quarta-feira, 14 de maio de 2014

MARTHA MEDEIROS - Ansiedade em vão

Zero Hora 14/05/2014

Não conhecia o Iago, o rapaz que entrou na contramão na ponte do Guaíba e percebeu tarde demais que o vão estava levantado. Ele não conseguiu frear a tempo, caiu e abreviou sua vida por causa de uma aflição.

Não sei detalhes da história, a não ser que ele estava atrasado e que não conhecia bem os meandros de entrada e saída de Porto Alegre. Tinha um carro na mão, um relógio fazendo tic-tac e uma entrevista marcada, e já passava da hora: quem tem o mínimo de responsabilidade sabe que compromissos existem para serem cumpridos.

Uma das razões de o Brasil ser essa bagunça colossal é que a palavra compromisso, para a maioria, não tem o menor valor.

Para Iago, tinha. Mas até onde devemos sucumbir ao desatino? Se o plano inicial começou errado, melhor não emendar com novos erros. Um atraso normalmente acarreta excesso de velocidade, estacionar em local proibido, estresse, e tudo isso para quê? No caso do garoto, o desespero resultou numa fatalidade.

Mais vale aceitar nossos vacilos sem buscar uma correção afobada. Falhou, está falhado. Respire fundo e vá tomar um café. Celular também existe para isso: “Não consegui chegar, desculpe”.

Claro que ele não cogitou morrer. Pensou no máximo na perda de emprego, de oportunidade, de promoção, de seja o que for que a entrevista significasse. Ele apenas quis correr atrás do prejuízo. E no caminho não viu as placas de sinalização, todas de costas para ele.

A aflição é como um sol traidor, aquele que bate de frente e te cega.

Para muitos, foi apenas um acidente com características incomuns. Para mim, foi um aviso: não vale a pena sacrificar a vida pelo bom-mocismo.

Já fiz o que ele fez. Já me perdi por ansiedade, já me senti devedora por não cumprir o combinado, já tentei consertar estragos numa tentativa presunçosa de extirpar o erro da minha biografia. Ora, um erro ou outro, o que é que tem? Aquele que não se permite uns desacertos se desumaniza pela insistência em ser perfeito.

Pressupondo que eu esteja certa a respeito da angústia do Iago, ela me fez sentir total empatia com a situação dele. Naqueles segundos finais antes de cair da ponte, ele deve ter pensado: “O que fui fazer!”. Está feito. Mas ficou o recado: sejamos todos mais atentos, porém menos ansiosos. A ansiedade não serve para nada, ela apenas faz com que tentemos superar a nós mesmos. “Superar a nós mesmos” é uma bonita frase de efeito, mas induz a uma competição besta: o vencedor e o perdedor são a mesma pessoa.

TeVê

TV Paga
Estado de Minas: 14/05/2014


 (SescTV/Divulgação)

Duas vezes Gil

Amigos de longa data, Jorge Mautner e Gilberto Gil (foto) fizeram show juntos em um projeto do Sesc, relembrando a trajetória de um e outro e os tempos de Tropicalismo. O SescTV registrou tudo e mostra hoje à noite, às 22h, com entrevistas dos dois artistas e um repertório riquíssimo. Também hoje, às 20h30, o Arte 1 reprisa o especial Tempo rei, que comemorou os 30 anos de carreira de Gil, em 1996. Uma terceira opção musical para hoje é A batuta, às 20h, no Film&Arts, com o registro do concurso de jovens regentes Gustav Mahler Conducting Competition, em Bamberg, na Alemanha.

Viva vai reprisar
o seriado Mulher


O canal Viva continua com sua série de especiais comemorativos de seus quatro anos no ar, reservando para hoje a volta da série Mulher, exibida originalmente pela Rede Globo em 1998. A produção acompanha o cotidiano de uma clínica especializada em atender a pacientes mulheres, dirigida pelas médicas interpretadas por Eva Wilma e Patrícia Pillar. Toda quarta-feira, às 23h10.

FoxLife até parece
uma imobiliária


Na FoxLife, às 18h30, estreia a nona temporada de Proprietários de primeira viagem. Egypt Sherrod vai levar os assinantes na procura pela casa ideal, sabendo que os compradores estão por adquirir seu primeiro imóvel. O programa também oferece ideias e conselhos para quem tem o sonho da casa própria.

Curta-metragem
tem público fiel


No canal Curta!, as opções são óbvias, começando às 20h, com os curtas-metragens Boca a boca e Papo de botequim, de Allan Ribeiro; e Feliz aniversário, Urbana, de Betse de Paula. Às 22h35 é a vez de Felicidade é... sonho, de José Pedro Goulart. Já num formato um pouco mais extenso,
o chamado média-metragem, Segundo movimento para piano e costura, de Marco Del Fiol, é a atração do Canal Brasil, às 22h.

Telecine resgata
filme de Pasolini

Para quem prefere longas-metragens, são muitas as alternativas. O destaque é As mil e uma noites, de Pier Paolo Pasolini (1922–1975), às 23h55, no Telecine Cult. Na concorrida faixa das 22h, o assinante tem mais oito opções: Julie & Julia, no Studio Universal; As duas faces da lei, no Glitz; O amor não tira férias, na MGM; Sete psicopatas e um shih tzu, na HBO; 30 minutos ou menos, no Max HD; Amostras grátis, na HBO HD; Guerra Mundial Z, no Telecine Pipoca; e Despedida em Las Vegas, no TCM. Outras atrações da programação: O mistério das duas irmãs, às 20h55, no FX; Piratas do Caribe: o baú da morte, às 21h45, no Megapix; e Gladiador, às 22h50, no Universal Channel.

Caras & Bocas

Simone Castro - simone.castro@uai.com.br


Camila Pitanga será a protagonista da novela Babilônia, que vai estrelar no ano que vem   (Marcos Pinto/Revista Contigo)
Camila Pitanga será a protagonista da novela Babilônia, que vai estrelar no ano que vem
Estrela das nove

Afastada das novelas desde a premiada Lado a lado (Globo) – que ganhou o Emmy de melhor novela no ano passado –, a atriz Camila Pitanga já tem data para voltar à telinha. Ela será a protagonista de Babilônia, novela de Gilberto Braga, Ricardo Linhares e João Ximenes Braga, que vai substituir Falso brilhante, de Aguinaldo Silva, sucessora de Em família, em 2015. A informação é da edição desta semana da revista Contigo!. O nome da novela se refere ao Morro da Babilônia, no Rio de Janeiro, uma das comunidades mais violentas da capital até ser pacificada, em 2009, e que será um dos cenários da trama. No elenco, entre outras, também estão confirmadas as atrizes Glória Pires, Fernanda Montenegro, Nathalia Timberg e Daisy Lúcidi. Camila, prestes a completar 37 anos, ainda falou à publicação sobre sua vida pessoal e revelou que deseja ter mais um filho. Ela já é mãe de Antônia, de 6 anos. “Não tenho preferência por sexo, mas adoraria ter um casal, para viver uma história com um menino”, disse a atriz, que não assumiu nenhum novo relacionamento desde o fim do namoro com o cantor Lucas Santtana, em 2013.

