sábado, 6 de julho de 2013

Marcelo Coelho

folha de são paulo - Opinião
Manifestações expõem o fato de que o poder não muda
O FATO DE QUE O PODER NÃO MUDA, DE QUE HADDAD SE ALIA A MALUF ENQUANTO A CURA GAY FOI IDEIA DE UM TUCANO, FOI EXPOSTO
MARCELO COELHOCOLUNISTA DA FOLHAAs manifestações do mês passado foram de lavar a alma. Em 2007, tentou-se fazer coisa parecida. Mas quem se lembra do movimento "Cansei"? Não deu certo. Estava excessivamente identificado com o antilulismo, a Fiesp, o "andar de cima", enfim.
Silenciou-se, agora, a versão de que toda crítica ao PT era coisa da direita golpista. Se as críticas à corrupção e ao péssimo estado dos serviços públicos cresceram agora --e pouco se falou contra desemprego ou carestia--, isso talvez seja consequência dos próprios ganhos sociais acumulados na última década.
Garantido um maior acesso aos bens de consumo, chega a hora em que o cidadão menos rico também diz "cansei". Compra um computador, e aquilo bem ou mal funciona. Mas o ônibus não funciona, nem a escola nem o posto de saúde.
A "nova classe C" chegou provavelmente a seu teto de consumo, e não lhe sobram tantos recursos para migrar de vez para o mundo da escola paga, do plano de saúde privado, da segurança particular.
Isto posto, é certo que as manifestações de junho foram "multiclassistas". Havia a ultra-esquerda. Havia uma classe média que, decepcionada com os seus tucanos e com os seus Demóstenes, resolveu fazer oposição com as próprias mãos. Havia uma massa estudantil que já não é tão elitizada, graças às cotas e ao ProUni.
Havia uma juventude de periferia para quem os males do Estado não se localizam em Dilma ou Renan, mas numa PM que prende, achaca e barbariza. Havia os descontentes com uma PM que não prende e com uma Justiça que prende menos ainda.
No meio desses dois extremos, a maioria só se mobilizou de fato quando entrou em cena o direito democrático de protestar sem ser espancado pela polícia.
Uma escolha foi feita entre duas fotos terríveis: a do policial quase linchado e a do outro, batendo no casal que tinha entrado numa cafeteria.
Ninguém estava a favor do vandalismo. Mas estava menos ainda a favor da baderna policial. A questão da PM é o grande tema ainda a ser tratado, com reforma política, transportes, educação.
Com isso, as circunstâncias fizeram com que Alckmin e Haddad, PSDB e PT estivessem "objetivamente" do mesmo lado. A saber, do lado direito do Sena, em Paris.
Primeiro as planilhas, depois o cassetete.
O fato de que o poder não muda, de que Haddad se alia a Maluf enquanto a cura gay foi ideia de um tucano, foi exposto.
Não é só no Brasil que as máscaras da política vão caindo. Outras, com o "V" de Vingança, correm o mundo. Ainda que eu não me sinta confortável com o que pode vir daí, pessoalmente me senti vingado também.

    Laertevisão + Quadrinhos

    folha de são paulo - Laertevisão
    CHICLETE COM BANANA      ANGELI
    ANGELI
    PIRATAS DO TIETÊ      LAERTE
    LAERTE
    DAIQUIRI      CACO GALHARDO
    CACO GALHARDO
    NÍQUEL NÁUSEA      FERNANDO GONSALES
    FERNANDO GONSALES
    PRETO NO BRANCO      ALLAN SIEBER
    ALLAN SIEBER
    QUASE NADA      FÁBIO MOON E GABRIEL BÁ
    FÁBIO MOON E GABRIEL BÁ
    HAGAR      DIK BROWNE
    DIK BROWNE

