domingo, 24 de agosto de 2014

MARTHA MEDEIROS - Feliz aniversário

Zero Hora 24/08/2014

Ela sabe que é um pensamento improdutivo, mas mesmo assim se preocupa com a passagem do tempo, parece uma menina assustada diante do acúmulo de números que sua idade vem ganhando. Não entende onde foram parar seus 16 anos, seus 21, seus 29, seus 35, seus 42.

Ora, onde eles podem estar? Todos ainda dentro dela.

Ao assoprar as velas, a sensação é de que o passado também se apaga e um presente totalmente novo é inaugurado. Sendo virgem da nova idade, é como se estivesse nascendo naquele específico dia com pequenas rugas e manchas surgidas subitamente, e não trazidas do antes. Como se estivesse vindo ao mundo na manhã do festejado dia com os quilos, as dores e os limites de um adulto recém-nascido e com uma expectativa de vida mais curta, sem registro algum do tempo transcorrido até ali, aquele tempo que sumiu.

Sumiu nada.

Você tem seus 16 anos para sempre. Seus 21. Seus 25 e todos os outros números que contabilizou a cada aniversário: você tem oito anos, você tem 19, você tem 37. Você só ainda não tem o que virá, mas os anos que viveu ainda estão sendo vividos, são eles que, somados, lhe transformaram no que é hoje. Sua idade atual não é uma estreia, você não nasceu com esses anos todos que sua carteira de identidade diz que você tem. Só o dia do seu nascimento foi uma estreia. Desde então, você nunca mais saiu de cena. Ainda estão em curso seus primeiros minutos de vida.

Você ainda sente o nervosismo das primeiras vezes, as mesmas dúvidas diante das escolhas, o afeto por pessoas que foram importantes lá atrás, a adrenalina dos riscos corridos. Nada disso evaporou. O ontem segue agindo sobre você, segue interferindo na sua trajetória. É a mesma viagem, a mesma navegação. O meio de transporte é seu corpo, e ele ainda não atracou.

Mas e todo aquele peso extra que você um dia jogou ao mar? Não muda nada. A viajante que durante o percurso vem se desfazendo de algumas coisas continua sendo você. Aquele instante aos 19 anos ou aos 26 em que você cruzou o olhar com alguém que modificaria seu futuro continua acontecendo, o ponteiro continua se mexendo, o tempo não parou. Desiludem-se os amantes apaixonados que, quando se instalam num amor maduro, não encontram mais a mágica anterior que fazia o tempo parar, mas não se deve ser tão fatalista, você não tem 18 anos, ou 37, ou 53. Você tem 18, 37 e 53. No que tange o tempo vivido, não há “ou”. São várias idades contidas numa frequência cardíaca ininterrupta.

Você chegou a uma idade gloriosa, a idade de entender que não existem perdas, só ganhos. Não existe envelhecimento, e sim desenvolvimento constante. O tempo não passa, ele está sempre conosco. O novo não ficou para trás, ao contrário, o novo está adiante: na vida que ainda está por vir.

EM DIA COM A PSICANáLISE » Última morada‏

EM DIA COM A PSICANáLISE » Última morada
Regina Teixeira da Costa - reginacosta@uai.com.br
Estado de Minas: 24/08/2014


A finalidade da vida é a morte. Entretanto, mesmo sabendo que a morte é nossa única certeza, não nos conformamos com a finitude. Brigamos contra a morte, desejamos vencê-la, prolongamos a vida com todos os recursos possíveis e, muitas vezes, até vamos muito além do que deveríamos para mantê-la.

A missão da medicina é manter a vida e, para cumprir a ética médica, muitos de nós morrem em leitos frios de hospitais. Em UTIs mantidos vivos à custa de aparelhos, entubação e outros recursos invasivos e dolorosos, postergamos o fim apesar do desejo do paciente, que muitas vezes seria o de ir para casa e morrer no conforto de seu leito entre os entes queridos.

Toda vida anda nos trilhos da morte. O poeta Fernando Pessoa disse que o próprio viver é morrer, porque não temos um dia a mais na nossa vida que não tenhamos, nisso, um dia a menos nela. Mas temos medo.

Com a morte no horizonte, mesmo que a olhemos de viés, já que encará-la não é fácil, o valor da vida pode parecer menor. Freud, em 1915, escreveu sobre um poeta amigo que, diante da decadência do belo e do perfeito, perdia seu valor devido à transitoriedade.

Outros, no entanto, valorizam a vida justamente por ser breve. Mesmo os mortais, neste intervalo entre nascer e morrer, realizam uma passagem que deixa marcas da existência, com obras, arte e lembranças no coração daqueles que amaram. Acreditam ser os filhos uma continuidade assim como são os filhos dos filhos, de modo a amenizar um desaparecimento tão radical.

Para Freud, cada um de nós estaria em dívida de morte para com a natureza e deveria estar preparado para pagar tal dívida, já que a morte é natural, indiscutível e inevitável.

Mesmo com todas essas racionalizações sobre a morte e o morrer, é difícil aceitar a finitude. Vivemos como se fôssemos imortais, sem olhar de frente para o fim, porque recuamos diante do que é penoso. E a morte é uma separação radical acompanhada do doloroso luto.

Se morrer velho pode ser mais aceitável, um fim súbito, ao contrário, nos rouba alguém querido, próximo, ou mesmo um desconhecido, choca. E a morte de Eduardo Campos comoveu o país inteiro, principalmente por se tratar de um homem de vontade forte, que lutava por seus ideais, sonhos e anseios no auge da vitalidade e do desejo de realização.

Ver uma vida cortada por um acidente é muito triste. Parece-nos muito injusta. A morte, como disse uma amiga, envergonha, humilha. Retira-nos o narcisismo, a arrogância, a grandiosidade, o poder. Retira-nos tudo. Mortos, somos iguais. Somos pó e ao pó voltaremos.

É fato. Mas entre o nascer e o morrer temos um intervalo, e nesse espaço temporal podemos realizar grandes ou pequenas contribuições pelos que continuarão depois de nós. E desfrutar um pouco dos nossos desejos. Enquanto é tempo, mãos à obra antes de quitar a dívida!

Chega de saudade

Discos de vinil deixaram de ser mania de colecionador para se tornar opção cada vez mais presente no mercado. Consumidores e artistas festejam retorno das bolachas


Mariana Peixoto
Estado de Minas: 24/08/2014



O advogado Wagner Nardy com sua coleção de discos e equipamento com design vintage: nada de velharia
 (Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
O advogado Wagner Nardy com sua coleção de discos e equipamento com design vintage: nada de velharia

Adeus ao simples ato de apertar um botão ou clicar no mouse. Bem-vindo a um modus operandi quase ritual, que demanda espaço, tempo e atenção. Vinte e cinco anos atrás, se alguém vislumbrasse um retorno ao vinil em meio ao avanço tecnológico que viu nascer o CD e depois o MP3, poderia ser chamado de conservador, para dizer o mínimo. Mas eis que em pleno 2014, em meio à explosão dos sites de streaming – Spotify, Deezer e congêneres –, alguns fatos vêm comprovar que o retorno do vinil não é mais restrito a grupos de audiófilos ou nostálgicos avessos à tecnologia. Ele está fazendo parte efetivamente do cotidiano de pessoas que consomem música atual, que amadureceram com o meio digital e que têm acesso a todas as facilidades que o universo 2.0 oferece.

Aos 30 anos, o gaúcho Leandro Miguel se tornou consumidor de vinil ainda na pré-adolescência. A razão era simples: como no final da década de 1990 a bolacha havia caído em desuso, com pouco dinheiro era possível para o então garoto comprar vários discos. Pouco mais tarde, Leandro acabou se rendendo ao CD e aos MP3. Até que redescobriu o universo do acetato por meio de um amigo colecionador. Voltou a escutar seus velhos vinis com um aparelho 3 em 1 usado do pai de um amigo. Uma viagem aos Estados Unidos acabou se tornando definitiva para o que se tornou um hobby a que ele se dedica com esmero. Do primeiro toca-discos novo, comprado em 2013, ele já adquiriu outro, com mais recursos. E vem pensando em nova aquisição. “Estou querendo ver se consigo um toca-discos profissional, que custe US$ 400 ou até mais. E olha que não me considero um audiófilo, tenho um amigo que já gastou R$ 10 mil para montar o aparelho dele.”

O gasto com aparelhagem acompanha o de discos. Para Leandro, as compras são mensais. Como, nas palavras dele, “o vício é recente”, sua coleção ainda é pequena, com 80 discos no máximo. Muita coisa da Motown (Marvin Gaye e Stevie Wonder), Novos Baianos, Jorge Ben e Bruce Springsteen. A redescoberta da bolachona fez com que ele diminuísse o consumo de música digital. Algo que o advogado de Belo Horizonte Wagner Nardy, também de 30 anos, nem chega a ouvir. Com uma formação musical que veio do vinil, do acervo dos pais e irmãs mais velhas, ele prefere nem se aproximar do MP3. Sua coleção é basicamente feita de vinis e CDs. E ao contrário do que diz o senso comum, Wagner está longe de ser um rato de sebo. Sua coleção recente, montada nos últimos três anos, é quase que apenas de discos novos. Entre os títulos, clássicos oitentistas (New Order), dos 1960 e 1970 (Rolling Stones, Beatles, Simon & Garfunkel) e artistas novos, que já começaram suas carreiras na música digital (Amy Winehouse, Adele e Arcade Fire).

