dilma, nos últimos três anos, recusou os convites e enviou ministros como representantes, mas um fórum tão exclusivo prefere ouvir diretamente os governantes. Com o pessimismo sobre o Brasil se ampliando no ano de sua tentativa de reeleição, Dilma resolveu ir à montanha. O fundador e dirigente do fórum, Klaus Schwab, mediará sua apresentação, uma deferência já precedida de uma declaração favorável: “O Brasil tem todos os ingredientes para superar a crise de meia-idade que afeta os emergentes”.

O pessimismo externo é alimentado por indicadores indiscutíveis, como o baixo crescimento e a inflação teimosa, e também por implicâncias com sotaque ideológico, seja com ações do governo ou com o estilo de sua presidente. Haverá, portanto, um alto ceticismo na plateia da conferência reservada de Dilma, composta basicamente por executivos e investidores, que terão direito a lhe fazer perguntas. Lula, em suas participações em Davos, pregou o combate à pobreza e difundiu as políticas sociais que implementou. Ele falava a favor do vento: a crise mundial do capitalismo tornara o fórum mais sensível às questões sociais, a um papel mais forte do Estado, ao ressurgimento dos interesses nacionais em detrimento do mundo global. Dilma vai a Davos com o vento um pouco virado, pedindo mais mercado e menos Estado, ecoando palavras como liberação, competitividade e produtividade. Seu discurso não pode ser o de Lula, que naquela conjuntura seduziu Davos e ajudou a forjar a imagem do Brasil como emergente promissor, um dos Brics, potências do futuro. Agora, porém, trata-se de derrotar o ceticismo, vendendo o Brasil como terra de oportunidades para investidores.

Dilma pode dar suas pinceladas sociais no quadro brasileiro, mas vai se concentrar na defesa da solidez da economia e das contas públicas e, principalmente, na apresentação do repertório de concessões ao setor privado lançadas por seu governo. Citará cada um dos leilões já realizados ou programados, nas áreas de petróleo (com destaque para o campo de Libra), energia, ferrovias, rodovias e portos. Outras oportunidades virão, dirá ela, na medida em que foram bem-sucedidas as parcerias entre o Estado brasileiro e os investidores privados, impulsionando o crescimento de um país dotado de um grande mercado interno e de enormes riquezas naturais. Beijará a cruz reiterando compromisso com a estabilidade e a saúde fiscal. Nesse sentido, dizem os analistas, Dilma leva como sinal de zelo monetário a recente elevação da taxa interna de juros a 10,5% anuais, depois de constatado que o IPCA de 2013 fechou em 5,91%. O anúncio do presidente Barack Obama, na sexta-feira, de que os EUA não mais investigarão “governos amigos” também jogará mais luz sobre sua figura. Foi ela, seguida pela chanceler alemã, Angela Merckel, que primeiro se insurgiu contra a bisbilhotagem americana. Tudo conta, mas ela terá de ser convincente no que diz respeito à economia.

Rolezinho e segregação

Diferenças partidárias para lá, governantes e políticos entraram em rara sintonia, com petistas, tucanos, socialistas e outros istas falando a mesma coisa: não se deve criminalizar o “rolezinho” nem apelar para a repressão policial, que pode virar “fogo na gasolina”, como disse o ministro Gilberto Carvalho. Não haveria motivação política, mas apenas comportamental/cultural, no afluxo de centenas de jovens aos shopping: eles querem apenas “zoar”, se divertir, compartilhar os espaços e os símbolos que a sociedade elegeu como indicadores de prestígio.

Na reunião em que Dilma tratou do assunto com alguns ministros, houve quem lembrasse uma das primeiras reações ao rompimento da segregação urbana. Brizola governava o Rio e autorizou linhas de ônibus ligando diretamente a Zona Norte à Zona Sul do Rio. Os pobres, pardos e pretos do subúrbio começaram a frequentar as praias. Os da Zona Sul se incomodaram com suas farofas e maus modos, reclamando da falta de lazer nas periferias. Garotinho virou governador e construiu o Piscinão de Ramos. É verdade que a elite e a classe média tradicional passaram a reclamar da invasão de outras praias: da piora do trânsito com o maior acesso ao carro, dos aeroportos cheios e, agora, da invasão dos shoppings pelos da periferia. Tudo isso procede, mas, no caso dos rolezinhos, fica a pergunta: todos têm direito de ir ao shopping, ainda que só para zoar. Mas tem que ser em grupos de 200, 500, 1 mil?

EM DIA COM A PSICANÁLISE » O valor de uma ovelha‏

EM DIA COM A PSICANÁLISE » O valor de uma ovelha 

"Falo pelos clientes e também pelos médicos, todos fomos devorados pelo poder" 
 
Regina Teixeira da Costa
Estado de Minas: 19/01/2014


Diante de certos acontecimentos, fico me perguntando sobre o valor das pessoas. O fato de vivermos com densa população nos centros urbanos provoca fenômenos que só podemos jogar na conta do nonsense, tão falado pelos teóricos da pós-modernidade. Simplesmente não tem sentido as pessoas não valerem mais que os objetos.

Vejam que na nossa época infelizmente o dinheiro vale muito mais do que as pessoas. Dizem que alguns até venderiam a própria mãe por ele, talvez um exagero, mas de fato a corrupção inextinguível e tão arraigada a nossa política mostra que o poder e a ganância estão à frente de qualquer valor humanitário, e justamente de onde mais se esperava que ele fosse defendido.

Vejam a falta de lógica. Como se explica um médico fazer uma prova dificílima para entrar para o plano de saúde, como o da Unimed, se encher de clientes que, pelo volume, ele não conhece nem reconhece, nem sequer sabe se tiveram piora ou melhora com o tratamento e ainda assim ficar satisfeito e realizado no exercício da profissão que abraçou?