CONEXÃO REPÓRTER VISITA
PRISÃO PARA ESTRANGEIROS


O Conexão repórter desta quarta-feira, às 23h15, no SBT/Alterosa, revela, pela primeira vez, os bastidores da única cadeia do país exclusiva para estrangeiros e mostra histórias em um círculo vicioso: as condições em que vivem, os desabafos, os arrependimentos, os dramas de quem deixou o país natal em busca de dinheiro fácil e terminou a jornada atrás das grades. O episódio ‘‘Cárcere de forasteiros’’ traz a saga de homens e mulheres da prisão à liberdade, do crime ao trabalho, da família que é deixada de lado à retomada de suas raízes. O telespectador conhecerá a história do espanhol Alberto Garcia, de 34 anos. Preso com duas malas cheias de cocaína, ele receberia 6 mil euros pelo percurso até o Brasil. Cabrini localiza a família de Alberto na Europa e mostra o arrependimento e a saudade. E ainda: as histórias do sul-africano Will, 42 anos, que há mais de um ano ganhou a liberdade condicional; da senegalesa Aida, 37 anos, que depois de cumprir a pena vive em uma ONG que dá abrigo para estrangeiros; e do grego Konstantinos, 42 anos, que é ex-presidiário e tenta se fixar no Brasil. Ele encontra a esperança na solidariedade de um comerciante.

JOSÉ LUIZ DATENA JÁ FALA
EM APOSENTADORIA DA TV


O apresentador José Luiz Datena revelou, anteontem, em entrevista ao programa Mulheres, da TV Gazeta, os planos de se aposentar. Ele fala que pode ser no final do contrato com a Band, onde apresenta o Brasil urgente. “Queria fazer um programa de maior tranquilidade, um talk show, mas quem sabe um dia a Band me dê esta oportunidade. Tenho mais três anos de contrato, espero cumprir esses três anos e depois acho que vou para o interior. Estou com 56, vou estar com quase 60, vou pescar”, afirmou Datena, contando que tem vontade de morar no interior de São Paulo. E Datena ainda comentou sobre o que parecia ser um traço natural de sua personalidade. “Não tenho vontade de ficar opinando toda hora sobre todas as coisas. Só faço porque sou pago para isso, tenho que cumprir contrato. Chegou o momento de curtir a vida e fazer o que gosto. A direção da Band já sabe disso, já falei várias vezes e gostaria de ter um pouco mais de tranquilidade”, afirmou.

“VERGONHA!”


Um dos principais sambistas do Brasil, Zeca Pagodinho detonou a realização da Copa do Mundo no país, em entrevista à revista Status deste mês. “Fico pensando como tem gente que não tem vergonha de trazer uma Copa do Mundo, uma festa dessa, enorme, para cá”, disse, ao analisar paralelamente os inúmeros problemas sociais que afligem crianças ou as graves dificuldades de infraestrutura que o Brasil possui. Os desabrigados da enchente que castigou Xerém, onde tem uma de suas residências no Rio de Janeiro, no início de 2013, também são motivo de desapontamento para o cantor. Ele se envolveu no auxílio às vítimas, mas não sabe se as coisas mudaram desde então. “Não acompanhei mais. Porque a gente acaba sofrendo mais do que já deu para sofrer. Uns dizem que receberam casa, outros dizem que estão esperando até hoje. Tem outro que diz que a casa que recebeu é de papel, que, se der um soco na parede, a mão sai do outro lado. Então não sei como está hoje em dia.” Zeca também falou sobre a realização das diversas manifestações que tomaram conta do país recentemente. 

Frei Betto - Publicidade e crianças‏

Publicidade e crianças 

 
Estudos demonstram que crianças e adolescentes aderem às drogas por transferirem para a TV e a internet seu universo onírico
Frei Betto

Estado de Minas: 14/05/2014


Poucos se deram conta de que, em 4 de abril, a presidente Dilma assinou a Resolução 163/2014, do Conselho Nacional da Criança e do Adolescente (Conanda), que proíbe publicidade abusiva direcionada a crianças e adolescentes. Como alertou o jurista Dalmo Dallari, preservou-se o direito constitucional de liberdade de expressão. Limitou-se, porém, o de liberdade de comércio, que deve ser restrito quando ameaça direitos humanos.

Pais e educadores sabem o quanto crianças e adolescentes, sem maturidade e discernimento, ficam expostos à publicidade abusiva. Ídolos do esporte são usados em propaganda de bebidas alcoólicas; alimentos com alto teor de gorduras saturadas são apresentados como sadios; guloseimas que provocam obesidade precoce aparecem revestidas de embalagens sedutoras.

Enquanto a família e a escola querem formar cidadãos, a publicidade quer formar consumistas, considerando o lucro do anunciante acima da preservação da saúde física e psíquica. Estudos demonstram que crianças e adolescentes aderem às drogas por transferirem para a TV e a internet seu universo onírico. Os sonhos químicos tentam preencher o vazio da mente que não exauriu a fantasia no período da infância.

A Constituição brasileira dispõe no artigo 227: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida (...), à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-las a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

A aprovação da Resolução foi uma vitória do Conanda e, em especial, do Instituto Alana que, há anos, luta em prol dos direitos desse amplo e frágil segmento populacional com idade inferior a 18 anos. Por força de lei, agora estão proibidas no Brasil publicidade e comunicação mercadológica com intenção de persuadir crianças ao consumo de qualquer produto ou serviço, utilizando-se de “linguagem infantil, efeitos especiais e excesso de cores; trilhas sonoras de músicas infantis ou cantadas por vozes de criança; representação de criança; pessoas ou celebridades com apelo ao público infantil; personagens ou apresentadores infantis; desenho animado ou de animação; bonecos ou similares; promoção com distribuição de prêmios ou de brindes colecionáveis ou com apelos ao público infantil; e promoção com competições ou jogos com apelo ao público infantil.”

Nenhum dos recursos acima elencados pode mais ser utilizado “em eventos, espaços públicos, páginas de internet, canais televisivos, em qualquer horário, por meio de qualquer suporte ou mídia, seja de produtos ou serviços relacionados à infância ou relacionados ao público adolescente e adulto.” A lei proíbe também abusiva “publicidade e comunicação mercadológica no interior de creches e das instituições escolares da educação infantil e fundamental, inclusive em seus uniformes escolares ou materiais didáticos”. Tais medidas de proteção da criança e do adolescente “não se aplicam às campanhas de utilidade pública que configurem estratégia publicitária referente a informações sobre boa alimentação, segurança, educação, saúde, entre outros itens relativos ao melhor desenvolvimento da criança no meio social”.

