terça-feira, 27 de agosto de 2013

“Mais Médicos”: uma vereda para os nossos grandes sertões

Fonte
Reinaldo Guimarães*

O programa “Mais Médicos” está focado na necessidade de colocar médicos onde não há médicos e onde médicos não querem ir. O “Mais Médicos” não está interessado em atender as expectativas da corporação e, principalmente, de seus representantes sindicais.

O “Mais Médicos” não está fazendo competição com o mercado de trabalho dos médicos brasileiros. Antes de importar médicos, houve uma chamada para médicos brasileiros que, lamentavelmente, não prosperou. Em parte, devido a uma feroz campanha contra o programa liderada pelos líderes corporativos sindicais e de vários Conselhos Regionais de Medicina. 

Após a frustração da chamada de médicos brasileiros, o programa abriu uma chamada internacional que, apesar de ter atraído médicos de vários países, não logrou ainda atingir as metas estabelecidas pelo Ministério da Saúde. Foi então que, com a interveniência da Organização Panamericana da Saúde, foi assinado o convênio com Cuba. 

Se a campanha contra o programa já era feroz, a partir daí os sindicalistas médicos entraram numa escalada de insanidades que atingiu o seu ápice com as declarações do presidente do CRM de Minas Gerais. Disse ele que, caso tenha notícia de algum médico em exercício com diploma obtido no exterior e sem revalidação, acionará o Ministério Público do Trabalho e a Polícia Federal para impedi-lo. Fora de si (imagino eu), disse que orientará os médicos mineiros a não cooperarem com os “sem Revalida” cubanos, caso haja algum pedido de ajuda técnica por parte desses. No meu ponto de vista, caso essa afirmativa de seu presidente seja confirmada, o CRM de Minas está sob suspeição para julgar quaisquer transgressões éticas vindouras, posto que o seu presidente está a instruir os médicos mineiros a discriminar colegas, infringindo o Código de Ética Médica. Este,em seu capítulo I (princípios fundamentais), reza que “A Medicina  é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza” (grifo meu).

Os representantes corporativos esbravejam: sem o Revalida, não dá! Digo eu: se a banca examinadora não quiser, o Dr. Pitanguyou ou Dr. Jatene não serão aprovados num exame para revalidação de diploma. Não é a toa que apenas 10% dos que tentaram revalidar seus diplomas obtidos no exterior, desde a instituição do teste, conseguiram a revalidação. Com o estado de espírito que a maioria dos meus colegas têm apresentado com relação ao “Mais Médicos”, seria uma carnificina.

No dia 23 de agosto, um artigo na Folha de São Paulo dizia que médicos são produzidos em série em Cuba, para exportação. O tom era discretamente derrisório. É verdade, médicos são produzidos em série e esta é,há décadas, a principal ferramenta para a projeção internacional de Cuba. Qual o problema? Há quem exporte soldados e armas e guerras, há quem exporte cocaína e por aí vai. Cuba exporta médicos. Nesse caso, trata-se do que, em diplomacia, se chama soft power. Tão legítimo quanto, por exemplo, a exportação de programas de ajuda realizada há décadas pela agência estatal de cooperação norte-americana USAID. 

Cuba produz médicos “em série”, também porque, graças ao bloqueio econômico imposto pelos Estados Unidos e, mais tarde, com o colapso soviéticonecessita, para subsistir, de divisas. O exercício do soft power médico contribui também para que entrem divisas em Cuba. Pessoalmente, não me sinto confortável em apoiar que a remuneração de um profissional seja, em parte, apropriada pelo Estado. Mas o meu desconforto diminui quando me dou conta de quase 40% dos meus rendimentos são religiosamente apropriados pelo Estado brasileiro na forma de impostos variados. Parte desses, na fonte, como é o caso dos médicos cubanos que um colunista hidrófobo da revista Veja denominou de “escravos do Partido Comunista cubano”. 

Outro comentário lido sobre os médicos cubanos, “produzidos em série”, é que eles não prestam. Sua formação é precária e eivada de ideologia. Não é o que a opinião internacional informada sustenta ; ; (tomei como tal, o American Journal of Public Health, o Lancet e uma carta publicada em Science).A conclusão do artigo de Cooper et. al. sobre a prevenção e controle das doenças cardiovasculares em Cuba vale a pena ser transcrita: “Where as the social and political structure of societies can under go rapid and dramatic change, such cultural norms as food, music, and religion are sometimes more resilient. The goal of socialist revolutions in poor undeveloped countries has been first and foremost to catch up with the industrial economies of the world. In public health, this has meant almost exclusively the elimination of infectious diseases and the assurance of low death rates in childhood. Cuba stands as the prime example of the unequaled success of the socialist project in achieving that goal. Within that tradition, however, the need to aggressively intervene against engrained cultural patterns, particularly those related to consumption, was something of a foreign idea. A fundamental rethinking of this strategy will be required to take full advantage of the new knowledge in prevention science that could now make an important contribution to the future health of the Cuban people. The improvements in quality and duration of life in Cuba over the last 50 years have been astounding and set the standard for poor countries around the world. These achievements—for example, eliminating polio in 1962, two decades ahead of the United States—are evidence of the remarkable goals Cuba is capable of achieving. Similar leadership in CVD prevention could make enormously valuable contributions to the worldwide campaign to control what has already become the most severe epidemic ever faced by humanity. The Cuban experience thus demonstrates that control of CVD in non industrialized countries is by no means impossible, and it highlights the critical importance of population-based prevention strategies”.

Acredito que os médicos cubanos talvez não sejam peritos em “procedimentos” de última geração - nem os realmente úteis, nem os inúteis ou francamente prejudiciais. Entretanto, desconfio que a maior parte dos médicos brasileiros também não seja, embora atualmente talvez almejem sê-lo. Mas os médicos cubanos não estão entre nós como “procedimentólogos”, mas como profissionais no campo da atenção primária (promoção, prevenção e cuidados básicos de saúde). E, nesse terreno, creio que eles têm muito a nos ensinar. Aliás, de acordo com o presidente Barack Obama, têm a ensinar também aos médicos norte-americanos -“U.S. President Barack Obama hasacknowledgedthatthe United Statescouldlearn from Cuba's medical foreign aidprogram” .

