quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

MARTHA MEDEIROS - Amores ideais

Zero Hora - 19/02/2014

No filme A Garota Ideal, de 2007, o ator Ryan Gosling vive um cara tímido e introspectivo que compra uma boneca inflável, dá a ela o nome de Bianca e começa a tratá-la como a uma namorada de verdade. Cega, surda e muda, mas com um corpo, ele a leva para passear e a apresenta aos colegas, deixando todos perplexos com esse delírio.

Em determinada cena, uma vizinha, entrando no jogo do rapaz, presenteia a “namorada” dele com flores de plástico, deixando-o comovido: as flores durariam para sempre, como Bianca. Em sua cabeça, ele havia conquistado uma relação eterna, à prova de realidade.

Corta para o excelente Ela, filme em cartaz com Joaquin Phoenix vivendo um recém-divorciado que, solitário e carente, se apaixona pela voz de um sistema operacional – outro absurdo, mas é isso mesmo que acontece: ele fala com um smartphone através de um serviço de inteligência artificial que faz parecer que há, de fato, uma pessoa real batendo papo com o cara.

Dessa vez, não há um corpo, mas há uma voz feminina que pergunta, responde, conversa, faz declarações de amor, discute a relação, faz sexo por telefone, dá toda a pinta de que é humana – só que é outra “garota ideal” que não existe.

Em ambos os filmes, os protagonistas tratam as suplentes como gente: um leva a boneca para as refeições à mesa com a família, o outro leva o aparelho tagarela para um piquenique com um casal de amigos. A diferença entre os filmes é que, no primeiro, todos ao redor estão conscientes de que aquela maluquice é um caso isolado. Já em Ela, a situação é considerada normal, corriqueira até. Não duvide: em muito pouco tempo, estaremos namorando smartphones e quiçá casando com eles.

Se, no primeiro filme, o protagonista é um desajustado, no segundo é um homem sensível, romântico, que está apenas atravessando uma fossa e encontra na tecnologia uma forma aparentemente menos sofrida de se relacionar. Porém, havendo idealização, sempre haverá a dor da perda – mesmo entre um homem e uma máquina. A única forma de manter uma relação sem brigas, ciúmes e desencantos é não se envolvendo emocionalmente. Ou seja: quem almeja um romance perfeito, que abrace de vez a solidão, a única candidata à altura do projeto.

Parece ficção científica, mas o relacionamento entre pessoas reais e virtuais, que já acontece, não demora será convencional. Esse futuro está logo ali, dobrando a esquina. O artificial e o verdadeiro estão cada vez mais próximos e parecidos. Enquanto isso, o melhor é continuarmos nos virando com amores onde há cheiro, toque, pele, e que brotam e murcham, dois processos naturais da vida orgânica. Ao menos, poderemos guardar deles a lembrança das mãos que acariciaram nossos cabelos e dos beijos de boa noite.

O dia que um smartphone também fizer isso, eu caso.

Marina Colasanti - Com notas de pé de página‏

Com notas de pé de página 
 
Marina Colasanti - marinacolasanti.s@gmail.com
Estado de Minas: 20/02/2014


Caçadores de obras-primas não é um grande filme, mas conta uma grande história, mais interessante porque real. Eu o vi cheia de anotações de pé de página, porque, como quem entra na sala de projeção portando aquele copázio de pipocas, sentei na minha poltrona levando três visões complementares.

Poucos dias antes havia visto Matt Damon, George Clooney e Jean Dujardin sendo entrevistados na televisão italiana. Não caçavam obras de arte, promoviam o lançamento, e o faziam com o charme que já conhecemos. Clooney, diretor do filme, praticamente não tocou no conteúdo dramático daquele episódio da Segunda Guerra. Talvez por estar na Itália, antiga aliada da Alemanha, preferiu conduzir a conversa com leveza, falar da amizade do grupo, de seu entrosamento. E, em resposta a uma pergunta do entrevistador, contou que, recentemente, em sua vila no Lago de Como, havia recebido um telefonema de Bill Murray – ator imprevisível e outro dos caçadores –, dizendo que estava no aeroporto de Milão, podia mandar buscá-lo? Recolhido, instalou-se na vila e, sem que nenhum convite tivesse sido formulado, ali ficou serenamente por duas semanas.
Vendo o filme, diante de um Murray fardado em meio à lama e às explosões do combate, eu o desdobrava, imaginando-o deitado numa espreguiçadeira à beira do lago que tão bem conheço, tomando campari. Mas é certo que tomasse uísque.

Bem mais dramática era a outra visão que me habitava. Dois dias antes, por pura coincidência, havia visto um documentário brilhante sobre a paixão de Hitler por arte. Filmes de época, feitos certamente com intuito propagandístico, o mostram percorrendo as grandes exposições realizadas em Munique e Berlim. Comprador compulsivo, de cada exposição adquiria centenas de obras para a sua coleção pessoal. Era o começo da sua decisão de construir em Linz, sua cidade natal na Áustria, o maior e mais importante museu do Ocidente. Cenas o mostram ao lado do arquiteto Albert Speer, examinando projetos, e mais tarde maquetes dessa construção gloriosa. Tão gloriosa, que deveria ser construída pensando nas ruínas que séculos mais tarde ofereceria ao mundo, mais imponentes que as da Roma imperial. Para preencher esse futuro museu, Hitler ordenou a razzia de obras de arte.

No documentário, a cena mais surpreendente é a da primeira visita do Führer à Paris ocupada. Seis horas da manhã, ruas desertas, o jipe para diante da Opera. Ele desce, percorre tudo, e estranha a ausência de uma antessala que havia sido suprimida em obra anterior: apaixonado por ópera, conhecia de cor a planta do teatro.

