terça-feira, 7 de maio de 2013

Oded Grajew: O que é (e o que não é) sustentabilidade


Oded Grajew: O que é (e o que não é) sustentabilidade


Tendências / DebatesEmbora em voga, o conceito de sustentabilidade ainda é pouco compreendido tanto por quem fala sobre ele quanto por quem o ouve.
Nos últimos anos, intensificou-se a discussão a respeito do aquecimento global e do esgotamento dos recursos naturais. São preocupações legítimas e inquestionáveis, mas que geraram distorção no significado de sustentabilidade, restringindo-o às questões ambientais.
Não é só isso. A sustentabilidade está diretamente associada aos processos que podem se manter e melhorar ao longo do tempo. A insustentabilidade comanda processos que se esgotam. E isso depende não apenas das questões ambientais. São igualmente fundamentais os aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais.
A sustentabilidade e a insustentabilidade se tornam claras quando traduzidas em situações práticas.
Esgotar recursos naturais não é sustentável. Reciclar e evitar desperdícios é sustentável.
Corrupção é insustentável. Ética é sustentável. Violência é insustentável. Paz é sustentável.
Desigualdade é insustentável. Justiça social é sustentável. Baixos indicadores educacionais são insustentáveis. Educação de qualidade para todos é sustentável.
Ditadura e autoritarismo são insustentáveis. Democracia é sustentável. Trabalho escravo e desemprego são insustentáveis. Trabalho decente para todos é sustentável.
Poluição é insustentável. Ar e águas limpos são sustentáveis. Encher as cidades de carros é insustentável. Transporte coletivo e de bicicletas é sustentável.
Solidariedade é sustentável. Individualismo é insustentável.
Cidade comandada pela especulação imobiliária é insustentável. Cidade planejada para que cada habitante tenha moradia digna, trabalho, serviços e equipamentos públicos por perto é sustentável.
Sociedade que maltrata crianças, idosos e deficientes não é sustentável. Sociedade que cuida de todos é sustentável.
Dados científicos mostram que o atual modelo de desenvolvimento é insustentável e ameaça a sobrevivência inclusive da espécie humana.
Provas não faltam. Destruímos quase a metade das grandes florestas do planeta, que são os pulmões do mundo. Liberamos imensa quantidade de dióxido de carbono e outros gases causadores de efeito estufa, num ciclo de aquecimento global e instabilidades climáticas.
Temos solapado a fertilidade do solo e sua capacidade de sustentar a vida: 65% da terra cultivada foram perdidos e 15% estão em processo de desertificação.
Cerca de 50 mil espécies de plantas e animais desaparecem todos os anos e, em sua maior parte, em decorrência de atividades humanas.
Produzimos uma sociedade planetária escandalosa e crescentemente desigual: 1.195 bilionários valem, juntos, US$ 4,4 trilhões --ou seja, quase o dobro da renda anual dos 50% mais pobres. O 1% de mais ricos da humanidade recebe o mesmo que os 57% mais pobres.
Os gastos militares anuais passam de US$ 1,5 trilhão, o equivalente a 66% da renda anual dos 50% mais pobres.
Esse cenário pouco animador mostra a necessidade de um modelo de desenvolvimento sustentável. Cabe a nós torná-lo possível.
ODED GRAJEW, 68, empresário, é coordenador da secretaria executiva da Rede Nossa São Paulo e presidente emérito do Instituto Ethos. É idealizador do Fórum Social Mundial
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Quadrinhos

folha de são paulo

CHICLETE COM BANANA      ANGELI
ANGELI
PIRATAS DO TIETÊ      LAERTE
LAERTE
DAIQUIRI      CACO GALHARDO
CACO GALHARDO
NÍQUEL NÁUSEA      FERNANDO GONSALES
FERNANDO GONSALES
MUNDO MONSTRO      ADÃO ITURRUSGARAI
ADÃO ITURRUSGARAI
BIFALAND, A CIDADE MALDITA      ALLAN SIEBER
ALLAN SIEBER
MALVADOS      ANDRÉ DAHMER
ANDRÉ DAHMER
GARFIELD      JIM DAVIS
JIM DAVIS

HORA DO CAFÉ      ALVES
ALVES

Suzana Herculano-Houzel

folha de são paulo

O que fazer com sociopatas adolescentes?