A fonte de uma das maiores frustrações (e de aprendizado) dos especialistas brasileiros no terreno da educação e do trabalho em saúde foi a evidência de que reformas curriculares não mudam o mercado de trabalho e que o caminho de ajustar a formação médica às necessidades de saúde é o inverso. É a mudança do mercado que será capaz de ajustar os currículos. Se tomarmos a atual conformação do mercado médico brasileiro, com a deterioração paulatina e consentida do SUS e a expansão selvagem do sistema suplementar, concluiremos que a formação médica entre nós decididamente não vai ao encontro das necessidades de saúde, muito pelo contrário. Não foi por outra razão que os médicos brasileiros não atenderam ao chamado do “Mais Médicos”. A campanha dos líderes corporativos contra o programa, nesse sentido, interpreta corretamente os desejos da maioria dos nossos médicos, em particular os mais jovens. 

Esta é a razão da convocação dos médicos estrangeiros e, em particular, dos cubanos que, pelas razões que expressei no início desse texto, parecem estar dispostos a enfrentar os desafios médico-sanitários do Brasil profundo. Pode vir a ser um bom exemplo ao mercado.

Em 1997, uma equipe liderada por Maria Helena Machado concluiu e publicou uma pesquisa sobre os médicos brasileiros. O panorama que nela se vislumbra permanece atual, a despeito de terem se passado 16 anos. A rigor, as tintas com que Machado e sua equipe descrevem a categoria médica brasileira de então devem ser hoje bastante mais carregadas. Uma cópia do livro pode ser encontrada em http://static.scielo.org/scielobooks/bm9qp/pdf/machado-9788575412695.pdf. A leitura desse clássico me parece indispensável para compreender os dilemas dos médicos e seus representantes corporativos frente ao “Mais Médicos”.

Julie Feinsilver é uma socióloga atualmente na American University. Esteve no Brasil como consultora da presidência da Fiocruz em 1996. Nos últimos 20 anos vem estudando a diplomacia médica cubana. Em 2010, publicou um artigo na revista CubanStudies  que fornece uma visão abrangente sobre a ação de Cuba nesse terreno durante os primeiros 50 anos da revolução cubana. O centro de sua argumentação se localiza no balanço entre a solidariedade e o pragmatismo como vetores da atuação internacional de Cuba no campo da saúde. Creio ser uma leitura essencial para compreender esse tema e uma cópia de seu trabalho pode ser encontrada em: http://www.academia.edu/1139326/Fifty_Years_of_Cubas_Medical_Diplomacy_From_Idealism_to_Pragmatism .

* - Médico Sanitarista

Notas

(1) Manuel Franco, Richard Cooper, Pedro Orduñez - Making Sure Public Health Policies Work. SCIENCE, Vol 311 www.sciencemag.org.  24 February 2006, p. 1098 (letters).
(2)R. S. Cooper, P. Orduñez, M. D. I. Ferrer, J. L. B. Munoz, A., Espinosa-Brito - Cardiovascular Disease and Associated Risk Factors in Cuba: Prospects for Prevention and Control
 http://ajph.aphapublications.org/doi/abs/10.2105/AJPH.2004.051417, Am. J. Public Health 96, 94 (2006). 
(3)Wakai S. - Mobilization of Cuban doctors in developing countries. Lancet 2002: 360;92
(4)http://www.worldpoliticsreview.com/articles/12840/the-danger-of-dependence-cubas-foreign-policy-after-chavez
(5)Julie M. Feinsilver -Fifty Years of Cuba's Medical Diplomacy: From Idealism to Pragmatism. 
Cuban Studies, Volume 41, 2010, pp. 85-104

Tv Paga



Estado de Minas: 27/08/2013 


 (Califórnia Filmes/Divulgação)

Seleção brasileira


Diretor dos premiados Baile perfumado (1996) e Deserto feliz (2008), o pernambucano Paulo Caldas rodou em 2011 o longa-metragem País do desejo, que estreia hoje, às 22h, no Canal Brasil. O filme mostra a influência da religião na vida privada e na sociedade, a partir do relacionamento de uma pianista clássica com um padre, interpretados respectivamente por Maria Padilha e Fábio Assunção (foto).

Muita diversidade na
programação de filmes


Outro destaque do pacote de filmes de hoje é a sessão Cinemundi, também às 22h, no Telecine Cult, com mais uma produção argentina: Todos tenemos un plan, dirigido por Ana Piterbarg e protagonizado por Viggo Mortensen. Na concorrida faixa das 22h, o assinante tem mais 10 opções: Um divã para dois, no Teleicne Premium; Espelho, espelho meu, no Telecine Pipoca; Partir, no Glitz; O justiceiro, no ID; Rápida vingança, na HBO; Insônia, no Max Prime; Sentença de morte, na MGM; Renascido das trevas, no Space; Zumbilândia, no Studio Universal; e Agente 86 na Warner. Outras atrações da programação: O livro de Eli, às 20h, no Universal Channel; O carro de Jayne Mansfield, às 2050, no Max; e As loucuras de Dick e Jane, às 23h, no Comedy Central.

Abujamra vai provocar
atriz Maria de Medeiros

A trajetória de Tom Cruise, um dos maiores nomes da história da indústria cinematográfica, é destaque hoje em um especial do canal Bio que vai ao ar às 17h. Outro ator em destaque hoje, mas brasileiro, é Tony Ramos, convidado de José Wilker em mais uma edição do programa Palco e plateia, às 21h30, no Canal Brasil. E às 23h, na Cultura, Antônio Abujamra conversa com a atriz portuguesa Maria de Medeiros no programa Provocações.

Discovery ouve quem
sobreviveu a desastres

O Discovery Channel estreia hoje, às 23h25, mais uma leva de oito episódios na nova temporada de Viver para contar. Produzida pela Conspiração Filmes, a série narra casos extraordinários de sobrevivência ocorridos na América Latina. Entre eles quatro brasileiros, como Juliano Romancine, um trilheiro experiente que sofreu um grave acidente ao participar de uma expedição em grupo em um cânion no sul do país, tendo o quadril esmagado por uma pedra de 100 quilos.