    Walter Ceneviva

    folha de são paulo
    Angústia de nossa era
    Não há justiça, qualquer que seja o resultado, se a demora deste for excessiva
    O leitor não integrado às profissões jurídicas tem motivo para dúvida quando vá definir o que seja a Justiça humana e o que espera dela. O profissional do direito esbarra com razões ainda mais severas na análise do problema e dos caminhos para seu aperfeiçoamento.
    A justiça oficial --de mulheres, homens e governos-- é do interesse de cada brasileiro, em cada momento de sua existência, mas gera insegurança quando se chega à pergunta inafastável: afinal há efetivamente uma justiça humana?
    Dois exemplos recentes em nosso país (dois, entre muitos) forçam a reiteração da pergunta.
    O primeiro nos leva ao homicídio que vitimou uma criança, no colo de sua mãe boliviana. O ladrão que a assaltou considerou pouco o dinheiro de que ela dispunha. Matou o menino a tiro. A justiça humana tem punição adequada para o homicida e o delito horrendo?
    O mesmo questionamento surgiu quando quatro moços, na faixa dos 20 anos, encontraram menina de 14 anos, que voltava para sua casa na trilha de uma área desabitada. Agarram-na e a estupraram seguidamente. Para impedir que ela os denunciasse, mataram-na. Enterraram o corpo. Acabaram descobertos. Confessaram.
    O que fazer com os autores desses atos? De novo: o sistema da justiça humana está habilitado para fazer justiça? Para localizar os delinquentes, processá-los? Daqui a quantos meses ou anos a sentença será exequível?
    A primeira resposta é óbvia: as decisões judiciais devem ser proferidas em tempo breve. O juiz e o administrador estão obrigados pela Constituição a preservar a duração razoável do processo. Razoável não se ajusta aos enormes prazos de muitos feitos judiciais. Se a máquina pública impedir o ajustamento, os juízes hão de se revoltar contra ela.
    Nestes tempos de transformação dos costumes, cresce a preocupação com o papel do Judiciário e com a aplicação eficiente do direito penal. Transportada a questão do nível humano para a dignidade dos procedimentos das nações desde as mais poderosas às mais pobres também há dúvida sobre a justiça entre elas. Como pedir solução rápida entre as nações, se não conseguimos dá-la para nossos cidadãos?
    Pergunta frequente: pode a sociedade continuar convivendo com delinquentes cada vez mais ousados e cruéis? Nenhuma solução, porém, pode ser aceita se fugir à apuração cuidadosa de cada conduta individual ou de cada participante de ação coletiva. Por outro lado, sabe-se das deficiências do aparelho punitivo, desde dúvidas sobre a lisura das investigações. Mais, ainda, com prisões que estimulam o crime em vez de o combater, desde apurações com meios insuficientes, na lentidão até chegar à sentença final, condenatória ou absolutória.
    Repetindo: não há justiça, qualquer que seja o resultado, se a demora deste for excessiva.
    A Constituição passou a considerar defeito incompatível com os direitos fundamentais a quebra da celeridade na tramitação do processo. Para atacar essa angústia de nossa era, além da exigência do prazo breve, falta o tratamento para delitos cuja extrema gravidade não os enquadra nas definições da lei penal de hoje, com clareza tal que, além da interpretação atualizada, permita o afastamento da insegurança nos meandros da triste problemática punitiva de hoje.

    LIVROS JURÍDICOS
    CONTRATO ADMINISTRATIVO
    AUTOR Fernando M. de Almeida
    EDITORA Quartier Latin (0/xx/11/3101-5780)
    QUANTO R$ 99 (405 págs.)
    Odete Medauar apresenta o texto do autor, para concurso de livre-docência na Fadusp, como "estudo primoroso". São três partes: na primeira, vai da matriz francesa a aspectos conceituais do contrato e à natureza do contrato em nosso direito. Na terceira vê a complexidade contratual brasileira, em sua essência.
    DIREITO ADQUIRIDO
    AUTOR Lilian Barros de Oliveira Almeida
    EDITORA Saraiva (0/xx/11/3613-3344)
    QUANTO R$ 62 (222 págs.)
    José Eduardo Martins Cardozo destaca no prefácio a importância desta dissertação de mestrado no exame do direito adquirido "sob os prismas histórico, teórico, dogmático e jurisprudencial". A súmula conclusiva da autora, em oito páginas, compõe súmula compacta, merecedora de leitura, antes dos sete capítulos do texto.
    RESPONSABILIDADE CIVIL: A PERDA DE UMA CHANCE NO DIREITO DO TRABALHO
    AUTOR Flávio da Costa Higa
    EDITORA Saraiva
    QUANTO R$ 50 (272 págs.)
    Súmula de julgados nacionais e estrangeiros e notas bibliográficas (págs. 248-271) revelam a pesquisa desenvolvida pelo autor. O texto, de conteúdo denso, tem história, noções propedêuticas, compondo notas introdutórias e definindo a perda de uma chance, em geral e, em particular, no direito do trabalho.
    A PROVA NO DIREITO PROCESSUAL CIVIL
    AUTOR Obra coletiva
    EDITORA Verbatim (0/xx/11/5533-0692)
    QUANTO Preço não informado (655 págs.)
    Tema de importância fundamental na aplicação às questões do processo civil surge na obra em homenagem a João Batista Lopes. A coordenação de Olavo de Oliveira Neto, Elias M. de Medeiros Neto e Ricardo A. de Castro Lopes deu a utilidade fundamental do texto para profissionais, em 44 ensaios de amplo espectro.
    COLEÇÃO "CARREIRAS ESPECÍFICAS"
    EDITORA Saraiva
    QUANTO R$ 129 cada volume
    A magistratura federal surge em dois volumes (vol. 1, 974 págs.; e vol. 2, 1.000 págs.), coordenada por Flávia Moura de Andrade e Lucas dos Santos Pavione, em comentários e estratégia para 14 matérias.
    COMO SE PREPARAR PARA CONCURSOS PÚBLICOS
    AUTOR Maria Rosa Fiorelli
    EDITORA Atlas (0/xx/11/3357-9144)
    QUANTO R$ 32 (120 págs.)
    Fiorelli teve a boa iniciativa de definir método de preparação com planejamento, estudo (domínios de conteúdo) e a avaliação (evolução da aprendizagem).