Prova do interesse crescente da produção atual vem do guitarrista Jack White. Seu segundo álbum solo, Lazaretto, tornou-se o disco de vinil mais vendido desde 1994 (época em que foi lançado Vitalogy, do Pearl Jam). Lançado em 10 de junho, o álbum vendeu nos EUA, em sua semana de estreia, 40 mil cópias – já totalizou 60 mil vendidos. Outros nomes que figuram na lista dos top 10 dos vinis são o duo francês Daft Punk e os ingleses do Arctic Monkeys. “O ritual da música é importante. Gosto de ouvir o lado A inteiro, depois o B. O vinil não tem a comodidade do MP3, em que você avança já para a faixa que quer, você tem que estar disposto a ouvir. E além do mais, no vinil o som do grave faz a diferença. Acho um prazer mais sincero”, acrescenta Wagner, que adquiriu há alguns anos um aparelho da marca norte-americana Crosley, especializada em toca-discos, rádios e aparelhos de som com design vintage.

De verdade A procura crescente pelo vinil vem acarretando mudanças em toda a cadeia que cerca uma bolacha. Artistas que nunca tinham tido um registro no formato resolveram investir. Formada há 10 anos, a banda paulistana Ludov tinha três álbuns e quatro EPs até o lançamento de Miragem. Lançado em junho, o trabalho só existe nas versões em vinil e MP3. Foram prensadas 300 cópias em vinil – só restam 50 da primeira tiragem, tanto que a banda já pensa numa segunda. Os custos foram arcados pelos próprios fãs do Ludov por meio do sistema de crowdfunding, a chamada vaquinha virtual. O grupo conseguiu R$ 12 mil para bancar a prensagem, realizada pela Polysom, única fábrica de vinil em atividade na América Latina.

“Foi a oportunidade de realizar um sonho de infância de ter um disco nosso de verdade. E mudou tudo, pois antes mesmo de gravar a gente ensaiava pensando qual música seria boa para começar um lado B, qual tinha cara de terminar o lado A. Quando se lança um disco em MP3, você também perde o conceito de capa, a ordem das músicas. Tudo fica randômico”, comenta o guitarrista Habacuque Lima. Orgulhoso da bolacha, ele ainda chama a atenção para a capa dupla, que leva a assinatura do quadrinista Gabriel Bá. No Brasil, a reabertura da fábrica Polysom, em 2010, serviu como um estímulo e tanto para gravadoras e artistas independentes. Ainda que seu campeão de vendas seja um álbum clássico – A tábua de esmeralda (1974), de Jorge Ben –, atualmente, boa parte dos artistas nacionais faz uma edição em vinil.

Selo mineiro aposta na onda

Selo criado pelo mineiro Luiz Valente, que se divide entre BH e Londres, a Vinyl Land já lançou, neste período, 30 títulos (entre compactos e LPs) de artistas nacionais. Até então todos eram prensados em fábricas na Europa, por causa do preço reduzido. Pela Polysom, lançou até então somente a coletânea Collector’s choice, com 21 artistas de BH, realizada com recursos de incentivos fiscais. Agora, Valente está lançando o primeiro vinil produzido pela Polysom de um só artista, o álbum Sobre noites e dias, de Lucas Santtana, que deve ficar pronto em outubro. Valente está bancando metade da produção – a outra parte cabe ao artista. O investimento da dupla é de R$ 13 mil para uma tiragem de 500 cópias. “A grande dificuldade de um selo é fazer a venda direta para os fãs. Normalmente, a compra é realizada nos shows, então fechei a parceria com o Lucas, que vai vender nas apresentações tanto a cota dele quanto a nossa.”

Como seus vinis eram prensados no exterior, a venda era feita por um site internacional – ou então de lojas que compravam do site. Agora, com a produção via Polysom, a Vinyl Land vai poder realizar a venda no Brasil. “E o mercado nacional está aquecendo muito. Além das várias prensagens que a Polysom está fazendo, com o dólar e a libra muito caros, está mais difícil fazer compra internacional na internet. Além do mais, está havendo o ressurgimento das lojas (físicas)”, acrescenta Valente.

Equipamento No mercado , também quem não está reclamando são as que vendem equipamento – vale lembrar que não existe fábrica alguma de toca-discos no país. Desde 1986 na Savassi, a Som Alternativo, especializada em todo o tipo de aparelho para áudio e vídeo, tem como campeão de vendas equipamento de vinil, conforme atesta o proprietário Moacir de Souza Rocha. “Para aquele que não tem nada e quer curtir um vinil, ele tem que comprar um receiver, um par de caixas acústicas e um toca-discos. Um usado (básico) sai, em média, por R$ 1,4 mil. ”À medida que a paixão toma conta – e o bolso permite –, um upgrade é sempre necessário. “É colocar um equalizador, uma caixa melhor e por aí vai”, acrescenta. Quanto ao investimento, o céu é quase o limite. Moacir garante: há quem pague até R$ 100 mil para montar o equipamento de som dos sonhos.

Números

135 mil

discos foram produzidos pela Polysom desde 2010

63%
foi aumento registrado na produção em 2013

300 unidades
é a tiragem mínima de um vinil

60 mil

vinis de Lazaretto, de Jack White, vendidos este ano

R$ 10 mil
é o custo médio de uma tiragem de 500 discos

Foi bom enquanto durou Anderson Noise, o mais conhecido DJ de Minas Gerais, aposentou de vez os álbuns de vinil. Discoteca Pública tem 15 mil títulos de música brasileira disponíveis para os interessados


Mariana Peixoto


Anderson Noise em seu apartamento na Savassi: as picapes e os vinis agora são objeto de decoração (Paulinha Vilarino/Divulgação)
Anderson Noise em seu apartamento na Savassi: as picapes e os vinis agora são objeto de decoração

“Vinil virou decoração.” A frase ganha um efeito maior porque vem de um produtor e DJ que fez carreira com a colaboração indispensável do bolachão. Mais importante DJ de Minas e um dos maiores do Brasil, Anderson Noise tem 26 anos atrás de uma picape. Pois desde 2006, ele afirma, não compra nenhum disco de vinil. Suas discotecagens desde aquela época também são realizadas com CD. “O vinil não me satisfaz mais. A logística é complicada, pois você tem que levar uma case grande. E chega em clubes e festas que só têm Technics (marca de picapes mais usadas por DJs profissionais) caindo aos pedaços. Ou seja, não dá para fazer uma performance legal.”

Os vinis, todos de música eletrônica, que reuniu ao longo de 18 anos estão em estantes que ocupam duas paredes de seu apartamento. Ele guarda ainda caixas e mais caixas em Londres. Um dos destaques da sala são dois toca-discos Technics produzidos em edição limitada e banhados a ouro. “Já me ofereceram até R$ 15 mil pelo par”, conta Noise. Por ora, ele nem pensa em vender. As viagens constantes que ele faz ao redor do mundo já lhe custaram bons exemplares de vinis. Uma companhia aérea espanhola perdeu uma case de que ele nunca mais teve notícias. “Já fiz apresentações malucas, tocando sexta em Madri e sábado em Campo Grande. Não é normal virar a noite, entrar num avião e descer em outro país. Sofri demais com a bagagem”, admite.

E não somente isso. Para Noise, a performance de um DJ não muda em nada ao utilizar um CD. “Faço scratch ainda melhor com os equipamentos que existem hoje. O vinil te deixa limitado. Já o CD permite milhões de possibilidades a mais, você pode usar muitos efeitos diferentes.” Seu próprio selo, a Noise Music, também parou de produzir vinis – dos 63 lançamentos, ele só fez edições no bolachão até o número 23. E para quem pretende investir no equipamento, Noise dá a dica: “Um leigo deveria comprar um toca-discos que tem saída para USB, que é mais interessante. Você pega o vinil e pode colocar a música no seu computador. Ou seja, o equipamento, além de tocar, também grava música.”

Consulta e audição Neófitos no vinil têm um endereço obrigatório para iniciar sua pesquisa em novos e velhos sons. Projeto criado por Edu Pampani há nove anos, a Discoteca Pública traz um acervo de 15 mil títulos de música brasileira, material disponível para consulta, gravação e audição. Há dois meses ocupando uma loja no Mercado do Cruzeiro, a Discoteca Pública também tem uma loja (com vinis e CDs, novos e usados). E duas vezes por mês ainda promove uma feira de vinis – no segundo sábado de cada mês na Galeria Inconfidentes, na Savassi e no terceiro sábado no Mercado do Cruzeiro – onde também se encontram toca-discos.

“De 2010 para cá, deu para perceber que a procura por vinis chegou a pessoas mais jovens. E não é por saudosismo, mas geralmente são pessoas que herdam discos dos pais e avós e com o tempo começaram a pegar o gosto pelo vinil”, diz Pampani. Por dia, circulam em média 70 pessoas no espaço do mercado. “Filhos, sobrinhos e netos de compositores que já morreram estão começando a resgatar a memória do artista. Geralmente, são nomes que gravaram um só compacto, então, como a família não guardou nada, eles vêm aqui para escutar e gravar. Não fico só atrás dos medalhões”, diz Pampani. Na internet, ele ainda oferece o mapa da mina. No endereço discotecapublica.blogspot.com.br, encontra-se uma seleção de sebos, lojas de discos e de equipamentos de BH, dicas de como cuidar dos discos e o acervo de títulos que compõem o projeto.

TeVê

TV paga

Estado de Minas: 24/08/2014


 (Dimitrios Kambouris/Getty Images/AFP)
 Musicais O concerto Valencianas, que uniu Alceu Valença e a Orquestra Ouro Preto, será exibido hoje, às 17h, no Canal Brasil. Na Cultura, às 23h, o cantor, compositor e ator Gero Camilo é o convidado do Ensaio. No Film&Arts, às 17h30, vai ao ar um documentário sobre a Orquestra West-Eastern Divan, formada por jovens de países do Oriente Médio e da Espanha. Na MTV, com oito indicações, Beyoncé (foto) é a favorita do Video Music Awards, que será transmitido a partir das 21h. E no Bis, à meia-noite, tem show de Phil Collins.