Com o tempo a realidade, mestra em desconstruir paixões e ilusões, não perdoa nem engana os que querem ver a verdade. O tempo o torna insatisfeito e, claro, ele há de perceber que para receber o que precisa para viver tem de atender em massa, pois o valor das consultas é irrisório. Estará trabalhando por vocação ou pelo dinheiro?

Consultas baratas o impedem de dar retornos, preparar os ajudantes e auxiliares, saber se o tratamento foi correto, se o diagnóstico acertado. Por sua vez, o cliente desassistido cura ou permanece na busca da sorte grande, pois é humanamente impossível neste sistema de saúde atual ter um médico que de fato lhe cuide. Nem estou falando da saúde pública, mas de uma saúde privada que pegou o jeito da outra!

E em pronto-atendimento o que vale um entre mil na espera? Então, uma pessoa passa 10 anos estudando para estar apta e a prática está tão distante da vocação. Ninguém pode desejar uma qualidade de vida desta. Falo pelos clientes e também pelos médicos, todos fomos devorados pelo poder. O poder do capital, de uma vida impossível fora desse sistema.

Médicos e clientes tornaram-se objeto de um sistema que desvaloriza o ser humano, embora paradoxalmente a proposta inicial tenha sido saúde à disposição de todos, mas o próprio sistema trata, ele mesmo, de corromper seus princípios.

O mesmo eu diria de pessoas de uma comunidade religiosa evangélica ou mesmo católica, que, desejando converter o mundo, cresce a galope, faz cultos de massa. Tínhamos antes pequenas igrejas evangélicas, que orientavam ali seus poucos fiéis com um bom pastor. Este, conforme a Bíblia Sagrada ensina a ser o vero bom pastor, percebendo que uma de suas ovelhas se perdera, deixava ali todo o rebanho e saía em busca daquela “zinha” perdida e a encontrando festejava alegremente.

Hoje, quem pode ter controle de tantas pessoas? Quem pode saber se alguém faltou? Quem dá valor a uma alma que se perdeu? Alguns pastores, mesmo sabendo dos problemas de algum membro, nem assim se abalam em busca dele. Outros consideram certos problemas bobagens. Esquecem que o que é bobagem para um pode não ser para outro, esquecem que acolher o débil, o frágil, o que sofre é a missão cristã.

Não quero aqui fazer apenas crítica a todos os sistemas de massa atuais. Eles ainda funcionam, mesmo que precariamente, no quesito valor da pessoa. Pelo menos tentam, mas talvez seja mesmo impossível atingir a perfeição. Do um a um, do amparo e acolhimento sustentados, valorizando o humano como prioridade máxima e acima do corporativismo, do poder político, financeiro e expansionista.

Na realidade, enfatizo com esses exemplos exatamente o quanto somos um grãozinho de areia na imensidão, e mesmo nos propondo valorizar tanto nossa existência, sofremos golpes narcísicos constantes, que nos remetem a nosso lugar de pó.

Seria muito confortante criarmos sistemas mais eficientes para nos promover um alento, acolhimento, mas cada proposta culmina quase em afirmar cada vez mais nosso pouco valor. Sistemas que tentam, enfim, dar conta de um impossível real cujo furo talvez possamos apenas bordejar melhor.

Vida e obra da escritora Helena Jobim ganham filme dirigido por Ernane Alves

CINEMA » Memórias do afeto 
 
Vida e obra da escritora Helena Jobim ganham filme dirigido por Ernane Alves. Produção conta com a participação de Sandy, Deborah Secco e Bruno Gagliasso


Carlos Herculano Lopes
Estado de Minas: 19/01/2014

Radicada desde 2000 em Belo Horizonte, onde escreveu parte significativa da sua obra, traduzida para diversas línguas, a escritora carioca Helena Jobim terá sua vida levada ao cinema pelo diretor mineiro Ernane Alves.

Helena, que começou a ser rodado há dois anos, demandou 40 horas de entrevistas com a escritora. O filme mescla realidade e ficção. Em fase de finalização, ele deve ser lançado ainda este ano, informa a produtora Ana Paula Valois. Faltam apenas alguns ajustes, que deverão ser resolvidos com recursos cuja captação foi viabilizada por leis estaduais de incentivo à cultura e do audiovisual.

Mineira de Belo Horizonte, Ana Paula Valois começou a se interessar pelo trabalho de Helena Jobim há cerca de 10 anos, quando a entrevistou para a Rede Minas. Fascinada pela bossa nova desde a adolescência, a produtora teve empatia imediata com a irmã do compositor e maestro Antônio Carlos Jobim, autor do clássico Garota de Ipanema em parceria com Vinicius de Moraes.

“Li toda a obra da Helena e fiquei fascinada. Comentei sobre os livros com meu marido, Ernane Alves, que mergulhou neles. Veio daí a ideia de fazer o filme”, conta Ana Paula. A parte relativa à vida da escritora já foi concluída, com gravações realizadas no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte.

No momento, a equipe se dedica a complementar a parte ficcional. Artistas vão recitar trechos da obra de Helena Jobim. Bruno Gagliasso, Deborah Secco e a cantora Sandy já gravaram. A trilha sonora do filme de 100 minutos é assinada por Lucas Lima, marido de Sandy.