      Droga tradicional para cólica de bebê volta ao mercado

      folha de são paulo
      jOHANNA NUBLAT
      DE BRASÍLIA

      A Funchicórea --remédio tradicional contra cólicas de bebês usado por mais de sete décadas no Brasil, mas fora do mercado há mais de um ano-- poderá voltar em breve às prateleiras.
      Na quinta-feira, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) reverteu decisão adotada em 2005, que indeferiu o registro do produto.
      Vendas do remédio ainda ocorreram até o início de 2012, sob o efeito de liminar conseguida pela empresa. Derrubada a medida, a Funchicórea saiu do mercado.
      Segundo Dirceu Barbano, diretor-presidente da Anvisa, o veto do produto em 2005 não teve relação com questionamentos sobre sua eficácia.
      O diretor explica que, à época, havia receios sobre a variações na quantidade do princípio ativo no produto porque um dos componentes, a planta ruibarbo, estava na forma de um pó.
      "A planta em pó poderia ter variações. Hoje, com a documentação apresentada pela empresa, pelas tecnologias que temos e por mudanças no marco de regulação, é possível retomar a autorização."
      Editoria de Arte/Folhapress
      Neste ano a Anvisa começou a discutir a criação da categoria de produto tradicional fitoterápico para flexibilizar a cobrança de dados científicos que comprovem a eficácia e segurança de fitoterápicos e liberar esses produtos tradicionais.
      A ideia é que os fabricantes comprovem a segurança pelo uso tradicional registrado em artigos e livros, desde que os fabricantes cumpram as regras de higiene atualmente exigidas.
      O diretor da Anvisa explica que a Funchicórea volta ao mercado registrada como medicamento, mas que a empresa poderá optar por enquadrá-lo na nova categoria.
      Barbano diz que a questão sobre eficácia e segurança da Funchicórea não foi alvo de muita discussão, já que produtos registrados antes de 1995 não tinham que apresentar tais documentações.
      "Pelos critérios de tradicionalidade e dados da literatura sobre os compostos da formulação, a Anvisa tem condições de dizer: esse produto pode permanecer no mercado porque é capaz de gerar os efeitos que diz ter."
      Na avaliação de Marco Antônio Duarte, do departamento de gastroenterologia da Sociedade Brasileira de Pediatria, o gosto doce da Funchicórea desvia a atenção do bebê do incômodo da cólica --que afeta metade das crianças entre 15 dias e três meses.
      Barbano diz que a liberação da Funchicórea será imediata, assim que finalizado o relatório de inspeção da fábrica da empresa. E que caberá à empresa retomar a venda quando quiser.
      O laboratório Melpoejo, responsável pelo produto, informou que só vai se pronunciar após oficializada a autorização.

      Alexandre Vidal Porto

      Folha de São Paulo
      Faça amor, não faça a guerra
      O ciberespaço permite tanto ataques capazes de parar um país como o encontro de casais; é só saber escolher
      Se você pensa que guerra cibernética é coisa de filme de ficção científica ou de jogos eletrônicos, pense de novo. Ela é real e pode afetar sua vida.
      Além do ar, da terra e do mar, o ambiente virtual --o ciberespaço-- também se tornou cenário de operações militares. De acordo com o Instituto para Pesquisa em Desarmamento da ONU, 41 países incluem ações cibernéticas --ofensivas ou defensivas-- no planejamento de suas operações militares. Desses, 27 têm unidades de forças armadas dedicadas exclusivamente ao emprego de tecnologia cibernética em exercícios de guerra.
      Nessa modalidade, os ataques podem acontecer por roubo de segredos militares ou industriais ou pela perturbação de serviços essenciais, como energia elétrica ou telecomunicações. No passado, seria necessário um bombardeio para desabilitar um aeroporto; hoje, basta um vírus ou um programa malicioso inserido no sistema de tráfego aéreo. Produz o mesmo efeito.
      Em 1993, havia só 50 websites registrados. Em 2013, são cerca de 650 milhões. A universalização da internet em operações governamentais, empresarias e pessoais cria dependência e evidencia vulnerabilidades, que podem ser exploradas por inimigos --governamentais ou não.
      Em 2007, a Estônia sofreu ciberataques que desabilitaram vários sites públicos e privados. Ministérios, bancos e redes de TV foram afetados. O país saiu do ar. As autoridades acusaram a Rússia, mas nada foi provado contra Moscou.
      Em 2012, 30 mil computadores da companhia de petróleo da Arábia Saudita foram infectados simultaneamente. Não se sabe a identidade dos autores, porque a natureza difusa da internet dificulta a identificação da origem dos ciberataques. É uma luta de espadas no escuro.
      O desenvolvimento dos programas militares cibernéticos acontece em sigilo. Sabe-se de algo quando alguém, como Edward Snowden, denuncia, ou quando autoridades de algum país divulgam --como fez a China, que, em maio, anunciou exercícios cibernéticos para teste de novos tipos de "forças de combate". Os EUA, por sua vez, já declararam que ciberataques podem ser respondidos com armas convencionais.
      Não se sabe até que ponto os sistemas de gerenciamento de serviços essenciais se encontram comprometidos pela infiltração de armas cibernéticas. Os setores que mais recebem ataques predatórios são o aeroespacial e o de defesa, seguidos por energia e combustíveis, farmacêuticos e financeiros.
      Os computadores e as redes aumentam a produtividade econômica e são fundamentais para a administração de governos em todo o mundo. Essa dependência da internet cria vulnerabilidades. No entanto, com ou sem risco, ninguém quer voltar para um mundo sem tecnologia digital. Os governos vão ter de se preparar.
      No ciberespaço tem muita coisa boa. Você sabia que quase 20% dos casais que contraíram matrimônio nos EUA no ano passado se encontraram pela internet? Pois é, no mundo virtual tem guerra, mas tem amor também. É só saber escolher.