O objetivo da lei promulgada pela presidente é assegurar o “respeito à dignidade da pessoa humana, à intimidade, ao interesse social, às instituições e símbolos nacionais; atenção e cuidado especial às características psicológicas do adolescente e sua condição de pessoa em desenvolvimento; não permitir que a influência do anúncio leve o adolescente a constranger seus responsáveis ou a conduzi-los a uma posição socialmente inferior; não favorecer ou estimular qualquer espécie de ofensa ou discriminação de gênero, orientação sexual e identidade de gênero, racial, social, política, religiosa ou de nacionalidade; não induzir, mesmo implicitamente, sentimento de inferioridade no adolescente, caso ele não consuma determinado produto ou serviço; não induzir, favorecer, enaltecer ou estimular de qualquer forma atividades ilegais, a qualquer espécie de violência, a qualquer forma de degradação do meio ambiente; e primar por uma apresentação verdadeira do produto ou serviço oferecido, esclarecendo sobre suas características e funcionamento, considerando especialmente as características peculiares do público-alvo a que se destina”.

Resta, agora, estabelecer as punições adequadas a quem insistir em transformar, por meio da hipnose eletrônica, futuros cidadãos em precoces consumistas.

Barroco bachiano - Ailton Magioli

Barroco bachiano 
 
Uma canção é pra isso, que está sendo filmado em Ouro Preto, faz uma ponte entre Brasil e Alemanha, tendo como elo uma fictícia partitura perdida na cidade mineira


Ailton Magioli
Estado de Minas: 14/05/2014


Gravações em frente à Igreja do Pilar, em Ouro Preto: cidade colonial volta a ser cenário de produção internacional (fotos: Beto Novaes/EM/D. A PRESS)
Gravações em frente à Igreja do Pilar, em Ouro Preto: cidade colonial volta a ser cenário de produção internacional

Quase três décadas depois de Luar sobre parador, de Paul Mazursky, que reunia Richard Dreyfuss, Raul Julia e Sonia Braga no elenco, Ouro Preto volta servir de cenário para uma produção cinematográfica internacional. Na trilha do musicólogo alemão Curt Lang (1903-1997), que na década de 1940 localizou em Minas Gerais partituras e partes musicais manuscritas que remontam ao século 18, o diretor Ansgar Ahlers filma até semana que vem, na cidade colonial mineira, Uma canção é pra isso (Bach in Brazil). A ficção, que oficializa a estreia do jovem diretor alemão em longa-metragem, tenta tornar crível a hipótese de uma partitura original perdida de um dos filhos de Johann Sebastian Bach (1685-1750) ter reaparecido na cidade histórica mineira, há dois séculos.

Em busca de tal tesouro, desembarca a contragosto em Ouro Preto Marten, um professor alemão de música, interpretado por Edgar Selge (A experiência). Vítima de assalto em plena Praça Tiradentes, ele acaba se aproximando de Cândido, vivido pelo baiano Aldri da Anunciação, que será responsável pela transformação do alemão em terras mineiras. Criado no seio de uma família alemã, com a qual a mãe trabalha em Ouro Preto, Cândido, que é funcionário de um reformatório infantil, vê no alemão a oportunidade de levar a música para os internos da instituição, com os quais o professor acaba se envolvendo.

“Eu te ajudo a conseguir de volta seus documentos e roupas roubados, além de ajudar a procurar a partitura que veio buscar. Em contrapartida, você vai dar aula de música para as crianças”, relata o ator baiano Aldri da Anunciação sobre seu personagem, salientando que, a partir de então, a trama toma novo rumo, gerando o envolvimento do mestre com os novos alunos. “É uma história de dupla reinserção social: das crianças e do professor”, diz o ator. Além da alemã Franziska Walzer, o elenco de Uma canção é pra isso (Bach in Brazil) se completa com os brasileiros Marília Gabriela, Stepan Nercessian, Thays Garayp e uma centena de figurantes mineiros.

Foi a partir de conversa com um artista que esteve no Brasil e manteve contato com a produção musical colonial que o diretor Ansgar Ahlers diz ter tido o insight para o filme. “Ninguém acreditava que havia música barroca no Brasil, achavam a informação inverossímil”, recorda Clemens Schaeffer, que divide a coprodução alemã com a carioca Eliana Soarez, da Conspiração Filmes. De acordo com ele, o diretor ficou impressionado ao descobrir que o Brasil não era apenas praia, favela, Rio e São Paulo. “Ao enviar fotos de Ouro Preto, todos perguntavam se ele estava na Toscana (Itália) ou em Portugal. ‘Não, estou em Ouro Preto, no meio do Brasil’”, lembra o diretor.

Taxi daydream, de 2004, que Ansgar filmou em São Paulo, inaugurou a relação do diretor alemão com o Brasil. Para escrever o roteiro do primeiro longa-metragem, ele veio pessoalmente pesquisar o acervo de música barroca em instituições como UFMG (Acervo Curt Lange), Museu da Música de Mariana e igrejas de São João del-Rei. A escolha de Ouro Preto para as filmagens, ainda de acordo com Clemens, se deu por causa da similaridade arquitetônica da cidade histórica mineira com a região onde o longa será filmado, em Bückeburg, na Alemanha. Na próxima semana, o diretor e parte do elenco (Aldri da Anunciação, Thays Garayp e sete das oito crianças selecionadas) embarcam para a Alemanha.

Além da Igreja do Pilar, onde foram feitas as tomadas de Marília Gabriela, as igrejas do Carmo, da Sé, São Francisco de Assis e de Bom Jesus de Matosinhos, a Casa dos Contos, o Colégio Arquidiocesano de Ouro Preto e a mina Chico Rei serão cenário do filme, que ainda tem o Museu da Inconfidência, na Praça Tiradentes, como pano de fundo do assalto do recém-chegado professor alemão à cidade. Na pele da ministra da Justiça, Marília Gabriela faz uma participação especial no longa. “É uma participação afetiva”, relata ela, que recebeu convite do produtor brasileiro Leonardo Barros, radicado na Alemanha, depois que Fernanda Montenegro desistiu do projeto em razão de outros compromissos profissionais.

“A ideia do filme é bonita e importante, porque vai resultar em algo leve, apesar das grandes mensagens que traz, tais como as de reinserção social, juventude e cultura, esperança e sonho”, afirma a atriz e jornalista, para quem Uma canção é pra isso (Bach in Brazil) vai selar a identificação entre dois países, por meio da grande linguagem universal que é a música. “Esforcei-me para parecer uma ministra sofisticada, justa e incisiva”, confessa Marília, que garante ter construído a personagem com equilíbrio entre poder e delicadeza.
O diretor alemão Ansgar Ahlers em ação: entusiasmo com o cenário histórico da cidade mineira
O diretor alemão Ansgar Ahlers em ação: entusiasmo com o cenário histórico da cidade mineira

Mineira Única mineira no elenco, Thays Garayp vive Dulce, a supervisora disciplinar da instituição de ensino em que o professor alemão vai dar aulas de música para as crianças. “Muito rígida e entediada com a profissão, no decorrer da trama ela terá oportunidade de se transformar”, comemora a atriz, salientando o fato de o diretor ter dado mais visibilidade para a personagem depois de conhecê-la. “Estou orgulhosa”, confessa Thays, que está filmando em Ouro Preto desde o dia 5.