A terceira visão que foi comigo ao cinema é pessoal. Menina na Itália durante a guerra, via monumentos protegidos, as grandes colunas comemorativas de Roma envoltas em acolchoados e escoradas por estruturas metálicas. Naquela cidade que é um museu ao ar livre, muitas eram as ausências de que não me dava conta. Perto da casa da minha avó, passava frequentemente por uma praça chamada Das Tartarugas, com uma fonte no meio, mas nenhuma tartaruga que lhe justificasse o nome. Só anos depois do fim da guerra, quando os tesouros artísticos que haviam sido retirados e escondidos voltaram ao seu lugar, conheci as tartarugas e os quatro efebos de bronze que as sustentam acima da cuba de pedra.

TeVÊ

TV paga

Estado de Minas: 20/02/2014



 (MTV/Divulgação)
O príncipe da mpb

A proximidade do carnaval já está movimentando várias emissoras, como o Canal Brasil, que vem exibindo documentários temáticos que têm o samba como fio condutor. Para esta noite, a atração é Paulinho da Viola – Meu tempo é hoje (foto), às 19h. Dirigida por Izabel Jaguaribe, a produção traça um perfil da vida e obra do sambista, filho do violonista César Faria, integrante do lendário conjunto Época de Ouro. Portelense de coração, Paulinho da Viola é considerado herdeiro da tradição de Cartola, Candeia e Nelson Cavaquinho. É pouco?

Na Cultura, o destaque é
documentário sobre fado


Mais música na telinha. Na Cultura, às 22h, vai ao ar o documentário O fado – Uma nostalgia atlântica, que mostra a diversidade da música portuguesa como expressão da modernidade, com direito a depoimentos da cantora Misia e do grupo Madredeus, além de registros históricos da diva Amália Rodrigues. Mais tarde, às 23h30, Fernando Faro recebe o cantor Wanderley Cardoso no programa Ensaio.

Mais uma oportunidade
de conhecer James Joyce


Domingo foi o Arte 1. Hoje é a vez de o canal Curta! homenagear o romancista, contista e poeta irlandês James Joyce, um dos mais importantes nomes da literatura mundial no século 20. Às 23h, a série Grandes escritores vai narrar a trajetória do autor do clássico Ulisses, publicado em 1922. Entre outros trabalhos, Joyce escreveu também o volume de contos Dublinenses/Gente de Dublin (1914) e os romances Retrato do artista quando jovem (1916) e Finnegans wake (1939).

Futura promove debate
sobre epidemia do crack


Ainda no segmento dos documentários, o jornalismo do Canal Futura coloca a dependência química em pauta, debatendo não apenas o avanço do consumo de crack, mas as opções de tratamento oferecidas no Brasil. O primeiro programa, Além da dependência, de Cristiano Reckziegel, será exibido no Sala de notícias, às 14h35, com reprise às 21h. Já o Conexão Futura reúne especialista para discutir o assunto, com três entradas na programação, às 14h30, 14h50 e 15h25.

Série do SescTV analisa
o ciclo do cacau na Bahia


O cacau é o tema de hoje da série “Ciclos da terra”, do programa Coleções, às 21h30, no SescTV. Na cidade de Ilhéus, na Bahia, o documentário desvenda o ciclo de produção do cacau, suas especificidades, a crise do produto nos anos 1980 e a tentativa de retomar a região como polo de produção de chocolate.

Espiões brigam por causa
de loira. Mas que loiraça!


No pacotão de filmes, nenhum grande destaque, mas oportunas reprises, como a da comédia Guerra é guerra!, que mostra um triângulo amoroso formado por dois espiões que disputam o coração de uma bela loira, interpretada por ninguém menos que Reese Witherspoon, às 22h, no Telecine Touch. Ainda adolescente, Reese Witherspoon está também no suspense Medo, igualmente às 22h, na MGM. No mesmo horário, o assinante tem mais cinco boas opções: País do desejo, no Canal Brasil; 2012, no Sony Spin; Cold Mountain, no Studio Universal; As virgens suicidas, no Telecine Cult; e Cães de aluguel, no TCM. Outras atrações da programação: Nada em comum, às 21h, no Comedy Central; e Duro de matar 4.0, às 22h30, na Fox.


CARAS & BOCAS » Novas apostas
Simone Castro

Danilo Gentili é uma das estrelas do SBT anunciadas em evento concorrido em São Paulo (Lourival Ribeiro/SBT)
Danilo Gentili é uma das estrelas do SBT anunciadas em evento concorrido em São Paulo

O SBT anunciou, em coletiva de imprensa realizada na sede da emissora, em Osasco, São Paulo, as novidades da programação de 2014. O evento, bastante concorrido, reuniu os novos contratados da emissora, como Danilo Gentili e Otávio Mesquita. Em março, o primeiro estreia o aguardado talk show The noite, em que recebe entrevistados, discorre sobre os fatos mais e menos relevantes do dia, tudo com uma alta dose de humor. Também integram a atração Léo Lins, Murilo Couto e a assistente de palco Juliana, além do irreverente locutor Diguinho Coruja. A trilha sonora fica por conta da banda Ultraje a Rigor e o vocalista, Roger Moreira, não perde um comentário. A plateia também participa de quadros e concursos. A atração, que estreia em 10 de março, vai ao ar de segunda a sexta-feira, a partir da meia-noite. De volta ao SBT depois de 14 anos, Otávio Mesquita vai comandar o Okay pessoal, mesclando cultura, diversão, tecnologia, moda e informação. O título é um bordão conhecido do apresentador, que estará nas madrugadas do canal, a partir de abril. Ainda em março, vem aí o Arena SBT, que reunirá no programa dedicado ao esporte humor e muita música. Entre os apresentadores, o jornalista, atleta e comediante Smigol, além dos comentaristas Gavião e Edmílson. Aos sábados, às 23h15, a partir de 8 de março. Também em março, dia 9, vai estrear a segunda temporada do Menino de ouro, reality que mostra a paixão pelo futebol de garotos em busca de uma oportunidade para se tornar profissional. No ar aos domingos, às 10h. Sem data de estreia definida, o programa Esse artista sou eu, com formato da Endemol adquirido pelo SBT, é uma competição entre celebridades que precisam realizar performances semanais para imitar outros famosos, da caracterização a maneira de falar, cantar e até dançar. A apresentação é de Márcio Ballas. Ainda na grade: a quarta edição do SBT folia, com a cobertura do carnaval, a série nacional Águias da cidade e as séries importadas Dallas, Garoto de ouro, Arqueiro, Big bang, O diário de Carrie, O mentalista, Pessoa de interesse, Uma escolha de coração, Sam e Cat e Nikita.