Ao completar 18 anos de vida, o jovem brasileiro recebe um presente para o resto da vida: a imputabilidade penal, ao ganhar o status de um adulto plenamente responsável por seus próprios atos e, portanto, a quem pode ser atribuída a culpa por danos causados a outrem, e, com a culpa, suas consequências penais.
É uma idade arbitrária, claro. A adolescência é um processo que se estende por ao menos uma década de vida, durante a qual várias transformações ocorrem no cérebro e fazem com que a criança se torne um adulto capaz de raciocínio lógico e abstrato; capaz de se colocar no lugar dos outros e, assim, viver bem em sociedade; capaz de sentir remorso e, sobretudo, também antecipar possíveis remorsos.
Esta última capacidade é a base do raciocínio consequente, por sua vez base da imputabilidade criminal: a noção de que decisões de todo tipo, das mais prosaicas às mais transformadoras, são tomadas com a plena ciência das suas consequências sobre si mesmo e sobre os outros.
A neurociência, hoje, sabe que o raciocínio consequente depende de regiões do córtex como o órbito-frontal, uma das últimas áreas do cérebro a terminar de amadurecer.
Mas, por ser um processo, e não um evento com data marcada, não há como definir quando exatamente essa capacidade se instala plenamente no cérebro.
Provavelmente é bem antes dos 18 anos --mais cedo em uns, mais tarde em outros. Mas é bastante seguro presumir que, aos 18 anos completos, o cérebro de essencialmente todos os jovens já tenha alcançado a capacidade de compreender e antecipar as consequências dos seus atos.
Reduzir essa idade arbitrária para outra também arbitrária seria aceitar a possibilidade de imputar penas a jovens ainda não de fato prontos para responder por suas ações.
Contudo, se a maioridade penal aos 18 anos protege uns, por outro lado ela deixa a sociedade exposta a uma porção significativa da população que só agora começa a ser reconhecida pelo perigo que ela representa: a dos sociopatas.
Para esses, não há correção conhecida ou possibilidade de recuperação.
Ao contrário da adolescência, que "passa", a sociopatia é desde sempre e para sempre.
Jovens sociopatas de 13 anos, 16 anos, 18 anos incompletos ou 21 anos continuarão sociopatas --e se eles já agem como tais, deveriam ser reconhecidos e tratados como tais.
Voto por manter a maioridade penal aos 18 anos, mas por tratar sociopatas de qualquer idade como sociopatas que são: um perigo para a sociedade.
Suzana Herculano-Houzel
Suzana Herculano-Houzel, carioca, é neurocientista treinada nos Estados Unidos, França e Alemanha, e professora da UFRJ. Escreve às terças, a cada duas semanas, na versão impressa de "Equilíbrio".

Cadastro Nacional de Adoção completa cinco anos sem atingir seus objetivos

folha de são paulo

IARA BIDERMAN
JULIANA VINES
DE SÃO PAULO

O Cadastro Nacional de Adoção acaba de completar cinco anos, mas ainda está longe de atingir seus objetivos: agilizar processos na Justiça e reduzir o número de crianças em abrigos.
Criado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), o cadastro tem 29.284 adultos em busca de um filho e 5.471 menores aptos a serem adotados. Pouco para um universo de mais de 45 mil crianças e jovens à espera de um lar.
Até hoje, 1.899 adoções foram feitas pelo cadastro. Os números não atendem as expectativas do CNJ. "Ainda está muito aquém do desejado", diz Gabriel da Silveira Matos, juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça.
O juiz Matos, no entanto, afirma que a ferramenta agilizou a aproximação e que o número de adoções resolvidas não pode ser desprezado.