        Joaquim Barbosa usou cota do STF para viajar ao Rio

        folha de são paulo
        DE BRASÍLIAO presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa, usou a cota de passagens a que tem direito na corte para viajar ao Rio de Janeiro, seu Estado de origem, no início do mês passado.
        Na ocasião, ele assistiu ao jogo amistoso entre Brasil e Inglaterra, no estádio do Maracanã.
        Uma decisão administrativa de 1995 regulamentou cota de passagens aéreas para os ministros viajarem para o Estado de origem, caso dessa viagem de Barbosa.
        Reportagem da "Agência Estado" mostrou que o ministro usou a passagem e aproveitou para assistir ao jogo no camarote do casal de apresentadores da TV Globo Luciano Huck e Angélica.
        Em nota divulgada ontem, o STF negou que Barbosa tenha viajado para assistir ao jogo do Brasil.
        "O ministro retornou para a sua residência no Rio de Janeiro, como faz regularmente há mais de dez anos, desde que empossado no Supremo", afirma a nota do tribunal.
        De acordo com o STF, Barbosa teve seu deslocamento, em avião de carreira, pago pelo Supremo por ser uma prerrogativa de todos os ministros da corte e de outros tribunais.
        O Supremo informou que o gasto com a passagem está dentro do limite anual de gastos para os deslocamentos.
        "A cota de passagens é anual e tem validade independentemente do recesso judiciário ou períodos de licença", diz o texto.
          Sob pressão, governo vai abrir dados sobre uso de aviões da FAB
          Nomes de autoridades, datas, destinos e motivos das viagens com a frota oficial serão divulgados na internet
          Custo de deslocamentos e identificação de passageiros ficarão em sigilo; nova medida só vale para o Executivo
          FERNANDA ODILLADE BRASÍLIAO governo federal decidiu divulgar na internet informações sobre o uso de aeronaves oficiais depois que um ministro e os presidentes da Câmara e do Senado usaram aviões da FAB (Força Aérea Brasileira) para ir a uma festa na Bahia e ao jogo da seleção brasileira no Rio.
          Folha revelou os três casos nesta semana. O ministro Garibaldi Alves (Previdência) e o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), deram carona a amigos e parentes para o Rio, onde assistiram à final da Copa das Confederações, no Maracanã.
          Já Renan Calheiros (PMDB-AL), que preside o Senado, foi com sua mulher para a festa de casamento da filha do senador Eduardo Braga (PMDB-AM), líder do governo, em Trancoso. Todos decidiram ressarcir a União depois que as viagens foram reveladas.
          Decreto de 2002, que disciplina o uso das aeronaves da Aeronáutica, autoriza o vice-presidente, presidentes do Senado, da Câmara e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministros de Estado e comandantes das Forças Armadas a usar aviões "por motivo de segurança e emergência médica; em viagens a serviço; e deslocamentos para o local de residência permanente".
          A decisão do governo de dar transparência vale apenas para viagens de integrantes do Poder Executivo. Atualmente, nenhum detalhe das viagens em aviões oficiais é público.
          "Vamos abrir, não há por que não dar transparência. Não estou falando da Câmara e do Senado, mas do governo federal, que é o que me compete", disse à Folha o ministro Jorge Hage (Controladoria-Geral da União).
          Ainda está em discussão se os dados serão divulgados no site da Aeronáutica ou do Ministério da Defesa.
          Custos e lista de passageiros devem permanecer sob sigilo, assim como detalhes de voos relacionados à missões de segurança ou defesa.
          Hage afirma que o governo vai "colocar no ar" dados como o nome da autoridade que solicita o avião da FAB, a quantidade de passageiros, dia, hora e destino, bem como se o motivo da viagem é por uma emergência médica, a serviço ou para o local de residência do solicitante.
          São essas informações que as autoridades são obrigadas a apresentar no pedido encaminhado à Aeronáutica, conforme prevê o decreto que regulamenta o uso de aeronaves oficiais.
          No pedido, não é obrigatório listar o nome dos passageiros. A FAB alega que não arquiva informações sobre quem entra na aeronave juntamente com as autoridades.
          No momento da decolagem, todos os passageiros se identificam, mas depois a Aeronáutica afirma que descarta as informações.
          "Não sei se a Aeronáutica vai mudar seu entendimento em relação aos custos, que ela afirma ter natureza estratégica, ou aos passageiros", afirmou Hage.
          Ontem, ele se reuniu com o ministro Celso Amorim (Defesa) para tratar da transparência dos voos oficiais solicitados por autoridades.
          PRAZO
          Hage afirma que Amorim se mostrou aberto a colocar no ar as informações "já nas próximas semanas".
          Questionado por que o governo decidiu só agora divulgar os dados de voos oficiais, Hage explica que a ideia é "ir gradualmente dando transparência a tudo".
          "Decidimos priorizar isso depois de receber ofício solicitando a relação dos voos da FAB requisitados por autoridades", explicou o ministro, se referindo ao pedido feito pelo senador João Capiberibe (PSB-AP).