Documentários Mais uma novidade no canal ID, com a estreia hoje, às 21h, da série Idosos e perigosos, que reconstitui crimes hediondos cometidos por aparentemente inocentes velhinhos. Na Cultura, às 21h, vai ao ar a segunda e última parte do documentário História da moda no Brasil, de João Braga, Luís André do Prado e Tatiana Lohmann, falando da busca por uma identidade genuinamente nacional, o início do prêt-à-porter e o surgimento das escolas de design no país. 

Caras & Bocas

Simone Castro - simone.castro@uai.com.br


Fatinha quebra tudo

 (Renato Rocha Miranda/TV Globo)

Fatinha é uma personagem inesquecível de Malhação (Globo). Na temporada 2012, Juliana Paiva e sua espevitada estudante – ousada, independente e um tanto maluquinha – roubaram a cena e de um papel de coadjuvante saltou para o de protagonista. Prova disso é que a atriz estrelou a novela Além do horizonte logo em seguida. Pois agora Fatinha (foto) vai voltar a Malhação para uma visita e com uma novidade: está grávida de gêmeos. Ela procura por Nando (Leo Jaime) a fim de convidá-lo para ser o padrinho. O roqueiro aproveita para apresentar a jovem a toda a galera da Ribalta e relembrar os tempos do Misturama. Fatinha logo se enturma, conta por onde andam os amigos dos velhos tempos, a exemplo do seu marido, Bruno (Rodrigo Simas). Quem fica enciumada com o sucesso dela é Jade (Ana Júlia Dorigon), que não perde a chance de alfinetar a visitante. E acaba levando uma tirada bem humorada: “O que você ainda está aprendendo eu já até esqueci”, dispara Fatinha, provocando gargalhadas em todos. Como não poderia ser diferente, ela dá um show, pois, apesar do barrigão, mostra que tem energia de sobra, que mantém a ginga e “quebra tudo” no funk, dançando até o chão, para delírio geral. “Foi um papel muito bacana tanto para mim quanto para o público”, comentou Juliana, feliz da vida com o revival. As cenas da visita de Fatinha vão ao ar em 10 de setembro.

HUMORÍSTICO GARANTE  MAIS UMA TEMPORADA

Sucesso no Multishow (TV paga), o programa Tudo pela audiência, que terminou dia 11, vai ganhar nova temporada. As gravações devem começar em setembro, antes que Tatá Werneck comece a trabalhar na novela Lady Marizete (Globo), em que será protagonista.

MICROSSÉRIE TEM NOMES CONFIRMADOS NO ELENCO


Felizes para sempre, remake de Quem ama não mata, minissérie exibida em 1982, será exibido em janeiro. Cássia Kis Magro, que ainda está em O rebu, no papel de Gilda, foi confirmada no elenco. Também estão confirmados Paolla Oliveira, Selma Egrei, Perfeito Fortuna e Sílvia Lourenço. A direção é de Fernando Meirelles.

DEFINIDA NOVELA QUE VAI SUCEDER GERAÇÃO BRASIL

Alto astral é a substituta de Geração Brasil (Globo). O autor, Daniel Ortiz, ganhou uma nova parceira, Maria Helena Nascimento, conhecida por colaborar com Gilberto Braga em algumas novelas. No elenco, entre outros, Cláudia Raia, Guilherme Leicam e Thiago Lacerda. Sérgio Guizé, que ficou conhecido por interpretar Gibão, em Saramandaia (Globo), será Caíque. Ele surge na trama depois de uma temporada fora do país, retornando para o casamento do irmão.

UMA REPRISE PARA QUEM É  MUITO FÃ DE SAI DE BAIXO

O canal Viva (TV paga) reprisa na terça-feira, às 20h30, o episódio “Quem casa quer Caco”, um dos quatro produzidos para a temporada especial do Sai de baixo gravada pela emissora. Ingrid Guimarães faz participação especial como a fazendeira Henriqueta do Rego Amado, alvo de um golpe milionário que Caco (Miguel Falabella) planeja aplicar. O destaque fica por conta de Aracy Balabanian, que se divide na interpretação da esnobe Cassandra e também de uma cantora da Jovem Guarda.

REGRA DO SEXO PURITANO EM ANÁLISE NO CANAL BIO

No episódio de Como o sexo mudou o mundo de quarta-feira, às 23h, no canal Bio, a discussão será sobre o conservadorismo nos Estados Unidos. Para isso, o programa analisa a regra puritana do “sexo obrigatório” para pessoas casadas, jornais picantes do inventor e abolicionista Benjamin Franklin e até o design de alguns carros.

PAR EM CHIQUITITAS FICA HOJE DE FRENTE COM GABI
 (Carol Soares/SBT)

Os atores Emílio Eric e Letícia Navas são os convidados de Marília Gabriela (foto) no De frente com Gabi deste domingo, à meia-noite, no SBT/Alterosa. Em Chiquititas eles interpretam o casal de namorados Clarita e Beto. Fora da trama, afirmam que são apenas amigos e falam, inclusive, sobre seus namorados na vida real. “Tem crianças que conhecem o meu namorado e dizem que eu traí o Beto”, comenta Letícia. E Emílio revela um pouco mais da vida pessoal. “Estamos morando juntos. Meus pais aceitam de forma bem tranquila”, conta, referindo-se à namorada, Monique.


Enlatados
Mariana Peixoto - mariana.peixoto@uai.com.br

Já vai tarde

Saber a hora de terminar é uma arte. E a HBO, talvez se fiando na boa repercussão das temporadas iniciais, errou a mão com True blood. A série termina hoje, às 22h, depois de sete temporadas, sem deixar nenhuma saudade. Se nos primeiros anos a alegoria do mundo real ao mostrar vampiros tentando se integrar aos humanos tinha lances criativos, muito humor e um clima pra lá de kitsch, no decorrer da trama a história se perdeu. No episódio de hoje, Sookie (Anna Paquin) avalia o futuro com e sem Bill (Stephen Moyer). Eric (Alexander Skarsgard) e Pam (Kristin Bauer van Straten) enfrentam a parceria desconfortável com Mr. Gus (Will Yun Lee).

Prazer – Antes do final de True blood, a HBO promove a estreia do segundo ano de O negócio. As três protagonistas da produção brasileira terão de enfrentar os desafios de manter a empresa Oceano Azul no topo. A partir das 21h.

Ossos – Já na quinta-feira, às 22h30, a Fox exibe o final da nona temporada de Bones. No episódio “Recluse in the recliner”, a equipe do Jeffersonian investiga a morte de Wesley Foster, escritor em um blog de conspiração.

Ver de novo – Terminada em março depois de nove temporadas, How I met your mother, uma das melhores sitcoms da década, será reprisada pelo canal Sony desde o primeiro ano. A estreia será amanhã, às 19h30, sempre de segunda a sexta-feira, com três episódios em sequência.

Pó de arroz – Amanhã, às 22h, o Syfy estreia a sexta temporada do reality show Face off, que explora o mundo da maquiagem de efeito especial.

Zumbis – O quinto ano de The walking dead estreia em 12 de outubro. Atração do canal Fox, a série chega também ao Netflix. O site de streaming passa a exibir as três primeiras temporadas.


Pestinhas da vez


Simone Castro




Cláudia (Giovanna Rispoli) e Marian (Júlia Gomes): aprendizes de vilã (João Miguel Júnior/Globo)
Cláudia (Giovanna Rispoli) e Marian (Júlia Gomes): aprendizes de vilã
 (Lourival Ribeiro/SBT)

Vilanias não são próprias apenas de adultos. A ficção que o diga. O mundo da TV está cheio de crianças e jovens que de pequenas em pequenas maldades mostram que têm atributos para se tornarem os grandes vilões de amanhã. É claro que atuam com as armas que têm, agindo às vezes na inocência. Mas tanto investem contra o colega do lado, como atormentam a vida dos irmãos dentro da própria casa

Atualmente, duas pestes de novelas jogam pesado na tentativa de conseguir o que querem. Em Boogie oogie (Globo), a aprendiz de vilã da vez atende pelo nome de Cláudia, personagem da atriz Giovanna Rispoli. Desde o primeiro capítulo, mostrou que o que mais desejava era ver a irmã, Sandra (Ísis Valverde), pelas costas. Tudo para ficar com o quarto!

Agora, Cláudia quer se livrar do pai, o militar Elísio (Daniel Dantas), pois deseja ter o que sonha e, para isso, espera casar sua mãe, Beatriz (Heloísa Périssé), com um homem rico. Narizinho em pé, vive desafiando a autoridade dos mais velhos e destila pequenas doses de veneno, seja para testar a paciência dos pais e da irmã mais velha, seja para colocar em apuros o irmão Otávio (José Victor Pires).

Cláudia não é a primeira vilãzinha de Giovanna Rispoli. No início do ano, ela viveu Shirley, personagem de Viviane Pasmanter, na primeira fase de Em família (Globo). Foram poucos capítulos, mas o suficiente para a garota roubar a cena. Quem não se lembra da personagem, de longe, apenas observando Helena (Júlia Dalavia) se afogando, sem fazer um movimento para socorrê-la? O olhar de prazer foi de arrepiar. Agora com Cláudia, mais uma vez Giovanna diz a que veio.

Vale o mesmo para Júlia Gomes, a vilãzinha Marian, de Chiquititas (SBT/Alterosa). Ex-menina de rua, a personagem já foi moradora do orfanato Raio de Luz e acabou adotada. No entanto, retorna para azucrinar as outras meninas e, especialmente, Mili (Giovanna Grígio), de quem deseja tudo o que tem. Com uma maldade aqui, outra ali, Marian vai semeando a discórdia. E ainda tenta conquistar Mosca (Gabriel Santana), também com o intuito de magoar Mili. Ô peste!