Passo a passo da adoção

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Editoria de Arte/Folhapress
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Há quase 40 mil crianças em abrigos que não estão no cadastro nacional porque ainda têm algum vínculo com a família biológica.
É uma segurança: a criança só é cadastrada quando há uma sentença de destituição do poder familiar e não há mais qualquer possibilidade de a família recorrer, explica o advogado Antonio Carlos Berlini, presidente da comissão de adoção da OAB-SP.
"Tem muito processo parado, muita criança crescendo em abrigos. Os números oficiais dizem cerca de 40 mil, mas estima-se que mais de 60 mil estejam em instituições hoje", afirma Berlini.
Esse problema é anterior ao CNA (sigla para cadastro nacional), diz a advogada Silvana do Monte Moreira, presidente da comissão de adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família.
"Falta equipe técnica nas Varas da Infância e da Juventude. Isso faz com que todos os processos demorem. A habilitação dos pretendentes, que depende de entrevistas e visitas domiciliares, atrasa."
A gerente executiva do Grupo de Apoio à Adoção de São Paulo, Mônica Natale, conhece pretendentes que esperam há dois anos para entrar na fila. "A situação é pior no interior", avalia.
CAIXA -PRETA
Uma das vantagens trazidas pelo cadastro nacional foi a "abertura da caixa-preta dos abrigos", segundo Maria Bárbara Toledo, presidente da Associação Nacional dos Grupos de Apoio à Adoção.
Mesmo sem incluir todos os processos, os números registrados pelo CNA nesses cinco anos formam um retrato mais preciso da situação da adoção no Brasil e permitem uma análise do que melhorou e de onde estão os principais gargalos.
Preconceito de cor, por exemplo, ainda atrapalha, mas vem caindo: em 2010, apenas 31% dos pretendentes afirmavam não se importar com a cor da pele da criança; hoje, 40% atestam isso no formulário do cadastro.
O perfil da criança buscada já mudou muito, segundo Moreira. A mudança começou a partir de 2009, quando passou a ser obrigatório para os candidatos a pais adotivos fazer um curso na Vara da Infância ou em grupos de apoio.
"Nesses cursos são debatidos aspectos da adoção inter-racial, de crianças mais velhas e de grupos de irmãos."
TEMPO E GENTE
Idade é o gargalo. Nove em dez pessoas querem crianças de até cinco anos, faixa que corresponde a menos de 10% das cadastradas. Para 90% entre oito e 17 anos, o percentual de adultos dispostos a adotá-las é em torno de 2%.
Bárbara Toledo afirma que os grupos de apoio fazem um trabalho de persuasão em favor das "adoções necessárias". Mas não dá para atribuir aos candidatos a pais adotivos toda a responsabilidade para resolver a questão.
"Falar que os pretendentes são preconceituosos por não quererem crianças mais velhas é covardia", diz ela.
A solução, para Silvana Moreira, passa pela contratação de profissionais para tornar os processos rápidos, sem arranhar os direitos das famílias. "Hoje muitas crianças ficam no limbo jurídico e acabam sendo filhas do abrigo."
Editoria de Arte/Folhapress