            Painel - Vera Magalhães

            folha de são paulo
            Isolamento palaciano
            O Planalto admite que a maioria na Câmara está ameaçada e que partidos aliados, como o PMDB, agiram para derrotar o governo no projeto que destinaria ao Minha Casa, Minha Vida os recursos da multa sobre o FGTS. Após reunião com petistas ontem, Dilma Rousseff questionou Rui Falcão sobre o PT participar da paralisação geral marcada para quinta-feira. Segundo auxiliares da presidente, Falcão minimizou o ato e disse que o partido iria para defender a reforma política.
            -
            Faca nos dentes O entendimento de integrantes do governo é que os petistas aproveitarão a má fase de Dilma para pressioná-la a ceder cargos e trocas na equipe.
            Quem se habilita? Apesar das especulações, não há definições a respeito das substituições ministeriais. Nas lideranças do Congresso, um dos nomes defendidos internamente era o de Paulo Teixeira para a Câmara, mas o deputado se lançou para a presidência da legenda.
            Ação Os próprios petistas apresentaram a Dilma o diagnóstico de que a base aliada está em ruínas. A presidente reagiu e disse que fez seu papel ao reconquistar o apoio do faxinado PR e ao agregar o PTB e o PSD ao seu governo. Ela se comprometeu, no entanto, a ampliar o diálogo com o Congresso.
            Ponta Dilma jogou para a bancada do PT a responsabilidade de assumir um papel de "liderança" na coalizão governista. Para o governo, o PMDB se tornou protagonista no Congresso e consegue guiar a base aliada segundo seus interesses.
            Pauta única Mercadante tentou aproveitar a reunião com a bancada para sensibilizar os petistas sobre a retomada da proposta de destinar 100% dos royalties para a educação, mas foi cortado por Dilma. A presidente disse que não era hora de discutir questões específicas e que a pauta era apenas política.
            Baixa Em reunião com a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) ontem, o ministro Fernando Pimentel lamentou ao anunciar a saída de Tatiana Prazeres do Ministério do Desenvolvimento e Indústria. A secretária de Comércio Exterior da pasta se mudará para o exterior.
            Octógono 1 Em pleno esforço concentrado da Câmara e do Senado após os protestos de junho em todo o país, cinco deputados e um senador viajaram a Las Vegas para assistir à disputa entre Anderson Silva e Chris Weidman pelo título do UFC, hoje.
            Octógono 2 O senador e presidente do PP Ciro Nogueira (PI) e os deputados Dudu da Fonte (PP-PE), Guilherme Mussi (PSD-SP), Luiz Fernando Faria (PP-MG) e Maurício Quintela (PR-AL) viajaram para os EUA no domingo. Sérgio Guerra (PSDB-PE) se juntou ao grupo na quinta.
            Esquiva Dudu da Fonte disse ter custeado suas despesas e ter viajado em avião de carreira. Guerra também afirmou ter arcado com seus gastos. Os demais não retornaram as ligações da coluna.
            Plim-plim 1 Renan Calheiros (PMDB-AL) só mudou de ideia e decidiu reembolsar a União pelo voo em aeronave da FAB para ir ao casamento da filha de Eduardo Braga (PMDB-AM) quando o "Jornal Nacional'', da Globo, abordou o assunto.
            Plim-plim 2 Aliados do presidente do Senado o aconselhavam a não devolver o dinheiro, pois o recuo seria confissão de improbidade.
            Visita à Folha Alexandre Padilha, ministro da Saúde, visitou ontem a Folha. Estava com André Segantin, assessor, e Gabriela Wolthers, assessora de imprensa.
            com ANDRÉIA SADI e BRUNO BOGHOSSIAN
            -
            TIROTEIO
            "O senador Aécio fala tanto sobre a possível volta do presidente Lula que parece estar torcendo por isso, mais do que os petistas."
            DO DEPUTADO FEDERAL FERNANDO FERRO (PT-PE), sobre as declarações de Aécio Neves (PSDB-MG) sobre possível participação de Lula na reforma política.
            -
            CONTRAPONTO
            Arqueologia legislativa
            Provocado por Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) a explicar na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, um aspecto técnico do programa social Renda Básica de Cidadania, de sua autoria, Eduardo Suplicy (PT-SP) passou a narrar com minúcias a tramitação do projeto, que é seu xodó, até sua sanção em 2002.
            O petista voltou a relacionar o programa ao Bolsa Família. Aloysio Nunes, que credita a origem dos programas de transferência de renda aos governos do PSDB, retrucou:
            --A sua lei é tão precursora do Bolsa Família quanto a Lei do Ventre Livre é precursora da CLT.