GLOBO ECOLOGIA VAI AO
PARQUE DA CANTAREIRA


É para ver ou rever: O Globo cidadania deste sábado mostra reportagem sobre as florestas urbanas, ambientes essenciais para a manutenção da qualidade de vida nas grandes cidades. O Globo ecologia visita o Parque Estadual da Cantareira, em São Paulo, e o Parque Nacional da Tijuca, no Rio de Janeiro, para detalhar os benefícios das áreas verdes – que vão da regulação do clima a um papel fundamental no que diz respeito ao lazer.

CONCURSO DE DANÇA FICA
SÓ PARA DEPOIS DA COPA


“Dança dos famosos”, quadro do Domingão do Faustão (Globo), só entrará em cena no segundo semestre, depois da Copa do Mundo. Ainda não foram escalados os artistas participantes. Os que já estejam na reta final de um trabalho são os preferidos pela produção da atração. No ano passado, a atriz Carol Castro foi a vencedora.

POLÊMICA RENDE

O ator Carlos Vereza também se manifestou sobre a polêmica declaração que o ator Caio Castro deu em entrevista a Marília Gabriela, em sua atração no GNT (TV paga). Ele afirmou não gostar de teatro e de literatura, mas que lê por obrigação para estar “antenado” quando algum jornalista lhe fizer alguma pergunta. O curioso é que a entrevista, reprisada na semana passada, foi exibida em setembro do ano passado. Ao que parece, passou despercebida. Agora, vários atores criticaram as declarações de Caio. Ingrid Guimarães se disse espantada como alguns atores fazem da profissão um grande negócio. Pedro Paulo Rangel concordou e chegou a chamar Caio de anta, embora dissesse que não sabia de quem se tratava. Já Miguel Falabella se mostrou indignado: “Não é ator. É desinibido.” Mas Caio Castro contou com a “defesa” do veterano Carlos Vereza que, em um vídeo no YouTube, disse que é muito confortável massacrar Caio Castro e classifica a atitude de seus colegas críticos como “hipocrisia pura.” Mais: “Por que não culpar as televisões que incentivam as carinhas bonitas e sem conteúdo?” e “Caio e outros de sua geração fazem o jogo proposto pelo esquema das celebridades prét-à-porter... é isso aí Caio, parabéns por sua sinceridade. Agora, para os mais velhos: Retiro dos Artistas”, ironizou. Já Caio, antes das declarações de Vereza, já tinha se manifestado quanto à polêmica que levantou, via Instagram: “Falem oq falem, achem oq achem, sempre serei grato por vcs pela confiança, pela consideração, me colocaram aqui, confiaram no meu trabalho e eu to Feliz P Sempre”.

VIVAS
Tainá Müller, mais uma vez, mostra a que veio em composição na dose exata de sua personagem, Marina, na novela Em família (Globo). A parceria com Giovanna Antonelli já deu certo.

VAIAS
Viviane Pasmanter ainda não deu o ar da graça na trama de Em família. Como assim? Afinal, a personagem da atriz, a vilã Shirley, é uma das principais. Já passou da hora de estrear. 

Tereza Cruvinel - Desejos de mudança‏

Desejos de mudança 
 
Dilma segue favorita, apesar dos fortes sinais de insatisfação e desejo de mudança. Os candidatos de oposição não conseguiram, até agora, apropriar-se de tal sentimento 
 
Tereza Cruvinel
Estado de MInas: 20/02/2014


Nem o governo nem o PT soltaram fogos com a pesquisa CNT-MDA divulgada anteontem, mantendo a presidente Dilma Rousseff como favorita na disputa pelo Planalto, vencendo no primeiro turno se a eleição fosse hoje. E não apenas porque, contraditoriamente com esse indicativo eleitoral, a avaliação do governo oscilou negativamente, só ficando acima do fosso em que caiu após as manifestações de junho. Na parte menos lida e divulgada, a pesquisa traz uma profusão de sinais sobre a insatisfação e o desejo de mudança da população. Entretanto, Dilma segue favorita, porque os dois principais adversários, até agora, não conseguiram colar as candidaturas a esses sentimentos.

Dilma obtém na pesquisa 43,7% de intenções de voto. Está praticamente parada, tendo crescido apenas dois décimos percentuais em relação à última sondagem da série, em novembro. Nem por isso a oposição ganhou. O senador Aécio Neves (PSDB-MG) oscilou negativamente para 17% e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), para 9,9%. Outras razões explicam uma dinâmica tão paradoxal, como o baixíssimo interesse das pessoas pela disputa. E isso só vai mudar depois da Copa e com o início da campanha oficial. Outro fator também ajuda Dilma. Ela tem uma rejeição alta, de 37,3%, mas Aécio não fica muito atrás, com 36%, e Campos, com 35,5%. Isso mais a vida deles, que precisam crescer para alcançá-la.