Júlia Gomes interpreta sua primeira vilã. Aos 12 anos, viveu Sofia na primeira fase de A vida da gente (Globo, 2011), e Elisa, também na primeira fase de Amor eterno amor (Globo, 2012), ambas personagens boazinhas. Em 2010, a atriz foi a vencedora do Qual é o seu talento?, do SBT/Alterosa. No teatro, fez Shrek, o musical, A noviça rebelde e Garota do adeus. É uma jovem atriz que leva a sério a profissão. Com talento de sobra para viver mocinhas e vilãs.

PLATEIA

VIVA

Francisco Cuoco e Betty Faria, que já formaram par romântico em Pecado capital, se reencontram em Boogie oogie. Os personagens Vicente e Madalena prometem bons momentos.

VAIA
Cenas de Tuane (Nanda Costa) e Reginaldo (Flávio Galvão), com seus impasses sexuais, não têm graça alguma em Império (Globo). É uma trama sem atrativos e a dupla dispensável.  

PERFIL/PAULO ÁLVARES » Multiexperimental‏

PERFIL/PAULO ÁLVARES » Multiexperimental Radicado na Alemanha, pianista e professor mineiro se dedica a ampliar as fronteiras da música


Walter Sebastião
Estado de Minas: 24/08/2014



Paulo Álvares, pianista e professor (Marcos Michelin/EM/D.A Press)
Paulo Álvares, pianista e professor

O mineiro Paulo Álvares, de 53 anos, mora na cidade alemã de Colônia. Ele gravou mais de uma dezena de discos e já interpretou peças dos principais autores modernos e contemporâneos do país e do exterior, com ênfase em obras experimentais. Paulo tocou piano com luvas brancas, no escuro, iluminado apenas pela luz negra. Interpretou composições que não têm partituras – só indicações para o instrumentista. Executou peças que somam música e projeções ou se valem de recursos eletrônicos. Tudo isso pode parecer excêntrico em se tratando de um pianista, mas é música de primeira.

“Experimentação faz parte da música. Há obras que fixam um momento estético, histórico, existencial e levam para outro patamar. Assim, abrem-se novas possibilidades, alterando ideias que temos sobre o que é música”, afirma o professor de piano e improvisação da Escola Superior de Música de Colônia. Exemplos disso podem ser as peças Pierrot lunar (Arnold Schonberg), Sagração da primavera (Igor Stravinski), Quarta sinfonia (Charles Ives) ou L’estro armonico (Vivaldi).

“Para um instrumentista que se dedica à música contemporânea, não basta ser apenas tecladista, por exemplo. O músico tem de ser harpista para tocar nas cordas do piano, como pedem alguns compositores; ser percussionista para tirar som de utensílios, como querem outros; ou atuar como ator para fazer a música que usa teatro. Ele deve ser compositor para criar música aleatória, que cobra atitude de criação do intérprete. É preciso, ainda, dominar os recursos usados pela música eletrônica”, explica.

 “A especialização é valorizada, mas a competência múltipla também é muito cobrada”, avisa Paulo Álvares. No Festival de Campos do Jordão (SP), encerrado há pouco mais de um mês, o pianista tocou pela primeira vez a peça de um compositor espanhol contemporâneo, intepretou obras de quatro modernistas históricos e fez um concerto de Mozart.

“A diversidade é muito positiva, pois exige simultaneidade histórica no ensino do instrumento, que passa a ter de envolver desde o primeiro teclado pós-renascentista até o aparato eletrônico de última geração”, afirma o professor. Para ele, isso traz a sensação de liberdade estética, estilística e profissional. Tal contexto, reforça, é um desafio a ser enfrentado pela nova geração.

Marginal Álvares avisa: a música contemporânea não ocupa posição periférica. “Na Alemanha, ela não é marginal. Pode ser menos frequentada, mas faz parte das programações oficiais. Inclusive, há concertos muito ruins. No Brasil, ela fica um pouco à margem, mas não tanto como quando comecei. Compositores modernos são mais tocados, orquestras vêm encomendando peças, há gravações e regravações”, argumenta. “Tais transformações têm criado o contexto de modernidade no mundo musical brasileiro”, acredita.


Moderno, desde sempre

 “O piano é o meu único instrumento, desde criança. Sempre fui tátil”, afirma Paulo Álvares. O primeiro contato com as teclas se deu na casa da avó. Depois, ele iniciou os estudos no conservatório de Uberlândia. “Meu interesse sempre foi a música moderna”, afirma.

Adolescente, Paulo Álvares ouvia, o dia inteiro, discos de autores ligados à música moderna na casa de uma tia, professora da Universidade Federal de Uberlândia. A admiração por Bela Bartok (1881-1945) fez com que, aos 20 anos, o mineiro fosse para a Hungria, terra do compositor, para participar de um seminário sobre o ídolo. “Bartok era diferente. E, na juventude, a gente não quer ser normal”, recorda.

 Em Belo Horizonte, Paulo Álvares estudou na Fundação de Educação Artística (FEA). Também foi aluno da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP). Em 1987, ele se mudou para a Alemanha, onde estudou música de câmara e composição em Colônia. A opção pela Alemanha veio do fato de o país oferecer fartura de concertos de música improvisada, antiga, moderna e contemporânea, além de jazz e ópera.

Paulo convive há décadas com obras radicais. Diz que Mozart é o autor que mais o desafia, “pela liberdade e inexplicabilidade de suas invenções”.


Tributo a Eduardo

No momento, Paulo Álvares se dedica a divulgar a obra do irmão, o compositor Eduardo Álvares (1959-2013). Recentemente, o pianista tocou Jogo de antifonias com a Orquestra Sesiminas. A partir de anotações, ele finalizou e interpretou a última composição de Eduardo, A lua do meio-dia, com a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp).

Em dezembro, o pianista vai apresentar várias obras do irmão na Alemanha. O arquivo de Eduardo Álvares será transferido para o Instituto de Estudos Brasileiros (IEB), em São Paulo. “É o modo de deixar o material acessível e protegido”, explica o pianista. E anuncia: “Muita coisa vem pela frente”. São discos, edições de partituras e concertos.

“Eduardo era um compositor de linguagem original que cultivava permanentemente a ousadia e a rebeldia. Nesse sentido, ele não integra a vanguarda ortodoxa das universidades mineiras e paulistas, que é um caminho muito fechado”, explica o pianista. “Para mim, compositor deve ter personalidade para ir além da homogeneização das escolas”, argumenta, saudando Villa-Lobos.

Paulo Álvares explica que a obra do irmão parte de Debussy, Igor Stravinski, Edgard Varese, Luciano Bério e Maurício Kagel para chegar à linguagem econômica e heterogênea pontuada por humor irreverente e teatralidade – é patente o diálogo com a literatura e o teatro.

Na opinião de Paulo, as obras mais fortes do irmão são aquelas produzidas de 2008 a 2013, como Cortejos, Fogo no canavial e Lua do meio-dia. Esses trabalhos retomam a experimentação depois do resgate de ritmo, harmonia e melodia, “sem abandonar a dissonância”, revelando o namoro com a música popular.


OS MESTRES

BELA BARTOK (1881-1945)
A admiração pela obra do compositor fez com que Paulo Álvares viajasse para a Hungria, aos 20 anos, para participar de seminário sobre o ídolo

CLAUDE DEBUSSY (1862-1918)
O compositor francês é um dos pontos de partida da obra do compositor Eduardo Álvares, irmão do pianista

IGOR STRAVINSKI (1882-1791)

Sua obra-prima, Sagração da primavera, levou a música para outro patamar, acredita Paulo Álvares

MOZART (1756-1791)
O compositor austríaco ensinou ao pianista mineiro o apreço pela liberdade e a invenção

HEITOR VILLA-LOBOS (1887-1959)
Compositor brasileiro não se deixou aprisionar pelas escolas

PELOS OLHOS DA ALMA » A vida na escuridão‏

A vida na escuridão Série do EM revela como é percebido o mundo por pessoas com pouca ou nenhuma capacidade de enxergar. Um universo de sensibilidade altamente aguçada e força para contornar obstáculos

Jefferson da Fonseca Coutinho
Estado de Minas: 24/08/2014


Campeã de superação, de judô e de golbol, Ana Luiza de Freitas reconhece cada uma das 22 medalhas pelo tato. Apenas em Belo Horizonte, quase 70 mil pessoas enfrentam, como ela, dificuldades severas de visão (Leandro Couri/EM/D.A Press)
Campeã de superação, de judô e de golbol, Ana Luiza de Freitas reconhece cada uma das 22 medalhas pelo tato. Apenas em Belo Horizonte, quase 70 mil pessoas enfrentam, como ela, dificuldades severas de visão
Ver é bem diferente de enxergar. O sistema sensorial aguçado e a capacidade extrema de percepção dilatam o alcance de quem pouco ou nada vê. No breu das janelas da alma, deficientes visuais esbanjam sensibilidade e apresentam uma visão de mundo que vai longe, além do que se pode observar. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase 20% da população tem alguma perda significativa no olhar. A deficiência visual severa é a mais anotada – 3,5% das pessoas declararam ter grande dificuldade ou nenhuma capacidade de enxergar. Em Belo Horizonte, 61.425 cidadãos quase nada podem ver e 7.044 vivem na absoluta escuridão.

Com a disposição de entender um pouco mais a realidade desse grupo de pessoas, o Estado de Minas esquadrinhou vários pontos da cidade por uma semana, de dia e à noite, e encontrou lições de vida e recortes de determinação, superação, tristeza, revolta e alegria. Casos como o da universitária Ana Luiza Martins de Freitas, de 18 anos, cega de nascença, capaz de decodificar um livro na metade do tempo de uma pessoa com visão normal e campeã em esportes paralímpicos. Ou da judoca Deane Silva de Almeida, de 32 – uma das lideranças da Associação dos Deficientes Visuais de Belo Horizonte (Adevibel) –, que fez do esporte força para minimizar a perda de quase toda a visão.