CINCO ANOS DE ESPERA
Meu encontro com Manuela
RENATA RANGELCOLABORAÇÃO PARA A FOLHAEra um dia modorrento de outubro de 2011. Eu, à toa por conta do calor senegalês de Ribeirão Preto. Toca o telefone. Simone, psicóloga da Vara da Infância e da Juventude. "Como vai?". Eu: "Esperando". Ela: "Sua espera acabou. Sua filha chegou".
Eu me joguei no sofá, tremendo, suando, chorando. "Que idade ela tem?". Disse que tinha dois meses. Bebezinho! O que eu mais queria!
Uma criança de dois anos é considerada recém-nascida pelo Juizado. Portanto, difícil de adotar. Uma de dois meses é quase impossível.
Simone disse que eu deveria ir ao fórum no dia seguinte para saber a história da menina e então decidir. Fui.
Ela tinha sido abandonada ao nascer. A psicóloga perguntou se "traços negroides" eram problema. Nenhum. Então me disse que a bebê estava lá mesmo, no fórum.
Quando a vi, pensei que iria desmaiar. Tão pequenina, magra, com olheiras. Minha filha! Peguei-a no colo, fiz força para não chorar. Quando nos deixaram sozinhas, ela segurou meus dedos com força. Ficou me olhando, como se dissesse "me leve". Sussurrei: "Você é minha filhinha do coração, sou sua mãe". Então eu soube: estávamos predestinadas.
No pedido de adoção, o postulante diz o que quer. Cor, idade, se aceita doenças, deficiência etc. Nossas ressalvas eram só para soropositivo ou vítima de violência.
Nosso pedido foi feito no fórum central de São Paulo, onde eu vivia então. A fila era de 1.200 candidatos. Nas conversas com a assistente social e a psicóloga fomos avisados de que o processo demoraria.
Não imaginei que demorasse tanto. Foram cinco anos até minha filha surgir.
Nesse tempo, tudo mudou: me separei, voltei para Ribeirão, de onde saí aos 18. O médico me aconselhou a levar uma vida menos estressante.
A decisão de adotar surgiu por causa da minha saúde. Fiquei internada 15 dias com uma doença grave. No dia da alta, meu ex, ao lado da cama, me disse: "Não acha que é hora de fazermos algo importante?" Respondi: "Sim, adotar nossa filha." E entramos com o processo.
Mais tarde, já separada, fui a São Paulo saber do processo. Arquivado. Fiquei seis meses pensando se o desejo de um filho era projeto só do casal ou meu também.
Pesei prós e contras de criar um filho sozinha e decidi: EU quero! Desarquivei o processo e o transferi para Ribeirão. Repetiram-se as entrevistas. Fui aprovada novamente. Recomeçou a espera.
Tenho meus motivos para crer que meu encontro com Manuela estava decidido em algum lugar do Universo.
Em agosto de 2011, fiz uma novena para Santa Rita de Cássia que incluía três pedidos: um impossível, um necessário e um de negócios. Mas só pedi pela minha filha. Pois foi em agosto, dia 4, que ela nasceu. Creio que Santa Rita a escolheu para mim.
Manuela estava em um abrigo com outros recém-nascidos. Visitei-a todos os dias por uma semana. Já no primeiro dia levei minha mãe, Jacy, que se apaixonou por ela -paixão correspondida.
Em três dias montei o quarto dela com a ajuda de minha cunhada. Berço com o anjo da guarda da família, banheira, roupinhas, tudo!
Ela chegou na manhã de 12 de outubro. Minha irmã Patrícia e as filhas vieram recebê-la. E Lucia, minha empregada e amiga, com a filha. Ambas ajudaram muito.
Recebi a guarda provisória por seis meses e depois de outros seis saiu a adoção definitiva. Está lá, na certidão de nascimento: Manuela Garcia Rangel. Minha filha!
Manuela é linda, espertíssima e, melhor, alegre. Já tem 90 cm e 11 quilos. Dorme a noite toda, acorda cantando, fala numa língua que só ela domina, corre pela casa.
Esperei cada dia desses meses todos que me chamasse de "mãe". Em 17 de janeiro, correu em minha direção de braços abertos e gritou: "Mamãe!". Fiquei eufórica.
Manu corre pelo quintal, gosta de dançar. Às vezes, dança segurando as pontas do vestido. Já joga charme, a danadinha. É amada e acalentada por uma trupe: mãe, vovó, Lucia, babá e pai.
Sim, surgiu um relacionamento. Vasco já vivia comigo quando Manu chegou. É louco por ela e ela, por ele. É pai de fato e será de direito. Vai entrar com pedido de adoção.
Minha vida mudou. Estou bem de saúde, calma. Minha mãe, 82, renasceu. Manuela veio para renovar a família. Quando dizem que fiz algo maravilhoso ao adotá-la, digo: não, que maravilha ela fez por mim! Tenho um anjo em casa. O meu maior amor.