Casal precisa de ajuda
para salvar sua relação


Já o Discovery Home & Health traz nesta terça-feira, às 21h, a sexóloga Alessandra Rampolla e o neurocientista Jack Lewis para ajudar o casal Catriona e Kyle no episódio “Eu odeio o meu corpo”, da série Entre os lençóis. Os especialistas tentam solucionar o problema do casal, que parece ter um relacionamento perfeito, mas que não se dá bem na cama por conta da baixa auto-estima de Catriona.

Carol Ribeiro lembra
como virou top model


A modelo brasileira Carol Ribeiro é a convidada da vez da série Back track, às 21h, no canal VH1. Ela vai contar como começou a desfilar nas passarelas, durante passeio por São Paulo, onde mora. Carol lembra o momento em que foi descoberta e as grandes viradas em sua carreira, transformando-se no rosto de grandes marcas, estampando dezenas de capas de revistas e se tornando conhecida mundialmente. 

MARIA ESTHER MACIEL » O inferno burocrático‏


Estado de Minas: 27/08/2013 


Um dos meus cineastas de cabeceira é o polonês Kieslowski, autor da magnífica trilogia das cores (A liberdade é azul, A igualdade é branca e A fraternidade é vermelha). Ele viveu apenas 54 anos, mas deixou uma obra fílmica de grande beleza e densidade, capaz de provocar rebuliços internos em quem tem o privilégio de vê-la.

Na semana passada, resolvi revisitar, em DVD, sua série de 10 filmes intitulada Decálogo, feita para a televisão polonesa em 1988, sob a inspiração dos dez mandamentos. Ambientados na Polônia dos anos 1980, os filmes tratam de diferentes conflitos morais e dramas familiares, a partir de uma visão que mescla sensibilidade, ética e ironia. Além dessa série, o álbum ainda traz uma entrevista com o cineasta e um breve curta-metragem (de seis minutos) sobre o inferno da burocracia e seus efeitos nocivos na vida das pessoas que dela dependem.

Tendo que lidar, ultimamente, com desafios burocráticos de todo tipo, fiquei bastante tocada por esse filme. Nele, vários idosos em busca de uma aposentadoria enfrentam filas para um embate sem solução com a funcionária impassível e bitolada de uma instituição estatal. Cada caso de cada idoso é mais absurdo que o outro. Ninguém consegue resolver nada, por causa das exigências intermináveis. A cada entrega de documentos, outros formulários, declarações, certidões e registros são solicitados. Na sala dos fundos, pilhas de papeis se acumulam nas prateleiras que ocupam todas as paredes. Nada funciona e tudo se complica, para o desespero das pessoas. É uma cena que lembra as páginas de um livro de Franz Kafka – escritor que soube lidar, como nenhum outro, com o absurdo da burocracia que controla nossa existência.

O fato é que a burocracia, mesmo em nossos tempos computadorizados, continua atormentado a vida de todo mundo. Anos atrás, cheguei a pensar que os computadores pudessem mudar essa situação para melhor. Mas não. Parece que a máquina burocrática das instituições só tem aumentado, apesar de todo o avanço tecnológico atual. Os formulários, agora digitais, só se multiplicam. Uma pessoa, para nascer, viver e morrer, tem – cada vez mais – que ser transformada em números e inserida na realidade (ou virtualidade) dos protocolos, cadastros, atestados, declarações, certidões e registros. O inferno kafkiano entrou na era digital. Agora se chama “O Sistema”. E para quem não maneja os computadores, como acontece com grande parte da população brasileira, tudo fica ainda mais absurdo.

Penso, particularmente, na burocracia da morte. Não basta a dor causada pela perda de um ente querido, mas as pessoas ainda têm que lidar, em meio à tristeza, com inesperadas (e, por vezes, cruéis) exigências burocráticas. Um enterro, por exemplo, pode atrasar muito se o registro do atestado de óbito não for feito dentro das condições impostas. E o atestado pode não ser emitido a tempo se os papéis não estiverem todos à mão, naquela hora. Mesmo depois disso, a loucura dos registros, fichas e cadastros continua. Ninguém consegue viver seu luto em paz.

Um livro de Kafka ou o filme de Kieslowski é sempre bem-vindo nesses momentos. Com eles podemos aprender a suportar, com mais ironia, esse mundo dos números e formulários que consome nossas vidas. 

O BRASIL DO DESPERDíCIO » É muito remédio que vai para o lixo‏


O BRASIL DO DESPERDíCIO » É muito remédio que vai para o lixo
Descarte de medicamentos chega a R$ 13 bilhões, ou 20% do que é vendido no país. Falta a lei para o fracionamento 

Marinella Castro e Victor Martins

Estado de Minas: 27/08/2013 


Belo Horizonte e Brasília – O Brasil do desperdício mostrado pelo Estado de Minas nos últimos dias, também chega aos hospitais e aos remédios consumidos em casa. O desleixo com medicamentos é preocupante. Todos os anos o brasileiro e o poder público juntos jogam na lixeira bilhões de reais com o descarte de produtos impróprios para o consumo. São remédios que vencem antes de serem consumidos. Dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) apontam que o desperdício de medicamentos, incluindo os comprados no varejo pelos hospitais e pelo poder público, gira em torno de 20%. Considerando que o setor movimenta perto de R$ 65 bilhões ao ano, R$ 13 bilhões vão para o ralo.

A questão econômica esbarra no Projeto de Lei 7.029, de autoria do governo, que desde 2006 está tramitando no Congresso Nacional, atualmente na comissão de Constituição e Justiça. A lei tornaria obrigatório o fracionamento dos remédios, viabilizando o consumo de acordo com a necessidade. Decreto presidencial de 2006 já libera a venda fracionada mas a norma não pego. “Fabricar em frações com as informações necessárias à segurança na embalagem é possível e alguns laboratórios já fazem isso. Mas no geral a regra não vingou com prejuízos para o país”, diz Rilke Novato presidente do Sindicato dos Farmacêuticos de Minas Gerais (Sinfarmig-MG). Segundo ele, é comum o consumidor levar para casa 30 comprimidos quando precisaria de 20. “O restante ele joga fora ou repassa para outro usuário, o que é um risco grande à saúde.”