Com pessoas como elas, aprende-se uma nova forma de ler o mundo. O braile, sistema de leitura com o tato para cegos, inventado em 1827 pelo francês Louis Braille, vai perdendo espaço para softwares cada vez mais modernos, que leem em voz alta e-mails, mensagens, livros e jornais. Embora especialistas defendam a importância do braile como “leitura ativa” – que, além do conteúdo, dá ao cérebro do leitor a estrutura do texto, letras e pontuação –, é fato que as novas tecnologias, capazes de aumentar em até cinco vezes a velocidade da “leitura” de qualquer escrita, estão deixando o método tradicional para trás. O desempenho ajuda a explicar o fenômeno: o ritmo da decodificação por meio de sistemas de áudio pode chegar a 250 palavras por minuto, enquanto a média pelo tato não passa de 50.

Gustavo Felipe, de 39, andante apaixonado por Belo Horizonte, diz-se entristecido com a falta de cuidado de grande parte das pessoas com os deficientes. “Se pudesse fazer um pedido, hoje, pediria a visão”, diz. Alegre, sempre “feliz com as novas amizades”, Gustavo, a pedido do EM, descreve um de seus pontos preferidos em Belo Horizonte: a Praça da Liberdade.

Durante a reportagem em série, publicada a partir de hoje, conhecemos adolescentes cegos, tomados por sonhos de caminhos menos difíceis. Politizados, eles falam do desafio de viver em “mundo pensado para a maioria”. Tateando por esse universo, nos deparamos com pessoas, que perderam a visão já crescidas e falam das memórias dos tempos de luz. Descobrimos também mães apaixonadas, que vivem de emprestar os olhos aos filhos. Associações e ONGs de Minas Gerais e do Brasil também foram ouvidas e expõem cidades e indivíduos pouco preparados para a relação com os deficientes. Em Belo Horizonte, por exemplo, um dos pontos mais criticados é a pista tátil, um arremedo de traço em poucas calçadas da cidade, que costuma terminar em obstáculos ou levar a lugar algum.


Vitórias contra as sombras Conheça a rotina da jovem que não apenas superou as barreiras impostas pela cegueira para alcançar a independência, mas também acumula conquistas no esporte e na vida

Estado de Minas: 24/08/2014



Um dia na agitada vida de Ana Luiza: disposição para ler, treinar e estudar, sempre pensando no futuro: %u2018É difícil viver em um mundo feito para a maioria. A vontade de vencer, de me superar, é o que me dá força%u2019 (  Fotos: Leandro Couri/EM/D.A Press)

Um dia na agitada vida de Ana Luiza: disposição para ler, treinar e estudar, sempre pensando no futuro: %u2018É difícil viver em um mundo feito para a maioria. A vontade de vencer, de me superar, é o que me dá força%u2019
Um dia para não esquecer. Acompanhar a deficiente visual Ana Luiza Martins de Freitas, de 18 anos, é um aprendizado. Logo pela manhã, com satisfação, ela e a avó, dona Dalva, abrem a porta e o aconchego da casa pequena, no Bairro Novo Boa Vista, para a equipe de reportagem. Ana, filha da dona de casa Juliana Lina e do comerciante Benedito Martins, criança ainda, acompanhou com tristeza a separação dos pais. Desde os 8 anos passou a morar com os avós maternos em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. E é lá que a estudante vem somando vitórias – ainda maiores do que as representadas pelas 22 medalhas de judô e golbol já conquistadas. Em três anos de dedicação ao esporte, a estudante treina diariamente e participa de competições em várias partes do Brasil.
“Pegue lá as medalhas, minha filha”, sugere dona Dalva. Ana Luiza é cega de nascença. De acordo com a avó, em função de rubéola que acometeu a mãe, Juliana Lina, durante a gravidez. A menina reconhece cada uma das premiações pelo tato. Conta histórias e fala da última viagem, quando caiu de mau jeito e teve que seguir de ambulância para hospital do Espírito Santo, interrompendo sua participação na competição de golbol. “Desde os 12 anos ela anda para todo lado sozinha. É muito inteligente, essa menina”, diz, sorrindo, a avó.

Ana Luiza gosta de conversar. Quer ser jornalista. Traz o notebook para mostrar o texto que escreveu à faculdade, reclamando maior cuidado com a inclusão. Passa pelas redes sociais e mostra software de áudio capaz de acelerar a “leitura”. Ninguém na sala, além dela, é capaz de entender uma só palavra do que diz a máquina. Parece uma língua embolada qualquer, daquelas que exigem estudo e dedicação desde o nascimento.
A moça conhece bem o braile. No entanto, admite que tem deixado a leitura pelo tato de lado depois que aprendeu a dominar tecnologias, como o Dosvox – um sistema desenvolvido pelo Núcleo de Computação Eletrônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pensado para “conversar” com o usuário. Por meio do Dosvox, criado pelo professor José Antônio Borges, Ana Luiza pode fazer uso, sob a plataforma Windows, de mais de 60 utilitários.

PÉ NA ESTRADA Papo bom, mas é hora de tomar o rumo de Belo Horizonte para os compromissos do dia. Dona Dalva, com a Bíblia nas mãos, agradece a visita e confia a neta querida à reportagem. De carona, cinco minutos de estrada, Ana Luiza demonstra conhecer bem o caminho. “Gosto de passar pela BR-040. Melhor do que pela Avenida das Américas”, diz. Pelas curvas e lombadas, pelo cheiro e sons do ambiente, ela é capaz de reconhecer a maior parte dos trechos do itinerário. A habilidade sensorial impressiona.



“Este viaduto é bastante inútil, porque na saída dele os carros ficam presos no engarrafamento. É estreito. Não funciona”, avalia, deixando os acompanhantes boquiabertos em um trecho da Via Expressa. Mais adiante, no Barro Preto – que a estudante conhece bem, pelos tempos de Instituto São Rafael, especializado no ensino de portadores de deficiência visual –, um passeio a pé pelos quarteirões ilustra os obstáculos, que são muitos, a começar pelas calçadas irregulares, sem o menor padrão. Ana Luiza lamenta os recortes de pista tátil, que, para ela, “muito pouco auxiliam”.

Pausa para almoço. No self-service, a estudante e judoca conta com ajuda para fazer o prato e conseguir espaço à mesa. Não sem um esbarrão com o quadril em uma quina de madeira. Rotina. Ana Luiza não se abala. Gosta da prosa, da condição de entrevistada. Espera que o pedaço da sua vida no noticiário, quem sabe, desperte a atenção de quem pode ajudar com providências. “É difícil viver em um mundo feito para a maioria. A vontade de vencer, de me superar, é o que me dá força”, ressalta. Para o paladar apuradíssimo, a comida é boa, bem temperada. Namoro? Não deu certo. Arranjou um moço, esportista, também deficiente, mas que, segundo ela, não queria avançar na vida. Resultado: ficou para trás.
Antes de encarar as aulas de jornalismo no Bairro Caiçara, na Região Noroeste de BH, há o treino de judô do outro lado da Via Expressa, no Carlos Prates. “Guarda e meia-guarda. É o que mais tenho que treinar”, constata. No tatame, há oito judocas – seis deles com alguma deficiência. As duas alunas-instrutoras não fazem feio. Ana Luiza, faixa azul, tem força e técnica. Dá trabalho para Patrícia Castilho, estudante de educação física e liderança da hora. “Ela não me dá trégua; me deixa exaurida”, diz Patrícia, sorrindo, depois do treino com a jovem atleta.

“Se conhecesse uma redação de jornal, penso que poderia imaginar melhor como é o jornalismo na prática”, sugere Ana Luiza, charmosa, ao fim dos treinos. E por que não? Na redação do Estado de Minas, no Bairro Funcionários, a estudante de comunicação conheceu editores, infografistas, diagramadores, fotógrafos e repórteres. Não desperdiçou a oportunidade de se apresentar, pensando no futuro. Na despedida, agradeceu a visita com a alegria de quem sabe enxergar com os olhos do coração.

 Golbol/ Um esporte exclusivo

 O golbol foi criado em 1946 pelo austríaco Hanz Lorezen e pelo alemão Sepp Reindle. Ambos buscavam reabilitar veteranos da Segunda Guerra que haviam perdido a visão. Nos Jogos de Toronto (1976), sete equipes masculinas trouxeram à luz a modalidade. Dois anos depois, o registro do primeiro Campeonato Mundial, na Áustria. Em 1980, na Paralimpíada de Arnhem, o golbol passou a integrar o programa paralímpico. No Brasil, a modalidade foi implantada em 1985. O primeiro campeonato nacional foi realizado em 1987. Em Pequim, em 2008, ocorreu a estreia da Seleção Masculina em uma paralimpíada. Diferentemente de outras modalidades do gênero, o golbol foi desenvolvido exclusivamente para pessoas com deficiência. A quadra tem as mesmas dimensões da de vôlei – 9m de largura por 18m de comprimento. As partidas duram 20 minutos, com dois tempos. Cada equipe conta com três titulares e três reservas. De cada lado, um gol com nove metros de largura e 1,2 de altura. Os atletas são, ao mesmo tempo, arremessadores e defensores. O arremesso deve ser rasteiro e o objetivo é balançar a rede adversária. A bola, semelhante em tamanho à do basquete, tem 76cm de diâmetro e pesa 1,25kg. Carrega um guizo no interior que emite sons para que os jogadores se orientem.

 Um mundo pelo tato
lll Censo
Segundo dados do IBGE de 2010, no Brasil, mais de 6,5 milhões de pessoas têm alguma deficiência visual. Do total, 528.624 pessoas são incapazes de enxergar (cegos); 6.056.654 pessoas possuem grande dificuldade permanente de enxergar (baixa visão ou visão subnormal). Outros 29 milhões de pessoas declararam possuir alguma dificuldade permanente de enxergar, ainda que usando óculos ou lentes.