Com viagem agendada para a Alemanha, onde irá participar da conclusão das filmagens, ela comemora o fato de a primeira viagem internacional de carreira ter sido coincidentemente na Europa, onde se apresentou com o coral Ars Nova, que integrava na época. “Estou em estado de graça”, diz Thays Garayp. “Não planejei chegar à TV, que dirá a uma produção cinematográfica internacional”, justifica a alegria. Thays, que é engenheira civil de formação, iniciou carreira na música, passou pelo teatro, conquistou espaço na TV e agora retorna ao cinema, depois de Mulheres do Brasil, de Malu De Martino, e O circo das qualidades humanas, de Geraldo Veloso, Jorge Moreno, Paulo Augusto Gomes e Milton Alencar.

Figura conhecida dos brasileiros, o carioca Stepan Nercessian interpreta Vargas, o diretor de recuperação infantil da instituição de ensino que abriga as crianças. “Hoje (ontem) filmamos a cena que deve ser o ápice da glória da garotada, que faz a primeira apresentação pública durante a visita da ministra da Justiça (vivida por Marília Gabriela) à cidade”, afirma Stepan, constantemente abordado por populares durante as filmagens em Ouro Preto.

“É um filme muito bonito. Um olhar estrangeiro sobre o Brasil e Ouro Preto”, acrescenta o ator e deputado federal (PPS/RJ). Segundo Stepan Nercessian, o diretor Ansgar Ahlers optou por um olhar diferenciado do país, indo além dos estereótipos. “É um clima muito bonito, o lugar, o tempo, o ritmo”, conclui o ator. A estreia de Uma canção é pra isso (Bach in Brazil) está prevista para o segundo semestre de 2015.
Marília Gabriela faz participação no papel de ministra da Justiça
Marília Gabriela faz participação no papel de ministra da Justiça

Bach à brasileira

Uma canção é pra isso (Bach in Brazil) vai contar ainda com a participação do cavaquinista carioca Henrique Cazes na trilha sonora. O instrumentista escreveu três arranjos especialmente para o filme, apresentando temas de Bach com molho brasileiro. Cazes já havia mostrado com sucesso o casamento do barroco com o chorinho com o grupo Camerata Brasil, em disco que reuniu a elite dos chorões cariocas em torno de um repertório que incluía Bach, Pixinguinha e Villa Lobos.

Baiano alemão

Aldri da Anunciação diz que não sentiu dificuldades em coprotagonizar o filme, porque domina a língua alemã. O ator baiano, que morou em Berlim, onde estagiou em escolas de teatro e ópera, salienta que 80% das falas de seu personagem são em alemão. “Mas o trabalho que estou fazendo é uma mistura. Afinal, o Cândido vive entre as ruas de Ouro Preto e a casa da família alemã em que a mãe dele trabalha. Daí o fato de ele se prontificar a ajudar o professor assaltado na cidade”, explica o ator, para quem a atuação não tem idioma.

Eduardo Almeida Reis - Lição‏


Cícero e a maioria dos seus contemporâneos foram educados com os ensinamentos de velhos filósofos, poetas e historiadores gregos


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 14/05/2014






Marcus Tullius Cicero (106-43 a.C.), em português Marco Túlio Cícero, figura máxima da latinidade clássica, filósofo, orador, escritor, advogado e político nascido em Arpino, 100 quilômetros ao sul de Roma, não era um “romano” no sentido clássico e dizem que se envergonhava disso.

In illo tempore, para ser considerada pessoa culta havia que falar grego e latim. A alta classe romana preferia usar o grego na correspondência privada, porque tinha expressões mais refinadas e precisas, era sutil e mais rico em nomes abstratos. Cícero e a maioria dos seus contemporâneos foram educados com os ensinamentos de velhos filósofos, poetas e historiadores gregos. Aos esquecidos relembro que in illo tempore significa “naquele tempo” e pega bem à beça.

Os mais proeminentes professores de oratória também eram gregos e Cícero utilizou seus conhecimentos daquela língua para traduzir em latim muitos conceitos teóricos da filosofia grega e conseguir maior audiência. Por sua educação, acabou ligado à tradicional elite romana.

Seu pai era um rico equestre com bons contatos em Roma. Em latim, di-lo a Wikipédia, Cícero (cicer,eris) significa grão-de-bico. Segundo o historiador Plutarco, um dos antepassados de Cícero tinha uma covinha na ponta do nariz que parecia um grão-de-bico, se bem que o referido grão tenha parecença com a verruga. De repente, era a ponta do nariz e não a covinha que parecia um grão-de-bico.

Foi-lhe sugerida, ao entrar na política, a mudança do nome ridículo, mas ele se recusou dizendo que faria de Cícero nome mais glorioso do que Escauro (“com os tornozelos inchados”) e Catulo (“Cachorrinho”). Casamento, divórcio, outro casamento com uma jovem, livros publicados, carreira política, sua vida foi muito complicada e não cabe nos limites desta coluna. Foi assassinado em 43 a.C.

Leitor atento mandou-me lição de Cícero datada de 55 a.C., que tem, portanto, 2014 + 55 anos. Ei-la: “O orçamento deve ser equilibrado, o tesouro público deve ser reposto, a dívida pública deve ser reduzida, a arrogância dos funcionários públicos deve ser moderada e controlada, e a ajuda a outros países deve ser eliminada para que Roma não vá à falência. As pessoas devem aprender a trabalhar, em vez de viver às custas do Estado”.

Qualquer semelhança com um país grande e bobo não é mera coincidência, mas ficou faltando explicar o significado de equestre. A ordem equestre romana (ordo equester) formava a mais baixa das duas classes aristocráticas da Roma Antiga: a mais alta era a ordem senatorial (ordo senatorius).

O membro da ordo equester era um eques, plural equites, que em latim significa qualquer pessoa a cavalo, mas naquele contexto tinha o significado de cavaleiro. Quando a cavalaria legionária foi abolida, os cavaleiros proviam os oficiais veteranos e grande parte da cavalaria das legiões manipulares até 88 a.C., ocasião em que a cavalaria legionária foi abolida. Manipular, no caso, era cada um dos soldados de um manípulo (subdivisão).

Jurídicas

Não por acaso, o direito romano foi e continua sendo disciplina ministrada em nossas melhores escolas jurídicas, aquelas que conseguem aprovar o maior número de bacharéis nos exames da OAB.
Não por acaso, Dei Dellitti e Delle Penne, livro originalmente publicado em 1746, foi escrito por Cesare Bonesana, marquês de Beccaria, jurista, filósofo, economista e literato italiano, avô do escritor e poeta Alessandro Francesco Tommaso Manzoni (1785-1873), um dos mais importantes nomes da literatura italiana.