Ana Paula conta que o filme terá duas canções de Tom Jobim: Samba do avião e Capitão Bacardi, composta em homenagem ao primeiro marido de Helena, o aviador Paulo. O segundo marido da escritora, Manoel Malagutti – com quem ela se mudou para Belo Horizonte –, faleceu há três anos.
O cineasta Ernane Alves vai contar a vida da escritora carioca Helena Jobim   (Fotos: Acervo pessoal)
O cineasta Ernane Alves vai contar a vida da escritora carioca Helena Jobim

ROMANCE Às vésperas de completar 83 anos, que serão comemorados em fevereiro, Helena Jobim começou a escrever ainda criança. Seu primeiro livro, o romance A chave do poço, lançado na década de 1960, ficou entre os finalistas do prestigiado Prêmio Walmap.

A consagração de Helena veio com Trilogia do assombro, levado posteriormente às telas pelo cineasta Marco Altberg. Lançado em 1986, o filme Fonte da Saudade conta a história de três mulheres em meio a lembranças de infância. O diretor reuniu elenco de primeira: Lucélia Santos, Cláudio Marzo, Chico Díaz, Norma Benguell, José Wilker, Daniel Dantas e Paulo Betti.

Em 1993, Helena recebeu o Prêmio Destaque em Prosa, concedido pela União Brasileira de Escritores. Ela escreveu também uma biografia dedicada ao irmão: Antônio Carlos Jobim – Um homem iluminado, lançada em 1996 pela Editora Nova Fronteira. O livro foi editado em Portugal e no Japão. Helena foi também cronista do Estado de Minas.

Docuficção Com 36 anos e vários filmes no currículo – como o premiado documentário Cinema, vale e sonhos, rodado no Vale do Jequitinhonha em 2010 –, Ernane Alves está finalizando dois outros longas, Clube das ilusões e Otto.

O cineasta conta que fazer um filme sobre Helena Jobim tem sido uma experiência e tanto. “Será o meu segundo docuficção. O primeiro foi Causos da melhor idade, rodado em Pedro Leopoldo. Estou muito entusiasmado. O que mais me impressiona na obra dela é o olhar feminino sobre o homem”, conclui.


EM FAMÍLIA

Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim nasceu em 25 de janeiro de 1927, no bairro carioca da Tijuca. Em 1931, ano de nascimento de sua única irmã, Helena, a família se mudou para Ipanema. A dupla era filha de Jorge de Oliveira Jobim (foto), diplomata, jornalista e poeta gaúcho, e de Nilza Brasileiro de Almeida. O casal se separou, Nelson morreu em 1935 e Nilza se casou novamente com Celso Frota Pessoa. “Celso foi o pai que conheci”, costumava dizer Tom. 

A arte de contar histórias‏ - Luciane Evans

Eles ainda contam histórias 
 
Pais resgatam tradição, aproximando-se de seus filhos e incentivando a criatividade dos pequenos 

 
Luciane Evans
Estado de Minas: 19/01/2014


Os advogados Felipe Martins e Letícia Junger se reúnem com os filhos João Felipe e Maria Eduarda na hora do almoço ou antes de dormir: narrativa oral agrada às crianças (Marcos Vieira/EM/D.A Press)
Os advogados Felipe Martins e Letícia Junger se reúnem com os filhos João Felipe e Maria Eduarda na hora do almoço ou antes de dormir: narrativa oral agrada às crianças


Era uma vez… um rei e uma rainha que todas as noites, antes de o príncipe e a princesa pegarem no sono, retiravam, com a ajuda das girafas do reino, o livro colorido do alto da estante mágica e folheavam cada página, uma a uma. As crianças mergulhavam para dentro da obra e, naquele mundo de lá, subiam no cavalo voador azul e iam passear pela floresta encantada. Esse não é um conto verdadeiro, tampouco conhecido. Foi inventado para dar início à história de muitos pais que todos os dias conversam com os seus filhos por meio do “era uma vez...” Antes de dormir, numa noite qualquer ou até mesmo durante o almoço, eles se permitem entrar para esse mundo da imaginação, com direito a cavalos falantes, girafas voadoras e lápis que viram vara de condão. E, mesmo com o tempo curto e a correria do dia a dia, dizem que, narrando ou inventando, encontraram o jeito certo de responder aos muitos porquês dos pequenos, incentivar a criatividade e ensinar a eles lições para uma vida inteira.

Em tempos de tecnologia avançada, de tablet ao alcance de bebês, a narração se tornou o resgate de uma tradição. “Os conhecimentos passados por via oral são a arte mais antiga da humanidade. Houve um tempo em que a narrativa era a única forma de passar cultura”, destaca Sylvia Flores, psicóloga, psicopedagoga e professora do Centro Universitário Newton Paiva. Nas antigas sociedades agrárias, os mais velhos estavam sempre contando casos e lendas. Mas o costume foi se perdendo com a modernização, principalmente nos grandes centros. Nem todas as famílias mantiveram a tradição. Por outro lado, há os pais que ainda as contam por acreditar que, assim, além de ensinar, estão estreitando os laços com os filhos.

E é verdade. Prova disso é o pequeno Gabriel Morais, de 2 anos e 7 meses, que ao ouvir da mãe, Valéria Morais Ramos, de 35, o “era uma vez...”, larga brinquedos para trás e tudo mais que estiver fazendo só para ficar com os olhos e ouvidos atentos em Valéria. “Gosto de ouvi-las sempre na hora em que vou dormir e também quando estou almoçando. E sempre que dá conto para meu irmão mais novo”, confessa a pequena Maria Eduarda, de 5, filha dos advogados e professores universitários Felipe Martins e Letícia Junger. Já Gabriel Santos Ferreira, de 8, cresceu ouvindo histórias da mãe, Roberta Fernandes Santos, e, hoje, conta orgulhoso que está na 80ª página de um livro com 112 páginas. “Gosto de ler e aprendi também a contar minhas histórias.”