Mas muito abaixo dessas tendências estão as disposições e os sentimentos mais profundos da população, ainda não traduzidos em inclinações eleitorais sólidas. A maioria é pessimista em relação a quase tudo: 77,2% acham que o custo de vida aumentou e 71,8% temem que continuará aumentando este ano. Destacaram o alto custo dos alimentos e das tarifas. Algum otimismo existe em relação ao emprego, que, para a maioria (36,7%), vai melhorar, contra 20,7% que acreditam em piora. Os números são semelhantes em relação à educação e à renda, mas a maioria (33,7%) crê em piora na segurança, contra 27% que acreditam na melhora. Aqui, a conta é compartilhada com os governadores. A maioria acredita também em piora na saúde.

O sentimento em relação à Copa é o pior possível: 75,8% consideram que os investimentos foram desnecessários, 80,2% reprovam os gastos com estádios, 66,6% não acreditam que as obras de mobilidade urbana ficarão prontas antes do evento e 85,4% acham que haverá protestos durante os jogos. Paradoxalmente, mais de 50% aprovam a realização da Copa no Brasil. Em relação a esses pontos, especialmente aos gastos, há muita desinformação, que o governo corre para superar, com ações mais eficientes de comunicação.

Agora, direto ao ponto da política: mais de um terço dos entrevistados (32%) não está com o menor interesse na eleição. Apenas 15%, muito interessados. Para a grande maioria, 37,2%, o próximo presidente precisa mudar completamente a forma de governar, 25% querem muitas mudanças, conservando algumas ações, e 23,1%, o inverso. Apenas 12,1% preferem que nada mude. Teoricamente, seria esse o eleitorado de Dilma, mas ela é preferida por 43,5%. No curso do processo, um dos oposicionistas convencerá os eleitores de que representa a mudança. Se isso não acontecer, Dilma será reeleita, mas terá que acenar com mudanças para poder continuar. Seria algo como “mudar com Dilma”. O problema é que, na atual conjuntura, não basta prometer. Em tudo, é preciso convencer.

Comoção no PSDB
A renúncia do agora ex-deputado Eduardo Azeredo, réu na Ação Penal 536, comoveu o PSDB e abalou a saúde dele, impedindo-o de anunciar a decisão, tomada para evitar constrangimentos ao partido e à Câmara. O mais candente discurso foi o do presidente do PDSB mineiro, deputado Marcus Pestana, que falou de sua trajetória e honradez, do papel de seu pai, Renato Azeredo, arqueiro de Tancredo Neves, na política de Minas, da ausência de provas contra ele. Como governador, não tratou pessoalmente das finanças de sua campanha à reeleição em 1998. Em mais de uma passagem, tratou de apontar diferenças com o chamado mensalão do PT e a conduta que Azeredo e o PSDB adotarão. Uma das carapuças. “Não esperem de um mineiro sereno como Eduardo Azeredo atitudes agressivas, punhos cerrados ao ar, cenas ou gestos provocativos e de confrontação com as instituições democráticas.”

É mesmo triste ver uma figura como Azeredo no banco dos réus. Acompanhei sua atuação como prefeito, governador, senador e deputado. Veremos ainda tragédias semelhantes atingirem outras figuras e outros partidos, por conta do maccartismo udenista engendrado para atingir o PT, que envenenou a sociedade contra a política. O PT, que no passado seguiu esse credo, parece ter aprendido. Ali, não se ouviu palavra de regozijo. Com essa nova ação penal, vamos descer mais, como já dito aqui, rumo ao poço escuro da descrença nas instituições da democracia.

Se Pernambuco deixar…
O senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) desconcertou colegas ontem ao anunciar, à queima-roupa, que não disputará a reeleição nem será candidato à Câmara, como já noticiado, puxando votos para a eleição de uma grande coligação ligada a Eduardo Campos. E assim decidiu, não por dificuldades eleitorais, mas por razões subjetivas: depois de tantos anos, e de ter ocupado tantos cargos, o desencanto tomou o lugar da paixão em sua relação com a política. Ouviu, entretanto, mais de uma voz dizer: Pernambuco não deixará que isso aconteça. 

Eterno carnaval - Kiko Ferreira

Eterno carnaval 
 
Há mais de 40 anos na estrada, Maria Alcina lança disco com repertório que junta canções antigas e inéditas de Arnaldo Antunes, Zeca Baleiro, Karina Buhr e Péricles Cavalcanti 


Kiko Ferreira
Estado de Minas: 20/02/2014


Maria Alcina levou dois anos para concluir este álbum, que sai pelo selo Nova Estação, de Thiago Marques Luiz  (Jardiel Carvalho/Divulgação )
Maria Alcina levou dois anos para concluir este álbum, que sai pelo selo Nova Estação, de Thiago Marques Luiz

A cantora Maria Alcina fará 65 anos em abril. Mas continua uma intérprete vigorosa, irreverente e original, como na estreia, em 1972, cantando Fio Maravilha, de Jorge Benjor. Há dois anos, para comemorar as quatro décadas de carreira, ela e o produtor Thiago Marques Luiz começaram a gravar o disco De normal (bastam os outros), lançado agora pelo selo do próprio Thiago, Nova Estação.