Não por acaso, outrossim, Cesare Lombroso (1835-1909), psiquiatra, cirurgião, higienista, criminologista, antropólogo e cientista, autor de L’uomo Delinquente, in rapporto all’antroipologia, alla giurisprudenza ed alle discipline carcerarie, era nascido em Verona, Itália.

Por isso, a Itália vem de dar ao mundo admirável lição jurídica ao condenar por fraude fiscal Silvio Berlusconi, de 77 anos, bilionário e político, quatro vezes primeiro-ministro, a um ano de prestação de serviços comunitários. A partir de agora, uma vez por semana, durante quatro horas consecutivas, don Berlusca deverá cuidar de idosos num asilo de Milão, a 40 quilômetros do palácio em que vive.

Nada mais chato do que cuidar de idosos. Falo de cadeira, ou, mais precisamente, de uma cadeira próxima do teclado do computador, porque cuido de mim 24 horas por dia. Berlusconi, durante quatro horas, uma vez por semana, vai ver o que é bom para a tosse.

O mundo é uma bola
14 de maio de 1264: Henrique III, da Inglaterra, é capturado na Batalha de Lewes e forçado a assinar o Mise of Lewes, fazendo de Simão de Monfort o governante de fato da Inglaterra.

Em 1265, Simão foi capturado e morto pelo príncipe herdeiro Eduardo, que restaurou o reinado de Henrique III e dissolveu o parlamento.

Em 1610, o rei Henrique IV, da França, foi assassinado em Paris. A matança de governantes deve ter contribuído para o esplendor da França e da Inglaterra, como também dos Estados Unidos e da Rússia.

Em 1897, primeira transmissão de rádio da história pelo físico e inventor italiano Guglielmo Marconi.

Ruminanças
“Programas de debates no rádio, como aquele do Haroldo de Andrade com debatedores inteligentes, eram interessantíssimos. Debatedores catados a laço nos corredores das emissoras fazem programas insuportáveis” (R. Manso Neto).  

A internet das coisas

Geladeiras e carros vão se comunicar com pessoas, empresas e o governo



Felipe Regis Lessa
Diretor de marketing e produto da Pagtel
Estado de Minas: 14/05/2014



Os limites entre homem e tecnologia vêm se tornando cada vez mais tênues, tendência que deverá se acentuar ainda mais com a crescente integração entre objetos e a internet, que é conhecida como a internet das coisas, (IoT, em inglês). Temos exemplos e ideias desse movimento vindos de todos os lados: desde geladeiras inteligentes que avisarão (ou vão comprar direto?) quando um produto acabar até o carro-smartphone que avisará ao seu seguro como você anda dirigindo. Essa poderosa rede de informações, que vai gerar infinitos terabytes sobre tudo o que você faz, será alimentada por centenas de bilhões de objetos identificáveis e que poderão interoperar uns com os outros, com data centers de empresas, governos ou nuvens computacionais. Até 2020 serão 26 bilhões de devices conectados contra "apenas" 900 milhões em 2009, de acordo com estimativas da consultoria Gartner. Fora os milhões de sensores de informações que deverão "digitalizar" sistemas até então analógicos, como reservatórios de água, energia e produção de alimentos.

Além disso, o mercado de dispositivos sem fio com conexão à internet deve movimentar entre US$ 2,7 trilhões e US$ 6,2 trilhões em valor econômico anualmente até 2025, segundo o McKinsey Global Institute, braço de pesquisa da consultoria McKinsey Company Inc. Além dos devices pessoais, a IoT vai aglutinar o mundo digital com o mundo físico, permitindo que objetos e corpos humanos façam parte de um sistema de informações totalmente integrado. Não será apenas a sua geladeira que será conectada a uma rede, mas você também. E já temos vários exemplos: desde a lente de contato que mede o nível de glicose, que o Google vem desenvolvendo para diabéticos, até o sistema da Ericsson que permite que o corpo humano transmita informações para aparelhos. É evidente toda a conveniência e economia de recursos que a IoT poderá trazer para a sociedade. Por outro lado, cresce o desafio das empresas de gerenciar seguramente esse vasto volume de informações gerado. Para alguns é uma evolução natural da tecnologia, para outros certamente causa arrepios e receios. Acredito que tudo depende do nível de transparência com que seremos tratados por empresas e governos quando o assunto forem as nossas informações. Entretanto, vale lembrar que aquele argumento “você escolheu estar em uma rede social, portanto abriu mão da sua privacidade” talvez não seja tão válido em um mundo no qual provavelmente não teremos um opt out para rejeitarmos o rastreamento e a utilização dos nossos dados. No Brasil, esse tema vem sendo debatido em função do Marco Civil da Internet.

Além disso, os questionamentos sobre segurança de dados provavelmente deverão ir além das informações pessoais e assumir um debate sobre segurança nacional, já que estamos falando também de usinas de energia e plantações conectadas. Em tempos de espionagem 3.0, seria muita paranoia desconfiar das singelas geladeiras inteligentes que andam lançando por aí?

Inflação e as jabuticabas em abril - Álvaro César Cunha

Estado de Minas: 14/05/2014 



O que pode ter em comum a produção de jabuticabas em abril e o avanço dos índices inflacionários nesses últimos meses no Brasil? Desconsiderando a rima na pergunta, que foi por acaso e até poderia ser evitada, as duas situações têm em comum o fato de preocupar aqueles que nasceram na roça e nunca viram jabuticaba nessa época, e os que vivem na cidade e já começam a sentir no bolso o gosto amargo dos efeitos de uma inflação em alta, tendo a natureza como ponto central nessa questão.

Uma análise mais acurada desses dois fatos exigiria uma pesquisa muito cuidadosa e apuração meticulosa dos resultados obtidos. Para fazer uma rápida avaliação dessas duas situações, prefiro lançar mão de comentários que já ouvi e de observações que faço quando estou abordando assuntos dessa natureza.

Ouvi, por diversas vezes, avós dizerem que estavam plantando uma jabuticabeira para seus netos. E quem já teve a oportunidade de plantar no pomar ou quintal de sua casa uma árvore dessas sabe muito bem que ela leva pelo menos uns 10 anos para produzir os primeiros frutos, exceção para os enxertos existentes hoje. Também sabe que a produção tem época certa: final de ano, com a chegada das chuvas. Sempre foi assim, mas as mudanças na natureza, provocadas por ela mesma e também por ações do homem, estão alterando essa regra.

Com seus 91 anos, sorriso farto e memória ativa, dona Estelita de Jesus Pinto, moradora da localidade de Tropeiros, em Esmeraldas, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, não hesita ao avaliar o fato. “Nunca vi jabuticaba nessa época do ano. Os pés no fundo do quintal estão carregados. Jabuticabas graúdas. Uma beleza. Mas é triste, porque é mais um sinal de que a natureza não é mais a mesma. Está tudo mudando e as coisas estão ficando pretas” – diz ela, sem qualquer preocupação com o politicamente correto.