              CLÁUDIA LAITANO - Uns por todos

              Zero Hora - 06/07/2013

              Um homem parado diante de uma frota de blindados perfilados produziu a imagem mais poderosa dos protestos da Praça da Paz Celestial, em 1989. Uma multidão pode estar certa ou errada, ser movida por ideias ou pela desrazão.

              O indivíduo que enfrenta algo maior e mais forte do que ele também pode estar certo ou errado, mas sempre seremos levados a nos compadecer diante da enorme fragilidade de um homem que combate sozinho. Um acaso e nem sequer existiríamos, uma distração e deixamos de existir. Ainda assim, uma única pessoa pode fazer toda a diferença no destino de uma causa ou de uma multidão de gente.

              Sempre me ocorre a imagem do manifestante chinês quando penso na batalha cotidiana de quem trabalha com cultura no Brasil. Em um cenário de poder público errático, raros mecenas e centralização de recursos nas grandes metrópoles, o papel da iniciativa pessoal acaba sendo decisivo. Seja dentro dos precários canais convencionais, seja operando de uma forma completamente alternativa, como a rede de coletivos Fora do Eixo.

              Por trás das histórias de sucesso da maioria dos empreendimentos culturais do país, há a figura de um manifestante chinês que se postou diante dos tanques da falta de grana, de informação, de política cultural, de planejamento, de público.

              Desse enfrentamento insistente, criativo, ousado, surgem projetos que podem alterar todo um circuito de público, mercado e produção.

              Luciano Alabarse com o Em Cena, Tania Rosing com a Jornada de Passo Fundo, Eva Sopher com o Theatro São Pedro, Bernardo de Souza e Marcos Mello na Coordenação de Cinema e Vídeo da SMC, Fábio Coutinho no Margs e depois na Fundação Iberê Camargo, Liliana Magalhães no Santander Cultural, Fernando Ramos na FestiPoa, sem falar das turmas que atuam somando esforços e talentos, como o pessoal dos festivais Cine Esquema Novo e Fantaspoa e os coletivos musicais que começam a pipocar na cidade.

              São muitos os exemplos aqui no Rio Grande do Sul, desde a época em que o jornalista Say Marques teve a ideia de instalar umas banquinhas na Praça da Alfândega para vender livros – inspiração do fenômeno tipicamente gaúcho da disseminação de feiras do livro pelo interior do Estado.

              O fato de um evento ou instituição tornar-se identificado com uma pessoa ou um pequeno grupo acontece no mundo todo. Em países com mais tradição cultural, porém, o talento surge em meio a um sistema capaz de dar continuidade e mesmo ampliar o alcance de um trabalho bem feito. No Brasil, a descontinuidade é a regra, e fenômenos longevos como a Feira do Livro, a exceção. Assim como nos orgulhamos de um teatro, de um evento, de um centro cultural que funciona, tememos pela sua sobrevivência. Nossa única tradição consistente parece ser a de sermos eternamente provisórios.

              Plebiscito é o melhor caminho para a reforma política? [tendências/debates]