A leitura de capítulos ou a invenção deles, segundo destaca a psicóloga e psicopedagoga Sylvia, é uma forma de os pais se aproximarem de seus filhos. “As crianças que vivem em um ambiente assim desenvolvem o interesse pelo lúdico e o prazer pela leitura. Elas vencem medos e aprendem valores.” Para a contadora de histórias e editora-chefe da Aletria e de livros infantis, Rosana Mont'Alverne, contar histórias é um ato de resistência. “É um antídoto contra essa onda de comportamentos padronizados. Contar é afeto, é dar seu tempo para a imaginação. Por isso é importante o lobo mau, Joãozinho e Maria. São repertórios que nos ajudam a lidar, de forma gostosa, com as angústias da primeira infância”, diz, ressaltando que, assim, ouvindo fábulas, casos e contos na sua infância, tornou-se uma adulta com os próprios pensamentos. “Esse é meu maior tesouro. Não me tornei uma Maria vai com as outras. Com as histórias, você consegue pensar sozinho. Comecei a ler o mundo e tomar as minhas decisões”, orgulha-se. 

Eduardo Almeida Reis - Escrever nas teclas do celular é chatíssimo, demorado e complicado‏

Escrever nas teclas do celular é chatíssimo, demorado e complicado



Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 19/01/2014


Mensagens

Nos celulares comuns, portanto não inteligentes, se você aperta “menu” aparece no meio da tela cheia de frescuras um retângulo verde com um envelope amarelo no meio. Você torna a clicar e aparece “sua mensagem”, isto é, um espaço para você escrever. Escrita a mensagem, você clica “enviar” e aparece uma lista encimada por “contatos”, que são os nomes e números que você já tem na agenda do telefoninho, mas você também pode enviar a mensagem para outros números. Resumindo: parece que a providência é muito mais barata do que um telefonema normal. Ora, telefone, do inglês telephone ou do francês téléphone, vem do grego téle, que significa longe, ao longe, de longe, e deve ter sido inventado para falar de longe. Escrever nas teclas do celular é chatíssimo, demorado e complicado. Nos teclados do computador ou das velhas máquinas escrevo com alguma facilidade, não raras vezes milhares de palavras por dia. Hoje, por exemplo, são 11h37 e vou a caminho das 2 mil. Para mandar um recadinho de uma dúzia de palavras, via celular, levo um tempão. Não entendo como cavalheiros e damas bem de vida recorrem às mensagens escritas via celulares. Mais grave que isso: fico furioso.

Parentalha

Nosso belo Kim Jong-un, jovem líder da Coreia do Norte, não se contentou com a ordem para matar seu tio Jang Song-thaek e muitos assessores. Também mandou prender centenas de parentes e amigos de Song-thaek, a parentalha do finado segundo homem do regime. Enviados para os campos de trabalho forçado, vão comer a grama que o diabo amassou. O ditado fala em pão amassado pelo diabo, mas o pão norte-coreano anda escasso e o recurso à grama tem sido comum, enquanto a Coreia do Sul vai-se transformando num dos países mais prósperos. Veja o leitor que não escrevi “países do mundo”, por absoluto desconhecimento de países fora do nosso planeta. Mais que possível, é provável que existam, porque as estrelas, com os seus planetas, só em nossa galáxia se contam por bilhões. As estimativas variam de 200 bilhões a 500 bilhões de estrelas só na Via Láctea, uma galáxia entre bilhões. Circula na internet uma lista de coisas que nunca soubemos ou já nos esquecemos, e-mail interessantíssimo que recebi de um arquiteto amigo. Nele, aprendi que Yotta (Y) = 1024 = 1.000.000.000.000.000.000.000.000 é o tipo do número que se presta para os cálculos estelares. Aprendi, também, os 12 profetas do Antigo Testamento, nomes hoje comuns: Isaías, Jeremias, Jonas, Naum, Baruque, Ezequiel, Daniel, Oséias, Joel, Abdias, Amos. Da lista consta ainda Habacuque. Confesso que nunca soube de um Habacuque de Oliveira – o melhor apelido seria Cuquinho –, mas vou ao Google e encontro mais que 1 milhão de entradas para Habacuque. É ou não é de cabo-de-esquadra?

Casamentos

Personagem do Eça, o desembargador Amado sonhava com um genro bacharel, temente a Deus, sem tísicos na família. Mudam-se os tempos e no Brasil de hoje, com a TB mais ou menos sob controle, bacharéis a montões e mais de 90% da população temente a Deus, ainda que muita gente iludida pelo pastor das toalhinhas, penso que outros sonhos se impõem. Futuro genro e futura nora devem ser Taxa Zero e wireless, dotados de no break na hora dos finalmentes. Nada pior do que os finalmentes brecados por falta de energia. E banda larga, ou, pelo menos, banda compatível, sem Bluetooth, por favor, que a trademark significa literalmente dentes azuis. Halitose é o diabo sob a forma de parceiro (a), enquanto a careca é perfeitamente natural e nunca foi defeito. Abgar Renault, calvo desde muito jovem, escreveu: “Todo mundo se acostuma com a calvície, salvo o seu proprietário”. Problema que deixou de existir no Brasil de hoje: basta requisitar um jato da FAB para implantar 10 mil fios no médico recifense. É fio à beça e à bessa.