Consultados a respeito, alguns técnicos em fruticultura explicam que a jabuticabeira é árvore típica que produz quando tem água, principalmente de chuva. Eles admitem que o baixo nível pluviométrico registrado no final do ano passado, seguido por intenso calor e acompanhado por chuvas esporádicas podem ter “confundido” as jabuticabeiras e as levado a produzirem fora de seu período tradicional, que começa na primavera, com a floração.

Para dona Estelita, se as plantas estão se confundindo, mais confusos estamos nós diante de tantas mudanças na natureza. Até a quaresmeira, depois que foi plantada na cidade, está florindo fora da Quaresma, alertou. E, ao tomar conhecimento de que uma pequena bandeja com jabuticabas em um supermercado estava sendo vendida por mais de R$ 3,00, não conseguiu esconder seu desconforto e sustentou: “É isso que dá ficar castigando a natureza. A chuva acaba. A terra não produz direito. Os produtos ficam caros. E agora vão acusar a jabuticaba de abril pela inflação”.

Possivelmente isso não ocorrerá, porque a jabuticaba não entra na relação dos produtos pesquisados para a formação dos índices inflacionários, como acontece com outras frutas. Independentemente da jabuticaba, os consumidores, e não apenas dona Estelita, estão assustados com a alta generalizada de preços dos alimentos e começam a ver na elevação dos índices inflacionários um mal que afeta a todos.

Quem frequenta com alguma regularidade supermercados e sacolões de hortifrutigranjeiros sente no bolso o peso dos preços em evolução. Fornecedores e vendedores garantem que a maioria dos produtos vendidos nesses estabelecimentos está com seus preços elevados por causa de fatores climáticos. Sem dúvida, a falta de chuvas e a consequente redução do volume de água é o principal fator. Impede a produção regular de alimentos e aumenta o preço final. Com a irregularidade pluviométrica se acentuando a cada ano, seus efeitos nefastos vão direto para a conta de cada consumidor.

Mesmo não servindo de conforto, é preciso lembrar e reconhecer que para tudo existe um tempo de duração. Basta observar os índices de crescimento econômico em vários países nos últimos anos, com a indústria produzindo a todo vapor e o consumo se estendendo a todas as camadas da sociedade. Não é difícil imaginar que em algum momento isso iria mudar, como já ocorreu em diversas outras épocas, e agora não é diferente.

Para os estudiosos de matemática, isso pode ser explicado pela teoria ou lei das probabilidades. Para mim, fica a impressão de que a própria natureza provoca certas mudanças para arrefecer um pouco os ânimos e a ânsia por crescimento e consumo, enquanto ganha mais um tempo para se recompor e continuar servindo de bens e produtos à humanidade. Talvez isso explique a produção da jabuticabeira em abril e a inflação em alta.

O som da assinatura - Isabela de Oliveira

O som da assinatura 

Projeto da USP cria forma de autenticar a rubrica de uma pessoa a partir do ruído que ela gera no contato da caneta com o papel. Depois de aperfeiçoado, o sistema poderá ser adotado em bancos e cartórios 
 
Isabela de Oliveira
Estado de Minas: 14/05/2014


Brasília – É uma luta sem fim. Enquanto os responsáveis pela segurança de empresas e instituições públicas se empenham em adotar medidas cada vez mais eficazes para evitar fraudes, as quadrilhas encontram formas de burlar os sistemas de proteção. Com isso, centros de pesquisa em todo o mundo se esforçam para criar métodos de verificação que deem mais garantias aos usuários.

Um exemplo é o projeto em desenvolvimento no Instituto de Física de São Carlos, da Universidade de São Paulo (IFSC/USP). O professor João Paulo Lemos Escola, tecnólogo em informática, decidiu aprimorar o conhecimento já consolidado em biometria (processo de reconhecimento baseado em características fisiológicas ou comportamentais) para modernizar um dos mais antigos métodos de identificação: a assinatura.

A lógica por trás da técnica criada pelo brasileiro é simples. Algumas características da escrita de uma pessoa não são impressas apenas no papel. O padrão de som que a caneta gera ao entrar em contato com a folha, por exemplo, é único em cada rubrica. A partir daí, João Paulo teve a ideia de desenvolver um sistema que pudesse atestar a veracidade de uma assinatura a partir dos ruídos que ela promove. O método poderá ser útil no reconhecimento de clientes de bancos e cartórios, por exemplo.

Desde 2007, o grupo de pesquisa do especialista, que é professor efetivo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, estuda atividades relacionadas ao processamento de áudio. A equipe se concentra, especialmente, em Wavelet, uma técnica que permite converter sinais do domínio do tempo, como uma música, em sinais de frequência.

O conhecimento acumulado nesse tempo permitiu que os cientistas coletassem as frequências mais importantes do som da escrita e as transferissem para o computador. Para isso, o primeiro passo foi incorporar um microfone a uma caneta esferográfica comum para capturar os ruídos de uma assinatura. Os sinais de áudio são, então, processados por softwares que convertem a informação em dados a serem interpretados pelo sistema. “O ruído da escrita de cada indivíduo será sempre parecido, ainda que tenha algumas oscilações. O que generaliza essas informações é o software. Ele informa a probabilidade de uma assinatura pertencer ou não à pessoa a partir da análise dos padrões que ela tem na hora de escrever”, descreve João Paulo.

Intervalos O grau de sucesso na validação da assinatura depende de um algoritmo combinado a uma técnica chamada Máquina de Vetor de Suporte (SVM) – sistema computacional que analisa dados e reconhece padrões. O modelo foi treinado para “aprender” os traços de cada uma das quatro pessoas que forneceram assinaturas reais para o experimento. Esse aprendizado só foi possível porque o protótipo analisa as informações com uma rede neural artificial (RNA), um programa de computador inspirado no sistema nervoso de seres vivos. Portanto, assim como ocorre no cérebro humano, as RNAs conseguem adquirir e administrar conhecimento.

O áudio repassado para o cérebro virtual é salvo no computador em formato WAV, modelo mais simples de armazenamento de amostras digitalizadas de áudio. Ele permite que os pesquisadores dividam a faixa de frequências audíveis pelo ouvido humano em 25 intervalos, chamados de bandas críticas. Quando são captados simultaneamente dois ou mais sons de frequências diferentes, mas pertencentes à mesma banda crítica, o de maior amplitude mascara qualquer outro áudio de amplitude menor. Esses padrões emitidos pela escrita das assinaturas são “aprendidos” pela rede neural, e é ela a responsável por diferenciar os indivíduos que estão no sistema daqueles que não estão. Isso significa que a técnica não acusa a assinatura errada, apenas a certa.