A praça da imaginação Um dos mais famosos pontos de BH descrito por quem o percebe pelas sensações e sentimentos

Jefferson da Fonseca Coutinho
Estado de Minas: 24/08/2014



Gustavo Felipe saiu sozinho pelas ruas de Belo Horizonte quando completou 22 anos, em 1997. De la para cá, não parou mais. Gosta de festas, shows e, especialmente, da biblioteca pública, na Praça da liberdade (Túlio Santos/EM/D.A Press)
Gustavo Felipe saiu sozinho pelas ruas de Belo Horizonte quando completou 22 anos, em 1997. De la para cá, não parou mais. Gosta de festas, shows e, especialmente, da biblioteca pública, na Praça da liberdade
Morador da Região Centro-Sul de Belo Horizonte, Gustavo Felipe, de 39 anos, é frequentador assíduo da Praça da Liberdade. Desde os 22 anos, quando se arriscou a cortar a cidade sozinho pela primeira vez, o deficiente visual passa algum tempo contemplando – como pode – um dos pontos mais charmosos da cidade. Conhece o Edifício Niemeyer, “referência para o ponto de ônibus e de prédio diferente, curioso”. Sabe bem do coreto e do antigo palácio do governo. Formado em letras, Gustavo, a pedido do EM, descreve esse que é um de seus pontos preferidos na cidade. “O ar é bom. É puro perto das fontes. E tem muitas árvores. Árvores altas. A grama é verdinha. Não é o verde que você conhece. É um verde que eu imagino, molhado e vivo.”

“Tem sons de tudo o que é jeito. Até o barulho dos beijos conheço. Os namorados pensam que não. Mas estou vendo tudo (risos). Ouço os pássaros e sinto a presença dos policiais. Vejo crianças e velhos perto de mim. Moças bonitas também. Perfumes e vozes facilitam bastante. E tem o calçamento. As pedras que fazem o caminho.” Divertido, romântico e desconfiado, Gustavo conta que teve um nascimento difícil. Diz que veio ao mundo por meio de fórceps, instrumento médico usado em partos difíceis, “com consequências graves”. A maior delas, a perda da visão. Houve também, em função de uma cirurgia na cabeça, danos nos movimentos do lado esquerdo do corpo.

Apesar da força e da superação, Gustavo lamenta a discriminação vivenciada na cegueira. “Muita gente discrimina. Somos tratados por muitos como se fôssemos de outro mundo. Falta consideração. No ponto de ônibus, por exemplo, nem todo mundo tem boa vontade para ajudar. Por que não há um aviso sonoro pensado para a nossa situação? E você acredita que já fui assaltado três vezes?”

Barreiras para superar

Julia Martins de Oliveira, de 47 anos, tem dificuldades em lidar com a deficiência da filha Juliana, de 15. “Não é fácil. Só Deus. Ela lida com a situação muito melhor que eu”, revela a mãe. A dona de casa, moradora de Ibirité, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, deixou de lado todos os projetos pessoais para se dedicar à filha caçula. Juliana nasceu deficiente visual, com glaucoma congênito. Bonita, inteligente e dedicada, a menina vem se destacando nos estudos e na prática de esportes. É uma das jovens atletas de golbol do Programa Superar.

É noite de treino com o educador físico Vinícius Barreto. Para o orgulho da mãe companheira, Juliana chama a atenção na quadra. Salta para evitar o gol com a disposição de veterana. Lança a bola com a força e direção de campeã. Com ela em campo, fica mais difícil para o time adversário vencer. Júlia não esconde a alegria de ver a batalha da filha. “Ela é muito aplicada. Dá gosto ver.” A dona de casa cobra mais empenho do poder público em benefício dos deficientes visuais da cidade. Daí, a maior revolta.

Para Deane Silva de Almeida, de 32, da Associação dos Deficientes Visuais de Belo Horizonte (Adevibel), a cidade, de fato, não está preparada para lidar com quem tem grande dificuldade ou nenhuma capacidade de enxergar. De acordo com a liderança, foi feito o rebaixamento das calçadas pensando nos cadeirantes, mas isso dificultou ainda mais a vida dos cegos. A pista tátil, também para ela, é outro ponto crítico na cidade. “Especialmente no Hipercentro. Não temos a pista em todos os lugares e onde elas estão, acabam do nada, em postes, orelhões e bancas de jornais e revistas”, critica.

Deane fez carreira como judoca. São duas décadas nos tatames de todo o Brasil. A atleta enxergou até os 8 anos. Hoje, vítima de intoxicação por medicamento, tem “baixa visão” – algo entre 15% e 20% da capacidade de uma pessoa comum. Politizada, a esportista tem trabalhado pelos deficientes visuais com a dedicação de quem conhece a fundo as agruras da causa.


Quer ajudar? pense nisso...

  •  Identifique-se, caso encontre alguém que pareça estar em dificuldades. Permita que a pessoa com deficiência visual  perceba que você está falando com ela e ofereça seu auxílio. Mas é bom saber que nem sempre a ajuda é necessária.

  •  Caso sua ajuda como guia seja aceita, coloque a mão da pessoa no seu cotovelo dobrado. Ela irá acompanhar o movimento do seu corpo enquanto você vai andando. Em um corredor estreito, por onde só é possível passar uma pessoa, coloque o seu braço para trás, de modo que a pessoa cega possa continuar seguindo você.
  •  É sempre bom avisar sobre a existência de degraus, pisos escorregadios, buracos e outros obstáculos durante o trajeto.
  • Ao explicar direções, seja o mais claro e específico possível; de preferência, indique as distâncias em metros (“uns vinte metros à frente”, por exemplo). Quando for se afastar, avise sempre.

  • Não se deve brincar com um cão-guia, pois ele tem a responsabilidade de guiar o dono que não enxerga e não deve ser distraído dessa função.

  • As pessoas cegas ou com visão subnormal são como você, apenas não enxergam. No convívio social ou profissional, não as exclua das atividades normais. Deixe que decidam como podem ou querem participar.
  •  Fique à vontade para usar palavras como “veja” e “olhe”, pois as pessoas com deficiência visual as empregam com naturalidade.

Dificuldade em vários graus

 Baixa visão (leve, moderada ou profunda): compensada com o uso de lentes de aumento, lupas, telescópios, com o auxílio de bengalas e de treinamentos de orientação.

 Próximo à cegueira: quando a pessoa ainda é capaz de distinguir luz e sombra, mas já emprega o sistema braile para ler e escrever, utiliza recursos de voz para acessar programas de computador,
locomove-se com a bengala e precisa de treinamentos de orientação e  de mobilidade.

Cegueira: quando não existe qualquer percepção de luz. O sistema braile, a bengala e os treinamentos de orientação e de mobilidade, nesse caso, são fundamentais.

 O diagnóstico de deficiência visual pode ser feito muito cedo, exceto nos casos de doenças degenerativas como a catarata e o glaucoma, que evoluem com o passar dos anos

Um mundo pelo tato

 lll Avanço
A cada 5 segundos, uma pessoa se torna cega no mundo. Do total de casos de cegueira, 90% ocorrem nos países emergentes e subdesenvolvidos. Até 2020, o número de deficientes visuais poderá dobrar no mundo.

Eduardo Almeida Reis - Regentes

Antes de ser previsão do tempo, isto que as tevês fazem é perda de tempo
Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 24/08/2014






Regentes
Perguntado numa entrevista sobre a função do maestro, Zubin Mehta (nascido em Bombaim, atual Mumbai, 1936) disse que sua função é fazer que os músicos toquem nas horas certas, pois numa orquestra sinfônica o instrumentista, sentado numa das extremidades, não sabe o que os do lado de lá estão tocando. Casado com Nancy Kovack desde 1969, pai de Zarina Mehta e Mervon Mehta, contou que sua mulher aplicava o dinheiro do casal na compra de casas na Califórnia. No dia em que foi entrevistado era dono de 48 casas alugadas e confessou não saber onde iriam parar com tantos imóveis. Fio que o estouro da bolha imobiliária norte-americana tenha poupado a família Mehta.
Lembrei-me da entrevista ontem à noite depois de ver na tevê cinco previsões diferentes para o tempo que faria hoje. Nos anos todos em que morei na roça, fiquei viciado nas previsões do tempo. Na roça fluminense, 11 quilômetros de indecorosa estrada de terra para chegar ao asfalto num carro sem “extração” nas quatro rodas, você precisava sair da fazenda antes da chegada do caminhão do leite.
Bom de barro, como sempre fui, conseguia chegar ao asfalto ao preço de algumas reladas nos barrancos, enquanto os motoristas comuns ficavam pelo caminho. Das chuvas dependíamos, também e muito, para melhorar os pastos e as aguadas. Onde a necessidade de um maestro nas previsões televisivas? Ora, para fazer que as moças do tempo falem a mesma língua.

Nas previsões de ontem não vi duas iguais. Escrevo às 9h30min, céu azul, sol de fora, manhã espetacular posto que muito fria. Ontem, três das moças previam chuvas aqui para a Manchester Mineira. E uma outra, anteontem, dizia que hoje começaria a esquentar. Antes de ser previsão do tempo, isto que as tevês fazem é perda de tempo e uma das redes conseguiu contratar bela moça que pronuncia reconcavo, assim mesmo, inventando o recôncavo paroxítono: vocábulo cuja sílaba tônica é a penúltima.