Como toda boa festa, o disco mescla memórias marcantes com novidades. São 13 músicas distribuídas em 12 faixas. Só quatro delas inéditas. A primeira, Eu sou Alcina, de Zeca Baleiro, representa bem a personalidade da mineira de Cataguases, traduzida como sapeca, moleca, altiva, ativa, montada e ladina, uma “safada fada fadada/ a ser o que eu sou”. A faixa De normal, de onde saiu o título do CD, é de Arnaldo Antunes, segue linha semelhante e defende o estilo inusitado da figura Alcina. Cocadinha de sal, tema menos inspirado de Karina Buhr, tem melhor forma que conteúdo. E a marchinha Dionísio, deus do vinho e do prazer, de Péricles Cavalcanti, soa como uma mistura de Jorge Mautner e Zé Celso Martinez Corrêa.

Aliás, uma mescla óbvia de estilos, que já deveria ter acontecido há tempos, finalmente se concretiza. Alcina encontra Ney Matogrosso numa das melhores faixas, uma leitura refrescante do clássico Bigorrilho (Sebastião Gomes, Paquito e Romeu Gentil), samba com DNA de coco que foi sucesso na voz de Jorge Veiga. Outro standard, Segura esse samba, de Oswaldo Nunes, também ressurge em interpretação mais do que convincente, incluindo trecho de Dondoca, de Adoniran Barbosa. E o baião Não se avexe não, de Chico Anysio e Haydee de Paula, ganha tempero superior ao da gravação original de Dolores Duran.

Na linha de letras maliciosas de duplo sentido, que ela consagrou em músicas como Prenda o Tadeu e É mais embaixo, aparece Concurso de bicho, com presença de uma das autoras, Anastácia. E o carimbó Fogo da morena, do paraense Felipe Cordeiro, assim como Nhem nhem nhem, de Totonho, reafirma o diálogo da cantora com as novas gerações, explicitado no ótimo disco que ela gravou há 10 anos com o grupo Bojo.

A dupla João Bosco & Aldir Blanc, de quem ela chegou a gravar quatro faixas num só disco (incluindo o hit Kid Cavaquinho), reaparece num tema pouco conhecido, da safra dos anos 1990, O chefão. Mesmo habituada aos dribles e maldades das letras de Blanc, Alcina soa um pouco sem cintura na faixa. Situação semelhante ao da música Sem vergonha, de Jorge Benjor, que ela mesma já havia gravado em 1992. Apesar de ter sido um presente do Babulina, não está no rol de sua melhor safra.

Sucessor do álbum Maria Alcina, confete e serpentina, de 2009, De normal (bastam os outros) é um bom suporte para celebrar os 40 anos de vida artística da mineira. É prova inconteste de que ela tem uma qualidade rara numa época de poucos riscos: estilo. E sugere que um show dela com Ney Matogrosso seria, no mínimo, sensacional.

Eduardo Almeida Reis - Férias‏

Férias 
 
Quem não gosta do que faz deve trocar de emprego; quem gosta não precisa de férias 
 
Eduardo Almeida Reis
Publicação: 20/02/2014 04:00




Não foi uma nem duas vezes: já lhe disse um sem conto de vezes que no país dos meus sonhos ninguém tiraria férias. Quem não gosta do que faz deve trocar de emprego; quem gosta não precisa de férias. Custam dinheiro, cansam, exigem dois meses de recuperação. No tal país com que sonho, as férias seriam substituídas pelas licenças remuneradas sempre que o trabalhador tivesse necessidade de se ausentar por um ou mais dias. Todos vimos o que ocorreu em 2014 com o meu amigo Jaeci Carvalho. Passou férias em Miami e voltou com raiva do nosso belo país, superiormente dirigido pela mineira Dilma Rousseff. Diz que a Copa será vencida pela Alemanha ou pela Argentina, que os gastos, a ladroeira e a incompetência continuam os mesmos, quando é sabido que o Brasil é modelo no concerto das nações que não têm conserto. O noticiário deu para implicar com a Atenas Brasileira, a Ilha do Amor, a Cidade dos Azulejos, a Jamaica Brasileira, a Capital Brasileira do Reggae, habitada pelos ludo-vicenses, só porque alguns presos no Complexo Penitenciário de Pedrinhas andaram decapitando companheiros apenados. Consequência, como foi explicado pela ilustre governadora Roseana Sarney, do enriquecimento do povo maranhense. Diante da notícia de que o ex-deputado Carlos Rodrigues, o notório Bispo Rodrigues, preso na Papuda, anda distribuindo bênçãos pelos apenados, talvez fosse o caso de engaiolar em Pedrinhas uns 10 bispos, dos mais conhecidos, famosos e ricos. De bênção em bênção, alternadas com intenso decapitar, o Brasil só poderia melhorar para alegria do jornalista Jaeci Carvalho e minha, valha a informação.