O mundo é uma bola

19 de janeiro de 379: Teodósio I se torna imperador romano. Nascido Flavius Theodosius, dito O Grande, foi o último líder do Império Romano unido. Seu reinado é conhecido pelo Édito de Tessalônica, que institui o cristianismo como religião oficial do império. Casou-se duas vezes: com Élia Flacila e com Gala, três filhos com Élia, três com Gala. Era filho do conde Teodósio com Temância. Só de imaginar Temância aos berros encomendando Flavius Theodosius ao conde, numa noite quente de Cauca, atual Segóvia, Espanha, acho melhor parar por aqui. Em 1880, o Congresso espanhol vota a abolição da escravidão em Cuba, mas a democracia plena, sistema de liberdade absoluta, só chegaria à região com os irmãos Castro. Em 1944, durante a Segunda Guerra Mundial, num só dia a RAF lança 2,3 mil toneladas de bombas sobre Berlim. Em 1951, inauguração da Rodovia Presidente Dutra. Em 1966, precedente perigoso: Indira Gandhi é eleita primeira-ministra da Índia, primeira mulher a ocupar o cargo. São decorridos 48 anos e os resultados aí estão até no futebol feminino. Em 840 nasceu Miguel III, o Ébrio, imperador bizantino. Foi assassinado aos 27 anos e sua história é tão complicada que não cabe neste espaço imaculado de nossa mídia.

Alterações físicas e emocionais Transtornos da sexualidade

Alterações físicas e emocionais 


Transtornos da sexualidade afetam homens e mulheres. Há cura para alguns, outros exigem tratamento com psicoterapia e medicamentos

Lilian Monteiro
De Curitiba*
Estado de Minas: 19/01/2014

O que é normal e o que é doença da sexualidade? O comportamento sexual humano é diverso e determinado por fatores controláveis ou não, que são influenciados desde o relacionamento de um indivíduo com outros, circunstâncias de vida, influência cultural até práticas consideradas transtornos patológicos que precisam de acompanhamento médico. Na mais recente edição do Congresso Brasileiro de Psiquiatria, em Curitiba, ocorrida no fim do ano passado, esse foi um dos temas de conferencistas que se debruçaram sobre diagnósticos e tratamentos. A psiquiatra Kie Kojo, especialista em sexualidade humana pela Universidade de São Paulo (USP), diz que é cada vez mais frequente a busca pela sexualidade satisfatória, uma necessidade básica e primordial para a saúde como um todo. "E tudo aquilo que cause alteração sobre essa sexualidade deve ser investigado, diagnosticado e tratado."

Tendo como base a Classificação Internacional de Doenças (CID-10), em vigor no Brasil desde 1993, Kie Kojo explica que os transtornos da sexualidade são divididos em três grandes grupos: disfunções sexuais, transtornos de identidade e transtornos de preferência. As disfunções sexuais englobam todo tipo de incapacidade de participar do ato sexual de forma satisfatória, seja pela falta, excesso, dor ou desconforto, falha nas respostas fisiológicas ou incapacidade de controlar ou experimentar o orgasmo. Por ser um tema delicado, mas pouco abordado no cotidiano, o Estado de Minas dá início hoje a uma série sobre o assunto.

As disfunções sexuais são os transtornos sexuais mais prevalentes e a psiquiatra alerta que "essa incapacidade está presente em todas ou quase todas as relações sexuais por um período mínimo de seis meses causando sofrimento pessoal e ao parceiro". Ela reforça que estudo realizado no Brasil pela professora Carmita Abdo indicou que 28,5% das mulheres apresentam algum tipo de disfunção, sendo as mais prevalentes o desejo sexual hipoativo, transtorno de lubrificação e anorgasmia (veja ao lado). Entre os homens, 18,2% apresentam algum tipo de disfunção, sendo mais comuns a ejaculação precoce e a disfunção erétil.

Kie Kojo ensina que as disfunções são classificadas em primária, quando ocorrem desde o início da vida sexual, e secundária, quando começam depois de um período de vida sexual satisfatória. A generalizada ocorre em qualquer situação e/ou com todos os parceiros e a situacional em uma determinada situação e/ou com um determinado parceiro. Há ainda a orgânica, quando existe algum tipo de lesão física (como sequelas de cirurgias e sequelas do diabetes, etc.), e a psicogênica, na ausência de lesão, provocada por problemas emocionais, sendo a mais comum. "As disfunções tendem a ser mais graves quanto mais precoce for o bloqueio no ciclo de resposta sexual, composto por desejo, excitação, orgasmo e resolução. De uma forma geral, o bloqueio do desejo é mais complexo de tratar do que o bloqueio do orgasmo."

A especialista explica que as disfunções sexuais são desejo sexual hipoativo, aversão sexual, disfunção erétil, disfunção de lubrificação, anorgasmia, vaginismo, dispareunia, ejaculação precoce, compulsão sexual e disfunção sexual não especificada. "O tratamento deve ser individualizado, mas na maioria das vezes usamos a associação da terapia sexual com a psicofarmacologia", diz.

Em busca da própria identidade
O segundo grupo dos transtornos da sexualidade é chamado de transtorno de identidade sexual, caracterizado pelo desejo irreversível de viver e de ser aceito como pertencente ao gênero oposto. "A epidemiologia é controversa, mas estima-se que no Brasil a proporção seja de um transexual masculino para cada 40 mil homens e de um transexual feminino para cada 80 mil mulheres", diz a psiquiatra especialista em sexualidade humana pela Universidade de São Paulo Kie Kojo. Ou seja, não é tão comum. "A etiologia também é inconclusiva. Mas parecem existir fatores hormonais e genéticos (cromossômicos) envolvidos no desenvolvimento desses transtornos."
Conforme a psiquiatra, os transtornos de identidade sexual são transexualismo, transvestismo de duplo papel, transtorno de identidade sexual na infância e transtorno de identidade sexual não especificada. "O transexualismo é o transtorno de identidade mais conhecido, caracterizado pelo desejo de pertencer ao gênero oposto acompanhado de um intenso desconforto com o seu sexo anatômico, assim como o desejo de se submeter a tratamentos hormonais e de mudança de sexo para tornar seu corpo o mais parecido possível com o do gênero oposto. Esse desejo tem de persistir por no mínimo dois anos para ser caracterizado como transtorno. O tratamento exige equipe multidisciplinar, na maioria das vezes, e acompanhamento mínimo de dois anos. O sofrimento é tão intenso que alguns pacientes chegam a tentar o suicídio", acrescenta.