    TRÊS DE UMA VEZ
    'Nosso primeiro encontro não foi mágico'
    DE SÃO PAULOQuando o economista José Marcelo Monteiro, 44, casou com a administradora de empresas Luciana Marques, 42, há 13 anos, ele sonhava em ter três filhos. "Nem pensar", disse Luciana, e o marido se conformou em ter um só.
    Luciana não conseguiu engravidar. Depois de vários tratamentos de fertilização assistida fracassados, o casal resolveu adotar um filho, de até quatro anos, no máximo.
    Começaram a frequentar grupos de apoio à adoção, enquanto esperavam ser chamados pela Vara da Infância do Rio de Janeiro, onde moram. O filho idealizado foi sendo trocado pela expectativa de uma criança real.
    Primeiro, ampliaram a faixa etária até seis anos. Depois, em vez de um, pensaram em adotar dois. "Imaginava um casal", diz Luciana.
    Quatro anos atrás, o casal recebeu um aviso sobre três irmãos aptos à adoção.
    "Era muita criança para administrar", diz Luciana. Mas os dois foram ao abrigo para conhecer Alexandre, Thaiane e Kaio -na época com dez, oito e três anos.
    "As pessoas falam que é um momento mágico quando você encontra seus filhos, mas não foi nada disso. Não vimos estrelinhas brilhando, só a possibilidade de formar uma família", diz Marcelo.
    Tiveram medo também. "Se você adota criança mais velha, precisa enfrentar o medo da rejeição. E se ela não nos aceitar?", diz Luciana.
    Mas a afinidade foi forte. "Nos primeiros oito meses não fomos pais, fomos bombeiros", diz a mãe.
    O mais difícil foi colocar limites naqueles três irmãos que moraram na rua e sofreram violência doméstica. "Claro, não iam confiar de cara na gente", diz Luciana.
    Para ela, a adoção não é ato heroico ou caridade. "Já me perguntaram até se foi para pagar promessa. Não foi, não serei abençoada por isso. Foi o desejo de ser mãe, de constituir uma família. Formei a minha e sou superfeliz."

      TIRA-DÚVIDAS
      1 Quem pode adotar?
      Maiores de 18 anos de qualquer estado civil e orientação sexual. Não há limite de idade nem renda mínima. Duas pessoas podem adotar a mesma criança se forem casadas ou viverem em união estável. O pretendente deve ser no mínimo 16 anos mais velho que o adotado.
      2 Quem pode ser adotado?
      Crianças e adolescentes de até 18 anos que tiveram o vínculo familiar rompido.
      3 Posso escolher?
      Em termos. Você descreve o perfil desejado no início do processo, mas só entra em contato com a criança quando é chamado pela Vara (daí pode visitá-la e aceitar ou não a adoção). Não é recomendável buscar ou visitar crianças em abrigos, porque a maioria delas não pode ser adotada.
      4 A família biológica pode pedir a criança de volta?
      Depois de o processo de adoção ser finalizado, não. Há o risco enquanto o poder familiar não tiver sido destituído.
      5 Onde buscar ajuda?
      Nas cerca de 120 entidades de apoio à adoção, onde é possível tirar dúvidas. Endereços no site da Associação Nacional dos Grupos de Apoio à Adoção: www.angaad.org.br