Consciência

Barão de Itararé, como é do conhecimento quase geral, foi o pseudônimo do gaúcho Apparício Fernando de Brinkerhoff Torelly (1895-1971). Conheci o imenso humorista, velhinho, de carona no carro de um amigo que o deixou em casa. Entre o Centro do Rio de Janeiro e Copacabana, Apparício, longa barba branca, foi contando piadas sem parar. É dele a frase: “A alma humana, como os bolsos da batina de padre, tem mistérios insondáveis”. Acabo de confirmar os mistérios insondáveis da alma humana, diante de um fato ocorrido dia desses: roubaram a mochila da filha de minha operadora de forno e fogão, universitária, estudiosa, de 20 anos, a caminho da Universidade Federal de Juiz de Fora. Mochila com “tudo” dentro: documentos, celular, cadernos de anotações, laptop. Dois ladrões do gênero pé de chinelo, um encapuzado, outro de focinho exposto, muita gente no ponto do ônibus, muita gente andando pela calçada. Ninguém fez nada, a não ser uma senhora, que levava sua filha para a UFJF, parou o carro, deu marcha à ré, embarcou a mocinha, levou-a para sua casa. Telefonou para a operadora de f&f contando o caso, a universitária não parava de chorar, e lhe deu R$ 100 para tomar um táxi e voltar para casa. Boa senhora, que, três dias depois, convidada para almoçar, teve a seu pedido um frango caipira com quiabo preparado pela operadora, cozinheira excepcional. O laptop já era; o celular e a mochila, idem. Havia a chatura imensa de providenciar todos os documentos, depois que o cartão de crédito foi sustado pelo banco. Aí entrou a consciência dos ladrões pé de chinelo: todos os documentos foram jogados num lugar visível, alguém os encontrou e deixou na sede regional dos Correios. Podiam queimar os documentos ou jogar num bueiro que em não seriam encontrados. Celular velho com novo chip, laptop a mocinha compra outro. Se o patrão da operadora não estivesse apertado, compraria um Sony Vaio no cartão. Gostei da consciência da dupla pé de chinelo, inexistente entre os ladrões do dinheiro público, que desviam milhões de vezes mais que um laptop e um celular.

O mundo é uma bola

20 de fevereiro de 1255: o rei Afonso III, de Portugal, doa os castelos de Ayamonte e Cacela a dom Paio Peres Corrêa, Mestre da Ordem de Santiago. Em 1547, Eduardo VI é coroado rei da Inglaterra. Tinha nove anos de idade. Era filho de Henrique VIII e de Joana Seymour, parente por parte de mãe do responsável pela coluna Tiro e Queda. Tuberculoso, o primo morreu em 1553. Em 1725, na colônia de New Hampshire, primeiro caso registrado de um índio escalpelado por um branco. Em 1777, chegada à Enseada de Canavieiras (Santa Catarina) de uma esquadra castelhana com 11 mil homens dispostos a recuperar aquela parte do sul brasileiro. Em 1832, Charles Darwin visita Fernando de Noronha – dizem que o arquipélago é muito bonito. Em 1941, os nazistas enviam o primeiro grupo de judeus para os campos de concentração. Em 1941, criação no Brasil do Correio Aéreo Nacional. Em 1962, num foguete Atlas, o astronauta John Glenn faz o primeiro voo orbital norte-americano. Em 2006, o historiador britânico David Irving é condenado por um tribunal austríaco a três anos de prisão por ter negado o Holocausto durante a Segunda Guerra Mundial. Em 1970 morreu Café Filho, 26º presidente do Brasil..

Ruminanças

“Devo tanto que, se eu chamar alguém de ‘meu bem’, o banco me toma” (Apparício Fernando de Brinkerhoff Torelly, o barão de Itararé, 1895-1971).

Big brother do Facebook - Fátima Soares Rodrigues

Big brother do Facebook
Com as redes sociais, o privado já é mais do que público
Luciana Carvalho
Psicanalista, terapeuta bioenergética, historiadora

Fátima Soares Rodrigues
Escritora
Estado de Minas: 20/02/2014


Em 5 de fevereiro, a professora universitária e diretora da Coordenação Central de Cooperação Internacional da PUC Rio, Rosa Marina Meyer, publicou uma imagem em seu perfil, no Facebook, em que aparece um homem vestido com camiseta regata e bermuda lanchando antes do embarque no Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro. Na legenda, uma pergunta irônica: “aeroporto ou rodoviária?”. O reitor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), Luiz Pedro Jutuca, doutor em matemática, comentou: “O glamour foi pro espaço”. Rosa respondeu: “Para glamour falta muito! Está mais para estiva!”. Logo abaixo, a professora de português para estrangeiros completa: “O pior é que o Mr. Rodoviária está no meu voo! Ao menos, não do meu lado! Ufa!”. Outra professora da PUC Rio, também de letras, Daniela T. Vargas, também comenta: “O pior é quando esse tipo de passageiro senta exatamente do seu lado e fica roçando o braço peludo no seu, porque – claro – não respeita (ou não cabe) nos limites do assento”.

A postagem da foto e os comentários chegaram à página do Facebook da Dilma bolada, que divulgou e obteve mais de 6,5 mil visualizações. Indignadas, várias pessoas condenaram a atitude da professora e dos comentários do reitor e da professora da área de letras, afinal, professor é formador de opinião. É fato que as redes sociais tornaram possível a aproximação de pessoas. Graças a ela, o amigo, parente e até meliante podem ser mais facilmente localizados. Porém, também é fato que a privacidade nos foi roubada, pois, ainda que não nos exponhamos, somos expostos pelo outro. Vivemos um verdadeiro Big brother virtual. É possível falarmos de vida privada em uma época de exposição contínua de pensamentos e valores impermanentes, heterodoxos e duvidosos? Somos um amontoado de fragmentos, acontecimentos, fotos/fatos e compartilhamentos desnecessários, a menos que realmente estejamos perante a época de um individualismo exacerbado. Individualismo como conceito político que exprime a afirmação e a liberdade do sujeito perante o grupo. Observando as pessoas nas ruas, vemos um povo desnudado, sofrido, fracassado. Este é o real Facebook: um compêndio de livros de caras e histórias singulares e, no mais das vezes, sofridas.

Há uma confusão entre público e privado. Há uma confusão entre dinâmicas sociais que limitam, enquadram e que incitam o sujeito ao seu completo desnudamento. Há uma eterna confusão entre o que o sujeito deseja e o que ele deve (no sentido de dever público). Todos se expõem com tranquilidade, sem comprometimentos, deixando o privado nas mãos de outrem: quem? Acreditamos que o Facebook é a nossa mais nova catedral virtual! Não precisamos de padres, pastores e gurus. Temos estranhos a nos ouvir e amigos a nos redimir. Estamos lavando a roupa suja na tela de um computador, esquecendo-nos de que o privado atualmente é mais que público.