              folha de são paulo
              BRENO ALTMAN
              Plebiscito é o melhor caminho para a reforma política?
              SIM
              Para reinventar a democracia
              Os dois argumentos principais contra o plebiscito para reforma política transitam entre o cinismo e a demofobia. O primeiro deles é que, nas ruas, poucos pediram alteração do sistema institucional --apesar do apoio de 68% dos eleitores, detectado por pesquisas como a do Datafolha, à proposta da presidente Dilma Rousseff.
              O segundo alega que sobra complexidade técnica e falta tempo para que o povo se pronuncie acerca do tema antes de 2014, sugerindo que deveria ser deixado para os conciliábulos do Parlamento. Na melhor das hipóteses, depois de fechado o pacote, os eleitores seriam chamados a referendá-lo.
              Ambos os raciocínios afundam na mesma areia movediça ao desconsiderarem que a cultura da qual emanam múltiplos movimentos e reivindicações é fruto da ruptura entre a vontade popular e as instituições políticas.
              Quando acenou para a abertura de processo constituinte, por meio de consulta à cidadania, a chefe de Estado não se limitou a bandeiras desfraldadas nas manifestações. De forma audaciosa, exigiu a refundação política da República, calibrada pelo protagonismo direto dos cidadãos.
              Mesmo que a ideia original tenha sido modificada, o plebiscito sobre reforma política é caminho que vai além de ouvir as ruas, pois a essas devolve o poder originário previsto na Constituição. Sem esse passo, qualquer outra iniciativa será parte do surrado axioma de que algo deve mudar para tudo permanecer como está.
              Essa ferramenta pode liquidar o ordenamento autoritário, herança da transição conservadora à democracia. Salvo em processos eleitorais, a cidadania possui canais pobres de participação, apesar da sofisticada rede de organização da sociedade.
              As atuais regras eleitorais --com financiamento empresarial, proibição de doações sindicais e voto uninominal-- facilitam a influência de grupos econômicos, diluem o confronto político-ideológico entre projetos e preservam históricas relações de clientelismo, tão preciosas ao poder de coronéis rurais e urbanos.
              A interdição de contribuições empresariais e a implementação do voto em lista certamente constituiriam golpe duro contra essa faceta da ordem política. Aparte limpeza nos modos e costumes, tal reforma tenderia a transformar o voto nas eleições parlamentares em opção mais clara quanto a programas e partidos.
              O avanço poderia ser maior, contudo, se houvesse decisão de ir à raiz do problema, ampliando o território da soberania popular. A possibilidade de convocar plebiscitos impositivos por iniciativa dos próprios cidadãos, por exemplo, desde que apoiada por percentual mínimo de eleitores, estenderia as fronteiras democráticas.
              Apenas o Parlamento, atualmente, detém essa prerrogativa. Ainda assim, seus resultados estão sujeitos à confirmação de deputados e senadores. Se o presidente da República também pudesse convocar plebiscitos, muitas das mazelas que caracterizam as negociações entre Poderes estariam fulminadas. Decide, em última instância, a cidadania soberana.
              Ares frescos seriam igualmente lufados se houvesse recurso ao voto popular para o impedimento de governantes e parlamentares. Os norte-americanos chamam isso de recall, os venezuelanos também o aplicam e tem se mostrado eficaz mecanismo de controle do eleitorado sobre seus representantes.
              O fato é que a rebelião popular e juvenil iniciada em junho desnudou a putrefação e o emperramento do sistema político. As ruas lutam por mais democracia para reposicionar o Estado. O plebiscito se apresenta como passo indispensável para varrer entulhos oligárquicos.
                FLAVIO FLORES DA CUNHA BIERRENBACH
                Plebiscito é o melhor caminho para a reforma política?
                NÃO
                A pauta que parou
                O Brasil tem uma Constituição, instrumento jurídico cuja finalidade é limitar o poder político. A Constituição é o estatuto do governo e as hipóteses de soberania popular nela previstas não podem ser usadas como pronto-socorro.
                Caso o Brasil sobreviva mais 200 anos a seus políticos, algum dia, no futuro, quando se examinar o arquivo morto correspondente à atual fase de nossa história, será encontrado o atestado de óbito de instituições que perecem por doença de lenta evolução. Metástases avançadas tomam conta dos organismos, alastrando-se impiedosamente nos Estados e municípios, empresas públicas e autarquias, entes da administração pública e na vida privada.
                A certidão será lavrada com a estampilha maldita da corrupção --a miúda e a graúda--, usada de modo constante, corriqueiro, quase casual, como instrumento de poder.
                Para lembrar apenas o conhecido episódio de Ruy, estarrecido diante da vitória das nulidades, ou o célebre sermão do padre Vieira, na conjugação do verbo rapio, tudo o que já se disse no Brasil, em todas as épocas, acerca da roubalheira despudorada, da gatunagem institucionalizada, dos sobrepreços criminosos, da malfeitoria organizada, da impune confusão entre a "res publica" e a "cosa nostra" não passa de pálida imagem de aquarela ante as tintas sombrias dos delitos que se sucedem como pragas bíblicas.
                Até poucos dias atrás, parecia que não indignavam mais ninguém. O escândalo de cada semana tornava perempto o da anterior e assim imaginávamos que seria na seguinte. Esse crime continuado tinha de parar. Há de parar. A afronta a elementares princípios éticos não pode se tornar banal. Ontem, era imperativo lutar por liberdade. Hoje, pela decência.
                Era preciso um gesto inicial de esperança, que chegasse para dar impulso a uma tarefa pedagógica de compostura e limpeza. Não veio dos políticos. Nem da universidade. Veio de onde menos se esperava, do povo, consciente de que já não lhe bastam pão e circo. O povo, por enquanto, pode não saber bem o que quer, mas bem sabe o que não quer.
                Faz pouco mais de uma semana, poderia ter sido consultado o Conselho da República, medida prevista nos artigos 89 e 90 da Constituição Federal. Porém, a presidente optou por outra saída. Agora é tarde.
                As fórmulas mágicas, as alquimias políticas, meros placebos institucionais, nada resolvem, só agravam e prolongam a doença. Refiro-me à constituinte exclusiva e aos plebiscitos com alguma autoridade e nenhum ressentimento. Em 1985, na transição do regime militar para a democracia, foram minhas ambas as propostas. No Congresso Nacional, fiquei vencido. Entretanto, tive o apoio da sociedade civil e da Ordem dos Advogados do Brasil.
                Agora, a ideia velhaca da constituinte foi abortada em 24 horas. O povo sabe que o Congresso é poder constituído e não constituinte. Outrora, o povo saiu às ruas por falta de uma Constituição. Hoje, não.
                Os pronunciamentos populares, sejam plebiscitos ou referendos, já foram matrizes de algumas ditaduras e ajudaram a sepultar outras. Estão sempre na ambiguidade da transição, ponto de partida ou ocaso de um regime de exceção. A história ensina que a confusão entre democracia e democratismo geralmente termina mal. Os governos desapetrechados costumam perder a estabilidade quando atiram no próprio pé.
                Espera-se dos intelectuais clareza nas ideias. Dos políticos, na ação. Aos sociólogos, cabe dar explicações, interpretar os fatos. Aos políticos, cabe apontar caminhos. Senão, o povo escolherá o seu trajeto. Não vai combinar com a polícia e vai passar por cima da hipocrisia dos que ostentam o monopólio da virtude.