O transvestismo de duplo papel é o uso de roupas do gênero oposto durante parte da existência do indivíduo com o intuito de desfrutar a experiência de ser do gênero oposto, sem qualquer desejo de mudança de sexo ou de estimulação sexual. O indivíduo, neste caso, sente-se bem com o seu sexo anatômico. O transtorno de identidade sexual na infância é diagnosticado quando a criança apresenta uma angústia intensa e persistente com relação ao próprio gênero, junto com o desejo ou insistência de que é do gênero oposto. Ocorre, geralmente, antes da puberdade. "Dois terços dessas crianças na idade adulta terão como orientação sexual o homossexualismo. E apenas uma pequena parte delas se tornam transexuais." Já o transtorno de identidade sexual não especificada é tudo aquilo que não se encaixa nos demais.

CIRURGIA Como o transexualismo é o transtorno mais conhecido e divulgado, Kie Kojo enfatiza que a cirurgia de redesignação sexual, ou transgenitalização, é feita gratuitamente no Brasil desde 1997, embora fosse restrita a hospitais-escola do setor público. Em 2008, ela passou a integrar a lista de procedimentos cirúrgicos do Sistema Único de Saúde (SUS). Recentemente, o Conselho Federal de Medicina autorizou clínicas particulares a fazer o procedimento. "Já não é necessário autorização judicial. É importante ressaltar que o procedimento é complexo e irreversível. Portanto, tem de ser feito de forma responsável e por equipe capacitada."
O terceiro grupo é o de preferência sexual, ou parafilia, que adota padrão de comportamento sexual considerado perversão, tema que será abordado na edição de amanhã. Deve estar presente por um período mínimo de seis meses causando sofrimento pessoal e interpessoal. "Estima-se que 1% da população no Brasil tenha algum tipo de parafilia, sendo mais comum no gênero masculino. Frequentemente se inicia antes dos 18 anos. As parafilias mais comuns são pedofilia, voyerismo, exibicionismo, sadismo e masoquismo."

l A repórter viajou a convite da Associação Brasileira de
Psiquiatria (ABP)

Uso diário do cérebro torna a pessoa apta a adquirir habilidades

Cientistas acham que o estudo pode ajudar pacientes com problemas de movimento


Vilhena Soares
Estado de Minas: 08/01/2014






Você sabia que, ao acessar diariamente seu computador para as mais diferentes tarefas, está exercitando seu cérebro? Pois é o que defendem pesquisadores da Northwestern University e do Instituto de Reabilitação de Chicago. Em um estudo realizado recentemente e divulgado na revista Current Biology, os cientistas concluíram que pessoas com o hábito de usar laptops e tablets ganham diversas habilidades mentais, incluindo algumas relacionadas a atividades motoras. Isso pode levar, dizem os autores, a formas mais eficazes de ajudar na recuperação de pessoas que tiveram prejudicados os movimentos do corpo.



No experimento, os cientistas analisaram dois grupos de trabalhadores imigrantes japoneses, um com familiaridade com os computadores e outro sem. Após alguns testes de aprendizagem de movimentos, os trabalhadores do primeiro grupo tiveram um desempenho bem melhor. Um dos testes consistia em mover um cursor com a mão, para várias direções. O trabalho foi bem executado por aqueles com muito mais familiaridade com as máquinas.

Em outro momento, com um novo grupo de 10 pessoas que não estavam familiarizadas com computadores, os autores pediram que os voluntários passassem duas semanas treinando o uso de jogos de computador, que exigiam o uso intensivo do mouse por duas horas a cada dia. Com o treinamento, as pessoas que antes não tinham muita produtividade nas atividades evoluíram bastante. “Duas semanas de experiência foi o suficiente para converter os padrões de usuários de computador normal para os padrões de indivíduos que usam computador, que era o que acreditávamos que aconteceria”, relatou Konrad Jording, um dos responsáveis pelo estudo.

Kording explica que esses dados obtidos são de extrema importância, pois mostram que é possível desenvolver a agilidade mental de forma mais rápida com o uso das máquinas. Especialista na área de recuperação médica do Instituto de Reabilitação de Chicago, o cientista vê uma possibilidade de usar o treinamento via computador para ajudar seus pacientes. “Se pudéssemos fazer com que eles generalizassem essa habilidade em um treinamento robótico feito no hospital e o usassem para tomar chá em casa, por exemplo, o treinamento no hospital melhoraria ao máximo a vida cotidiana dessas pessoas”, afirma.

“Essa busca é muito importante, porque queremos que os pacientes que têm doenças relacionadas a movimentos tenham um treinamento eficiente no hospital, obtendo desempenho funcional também em casa. Fora que ninguém, antes, havia pesquisado como os computadores mudam a nossa forma de aprender a mover-nos, pelo menos, até onde eu sei, isso ainda não havia sido feito”, destaca.