        'Só pensamos em cuidar dela', diz pai adotivo de garota com paralisia cerebral

        IARA BIDERMAN
        DE SÃO PAULO

        A aposentada Maria Rosa, 59, e o representante jurídico Márcio Mesquita, 56, planejaram seguir à risca a recomendação da psicóloga: contar à Patrícia que ela era adotiva depois dos seus 12 anos.
        O aniversário chegou, mas a psicóloga estava de férias. Os pais decidiram esperar. "Queria o acompanhamento de alguém preparado, temia a reação dela", diz a mãe.
        Patrícia, então, chamou a mãe para uma conversa: "Mamãe, por favor, sente aqui e me diga a verdade". A menina já sabia havia dois anos, a empregada tinha lhe contado que ela fora adotada.
        "Nós estávamos tão nervosos, a Pati nos acalmou, foi um alívio. A cabeça dela é muito boa", conta o pai.
        Fabio Braga/Folhapress
        Márcio e Maria Rosa Mesquita com a filha Patrícia, 15, em frente ao prédio onde moram, na zona oeste de São Paulo
        Márcio e Maria Rosa Mesquita com a filha Patrícia, 15, em frente ao prédio onde moram, na zona oeste de São Paulo
        O casal encarou naturalmente a adoção de uma criança com necessidades especiais. Patrícia, 15, tem paralisia cerebral, provavelmente por falta de oxigenação na hora do parto.
        Como qualquer mãe, Maria Rosa temia ter um filho com deficiência. "Mas ela tem e eu aceitei numa boa e a amo do mesmo jeito."
        Quando foram buscá-la numa maternidade no interior de Santa Catarina, os médicos não souberam explicar direito a gravidade da coisa.
        O problema afeta o sistema neuromotor e obriga Pati a usar cadeira de rodas e muletas para se locomover.
        "Meses depois, quando tivemos o diagnóstico de paralisia cerebral, só pensamos em cuidar dela", disse o pai.
        Pati,15, tem sessões semanais com fisioterapeuta, fonoaudióloga e psicóloga. Frequenta escola regular, está na oitava série e é ótima aluna.
        "Não sei se dá mais trabalho que outra criança, não tive outros filhos. Para mim, Pati é tudo", diz a mãe.

        Clovis Rossi

        folha de são paulo

        Não é uma guerra. Ainda
        Ataques israelenses à Síria introduzem mais um elemento de tensão ao horror do conflito
        Depois de o vice-ministro sírio do Exterior, Faisal Mekdad, ter declarado que os ataques de Israel a alvos na Síria eram uma "declaração de guerra", ainda assim o chefe do Comando Norte das Forças de Defesa de Israel, major-general Yair Golan, aparecia tranquilizador diante dos jornalistas. "Pareço tenso?", perguntou a eles, depois de afirmar que não sopram ventos de guerra na fronteira com a Síria.
        O fato de a Síria não ter reagido parece dar razão à "nonchalance" do major-general Golan. Mas o imbróglio naquela região recomendaria mais cautela.
        Afinal, como analisa Mitch Ginsburg, correspondente militar do sítio "Times of Israel", seu país "lida com um confronto na porta ao lado (com a Síria), com outro que pode ser ativado a qualquer momento (com o Hizbollah, o grupo político-militar forte no Líbano) e um terceiro que está no horizonte, com o Irã".
        Afinal, o ataque a alvos na Síria visava mísseis iranianos que apenas transitavam pelo país rumo aos arsenais do Hizbollah, cujo alvo permanente é Israel.
        O que significa dizer que o ataque mexeu com três atores. Ou, como disse Danny Yatom, ex-diretor do Mossad, o lendário serviço secreto israelense: "Assad muito provavelmente não vai responder agora. O Exército e o regime sírios estão quase completamente preocupados com a sobrevivência e não têm interesse em abrir uma nova frente contra Israel. Mas bem pode acontecer de que a Síria ou o Hizbollah ou o Irã levem a cabo alguma operação secreta e tentem cometer ataques terroristas contra um alvo israelense ou judaico em algum lugar do mundo".
        Pode ser paranoia (os judeus têm mil e uma razões para serem paranoicos), mas vale notar, como o faz Eyal Zisser, o mais renomado especialista israelense em Síria, que os ataques romperam uma regra não escrita que diz que Israel tem o direito de monitorar o trânsito de armas iranianas pela Síria, mas não o de atacar território sírio.
        Apesar de Israel e Síria ainda estarem tecnicamente em guerra, a fronteira tem estado em paz nos últimos 40 anos.
        A guerra na Síria e a inércia do mundo ante os seus horrores agudizou o debate em Israel sobre o que é melhor, deixar o ditador enfraquecido no poder ou derrubá-lo de vez.
        Os ataques do fim de semana parecem demonstrar que pode estar prevalecendo a opinião de um chefe da inteligência militar, Itay Baron, para quem as mil toneladas de armas químicas que ele diz que a Síria possui acabarão caindo nas mãos do Hizbollah ou de outros grupos radicais.
        Atacar preventivamente seria, pois, o melhor remédio. No lado árabe, maciçamente contrário a Israel e, por extensão aos ataques, há no entanto quem se regozije, caso de Abdel Rahman Al-Rashed, ex-editor-chefe do jornal "A-Sharq Al-Awsat": "Nós deveríamos ficar felizes com os ataques de Israel às forças e armazéns de Assad porque eles acelerarão sua queda e evitarão a morte de mais sírios".
        Vê-se, pois, que o major-general Golan deveria, sim, ficar tenso.