Método transforma pedaços de sacolas em óleo que pode substituir a gasolina

Combustível feito a partir do plástico 
 
Indianos transformam pedaços de sacolas em um óleo que poderá substituir a gasolina. Ideia é criar usinas geradoras da nova fonte de energia 
 
Roberta Machado
Estado de Minas: 20/02/2014


Brasília – A crise dos plásticos e a dos combustíveis caminham em direções opostas, mas em um ritmo igualmente preocupante para o meio ambiente: enquanto a escassez do petróleo aumenta a necessidade por outras fontes de energia, milhões de toneladas de plástico produzidos todos os anos se amontoam em verdadeiros mares e montanhas residuais, que crescem a uma velocidade maior do que a reciclagem consegue acompanhar. A esperança para esse impasse está no avanço de uma linha de pesquisa que estuda a transformação do lixo abundante na preciosa matéria energética. Por meio de um processo chamado pirólise, cientistas conseguem submeter o plástico a um processo químico que o transforma num óleo com propriedades petroquímicas.

O processo é descrito em um artigo da última edição da revista especializada International Journal of Environment and Waste Management, no qual uma equipe de engenheiros indianos publica os resultados de experimentos recentes com a reciclagem química do plástico. Os cientistas cozinharam pedaços de sacolas plásticas a até 500 graus e, com a ajuda de um catalisador, o material transformou-se em um óleo que pode ser usado para a fabricação de combustíveis.

“A técnica precisa de um reator, que é a unidade de pirólise, assim como de um condensador para a fração do material” enumera Achyut Kumar Panda, pesquisador da Centurion University of Technology and Management Odisha, na Índia, e um dos autores do trabalho. O processo usa polietileno de baixa densidade (LDPE), o mesmo tipo de matéria-prima de embalagens, componentes de computadores e outros tipos de objetos. “A maioria dos termoplásticos poderia ser reciclada com esse método”, garante o cientista.

O calor, com a ajuda do catalisador, quebra a longa cadeia de polímeros em um processo conhecido como degradação termocatalítica. “O polietileno, o plástico mais usado na sociedade, é feito de um hidrocarboneto com dois carbonos. Você une esses dois carbonos com mais dois, até ter alguns milhares. E esse é um polímero”, explica José Geraldo Pacheco, professor de engenharia química da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Sob o forte calor, o que antes era um conjunto de milhares de carbonetos se torna uma porção de pequenas moléculas à base de carbono. “A pirólise quebra o polímero e parte dele volta a ser o etileno, e o resto vira componentes similares”, descreve Pacheco.

O resultado, ressaltam os pesquisadores indianos, é muito similar aos combustíveis petroquímicos convencionais. Para cada quilo de plástico usado no processo, os cientistas produziram 700g de combustível líquido. O cozimento do material também resultou em gases e em uma pequena quantidade de resíduos sólidos.

Os autores da pesquisa pretendem desenvolver o trabalho para criar uma forma eficiente de reciclagem química do plástico. A intenção é implementar o método em grandes usinas, nas quais o combustível poderia ser gerado a partir de uma quantidade maior de plástico e a um preço mais baixo. Os últimos resultados publicados foram os melhores desde que os pesquisadores passaram a estudar a técnica, há seis anos. Desde então, eles testaram diferentes catalisadores e condições, até chegarem à “receita” com 70% de eficiência.

Técnica popular A pirólise já é estudada em todo o mundo há algum tempo e é usada em usinas pioneiras no exterior como alternativa para o gerenciamento de resíduos plásticos. “A viabilidade desses processos depende da escolha de catalisadores adequados e do projeto das plantas, de forma a otimizar o consumo de energia”, afirma o professor Fabio Barboza Passos, do Laboratório de Reatores, Cinética e Catálise, da Universidade Federal Fluminense (UFF). “Um cuidado especial deve ser dado à composição dos plásticos utilizados, que pode gerar contaminantes no combustível produzido”, alerta o especialista.

No Brasil, a equipe da UFPE já trabalhou com a pirólise de polietileno, polipropileno e poliestireno, usados para a produção de copos, sacolas, embalagens e isopor. Um tipo de resíduo, no entanto, continua sendo um desafio para os estudiosos da reciclagem química: as garrafas PET. “É mais complicado, porque é uma mistura mais complexa. Pode ser usado, mas ele já tem oxigênio na composição, aí é mais interessante fazer a reciclagem mecânica”, explica Pacheco, da UFPE. A pirólise é mais recomendada, de acordo com o especialista, para os resíduos do plástico que sobram da reciclagem tradicional, assim como para materiais que geralmente não são reaproveitados, como o isopor.

Como a produção de combustível a partir do óleo resultante do experimento indiano ainda exige alguns passos de separação e outros processos de refinamento, a técnica não pode, por enquanto, ser considerada sinônimo de economia. O método, ressaltam especialistas, deveria ser implementado em grandes usinas especializadas para ter um custo vantajoso em comparação com a produção tradicional de gasolina.

Três perguntas para...
Fabio Barboza Passos, embro do Laborátorio de Reatores, Cinética e Catálise da Universidade Federal Fluminense (UFF)

A técnica de transformação do plástico em combustível pode ser economicamente viável?
O trabalho (dos pesquisadores indianos) mostra um resultado similar a outros grupos. A técnica pode ser viável, dependendo da escala.