Maldade No propósito evidente de indispor o Sul-Sudeste com os nossos irmãos do resto do Brasil, circula na internet uma tabela com a lista dos estados desta República assaz tropical. De um lado, quanto o estado paga ao governo federal; de outro lado, quanto recebe do governo federal, isto é, de todos nós. Os estados mais caros são o Maranhão e a Bahia, o primeiro com um déficit anual de R$ 7.944.982.545,40, o segundo custando ao Brasil R$ 7.445.718.892,72. Seguem-se na lista dos deficitários: Pará, Ceará, Paraíba, Piauí, Alagoas, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Tocantins, Sergipe, Acre, Amapá, Rondônia, Mato Grosso, Roraima, Mato Grosso do Sul e Goiás, este último baratinho: custa ao Brasil R$ 176.621.016,75 por ano.

A lista dos superavitários começa com uma surpresa: muito criticado por ter recebido uma arena da Copa das Copas, o estado do Amazonas rende ao Brasil R$ 2.364.724.703,91 por ano. Com a renda de quatro Amazonas você paga o custo do Maranhão e ainda sobra algum. Depois vêm o Espírito Santo, superavitário em R$ 4.414.208.188,10, Santa Catarina com R$ 8.240.544.325,40, Minas Gerais com R$ 9.479.251.565,45, Paraná com R$ 12.466.616.542,08, Rio Grande do Sul com R$ 12.779.811.535,90 e São Paulo com R 181.414.113.886,10. Ficou faltando minha terra, o estado não muito grande do Rio de Janeiro, que, modéstia às favas, rende ao Brasil R$ 85.959.238.712,76 por ano.

O Maranhão tem 4.548.044 eleitores, a Bahia, 10.140.157, o Rio de Janeiro, 12.040.166. A partir desses números compete ao leitor, munido de uma calculadora, somar os maranhenses com os baianos para chegar à conclusão que quiser, porque tiro o meu time de campo. Não endosso maldades como esta da tabela que circula na internet.

O mundo é uma bola 

24 de agosto de 410: Roma é saqueada por Alarico I, rei visigodo nascido em 375 na Ilha de Peuce, delta do Danúbio. Foi o primeiro líder germânico a tomar a cidade de Roma, realizando o famoso saque, resultado de suas negociações com o Império Romano na tentativa de obter um posto no exército imperial. No século anterior era comum que o Império Romano recrutasse bárbaros para servir nas tropas auxiliares sob as ordens de generais romanos. Alarico liderou um grupo de soldados e serviu sob o comando do imperador Teodósio I, até que o imperador morreu em 395. Não tendo obtido o posto desejado, Alarico rebelou-se e promoveu três cercos a Roma, o último dos quais terminou com o saque nos dias 25, 26 e 27 de agosto de 410.

Em 1399, foi celebrado o casamento do herdeiro do trono português D. Pedro, o Justiceiro, com Constança Manuel, que trazia como aia Inês de Castro, “a mísera e mesquinha, que depois de morta foi rainha”, como nos contou Luiz Vaz de Camões. Pedro I de Portugal (1320-1367), também conhecido como o Cruel e o Cru, foi de ferocidade extrema. O resto só estudando com calma, que já escrevi sobre Inês de Castro um ror de vezes.

Ruminanças
“O mais típico dos pensadores chineses foi Confúcio, e o mais típico dos pensadores ingleses foi o Dr. Johnson, ambos filósofos do senso comum” (Lyn Yutang, 1895-1976).

SAÚDE » Vilão sorrateiro

Problemas decorrentes do estresse disfuncional vão desde diminuição do rendimento, cansaço excessivo, ganho ou perda de peso e insônia até desencadeamento ou agravamento de doenças


Lilian Monteiro
Estado de Minas: 24/08/2014


A pressão sempre 12 por 8 chega a 15 por 9. O coração acelera e o braço parece dormente. E tudo de repente. Corrida ao médico. Será algo grave? O interesse sexual já não é o mesmo. Do nada, um ataque de asma. Sem explicação, aparece uma alergia. De uma hora para outra, dor muscular, lombalgia. Diagnóstico: nenhuma doença séria. Tudo resultado ou culpa do estresse, um vilão silencioso e perigoso. 

A psiquiatra e psicanalista Sandra Maria Melo Carvalhais explica que é frequente associarmos o estresse com doenças, como se fosse sempre uma vivência nociva, patológica, com consequências negativas para a sua saúde física e/ou mental. Entretanto, ela enfatiza que ele é uma reação de defesa e adaptação frente a um agente estressor (ou situação estressante), com o objetivo de preparar o organismo para perceber a situação e reagir ao estímulo com as respostas adequadas.
“O estresse remonta aos primórdios da história do homem, necessário à sobrevivência diante dos perigos. É um mecanismo normal e benéfico, autorregulado pelo organismo, que deveria cessar quando a situação de risco é afastada.” Ela conta que situações de desafio, mesmo desejadas, estimulantes e de conotação agradável, também provocam essa reação, que prepara as pessoas para lidar com elas (emprego novo, promoções, novos relacionamentos).

Sandra conta que a expressão corporal e emocional dessa reação é mediada por substâncias que são liberadas no organismo. As duas mais importantes são a adrenalina e o cortisol, conhecido como o “hormônio do estresse”. “Fisiologicamente, as situações de estresse provocam aumento geral da ativação do organismo, com aumento do metabolismo, frequência respiratória, pressão arterial, aceleração cardíaca e contração muscular.” Entretanto, a médica diz que é frequente vermos que essa resposta deixa de ter esse aspecto positivo, adaptativo, e se manifesta de forma negativa (o distress). “As pessoas frequentemente se dizem estressadas. Pode ser pelo uso inadequado da palavra, aplicada para falar de cansaço, preocupações, angústia e tristeza, que são respostas corporais e emocionais compreensíveis diante das situações da vida. Mas também pode ser o ‘estresse negativo’, quando essa reação perde a capacidade de permitir a nossa adaptação aos embates da vida e passa a ser disfuncional.” 

A psiquiatra destaca que a resposta ao estressor é resultado da interação entre as características da pessoa e as demandas do meio. “Depende da singularidade de cada um, da forma como o indivíduo filtra e processa a informação e sua avaliação sobre as situações ou estímulos a serem considerados como relevantes, agradáveis, aterrorizantes, etc.” Sandra enfatiza que as pessoas têm reações diferentes para o mesmo estímulo. “Nem todos desenvolvem psicopatologia.” E as situações ambientais provocadoras de estresse podem ser eventos intensos, de grande carga emocional, acontecimentos diários próprios da nossa rotina habitual ou podem ser situações de tensão crônica.
Conforme Sandra, o enfrentamento do estresse não deve ser adiado. É importante refletir sobre as formas como nos posicionamos nas situações pessoais, familiares, sociais, de trabalho, de estudos e da competitividade da vida moderna. “Quando percebemos os sinais de que algo não está bem na nossa forma de reagir (leve ou grave), deveríamos ser capazes de reformular nosso estilo de vida. Mudar hábitos nem sempre é fácil e com frequência é necessário buscar o auxílio da psicoterapia e até mesmo da psiquiatria. Os sintomas orgânicos são tratados com o clínico geral. Os tratamentos devem ser complementares.” A psiquiatra lembra que o grande perigo é representado pelas “fugas”, o alívio de forma inadequada: automedicação (ansiolíticos), uso e abuso de bebida, consumo de drogas ilícitas e aumento da quantidade de cigarros. Sandra reforça ainda que é necessário “fazer exercícios físicos, para ajudar a aliviar o problema, assim como realizar atividades prazerosas e adotar uma alimentação adequada, rica em alimentos que combatam os radicais livres, como frutas e legumes”.

CHORAR É BOM O estresse afeta tanto as pessoas, que a oftalmologista Márcia Guimarães, do Hospital de Olhos de Minas Gerais, conta que as lágrimas são um veículo ótimo, essencial mesmo, para reduzir o estresse emocional em seres humanos (únicos animais que choram por razões emocionais). 

“Um estudo do centro de pesquisa em lágrima e olho seco St. Paul-Ramsey Medical Center, em Minnesota, descobriu que voluntários que foram induzidos ao choro em filmes tristes produzem lágrimas com mais proteínas do que quando choram por estimulação química (cortar cebola), embora os dois tipos de lágrima tenham substâncias estressantes, como o hormônio ACTH e a leucina encefalina, que é um composto parecido com a morfina e ajuda a aliviar a dor.” 

A médica destaca ainda outro estudo, da Marquette University, em Milwaukee, com 100 pacientes comprovou que “quando o ato de chorar é contido por ser considerado sinal de fraqueza, há uma incidência maior de doenças gastrointestinais por estresse, como úlceras e cólon irritável”.

Mente e corpo desconectados
O estresse é o mal do século 21. Está no dia a dia e afeta crianças, jovens, adultos e velhos. A preocupação em lidar com ele é tanta que o Centro de Saúde Geraldo de Paula Souza, da Faculdade de Saúde Púbica (FSP) da Universidade de São Paulo (USP), implantou em 2011 a Clínica de Redução do Estresse, que tem como referência o Programa de Redução do Estresse Baseado na Atenção Plena. Programa similar à Mindfulness Based Stress Reduction (MBSR), da Stress Reduction Clinic da University of Massachusetts, fundada em 1979. 

O trabalho é coordenado pelo psicólogo da saúde e especialista em psicanálise Rubens de Aguiar Maciel, doutor pela FSP. A clínica tem como fundamento o emprego da meditação da mente alerta, cada vez mais popular no meio médico e aplicada sistematicamente em estudos como parte de tratamento clínico e psicológico.

Membro da Shambhala International Meditation Center, Rubens ressalta a importância e o valor da meditação. “Ela é o conhecimento da mente. Ajuda a eliminar o sofrimento e encontrar o bem-estar e a felicidade.” Para ele, é fundamental que pessoas inquietas, agitadas e preocupadas com a busca material a pratiquem. “Meditação é quietude, apesar de muitos a perceberem como tediosa. Ela proporciona visão clara e acalma o metabolismo hiperacelerado. O mundo hoje exige pessoas produtivas e multitarefas. Mas é bom saber que não levamos nada dessa vida, a não ser bem-estar, saúde e bons relacionamentos.” 