“Por isso, a política da instituição deve ser de analisar se o indivíduo é mesmo quem diz ser, pois, se ele não pertence à base, o sistema não tem como saber”, afirma o autor. João Paulo Escola estima que a técnica não será cara caso chegue a ser comercializada, porque utiliza uma caneta comum com um microfone de eletreto embutido. Tudo isso custa menos de R$ 1. “Se você somar isso a 1 metro de cabo de áudio e um conector P2, vai ter um custo de produção de menos de R$ 5 para cada caneta”, calcula o pesquisador.

O próximo passo da pesquisa, segundo o autor, é a implementação de novas funções à caneta, como a captura da imagem da assinatura. Além disso, outra possibilidade é a inclusão de um sensor de impressão digital na caneta. Ele permitirá que a imagem da caligrafia e da impressão digital do usuário sejam registradas simultaneamente, uma combinação que deve melhorar o índice de acerto.


Eficiência Do jeito que está, a caneta acertou em 90% das vezes que foi utilizada. A marca ainda não é suficiente para proteger bancos e cartórios, diz Carlos Maziero, coordenador do Programa de Pós-Graduação em Computação Aplicada da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). Ele destaca que o trabalho é interessante, mas pontua que o índice de acerto precisa ser o mais próximo possível de 100%. “Isso depende do que você quer proteger. Por exemplo, se um prédio público deixa um estranho a cada 100 entrar, então há 99% de acertos, e esse valor é razoável para esse caso. Mas, se for uma conta de banco, não dá para ter menos do que 100%”, alerta. Maziero, que não participou do estudo, ressalta que a pesquisa está no caminho certo, porque a biometria é considerada, hoje, a técnica de proteção mais eficiente, especialmente a de reconhecimento de retina, que identifica os padrões do sistema circulatório do fundo do olho.

Por ser complexo e caro, esse método está disponível apenas para grandes empresas. Isso faz com que projetos como os de João Paulo Escola sejam importantes para ampliar o uso da biometria nos sistemas de segurança. Até porque, diz Maziero, as operações que utilizam login e senha estão perdendo espaço para novas tecnologias por serem frágeis e facilmente decifradas. “As autenticações multifatores, aquelas que utilizam vários métodos de uma vez, ganharão cada vez mais força”, aposta o especialista.

Três perguntas para...
Eudes da Silva Barboza, analista de Tecnologia da Informação e professor do Instituto Federal de Pernambuco (IFPE)

O sistema de segurança por senhas está ficando cada vez mais frágil. O que podemos esperar desse tipo de tecnologia?
Os meios de autenticação por senha estão, sim, mais frágeis. É evidente que o meio de autenticação convencional por senha terá que ser transformado, ou melhor, substituído por alguma outra forma de autenticação.

Existe algum dispositivo capaz de oferecer 100% de segurança?
Por mais que se invista em segurança da informação, não existe sistema perfeito. A pesquisa de João Paulo Escola segue uma linha inovadora na área de biometria por manuscrito e pode ser implementada em qualquer sistema de autenticação por se tratar de um meio de reconhecimento não invasivo. Agora, vale salientar que, como qualquer sistema de autenticação, esse terá de conter, no mínimo, dois fatores de verificação para ser validado. O problema é que as melhores técnicas de reconhecimento de indivíduo, como o caso de biometria de DNA ou por íris, são tecnologias caras, muito invasivas e até desconfortáveis para o usuário.

O que podemos fazer para nos proteger?
Eu recomendo a todos que necessitam realizar transações eletrônicas de valores pela internet ou telefone que utilizem dispositivos criptográficos (e-token, cartões inteligentes etc.), para garantir a confiabilidade, a integridade e a disponibilidade nos serviços bancários. Também que o usuário obtenha um bom antivírus e tome certas precauções, como não abrir qualquer tipo de e-mail nem instalar softwares gratuitos e piratas que precisam de crackers (software usado para quebrar um sistema de segurança qualquer). 

Rosácea não é apenas rubor na pele‏

Rosácea não é apenas rubor na pele
 
Doença similar à acne é problema crônico, devendo ser tratado com orientação médica. Exercícios físicos, temperaturas extremas, cosméticos e estresse podem contribuir para sua manifestação 
 
Márcia Maria Cruz*
Estado de Minas: 14/05/2014


Santiago (Chile) – Uma vermelhidão permanente na face pode indicar um problema crônico. Apesar de muitas pessoas considerarem uma simples irritação, o rubro pode ser sinal da rosácea, uma doença de pele crônica e inflamatória da face. O diagnóstico e tratamento da rosácea foram alguns dos temas discutidos durante a Reunião de Dermatologistas Latinoamericanos (Radla 2014), que ocorreu em Santiago, no início do mês. Estima-se que mais de 40 milhões de pessoas em todo o mundo tenha eritema (vermelhidão) facial de rosácea. “É uma doença que não tem cura, mas que pode ser controlada”, afirma a dermatologista Alessandra Nogueira, da Sociedade Brasileira de Dermatologia, que participou do congresso.

A doença se manifesta tanto em homens como em mulheres, com maior frequência entre os 30 e 50 anos. Embora seja mais comum em peles claras, acomete pessoas com as mais diferentes tonalidades. “Muitos acreditam que a rosácea não atinge a pele negra, mas não é verdade. O eritema também pode se manifestar em peles mais escuras”, afirma o médico Firas George Hougeir, especialista que também participou do congresso.

Os médicos tentam melhorar a divulgação sobre a doença e as formas de tratamento, porque ainda há uma subnotificação do problema. De acordo com Walter Gubelin, da Universidade dos Andes, apenas 10% dos pacientes são diagnosticados e tratam a rosácea. Muitas pessoas não fazem o tratamento correto, porque confundem a rosácea com quadros inflamatórios ocasionados por acnes. No entanto, são problemas distintos e também com tratamentos diferenciados.

Não se sabe ao certo quais são as causas da rosácea, mas é necessária uma predisposição genética para que ocorra. Alimentos apimentados e bebidas podem potencializar seu aparecimento. A prática de exercícios físicos, temperaturas extremas, cosméticos e o estresse também podem desencadear os eritemas. Para as pessoas com predisposição genética, a mudança em alguns hábitos pode evitar o início de crises. Alimentos apimentados devem ser cortados na dieta, é preciso evitar o estresse, alguns exercícios físicos, cigarros e bebidas alcoólicas não devem ser consumidos.

De acordo com Firas, a vermelhidão aparece porque alguns alimentos, a luz solar e temperaturas extremas contribuem para a dilatação dos vasos sanguíneos da face. A literatura científica descreve quatro tipos de rosácea: a eritematosa, que causa a vermelhidão; a inflamatória pápulo pustulosa que, além da vermelhidão, apresenta inflamações; a ocular, que acomete as vistas; e a granulomatosa, com quadros inflamatórios mais graves. A de maior frequência é a inflamatória pápulo pustulosa.