Esse método pode ser usado para reciclar qualquer tipo de plástico?
Qualquer plástico pode ser usado, mas a sua composição deve ser monitorada para evitar que haja uma concentração muito alta de contaminantes no produto. Deve-se evitar usar apenas plásticos que contenham esses contaminantes.

O processo sempre vai resultar em poluentes? Há uma forma de evitar ou de minimizar esse problema?
A formação de poluentes depende da composição do plástico original. Por exemplo, se o plástico tiver enxofre e nitrogênio, a combustão final vai gerar gases poluentes. Uma forma de minimizar isso é usar sistemas de tratamento dos gases formados na combustão.

Voo

Há um ano, um pequeno avião fez uma viagem de Sydney para Londres usando somente combustíveis fabricados a partir de plásticos. Essa foi a primeira aeronave a funcionar unicamente com o diesel feito da pirólise do material reciclado. O combustível, mais limpo que o feito de petróleo, também foi avaliado com uma qualidade superior ao tradicional. Os restos da pirólise foram usados para a pavimentação de ruas, resultando num processo sem emissão de CO2 e sem danos à natureza. O piloto Jeremy Rowsell fez a viagem de mais de 16 mil quilômetros em seis dias. 

Serviços de saúde e ambiência Aristides José Vieira Carvalho‏

Serviços de saúde e ambiência 
 
Aristides José Vieira Carvalho
Médico, coordenador da Residência de Medicina de Família e Comunidade do HC-UFMG e da Residência Multiprofissional de Saúde da Família/Atenção Básica do HOB-SMSA/PBH, professor do curso de medicina da Faculdade da Saúde e Ecologia Humana (Faseh)


Estado de Minas: 20/02/2014


Em 2003, foi instituída no Brasil a Política Nacional de Humanização da Saúde, que incluiu entre os seus dispositivos a construção coletiva de ambientes mais saudáveis para receber o cidadão. Para expressar a qualidade do ambiente dos serviços de saúde, o Ministério da Saúde escolheu o termo ambiência, palavra presente na língua portuguesa, embora pouco utilizada no dia a dia, que passou a ser utilizada para significar “o tratamento dado ao espaço físico” dos serviços de saúde, “entendido como espaço social, profissional e de relações interpessoais que deve proporcionar atenção acolhedora, resolutiva e humana”.

Sem dúvida avançamos nesses últimos 11 anos em relação à ambiência. Podemos listar vários serviços de saúde com ambientes acolhedores, agradáveis e saudáveis. Em muitas cidades mineiras e de todo o Brasil, várias unidades de saúde adotaram e investiram no conceito de ambiência para a arquitetura e relações interpessoais. Esses exemplos positivos, certamente pouco conhecidos, deveriam ser divulgados. Com a divulgação, além da informação e atualização das pessoas, poderíamos ter o que se chama motivação pelo exemplo, pelo que é possível fazer e é feito por tantos. Seria um reconhecimento aos anônimos que promovem a beleza da saúde.

Infelizmente, é de admitir o que é lembrado com frequência pela mídia: serviços distantes da ambiência sonhada. Exemplos nessa área são muitos. Na perspectiva da recepção dos usuários, um dos exemplos provavelmente compartilhados por muitos de nós é o da espera em serviços de saúde particular ou privados, quando nos sentimos tratados com indiferença pelos profissionais administrativos e/ou técnicos, e esperamos – paciente ou impacientemente – que um olhar nos localize e se dirija a nós. Essa situação é frequente e lamentável. Justificativas possíveis para ela seriam a sobrecarga dos profissionais, o cansaço, a insensibilidade, o medo de ser abordado e ter que dar atenção, a correria, o número restrito e insuficiente de profissionais, entre outros.

Preocupa-me a presença de serviços de saúde pesados e tristes, que priorizaram a tecnologia, os procedimentos e os medicamentos em detrimento da ambiência. Não há vida em suas paredes, não há sorriso nas salas de espera, não há relações interpessoais leves e agradáveis.

A mídia apresenta com frequência serviços em que o tratamento ao ser humano deixa muito a desejar. Esses serviços que estão distantes do conceito de ambiência precisam acordar. Devem reunir esforços dos seus gestores, profissionais e usuários no sentido de buscar a transformação. Precisam ser tocados pelos exemplos de tantos que, no anonimato, desenvolvem trabalhos exemplares. As experiências exitosas poderiam ser luz e norte para muitos desses serviços. Muitas vezes pequenas mudanças significam grandes transformações e ótimos resultados. A proatividade e a criatividade também devem ser consideradas.

Se por um lado avançamos em tecnologia e em profissionais mais qualificados, por outro ainda convivemos com situações em que as pessoas em serviços de Urgência e Centros de Terapia Intensiva ficam confinadas ao leito com aparelhos e acessos venosos, circundadas por paredes tristes, sem apelo visual e sonoro, com relações interpessoais frágeis e superficiais.

Os serviços públicos e privados têm muito o que aprender um com o outro. Conseguiram nos últimos anos acumular uma gama enorme de saberes e de experiências que pode ser utilizada pelo serviço privado. De forma semelhante, muitos serviços privados são exemplo de excelência e de ambiência e podem compartilhar os seus avanços com os serviços públicos. A mídia poderia contribuir nesse sentido..

É preciso acreditar na importância de investir na ambiência. De forma semelhante aos profissionais que lidam com design de ambientes, os políticos, os gestores e os profissionais do setor deveriam olhar o ambiente dos serviços de saúde, namorá-los, e deixar nascer desse romance leveza, dignidade, alegria e acolhimento. Isso é possível. É lógico que traz como desafios: capacitação e sensibilização de profissionais, adequação do número de profissionais às demandas do serviço, qualificação do gerenciamento, recursos financeiros e vontade política.