O TEMPO DA EDUCAÇÃO O desperdício no Brasil não se resume a perdas vultosas de dinheiro, a exemplo dos prejuízos estimados em R$ 1 trilhão ao ano com os gargalos de logística e falhas de planejamento. O país, que aspira uma cadeira entre as nações ricas, joga fora também oportunidades. O bônus demográfico, momento na história em que a maior parte da população está em idade de trabalhar, tem sido soterrado pelas nossas ineficiências. Os especialistas são unânimes: a omissão com o ensino e a capacitação pode tirar do Brasil uma chance única.

A pirâmide social deve favorecer o Brasil até 2030. A partir daí, a força de trabalho começa a envelhecer. Em 2040, teremos idosos demais para tomar conta e, se não aproveitarmos essa janela de oportunidade para resolver problemas na previdência e formar poupança robusta para os desafios futuros, o passivo social pode se tornar insustentável. “Parte desse bônus foi desperdiçado. Temos, na melhor das hipóteses, até 2040 para tirar proveito”, avalia José Luís Oreiro, professor de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Este momento é decisivo, pode mudar os nossos rumos”, ressalta José Matias-Pereira, professor da Universidade de Brasília (UnB).

A maioria das populações hoje ricas, aproveitou esse período para dar um salto rumo ao desenvolvimento. Chegaram a esse período da história com as reformas necessárias para colher os frutos do bônus demográfico, situação diferente da observada no Brasil. Aqui há desperdício da força de trabalho. “A palavra chave é produtividade. Se queremos mudar o perfil desse país, o trabalhador tem de ter um nível de produtividade elevado”, diz Matias-Pereira. Simão Silber, professor de economia da Universidade de São Paulo (USP), alerta que a situação é alarmante. O país reserva as piores vagas para os jovens, que são o público que deveria construir um Brasil melhor. “Grande parcela dos brasileiros sai da escola analfabeto funcional. É um nível de desinformação básica. Uma pessoa pouco treinada tem dificuldade de ter emprego produtivo, vai varrer rua.” 

Estreia nacional do novo espetáculo do Grupo Corpo‏


No limite 

Triz, novo espetáculo do Grupo Corpo, tem estreia nacional sexta-feira, no Palácio das Artes. Coreografia de Rodrigo Pederneiras foi criada a partir de trilha sonora composta por Lenine 

Sérgio Rodrigo Reis

Estado de Minas: 27/08/2013

Espetáculo com marcações rígidas e quebras, figurino em preto e branco e cenário feito com cabos de aço, Triz traduz no palco a metáfora da superação   (José Luiz Pederneiras/Divulgação)
Espetáculo com marcações rígidas e quebras, figurino em preto e branco e cenário feito com cabos de aço, Triz traduz no palco a metáfora da superação


Tudo em torno de Triz, novo espetáculo do Grupo Corpo, que estreia na sexta-feira, às 20h30, no Grande Teatro do Palácio das Artes, se deu em torno do coreógrafo Rodrigo Pederneiras. Tímido, de personalidade introspectiva e acostumado aos bastidores, ele virou o centro das atenções quando, prestes a iniciar o processo de criação, em fevereiro, teve de passar por uma cirurgia de reconstituição de um tendão do ombro e de dois músculos de seu braço esquerdo (o bíceps e o subescapular). Quando se preparava para retornar, em maio, rompeu o menisco do joelho esquerdo. Só depois de se submeter a nova cirurgia pôde dar início aos trabalhos, ainda assim com a perna imobilizada. A situação ficou tensa.

Com a estreia da turnê nacional e internacional já fechada e sem condições de coreografar o novo balé, reinventou o método de trabalho. Se até então criava no próprio corpo os movimentos para mostrá-los aos bailarinos, com a limitação física momentânea teve que verbalizar suas concepções para o balé. Aí a dificuldade aumentou e o coreógrafo e os bailarinos viveram meses no limite.

Triz, com música especialmente composta por Lenine, é, em linhas gerais, o oposto da festiva, leve e solta coreografia de Parabelo, de 1997, com trilha assinada por Tom Zé e José Miguel Wisnik, que abre o programa da noite. A 34ªcriação do Corpo cumpre, desta vez, uma agenda nacional atípica, por causa do adiamento em um mês da estreia. Primeiro vai ser apresentada em BH, terra natal do grupo, retomando a tradição dos primeiros anos de atividade da companhia, para só depois subir ao palco do Theatro Municipal do Rio de Janeiro (8 a 11 de setembro) e, em novembro, entre 20 e 29, entrar em cartaz no Teatro Alfa, em São Paulo, palco de estreias nacionais dos espetáculos mais recentes.

No meio da temporada, será feita uma pausa no novo espetáculo para turnês no Sudeste Asiático, em Bangcoc (6 de outubro) e Cingapura (11 e 12 de outubro), com apresentações de Sem mim e Onqotô; e, no Leste Europeu, em Moscou (16, 17 e 18 de outubro), quando serão exibidas Sem mim e Parabelo.
A limitação física do coreógrafo e a tensão inspirou a todos. “Ficou tudo atrasadíssimo e, quando não tinha mais jeito, tive que criar”, lembra Rodrigo. Quando começou, mal andava e diante das dificuldades extremas surgiu a ideia de um balé que se chamaria, até então, Limite. “A proposta era essa: tínhamos todos que ultrapassar os limites”, recorda.

A sensação de desassossego dominou a cena, até que, num determinado momento, a bailarina Carol Raslan, novata no grupo, expressou a opinião em voz alta diante da experiência: “Vivemos meses por um triz”. A fala conseguiu sintetizar todo processo criativo e, finalmente, o novo balé ganhou o nome definitivo. Ao contrário da maioria das coreografias do Corpo, que mesmo depois da estreia vão recebendo ajustes, desta vez, após tanto sufoco, a uma semana da estreia estava concluída a versão definitiva. Com o aperto, Rodrigo Pederneiras chegou à síntese.