          Aliança entre fé e política leva à intolerância religiosa, diz escritora britânica - Entrevista Karen Armstrong

          folha de são paulo

          REINALDO JOSÉ LOPES
          COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

          A violência e a intolerância não são elementos inevitáveis no "DNA cultural" das religiões, mas sim efeitos colaterais da aliança entre fé e política, para os quais as tradições religiosas são capazes de desenvolver antídotos pacifistas.
          É o que afirma a escritora britânica Karen Armstrong, 68, que participa do ciclo Fronteiras do Pensamento amanhã, em São Paulo.
          Patricia Santos - 24.abr.2002/Folhapress
          Britânica Karen Armstrong diz que violência e intolerância são efeitos colaterais da ligação entre fé e política
          Britânica Karen Armstrong diz que violência e intolerância são efeitos colaterais da ligação entre fé e política
          Ex-freira, Armstrong estudou literatura na Universidade de Oxford e passou as últimas décadas produzindo documentários e escrevendo livros que investigam a história das grandes tradições religiosas. "A ética da compaixão é o centro de todas essas grandes tradições, e é preciso retomá-la", argumenta.
          Por email, ela diz à Folha que o ateísmo radical é produto do fundamentalismo e que está "encorajada" com os sinais de humildade do papa Francisco, embora não espere grandes mudanças.
          *
          Folha - É comum ouvir dizer que, ao longo da história, o monoteísmo deu impulso à violência e à intolerância porque ele tende a ser exclusivista. A sra. concorda?
          Karen Armstrong - Não. Existem fundamentalistas entre os hindus e budistas.
          A história mostra que nenhuma fé consegue se transformar numa "religião mundial" se não for adotada por um Estado ou império dinâmico e em expansão.
          Como os Estados são inerentemente violentos (nenhum pode se dar ao luxo de acabar com seus exércitos), as religiões acabam adquirindo uma ideologia "imperial".
          Mas os monoteísmos também desenvolveram uma alternativa contracultural não violenta. As pessoas é que são violentas, e não as abstrações que chamamos de "religiões".
          O que significa ser uma monoteísta "freelance", como a sra. se definiu certa vez? É possível transcender as raízes históricas do judaísmo, do cristianismo e do islamismo e ainda se considerar monoteísta?
          Esse é um termo que usei de forma casual e que tem me perseguido desde então. Eu quis dizer que era capaz de obter sustento espiritual das três fés abraâmicas [referência a Abraão, que seria ancestral de judeus e árabes], e que não conseguia ver nenhuma delas como superior.
          Depois que afirmei isso, estudei as religiões orientais não teístas, e sou capaz de encontrar igual inspiração nelas.
          O termo que aplico a mim mesma hoje em dia é o de "convalescente". Estou em "fase de recuperação" depois de ter uma experiência religiosa ruim quando era moça [Armstrong tornou-se noviça aos 17 e sofreu com a disciplina e as penitências físicas].