PESQUISA Os principais efeitos da rosácea estão relacionados ao desconforto e às dificuldades no convívio social. Cerca de 40% dos pacientes evitam se expor, de acordo com pesquisa da Sociedade Nacional de Rosácea nos Estados Unidos. Cerca de 60% acreditam que a doença afeta negativamente sua vida profissional. Mais de 76% dos entrevistados disseram que a rosácea diminuía sua autoestima. Cerca de 50% já faltaram ao trabalho por conta dos sintomas graves da doença. O desconforto se deve ao fato de a rosácea tornar a pele mais sensível e ‘atacar’ bochechas, nariz, queixo, testa e, às vezes, os olhos.

O tratamento clássico é feito com retinoides (géis e cremes com metronizadol ou ácido azelaico e anti-inflamatório à base de doxiciclina). No entanto, um produto à base do tartarato de brimonidina promete reduzir a vermelhidão em 30 minutos. O medicamento atua diretamente nos vasos sanguíneos dilatados, fazendo com que haja uma vasoconstrição. “Existem cosméticos, mas esse é o primeiro medicamento para o tratamento da vermelhidão com alta efetividade”, afirma Alessandra. O tartarato age nos receptores dos vasos capilares da face e promove uma constrição, em outras palavras, uma redução na dilatação, fazendo com que os vasos voltem à função normal.

O medicamento já foi aprovado pela FDA (Food and Drug Administration), órgão governamental dos Estados Unidos que regula alimentos e medicamentos. Ainda não é comercializado no Brasil, embora já tenha sido iniciado o processo de avaliação  para sua liberação. “O tartarato de brimonidina tópico foi bem tolerado mesmo na presença de terapias concomitantes para as lesões inflamatórias das rosáceas”, afirma Firas. Como ele trata apenas a vermelhidão, em casos em que há quadros inflamatórios é preciso um tratamento combinado.

CONfusão A rosácea é um problema de pele diferente da acne, que caracteriza-se por uma aumento na produção de sebo nos poros e a disfunção das células do folículo piloso (estrutura na derme, onde é produzido o pelo). Muitas vezes, as acnes também geram processos inflamatórios, o que faz com que haja confusão com as rosáceas. Mais comum, a acne afeta cerca de 650 milhões de pessoas no mundo. Cerca de 85% dos adolescentes terão acne em algum momento. “As rosáceas inflamatórias podem ser confundidas com acnes, mas são doenças diferentes”, pontua a dermatologista Alessandra Nogueira.

As incômodas espinhas costumam aparecer na adolescência, mas podem se manifestar em outros períodos da vida. Nas mulheres, é comum a acne surgir durante o período pré-menstrual. Diferentemente da rosácea que se manifesta em eritemas, a acne apresenta pontos brancos e negros. Ela pode aparecer em outras partes do corpo, enquanto a rosácea só se manifesta na face.

Durante o Radla, a médica Patrícia Troielli, da Faculdade de Buenos Aires, fez uma alerta para a aplicação excessiva de antibióticos para o tratamento de acnes. Segundo a médica, as bactérias estão se tornando cada vez mais resistentes ao medicamento, o que já preocupa especialistas no mundo todo. “O abuso de antibióticos está se manifestando cada vez mais na dermatologia. Na terapia de acne, o uso generalizado de antibiótico, principalmente os tópicos, provocou maior prevalência de cepas resistentes”, afirmou a médica.

A repórter viajou a convite da Galderma.

Dores do frio - Anna Marina

Estado de Minas: 14/05/2014 



Frio chegando e corpo doendo. Acontece quase sempre e a dor, difusa, é difícil de identificar sem ajuda médica. Essa canseira se chama fibromialgia e é uma síndrome clínica, crônica, caracterizada por dor difusa e outros sintomas associados, principalmente fadiga (cansaço), sono não reparador, alteração de memória e concentração. De cada 10 pacientes com fibromialgia, de sete a nove são mulheres. Não se sabe a razão pela qual isso acontece. Não parece haver uma relação com hormônios, pois a fibromialgia afeta as mulheres tanto antes quanto depois da menopausa. Talvez os critérios utilizados hoje no diagnóstico da fibromialgia tendam a incluir mais mulheres. A idade de aparecimento da síndrome é, geralmente, entre os 30 e 60 anos. Porém, existem casos em pessoas mais velhas e também em crianças e adolescentes.

Ela foi classificada como doença reumática em 1990, quando foram lançados os critérios de diagnósticos que até hoje são utilizados pelo Colégio Americano de Reumatologia. A síndrome é associada à sensibilidade diante de um estímulo doloroso, que é descrito por pacientes como dores pelo corpo todo. Com linguagem bastante simples e de fácil compreensão, a cartilha educativa desenvolvida pelos reumatologistas da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), que tem como objetivo conscientizar sobre a doença e levar o paciente ao diagnóstico e tratamento com mais rapidez, está disponível para download ou pode ser encontrada nas unidades públicas de saúde.

Para o coordenador da Comissão de Dor, Fibromialgia e outras Síndromes Dolorosas de Partes Moles da Sociedade Brasileira de Reumatologia, o reumatologista Marcelo Cruz Rezende, existe uma associação muito forte com o aspecto psicológico, com quadros depressivos e ansiedade, mas não é possível afirmar que se trata somente de fundo emocional. “Hoje, sabemos que é um distúrbio relacionado à alteração nos sistemas de controle de dor, devendo ser considerado como síndrome de amplificação dolorosa.” O especialista explica ainda que a fibromialgia pode ter patologias associadas, como tendinites, bursites e neuropatias, entre outras, que podem ser detectadas por métodos complementares. Como raio-x e ultrassonografia.

O diagnóstico é eminentemente clínico. Em 2010, foram lançados novos critérios critérios, retirando a necessidade da contagem de pontos dolorosos e colocando um índice de dor generalizado e de grau de severidade de sintomas, mas que ainda estão sendo questionados pelos especialistas. Não existem exames complementares que ajudem na identificação da fibromialgia, somente para diagnósticos diferenciais e de patologias associadas.

Por se tratar de uma condição médica crônica, ela não tem cura. “Existe um controle da sintomatologia. Entretanto, pode ser confortador saber que a fibromialgia é uma doença benigna”, destaca Resende. Existem várias medicações com fortes evidências científicas que melhoram os sintomas da fibromialgia, como a amitriptilina. Fluoxetina, duloxetina e pregabalina são algumas substâncias utilizadas para o controle de dor, ansiedade e depressão. Para distúrbio de sono, a própria amitriptilina e o uso de alguns benzodiazepínicos podem ajudar. Existem alguns trabalhos isolados sobre o uso de ritalina para fadiga.

A fibromialgia é um problema bastante comum, presente em pelo menos 5% dos pacientes que vão a um consultório de clínica médica e em 10% a 15% dos pacientes que vão a um consultório de reumatologia. A maior dificuldade a respeito do diagnóstico e do tratamento da síndrome está no desconhecimento da doença pelas várias especialidades médicas, pois elas não consideram os critérios necessários para diagnóstico.