Sem cores
Triz é apresentado num cenário de Paulo Pederneiras inspirado em formas geométricas. Todo fundo de palco e as laterais foram preenchidas com 15 quilômetros de cabos de aço suspensos, numa alusão à trilha de Lenine, composta somente com instrumentos de cordas. Eles foram tensionados e agrupados em módulos de 100 fios, com altura de 5,5 metros, preenchendo toda a caixa cênica, à exceção de fendas assimétricas nas laterais e no fundo, de onde entram e saem os bailarinos.

A luz também tem que driblar as frestas, num raciocínio semelhante ao imposto aos bailarinos, que dançarão limitados por passarelas, como corredores impressos no piso. O traçado será ora respeitado, ora ultrapassado. “O início do balé se dá dentro desse limite e, de repente, quando eles saem, os limites desaparecem. Em seguida, voltam ao limite”, explica. O figurino persegue o mesmo clima. “Não há cores. É preto e branco. A Freusa Zechmeister conseguiu uma síntese maravilhosa”, avalia Rodrigo.

De uns tempos para cá, quando é desafiado a criar, o coreógrafo, por vontade própria, se coloca em algumas sinucas. Mesmo com os problemas em volta, em vez de simplificar, resolveu complicar. “Em meus espetáculos não uso trios, acho-os previsíveis, mas dessa vez resolvi fazê-los em praticamente todo balé. Mas resolvi cortá-los ao meio, desfazendo-os e, de tempos em tempos, intercalando com duos femininos.”

O processo, também pelas limitações físicas, foi bastante colaborativo. “Muita coisa foi criada pelos bailarinos. Viram minha dificuldade – levava até 15 minutos para subir as escadas até o palco – e resolveram ajudar. O sentimento se disseminou. Houve uma cumplicidade enorme e hoje o astral está no teto.” O clima certamente ajudará. “Com medo de não conseguir fazer, extrapolei os limites da velocidade do movimento, criando um balé cheio de coisas, com essa ideia de urgência. Os bailarinos ficam completamente no limite em cena e, para executar os movimentos, têm que ter atenção redobrada. Outro dia um deles brincou que, se perder um movimento, só consegue recuperar no próximo espetáculo.”


Palavra de Rodrigo

Opostos
“Enquanto Parabelo é completamente solto, tem muita ginga de bacia, xaxado e bater do pé, a nova coreografia, Triz, é o oposto. É mais marcada, traz uma movimentação mais rígida, que, constantemente, é quebrada. É algo totalmente proposital.”

Inspiração
“A ideia opressora do limite deixou a condição de adversidade para alçar o status de tema central e metáfora maior do balé. Outra fonte de inspiração foi a sensação de estar sob a mira da mitológica espada de Dâmocles, suspensa por um tênue fio de crina de cavalo.”

Trilha
“Lenine, em 38 minutos, em 10 temas musicais, usa as cordas polirrítmicas como inspiração. Do berimbau à balalaica, do violino ao violão, da cítara à rabeca, da tambura ao bandolim. O cortejo de cordas que povoa e imprime relevo à tessitura musical de Triz – assim como o tema central – tem suas possibilidades sonoras exploradas até as últimas consequências.”


Triz

Estreia nacional do novo espetáculo do Grupo Corpo. Sexta e sábado, às 20h30, e domingo, às 19h, no Grande Teatro do Palácio das Artes (Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro). A mesma coreografia será apresentada na terça, dia 3, às 20h30. Classificação: livre. Ingressos: R$ 80 (inteira). Informação: (31) 3236-7400.

À LUZ DO ESPIRITISMO » Alerta para a vida

Uma doença grave, como o câncer, pode ser a oportunidade para que a pessoa reavalie suas atitudes e a forma como encara seus problemas, de forma a se dar uma nova chance


Luciane Evans


Estado de Minas: 27/08/2013 

Aquilo que parece injustiça é, na realidade, uma oportunidade de fortalecimento para que as dores e os sofrimentos sejam suportados com maior grandeza do espírito. Algumas doenças, como o câncer e os males da infância, que muitas vezes nos fazem duvidar da fé e perguntar o ‘porquê’ de tanto sofrimento para tal paciente, tem também suas explicações. Pelo menos para o espiritismo, o câncer é como uma tentativa de reequilíbrio, como se fosse um aviso e um pedido de tempo a quem não soube elaborar as emoções da vida e, em muitos casos, achou que daria conta de tudo. Uma doença pode ter um significado muito maior do que se imagina. É assim, visto como uma oportunidade de rever e avaliar a vida, que muitos males são interpretados à luz do espiritismo. 

 Neste último dia da série do Estado de Minas, Saúde à luz do espiritismo, o jornal ouviu dos profissionais da psicologia e da pediatria as interpretações para males que, até hoje, não se sabe ao certo como surgem. “Em que momento a gente começa a adoecer?”, questiona a psicóloga clínica e espírita Letícia Fonseca Talarico, que faz parte de grupos de tratamento a pacientes com câncer, da Associação Médico-Espírita de Minas Gerais. A pergunta é, segundo ela, o pontapé inicial para essa discussão. Dentro de uma mudança de clima, podemos gripar, mas, “se estivermos mal emocionalmente, a gripe, que seria simples, piora”. 

 E, ao contrário do que se pensa sobre o câncer, mal que, segundo o Instituto Nacional do Câncer, atinge milhares de brasileiros todos os anos, é visto pelo conhecimento espírita, conforme a especialista, como uma tentativa de reequilíbrio. “Quando chega uma nova paciente para o nosso grupo de tratamento, dizemos: lá vem outra mulher maravilha. Geralmente, as mulheres que sofrem de câncer, durante muito tempo de suas vidas, acharam que davam conta de tudo e não conseguiram elaborar as emoções da vida”, diz. Ela exemplifica, contando o caso de uma paciente que se casou com um homem muito difícil de lidar. “Mesmo sabendo isso, ela foi passando a ideia de que dava conta de tudo. Passou por cima de si mesma. Veio o câncer e fez o contrário, colocou o marido para cuidar dela”, conta.