          Ao ler seus livros, a impressão é que a sra. fala de Deus como um conceito importante, mas que não necessariamente teria base real "lá fora". Se Deus não tem existência objetiva, por que se importar com Ele?
          Nossas mentes possuem uma predisposição natural para a transcendência, ou seja, temos ideias e experiências que estão além do alcance de nossa compreensão. Todos nós buscamos momentos de "êxtase", nos quais "ficamos de fora" do nosso eu. Se não encontrarmos isso na religião, vamos buscar tal sensação na arte, na música, na natureza, até no esporte.
          Nesses momentos, sentimos que habitamos nossa humanidade de um jeito mais pleno. "Deus" é um símbolo que, se usado de forma apropriada, traz essa experiência.
          Como a sra. enxerga o movimento dos Novos Ateus, que defende que os não crentes combatam de forma mais ativa a religião? É o sinal de um futuro cada vez mais secular?
          O Novo Ateísmo é, em grande medida, um produto do fundamentalismo religioso, o qual tentou domesticar a transcendência de "Deus" e acabou por transformá-lo em algo inacreditável.
          Mas, ao longo da história, os monoteístas, por exemplo, insistiram que "Deus" não é um outro ser e que não podemos dizer que "ele" existe, porque nossa noção do que é a existência é limitada demais.
          Na verdade, as pessoas estão ficando enjoadas com [Richard] Dawkins [zoólogo britânico], [Sam] Harris [neurocientista americano; ambos são expoentes dos Novos Ateus] etc. porque eles são agressivos e intolerantes demais. Acho que a Europa está de fato destinada a seguir o caminho do secularismo, mas os EUA continuam sendo um país muito religioso.
          Quais são suas impressões sobre o papa Francisco?
          Achei muito encorajador quando fiquei sabendo que ele abandonou seu palácio e adotou um estilo de vida mais simples. Mas ele ainda é conservador do ponto de vista teológico e ético, então não espere muitas mudanças!
          Vários papas, diante da pressão pelo sacerdócio de mulheres, afirmaram que teologicamente isso seria impossível, já que Jesus escolheu como apóstolos apenas homens. Como vê esse raciocínio?
          Eu acho que Jesus ficaria surpreso ao ver qualquer tipo de sacerdócio no "cristianismo". Os primeiros cristãos achavam que os sacerdotes só existiam no paganismo e no judaísmo; o modelo deles era mais igualitário.


          RAIO-X KAREN ARMSTRONG
          NASCIMENTO
          14 de novembro de 1944, em Wildmoor, Reino Unido
          FORMAÇÃO
          Aos 17 anos, tornou-se noviça e assumiu o nome de irmã Marta. Deixou o convento quatro anos depois. Estudou literatura inglesa na Universidade de Oxford
          PRINCIPAIS LIVROS
          "Jerusalém - Uma Cidade, Três Religiões" (2000), "Maomé - Uma Biografia do Profeta" (2002)



          SAIBA MAIS
          Ciclo chega neste ano à sua 7ª edição
          Iniciado em 2007, o ciclo de conferências Fronteiras do Pensamento chega neste ano à sua sétima edição, aberta no dia 17 de abril, em SP, pelo escritor peruano Mario Vargas Llosa. Karen Armstrong, que esteve ontem em Porto Alegre, dará palestra em SP amanhã. Mais informações no site do evento: fronteirasdo pensamento.com.br