Mais exercícios
Para Pablius Braga, um dos coordenadores do Centro de Medicina do Exercício e do Esporte do Hospital 9 de Julho (São Paulo), a pesquisa explora um tema interessante, de uma forma original e bastante produtiva, apesar de ter contado com um grupo experimental pequeno. “Comparar grupos de pessoas com hábitos diferentes foi uma boa estratégia. Acredito que poderiam ter usado um número de participantes maior, mas, mesmo assim, o experimento realmente mostrou que pessoas que já usam o computador possuem facilidade de visualização e de movimento”, declara.

O especialista acredita que isso se deve ao treinamento ao qual o cérebro é submetido ao realizar as atividades diárias relacionadas à máquina. “Quando realizamos uma atividade repetidas vezes, aquele movimento vai se repetindo no cérebro e fica ‘marcado’ nele. E isso é um exemplo de agilidade mental, que pode fazer diferença quando somos postos à prova, em outras atividades nas quais precisamos executar movimentos complexos”, complementa.

Braga acredita que o trabalho precisa de mais aprofundamento, para que, dessa forma, seja útil em pesquisas futuras, principalmente nas relacionadas à área médica. “Com trabalhos nessa linha, podemos conhecer e desvendar os mecanismos que fazem com que a resposta do cérebro a um movimento seja mais rápida que a resposta do corpo. Temos até um exemplo atual: muitas pessoas conseguem segurar e digitar em um celular apenas com uma mão, usando o polegar para teclar. É um hábito adquirido com o tempo. São mudanças desse tipo, adaptativas, que auxiliam na fisioterapia e que podem renovar tratamentos”, completa.

Jording adianta que o trabalho terá continuidade. Ele e sua equipe seguirão em busca de mais dados e novas descobertas na área de desenvolvimento mental. “O próximo passo lógico seria perguntar se podemos ter duas abordagens de treinamento do computador, com efeitos distintos nessa generalização de movimentos, pois assim poderemos aperfeiçoar futuras técnicas de aprendizagem”, adianta. “A grande questão no cenário clínico é se a reabilitação supervisionada pode levar à melhora funcional em casa. Assim, o próximo passo é ver como fazer essa generalização de movimentos ‘caseira’ ocorrer de forma mais eficaz.”

A questão das terras indígenas - Frederico Diamantino Bonfim e Silva

A questão das terras indígenas
 
Palavra final deve caber ao Congresso, que representa a sociedade


Frederico Diamantino Bonfim e Silva
Especialista em direito ambiental e agrário, diretor da Associação Brasileira de Criadores de Zebu (ABCZ)

Estado de Minas: 19/01/2014


Com a aprovação do Orçamento de 2014, o assunto sobre as demarcações de terras indígenas voltou a ser pautado no Congresso Nacional. Infelizmente, não é por ser um dos temas nacionais de maior relevância que vem trazendo insegurança para investidores e pecuaristas e explodindo o campo em violência, com confrontos armados. Mas sim por uma pressão política, contra o anunciado veto à aprovação do Orçamento impositivo, que nada mais é do que o pagamento obrigatório de emendas parlamentares. Inicialmente, um assunto não tem nada a ver com o outro. Mas, como o Executivo já anunciou que vai vetar o Orçamento impositivo, os deputados resolveram dar o troco político e instalaram a comissão que vai analisar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215 em pauta.

A referida emenda trata da alteração da Constituição Federal da seguinte forma: Ementa – Constitui Comissão especial destinada a apreciar e proferir parecer à Proposta de Emenda à Constituição 215-A, de 2000, do sr. Almir Sá e outros, que “acrescenta o inciso XVIII ao art. 49; modifica o § 4º e acrescenta o § 8º ambos no art. 231, da Constituição Federal” (inclui dentre as competências exclusivas do Congresso Nacional a aprovação e demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e a ratificação das demarcações já homologadas; estabelecendo que os critérios e procedimentos de demarcação serão regulamentados por lei). Em síntese, a PEC 215 altera o rito de demarcação de terras dos índios transferindo para o Legislativo a competência, que hoje é do Executivo, sobre a demarcação de novas terras indígenas. Além da perda de poder, o Executivo é contra a formação da comissão para analisar a PEC 215. Ela é formada em grande parte por deputados da bancada ruralista, contra os quais o governo tem amargado sequências de derrotas. A situação precisa ser definida. Não se pode simplesmente tomar as terras das pessoas que compraram títulos registrados em cartórios, que têm cadeia dominial completa e que fizeram investimentos pesados durante décadas e que estão na posse a gerações, com o argumento de que essas terras eram indígenas, de acordo com um procedimento administrativo da Fundação Nacional do Índio (Funai) e não indenizar ninguém por isso.

Do jeito que está não pode ficar, pois as pessoas que compraram as terras tituladas, livres e desembaraçadas e nelas investiram tempo e dinheiro não podem simplesmente ser retiradas delas e, pior, sem sequer ganhar indenização com a alegação simplista de que o primeiro possuidor das terras brasileiras eram os índios. Como o nome do próprio órgão indica, a Funai não possui independência para dar a última palavra sobre o assunto. Nada melhor que o Congresso, que é o representante do povo, para definir sobre as demarcações. A batalha começou apenas no campo político, mas com certeza a parte vencida vai bater na porta do Judiciário.

O BRASIL NAS URNAS Em outubro, 11 milhões de jovens votarão pela primeira vez.