TENSÕES Muitas vezes na vida, segundo Letícia, vamos vivendo as emoções fortes sem dar nome a elas. “Em vez de colocá-las para fora, vamos guardando-as e deixando-as passar”, diz, lembrando que isso ocorre muito com os homens, que guardaram muita tensão ao longo da vida e não a colocaram para fora, até o câncer lhe chamar a atenção para a vida. “O câncer é um alarme e um convite para rever a vida. E é uma doença que une as famílias. É um retorno à casa do Pai”, define a psicóloga. 

 No grupo da Associação Médico-Espírita de Minas Gerais, é obrigatório aos enfermos estarem em tratamento. Há psicoterapia e terapia de família.

Males da infância


Mas e se esse paciente for uma criança? Como o espiritismo encara os males da infância? Segundo comenta a pediatra e homeopata Lenice Aparecida de Souza Alves, a vida é, antes de tudo, regida por leis que expressam a vontade de Deus. “Uma criança que tem uma experiência dessa ordem teria, naturalmente, uma série de situações que poderiam favorecer a própria evolução”, diz, lembrando que, muitas vezes, uma doença desperta nas pessoas o sentido espiritual. 

Quando a criança é acometida por uma fatalidade, de acordo com a pediatra, podem-se buscar respostas nas causas do passado. “Pode ser uma prova para aquela família.” Ela se recorda de um menino que teve um quadro de leucemia e que não ficava sozinho de jeito nenhum. “Um dia, ele compartilhou comigo que tinha medo de morrer e ser levado para o interior. A criança nos surpreende. A leitura dela é particular.”

LAÇOS A especialista diz que seu consultório é um espaço profissional. “Sou homeopata, mas muitos pacientes me procuram por saber que sou espírita”, conta, lembrando que o tratamento espírita é água fluidificada, passe e ida ao centro espírita. “Há muitas crianças que falam do seu amigo invisível. Até que ponto é fruto do imaginário ou é a janela aberta entre o espiritual e o mundo terreno?”, questiona, lembrando que, no caso do câncer infantil, as crianças têm que se submeter ao tratamento convencional, como a quimioterapia e outros recursos que forem indicados para os seus casos.

“Pela visão espírita, essa situação vai ter algo mais a oferecer à família, vai dar a essa família elementos de reflexão para que abrace a experiência.” Lenice conta o caso de uma família em que a mãe teve que mudar de cidade em função do filho pequeno doente. “Ela teve que mudar por causa do transplante que ele faria. Não deu certo da primeira vez. O que percebemos no sofrimento de todos eles foi que o laço familiar se estreitou. A cumplicidade dos pais e o empenho da família. Há muitos ensinamentos contidos, que são riquíssimos”, conclui.

Rosely Sayão

folha de são paulo
A criança e a infância
O modo como a criança vive a infância depende de muitos fatores, entre eles o modo social de pensar a criança
"Não basta ser criança para ter infância." Essa frase contundente está presente no documentário "A Invenção da Infância" (disponível na internet) dirigido por Liliana Sulzbach, que propõe uma reflexão sobre os estilos de vida de nossas crianças no mundo atual. É uma frase que persegue meus pensamentos, conduz o meu trabalho e que, no último sábado, me fez pensar muito.
É que no dia 24 de agosto comemorou-se o Dia da Infância. Grandes reportagens a esse respeito nos veículos de comunicação ou mesmo pequenas notas lembrando a data, por acaso apareceram? De um modo geral, pouco vimos a esse respeito. A lembrança da existência dessa data parece ter ficado restrita aos grupos que, de maneira direta ou indireta, trabalham com e/ou para crianças.
Faz sentido esse silêncio da sociedade a respeito de uma data que, aliás, não deve ser considerada comemorativa. A infância está desaparecendo e temos contribuído de modo expressivo para isso. Como temos feito isso?
Para começar a pensar, temos de considerar que ser criança é um fato biológico, mas o modo como ela vive essa etapa da vida, que vai até a adolescência, depende de múltiplos e complexos fatores, entre eles o modo social de pensar a criança. É aí que entramos.
De um modo geral, cada vez mais a criança, notadamente a que pertence à família de classe média, tem sido tratada como um ser que precisa ser preparado para o futuro. Há algumas décadas, passamos a acreditar que quanto mais precocemente a criança for engajada em situações de estudos formais, maiores as chances ela terá de êxito no futuro.
Já temos inúmeros estudos e pesquisas que comprovam que iniciar o contato com o conhecimento sistematizado mais cedo não contribui no aprendizado que deve ocorrer a partir dos sete anos. Por isso, tudo o que conseguimos ao fazer isso é deixar de ver a criança em seu presente, ou seja, a vemos muito mais como um ser que, um dia, será alguém.
Também temos deixado a criança cada vez mais tempo na escola. As três ou quatro horas iniciais se transformaram, progressivamente, em cinco, seis, oito, dez e até 12 horas de permanência no espaço escolar! Se considerarmos que ir para a escola é o trabalho da criança, elas têm trabalhado demais, à semelhança de seus pais, os adultos.
Temos entendido que o tempo de permanência na escola é uma necessidade social já que os pais têm se dedicado muito à vida profissional. Conheço profissionais que trabalham muito além da jornada e justificam o excesso como necessário para dar conta da responsabilidade profissional. E a pessoal, com os filhos, onde temos colocado tal responsabilidade?
Crianças têm se alimentado como adultos que se alimentam mal. E, como estes, têm enfrentado doenças por causa disso. Esse fato não ocorre por falta de informação dos responsáveis pelas crianças e sim pela falta de paciência e dos cuidados necessários que elas necessitam.
Ah, mas elas pedem, exigem até, as porcarias ofertadas insistentemente e disponíveis em todos os cantos. Sim, mas por isso vamos permitir que fiquem escravas de seus impulsos e que consumam como adultos?
Abordei dois pontos apenas de nossa contribuição direta para o fim da infância. Há muitos outros. Por isso, todo dia deveríamos fazer essa reflexão: queremos que nossas crianças tenham infância, ou já consideramos esse conceito obsoleto?