O psicanalista conta que há mais de três décadas de pesquisa nos EUA e Europa e mais de 100 mil trabalhos de pesquisa sobre os efeitos da meditação na saúde. “A prática leva à redução de medicamentos para insônia, gastrite, pânico. O equilíbrio físico que estabelece retira o lixo e devolve a saúde. A mente agitada cria estresse e o hormônio cortisol destrói a capacidade do sistema imunológico. Temos de cuidar do nosso sistema psiconeuroimunológico.” Rubens diz que há várias práticas, mas as mais sérias são a tibetana e a zen. E afirma que nos hospitais do mundo inteiro, inclusive do Brasil – em São Paulo, Distrito Federal, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro –, a meditação tem espaço considerável. “É a busca pela vida simples. O que interessa é gerar condição de felicidade para você. É o que leva à evolução.” 

Mudanças climáticas devem agravar doenças já existentes, diz especialista

Variações extremas de temperatura causam problemas respiratórios e doenças relacionadas às condições hídricas, como a diarreia


Paloma Oliveto
Estado de Minas: 24/08/2014

Rua de Manaus inundada pela cheia do Rio Negro em 2009: enchentes favorecem aumento dos casos de leptospirose (Michael Dantas/A Crítica/AE)
Rua de Manaus inundada pela cheia do Rio Negro em 2009: enchentes favorecem aumento dos casos de leptospirose


Os perigos que as mudanças climáticas representam para a saúde humana não são fáceis de enxergar. Diferentemente da clássica imagem de um urso-polar tentando se equilibrar no que restou de uma geleira do Ártico ou da fotografia aérea de um rio sugado pela seca, os impactos das variações extremas de temperatura e precipitação sobre o organismo são praticamente invisíveis: partículas poluentes sendo aspiradas, bactérias e vírus invadindo o corpo, mosquitos milimétricos depositando agentes patógenos na corrente sanguínea.

“As mudanças climáticas não causam novas doenças, elas agravam as já existentes”, esclarece o médico Ulisses Confalonieri, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e integrante do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) das Nações Unidas. No Brasil, enfermidades transmitidas por vetores e pela água são os principais riscos, pois, em um país tropical com 4,5 milhões de quilômetros de floresta, males como dengue e hepatites já têm impactos significativos nas estatísticas de morbidade e mortalidade. Além disso, o Sistema Nacional de Informações de Saneamento 2010 indica que 19% da população não têm acesso a água tratada e 54% carecem de coleta de esgoto, o que aumenta o risco de contaminação de fontes hídricas e, consequentemente, das doenças associadas a esse problema.

Com o crescimento populacional, o desenvolvimento urbano desordenado e a inexistência de uma vacina, a dengue é considerada uma das mais importantes doenças vetoriais que afetam o país. Uma simulação do Programa de Computação Científica da Fiocruz e da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, da mesma instituição, constatou que, no Rio de Janeiro, o acréscimo de 1ºC na temperatura mínima do mês pode aumentar em 45% o número de casos da doença no mês seguinte. Ao mesmo tempo, 10mm a mais de precipitação no estado farão crescer 6% a quantidade de casos de infecção nos 30 dias posteriores.

Coordenador do Observatório Clima e Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e da sub-rede de saúde da Rede Clima, o pesquisador Christovam Barcellos deixa o aviso: com o aumento de temperatura previsto para as próximas décadas — na América do Sul, até 2100, o acréscimo será entre 1,7 grau e 6,7 graus —, os casos de dengue crescerão em boa parte do país. “Toda cidade acima do estado de São Paulo terá de se preparar para os surtos”, alerta. “É automático. Um verão úmido seguido de calor leva aos surtos de dengue.” 

Esses impactos não serão percebidos apenas no futuro. Alguns já podem ser sentidos, indica Barcellos. “Em Manaus, todo ano, o Rio Negro sobe e desce. De uns tempos para cá, ele está subindo mais. A água está entrando nas casas das pessoas que moram perto do rio; ela não escoa, então aumentam os casos de diarreia, leptospirose e hepatites”, relata o pesquisador. Em São Paulo, um levantamento do Centro de Vigilância Epidemiológica do estado mostrou que, após as enchentes de dezembro de 2009, houve um aumento de 51% nos registros de leptospirose se comparado ao mesmo período do ano anterior. Mais casos como esses podem ser esperados: alterações na temperatura e nos padrões de precipitação vão aumentar a ocorrência de desastres naturais em todo o globo.

Poluição As enfermidades transmissíveis não são o único motivo de preocupação para o brasileiro. As mudanças climáticas potencializam outro problema ambiental provocado pela ação humana, com graves consequências para a saúde: a poluição atmosférica. De autoria de Christovam Barcellos, o relatório “Mudanças climáticas e ambientais e seus efeitos na saúde: cenários e incertezas para o Brasil”, publicado pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e pelo Ministério da Saúde, afirma que as condições atmosféricas influenciam o transporte de poluentes. “Os efeitos das mudanças climáticas podem ser potencializados, dependendo das características físicas e químicas dos poluentes e das características climáticas, como temperatura, umidade e precipitação”, diz o texto.

Em São Paulo, o pediatra e virologista Saulo Duarte Passos, professor da Faculdade de Medicina de Jundiaí, percebeu, há tempos, que os problemas respiratórios aumentaram nas crianças, à medida que o clima se alterava. “Temos notado, nas últimas décadas, uma mudança no padrão das infecções do trato respiratório (IRA). Em São Paulo, observamos as quatro estações num dia. O sistema respiratório da criança se desenvolve plenamente dos 8 aos 10 anos, o que o torna bastante vulnerável às agressões externas”, conta. 

Isso o incentivou a investigar se a poluição e o clima estavam associados ao aumento dos casos. O resultado do estudo, uma revisão de artigos científicos produzidos entre 2002 e 2012 citados por cinco bancos de dados médicos, foi publicado na última edição da Revista da Associação Médica Brasileira. Passos concluiu que há informação suficiente para associar as enfermidades respiratórias pediátricas às mudanças climáticas. “Orientei duas dissertações de mestrado para responder a essa pergunta e o resultado é que sim. Quando há uma queda brusca de temperatura, aumenta de duas a quatro vezes a frequência de infecções pelo vírus sincicial respiratório, principal responsável pela bronquiolite viral aguda (BQT)”, revela.

As consequências incluem uma sobrecarga nos serviços de saúde. “Segundo dados do SUS, em 2009, foram registrados mais de 29 mil casos de hospitalizações por bronquiolites a um custo imenso para o sistema de saúde. Nos Estados Unidos, esse vírus foi responsável por 220 mil internações por BQT”, revela Passos. “A literatura mostra que, quando ocorre mudança climática, aumenta a ida aos pronto-socorros. Em nosso serviço, notamos isso em dois dias. Se hoje mudou o clima, pode contar que, em 48 horas, haverá um numero maior de atendimento das infecções, bem como dos casos de sibilância, o chiado no peito”, diz o médico. 

EDITORIAL » Homofobia na campanha‏

EDITORIAL » Homofobia na campanha
Além do baixo nível das propostas, há até quem desrespeita o telespectador
Estado de Minas: 24/08/2014


O programa eleitoral é obrigatório, mas não gratuito. Pagam-no os recursos que o Estado recolhe do cidadão na forma de uma das mais pesadas cargas tributárias do mundo. Ao ser criado, tinha finalidade nobre: informar as propostas dos candidatos e ajudar o eleitor a decidir a quem entregar o voto. O passar dos anos, porém, demonstra que boas intenções não se transformam necessariamente em fatos. Ao contrário. Não raro, as deturpam.

Transmitidos no horário nobre dos canais abertos, os 50 minutos de programação entram na casa dos brasileiros sem bater na porta. Mas o objetivo original dessa iniciativa democrática longe está de ser atingido. Muitos, talvez a maior parte, dos que surgem na tela da TV pedindo votos desqualificam a inteligência do telespectador. Dão a impressão de que estão falando com crianças que acreditam em histórias da carochinha.

Postulantes a cargos eletivos aparecem travestidos de supercriaturas ou semideuses. Uns prometem mudanças de 180 graus na educação, na saúde, nos transportes, na segurança, na seguridade, no mercado de trabalho — sem preocupação com competências e fonte de recursos.

Outros, apoiados por marqueteiros profissionais, exibem país-maravilha que faz inveja a suecos, noruegueses e demais Estados que frequentam o topo do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) — pesquisa da ONU que mede o bem-estar e a qualidade de vida dos moradores deste ou daqueles países.

Na quinta-feira, uma surpresa invadiu as telas. Indo além da enganação explícita e do baixo nível das campanhas, candidato à Câmara Federal pela capital da República deu provas de falta de sintonia com a contemporaneidade. Enquanto o mundo caminha rumo à tolerância e ao convívio harmonioso com as minorias, Matheus Sathler, do PSDB, demonstrou intolerável homofobia.
Ele defende a necessidade de distribuir cartilhas "para ensinar meninos a gostar somente de meninas", e "as mulheres a serem femininas". É lamentável constatar que a sociedade brasileira, que tanto lutou para derrubar tabus antigos que acarretaram sofrimentos a famílias de norte a sul do país, tenha a casa invadida por criaturas incapazes de respeitar o lar em que entram — muitos habitados por pessoas de diferentes tendências.

Não se trata de patrulhamento ou censura. É direito de todos ter opinião. Mas é inaceitável externar ideias retrógradas e preconceituosas em programa pago com o dinheiro arrancado do cidadão para ser informado sobre projetos capazes de melhorar a qualidade de vida dos brasileiros. O mínimo que o cidadão tem o direito de esperar dos partidos políticos é que sejam mais seletivos na oferta de candidatos ao crivo popular e na edição do que será dito às famílias no horário eleitoral obrigatório.