O BRASIL NAS URNAS

 Em outubro, 11 milhões de jovens votarão pela primeira vez. Uma geração que teve, em sua maioria, o primeiro contato com a política nos protestos pelas ruas do país em 2013 
 
Adriana Caitano
Estado de Minas: 19/01/2014


 (Evaristo Sá/AFP %u2013 20/6/13)

Brasília – A geração dos protestos de junho vai às urnas pela primeira vez em outubro. Cerca de 11 milhões de adolescentes entre 16 e 20 anos que tiveram papel decisivo no movimento que tomou as ruas do país no ano passado vão estrear nas eleições. São jovens como os estudantes Aníbal Londe, de 16 anos, e Ian Viana, de 18, que ainda não tinham vivenciado a atuação política e agora, com o título de eleitor em mãos, poderão ajudar a colocar em prática as transformações que reivindicaram. Atrair esse público será um dos grandes desafios dos candidatos, principalmente aos postulantes ao Planalto, que já afinam o discurso para se aproximar do grupo que corresponde a pelo menos 10% do eleitorado e será determinante no resultado.

Segundo números do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a média de novos votantes entre 16 e 18 anos no país tem sido de 2 milhões a cada pleito e neste ano já está garantido quase 1 milhão — o cadastramento só será encerrado em maio. A média dos demais adolescentes ainda no início da vida democraticamente ativa, entre 18 e 20 anos, é de 9 milhões. Se mantiverem a média de 11 milhões, juntos eles poderão contribuir para a vitória ou derrota de um candidato: em 2010, a diferença entre a presidente Dilma Rousseff e o segundo colocado, José Serra, ficou em 12 milhões de votos. E as manifestações podem ter ajudado a engordar esse número.

Aníbal Londe, que nunca gostou de política, despertou a curiosidade sobre o tema ao ver os colegas indo para as ruas em junho do ano passado. Depois de assistir aos protestos, convenceu-se de que, mesmo não sendo obrigado, votar seria uma forma de participar. “O Brasil é um dos países mais corruptos do mundo, isso desmotiva um pouco. Pensava que meu voto individual não ia mudar em nada, mas depois vi que cada voto é importante”, comenta o adolescente, que acaba de concluir o ensino médio e pretende ser médico. “Se a história for mudada nas eleições, minha participação ficará registrada.”

Ele integra o grupo de 65% dos jovens brasileiros que, de acordo com pesquisa da Secretaria Nacional de Juventude (SNJ), mesmo tendo voto facultativo, tiraram o título de eleitor ou pretendiam fazê-lo a tempo de votar este ano. O levantamento com cerca de 3 mil jovens entre 15 e 29 anos de todo o país foi feito em maio do ano passado, publicado em agosto e atualizado em dezembro. O estudo indicou também que 83% dos jovens brasileiros consideram a política mais ou menos ou muito importante e 91% acreditam poder mudar o mundo.

NAS REDES A pesquisa do órgão da Presidência da República em parceria com a Unesco apontou ainda que os jovens não veem só nas urnas a chance de contribuir com o país. Muitos apostam as fichas em movimentos organizados e em debates na internet. As instituições oficiais, no entanto, levam a pior: 88% deles disseram que não são nem querem ser vinculados a partidos políticos.

Ian Viana se enquadra nesses grupos. Ele criou o grêmio estudantil da escola em que estudava, organizando debates sobre temas como desigualdade social. Porém, ainda se sentia mal ao ver a falta de interesse político dos colegas. “Só fiquei animado quando estourou aquele boom dos protestos ano passado e pessoas que nunca ouviram falar de política começaram a debater sobre isso nas redes sociais”, empolga-se.

Foi dele a ideia de reproduzir em Brasília a primeira manifestação de apoio aos ativistas que apanharam da polícia em São Paulo, no início de junho de 2013. Para o evento, marcado pelo Facebook por ele e uma amiga, eram esperados apenas os colegas mais próximos, mas compareceram cerca de 10 mil pessoas. “Naqueles dias de protestos houve um suspiro de que política é mais que dar voto. Ela é feita nas ruas ou no lugar que a gente estuda.”

Para a secretária nacional de Juventude, Severine Macedo, os episódios de 2013 devem dar as rédeas do comportamento desta geração neste ano. “O levantamento e as manifestações do ano passado desmistificam a ideia de que esta geração é apática, eles se mobilizam sim, mas de outras maneiras, e não se preocupam só com suas próprias pautas”, comenta. Por causa da força de organização que a juventude adquiriu, essa faixa etária deverá ser amplamente visada pelos candidatos, segundo ela. “Espero de fato que o tema apareça melhor, pautando-se por uma perspectiva de autonomia e inclusão social desses jovens, permitindo-lhes trabalhar, estudar, ter lazer, o que garante o desenvolvimento do próprio país”.

Mobilização nos partidos

As chapas presidenciais que devem entrar na disputa deste ano já colocaram em campo estratégias específicas para se aproximar da geração de novos eleitores que chegam às urnas com a bagagem dos protestos do ano passado. Esse movimento tem ficado cada vez mais claro. A contratação, feita pelo comando das três principais campanhas, de equipes específicas para cuidar de mídias digitais e o envolvimento mais efetivo de cada um deles no Facebook e no Twitter revelam essa preocupação.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Marco Aurélio Mello, destaca que despertar no jovem a necessidade de participação democrática pode ser a solução para que essa faixa etária faça a diferença no resultado de outubro. Segundo ele, o tribunal fará uma campanha nacional em fevereiro para incentivar adolescentes entre 16 e 18 anos a tirarem o título de eleitor. “Vamos centrar nossas baterias neles para incentivar a crença de que atuarão ativamente na escolha de seus representantes, o que repercutirá também em suas vidas”, afirma o ministro.

Para o presidente do TSE, “os jovens precisam entender que, se estamos insatisfeitos com algo no país, o local correto para o protesto de excelência é a urna, porque a sociedade não é vítima, mas a autora responsável pelos maus políticos que tem”. (AC)