Monica Bergamo

folha de são paulo

51% da população brasileira está acima do peso, aponta pesquisa


 
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A maioria da população brasileira está acima do peso. Pela primeira vez, dados da pesquisa Vigitel, que coleta informações para o Ministério da Saúde, mostram que o percentual dos considerados "gordinhos" chegou a 51% em 2012. O índice, que em 2006 era de 43%, subiu pouco a pouco. Chegou a 48,5% em 2011. No ano passado, houve a virada.
A CULPA É DELES
Entre os homens, o problema é maior: 54% estão acima do peso, contra 48% das mulheres. O índice sobe no grupo masculino de maior escolaridade, chegando a 58% entre os que ingressaram na faculdade. Já entre as mulheres a situação se inverte: das que estudam até oito anos, 57% estão acima do peso, percentual que cai para 40% entre as que têm nível superior.
CARDÁPIO
A dieta alimentar inadequada é apontada como o maior problema. Dos 46 mil entrevistados, 31% dizem comer carne com gordura regularmente e 26% bebem refrigerante cinco ou mais vezes por semana. O consumo de carne gordurosa entre pessoas com 18 a 24 anos é de 39%. Nesse grupo, 36% tomam refrigerante em excesso.
REGIME
O Ministério da Saúde afirma que tenta combater os maus hábitos. Cita como exemplo a construção de polos de academia para incentivar a prática de exercícios e um programa de orientação nutricional para alunos da rede pública, além de acordos com a indústria para reduzir o teor de sódio nos alimentos.
PONTARIA
O PT vai realizar uma série de pesquisas qualitativas em vários Estados para fazer um diagnóstico local dos humores da população.
AQUELE ABRAÇO
Os músicos Tom Zé e Gal Costa, a apresentadora Marina Person e a atriz Angela Dip assistiram ao show "Abraçaço", de Caetano Veloso, no sábado. Os casais Bruna Lombardi e Carlos Alberto Riccelli, Marcos Frota e Priscylla Vitorassi e Ana Carolina e Marco Antonio Tobal também estiveram no Espaço das Américas.

Gal Costa e Tom Zé vão a show de Caetano Veloso

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Greg Salibian/Folhapress
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O músico Tom Zé esteve no show "Abraçaço", de Caetano Veloso, sábado (24), nos Espaço das Américas
MICROFONE
O documentarista Dado Galvão desembarca hoje em Brasília para gravar entrevista com o boliviano Roger Pinto Molina. Desde abril, o Itamaraty negava pedidos do baiano para conversar com o senador na embaixada brasileira em La Paz. O parlamentar chegou no fim de semana, numa viagem secreta do país vizinho ao Brasil.
MICROFONE 2
"Quero dar a Molina a chance de explicar as denúncias dele contra o governo e de se defender das acusações do Estado boliviano", diz o diretor. O senador é investigado por assassinato, desacato e dano ambiental.
PASSADO A LIMPO
Detalhes como o tamanho da equipe e o perfil dos membros da Comissão Municipal da Verdade serão fechados nos próximos dias pelo prefeito Fernando Haddad (PT-SP). O projeto que cria o grupo será encaminhado à Câmara em setembro. O colegiado terá cinco ou sete participantes. Falta decidir se serão aceitos parentes de mortos e desaparecidos políticos ou somente técnicos.
MAIS É MENOS
Nanda Costa explica a escolha de uma depilação menos cavada para o ensaio nu da "Playboy": "Foi um modo de não me expor tanto e de estar mais protegida", diz. E deixa no ar a possibilidade de repetir a dose: "Quem sabe na próxima apareço com outra depilação".
RODRIGO ArGENTINO
Rodrigo Santoro começa a filmar em setembro, em Buenos Aires, o longa "Focus", que tem Will Smith como protagonista. Ele está deixando a barba e os cabelos longos. "Assim, a produção tem mais com o que trabalhar na caracterização." Ele será um argentino dono de uma equipe de Fórmula 1. Dirigido por Glenn Ficarra e John Requa ("O Golpista do Ano"), o longa vai ser rodado também em Nova Orleans.
ALÉM DO PARAÍSO
A peça "Adão, Eva e Mais uns Caras" estreou no teatro Gazeta, na sexta, com direção de Ernesto Piccolo. Os atores Sheron Menezzes, Renato Goes, Gonçalo Diniz e Allan Souza Lima, que fazem parte do elenco, receberam os convidados. Entre eles, a empresária Fernanda Wagner.

Estreia da peça "Adão, Eva e Mais uns Caras"

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Zanone Fraissat/Folhapress
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A atriz Sheron Menezzes recebeu convidados na estreia da peça "Adão, Eva e Mais uns Caras", no teatro Gazeta, na sexta (23)

Com ELIANE TRINDADE, JOELMIR TAVARES e ANA KREPP
Mônica Bergamo
Mônica Bergamo, jornalista, assina coluna diária publicada na página 2 da versão impressa de "Ilustrada". Traz informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999.

Mia Couto aponta reinvenção do português como processo político - Raquel Cozer

folha de são paulo
Autor moçambicano vê neologismos de sua obra como reflexo da independência de seu país
Vencedor do prêmio Camões, escritor participou de encontro no último sábado, no teatro Geo, em São Paulo
DE SÃO PAULO
Um dos mais celebrados autores de língua portuguesa na atualidade, o escritor moçambicano Mia Couto, vencedor do prêmio Camões e autor de livros como "Terra Sonâmbula", participou de encontro no último sábado no teatro Geo, em São Paulo.
Em quase duas horas de conversa, Couto falou sobre sua maneira de reinventar a língua portuguesa ao escrever, seu envolvimento com a luta pela independência de seu país, a relação dos africanos com o Brasil e os estereótipos que rondam a África e a literatura do continente.
No evento organizado pela Folha, o Fronteiras do Pensamento, a Companhia das Letras e a Livraria da Vila, Couto foi entrevistado por Raquel Cozer, repórter e colunista da Folha, e Eliane Brum, escritora e colunista da revista "Época".
Leia a seguir os principais trechos da conversa.
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Língua portuguesa
Hoje o português é a língua nacional dos moçambicanos, mas a maior parte deles tem outra língua materna. É uma língua em constante movimento, e isso para um escritor é muito sedutor. Essa reinvenção da língua ocorre como um processo social.
João Guimarães Rosa foi uma grande influência. Era como um sinal verde que na literatura se pudesse fazer esse processo de reinvenção da língua. É a reinvenção da nação como linguagem. E Guimarães dá conta desse Brasil ameaçado pelo moderno. É uma coisa que vivemos em Moçambique. A linguagem vira campo de resistência.
Força das mulheres
É como se as personagens femininas se impusessem em minha obra. Mesmo sendo de uma geração em que era preciso dar provas de ser homem, eu venci o medo de encontrar essa mulher em mim.
Eu escutava as histórias que as mulheres contavam sentado fazendo o dever de casa no chão da cozinha. Eu me fiz escritor ali. Via as suas saias passando, ondulando. As mulheres produziram em mim essas memórias.
Imagem da África
O Brasil tem uma ideia muito mistificada da África. A gente imagina que, por ser negro, um brasileiro teria mais intimidade com a África, mas isso é uma bobagem.
Essa visão reducionista e simplificada também é uma coisa que os próprios africanos adotaram. Muitos deles traduziram uma África que os próprios europeus criaram.
Não houve a África do bom selvagem, em que todos viviam em harmonia até a chegada dos colonizadores. Houve uma mão de dentro até na escravatura, cumplicidades entre africanos e europeus.
Quando [os escritores] saímos do estereótipo da África com seus bichos e feiticeiros, enfrentamos outros preconceitos. Mas a África tem de fazer esse esforço.
Prosa e poesia
Sou mais poeta quando escrevo prosa do que quando escrevo poesia. Quando vejo algo que me espanta, escrevo até num guardanapo, em notas de dinheiro, em coisas que nem posso dizer. Tem de haver uma urgência naquilo.
Teor político
Minha literatura é política porque quero dizer coisas com a intenção de produzir um mundo melhor. Fiz parte de uma geração que lutou pela independência e venceu. Tem esse sentimento épico.

João Pereira Coutinho

folha de são paulo
Um rei em Washington
Se os ensinamentos da Bíblia não servem para mudar os homens, então a Bíblia serve para muito pouco
Viajo para Washington. Encontro a cidade em festa. Não admira. Cinquenta anos atrás, em 28 de agosto de 1963, Martin Luther King passou pela capital e, na presença dos 250 mil manifestantes que fizeram a Marcha sobre Washington, proferiu um dos discursos mais famosos do século 20.
Digo "famoso", mas infelizmente pouco lido. Pena. Relendo o discurso de Luther King por estes dias, entendi melhor o talento e a eficácia do homem na luta pelos direitos civis dos negros. Nada revela tão claramente uma inteligência quanto as palavras que ela escolhe.
Para começar, o texto é uma peça notável de oratória cristã. O fato é por vezes ignorado: Luther King foi sobretudo influenciado por Thoreau e Gandhi, dizem os especialistas, e a sua estratégia de resistência não violenta é tributária dos dois.
Certo, certíssimo. Mas, antes de Thoreau e Gandhi, recordo aos especialistas que Luther King foi formado na adolescência pelo teólogo Benjamin Mays, que incutiu no pupilo uma ideia revolucionária e simples: se os ensinamentos da Bíblia não servem para mudar os homens, então a Bíblia serve para muito pouco.
Luther King aprendeu a lição: primeiro, ao tornar-se também teólogo e pastor batista no Alabama. E, depois, ao aplicar o arsenal teológico à causa dos direitos civis.
A cadência e o vigor retórico de Luther King são próprios de um pastor em frente ao seu rebanho.
E o uso de metáforas --o sonho de que um dia um povo longamente escravizado chegará a um oásis de liberdade e justiça-- também só é possível em alguém que leu o Antigo Testamento e transpôs para a causa dos direitos civis as provações épicas dos israelitas nos seus múltiplos e trágicos exílios.
Mas a grandeza de Luther King não acaba aqui. Se o reverendo Luther King fosse um "Muçulmano Negro", espumando de ódio contra o "homem branco", talvez o discurso de 1963 fosse uma peça maniqueísta em que a luta pelos direitos civis seria apenas uma luta de negros contra brancos.
Luther King nunca comprou essa primária versão dos fatos. Como o próprio repetidamente afirmava, a luta não era entre negros e brancos. Era entre a justiça e a injustiça, independentemente da cor das vítimas e dos opressores.
Não é por acaso que, no discurso de 1963, o "sonho" de Luther King era chegar ao dia em que brancos e negros se sentariam na mesma "mesa da humanidade". Essa mensagem de "integração" seria impensável nas diatribes separatistas e violentas de Malcolm X e da Nação do Islã.
O que não significa que o radicalismo dos "Muçulmanos Negros" não tenha ajudado a causa de Luther King. Eis a terceira marca da sua inteligência: apresentar a luta pelos direitos civis como a "via média" entre dois extremismos gêmeos. O extremismo dos separatistas brancos. E o extremismo dos separatistas negros.
Na sua "Letter from Birmingham Jail", escrita no presídio anos antes da Marcha sobre Washington, Martin Luther King já era explícito na condenação daqueles que "perderam a fé na América"; dos que "repudiaram o cristianismo"; e dos que apresentam o homem branco como "um demônio incorrigível".
Tradução: se a América desejava evitar uma guerra civil racial, garantir direitos civis aos negros era melhor do que jogá-los na insurreição armada.
Felizmente, a América escutou Martin Luther King, não Malcolm X. Em 1964, o Congresso aprovava o Civil Rights Act, infligindo o golpe de misericórdia na segregação laboral, escolar, social. Os direitos eleitorais plenos viriam logo a seguir, em 1965. E hoje?
Fato: como relembra o "Wall Street Journal", o rendimento das famílias negras ainda representa 66% do rendimento das famílias brancas. Mas é também importante lembrar que, há 50 anos, metade da população negra vivia na pobreza. A cifra, hoje, ronda os 28%.
E, claro, escusado será dizer que, em 2013, a cor da Casa Branca não é mais branca.
Martin Luther King esteve na cidade em 1963 para imaginar o dia em que os seres humanos não seriam julgados pela cor da pele, mas pelo seu caráter.
Às vezes, as verdades mais antigas são as mais revolucionárias. E Luther King era esse admirável paradoxo: um conservador revolucionário. São os únicos revolucionários que eu respeito.