                  Enigma popular - André Singer

                  folha de são paulo
                  Enigma popular
                  Editoria de Arte/Folhapress
                  Aprovação do governo Dilma por renda
                  Aprovação do governo Dilma por renda
                  Ainda está obscura a intensidade e o significado, para as camadas populares, da insatisfação que explodiu em junho. Deflagrada pela classe média, os efeitos políticos e eleitorais da onda vão depender da maneira particular com que tenha impactado as periferias.
                  Nos setores médios deu-se fenômeno curioso. Liderado por jovens de esquerda, o movimento acabou atraindo grupos variados e opostos. Primeiro, veio uma leva de participantes que tem o perfil típico do eleitor de Marina Silva. Moderno no estilo de vida, liberal nos costumes, posicionado ao centro e irritado com a corrupção. Depois, chegaram os conservadores: furiosos com a corrupção e com o PT, a quem atribuem todos os males do Brasil. Para completar o caleidoscópio ideológico, até a extrema direita desembarcou na avenida, traduzindo em violência contra os partidos socialistas a raiva dos conservadores.
                  Em consequência, dividida em tudo o mais, a classe média desfilou unida pelo desejo de protestar. O seu crescente descontentamento com a situação do país já fora detectado pelo Datafolha no começo de junho (ver terceira coluna do quadro abaixo). Compreende-se, assim, que, nesse meio social, o clima estivesse propício a ações contestatórias.
                  Ocorre que, dada a desigualdade prevalecente, é pequeno o peso numérico dos que auferem ganhos maiores. Na última pesquisa Datafolha, só 15% da amostra tinha renda familiar mensal acima de R$ 3.390. Por isso, os efeitos de algo que se desse apenas nas franjas superiores seriam limitados.
                  Levantamento feito na cidade de São Paulo em 21 de junho, entretanto, mostrou que 66% dos entrevistados com renda familiar de 2 a 5 salários mínimos estavam a favor da movimentação pela redução das passagens. Mesmo 55% dos mais pobres (até 2 salários mínimos) inclinavam-se a apoiá-la. Em seguida, a forte queda da aprovação do governo Dilma (ver primeira coluna do quadro acima) indicava que, embora menos presente nas ruas, a base da pirâmide acompanhou o "era infeliz e não sabia" dos andares acima.
                  Contudo, enquanto não se compreender a extensão e o sentido de tal infelicidade no meio do povo, pouco se poderá dizer a respeito do futuro.
                  avsinger@usp.br

                    Ruy Castro

                    folha de são paulo
                    Conceitos a discutir
                    RIO DE JANEIRO - Vinicius de Moraes estaria fazendo 100 anos, e todas as homenagens que lhe têm sido prestadas, na forma de descoberta de "inéditos" (material de imprensa nunca antes reunido em livro), leitura de seus poemas e apresentação de seu cancioneiro, serão poucas. Mas uma efeméride deveria ser também pretexto para discussão, e Vinicius deixou vários conceitos merecedores disso.
                    Um deles, sua afirmação de que o samba "nasceu lá na Bahia". É um verso do "Samba da Bênção", e que muitos tomam ao pé da letra. A frase é simpática, mas importantes estudiosos do samba, como Carlos Sandroni, Nei Lopes, Roberto M. Moura e outros, nunca a levaram a sério. A inseminação inicial pode ter acontecido na Bahia e, antes ainda, na África, mas sua gestação se deu no Rio, incluindo fusões com outros ritmos e com a música europeia, até o seu glorioso parto, no bairro carioca do Estácio, por volta de 1925.
                    Outro, sua classificação de São Paulo como o "túmulo do samba". Quando Vinicius disse aquilo, numa boate paulistana em 1956, "samba" ainda era um sinônimo de "música popular brasileira" --o que "MPB" se tornou depois. Não se referia ao gênero em si. Claro que, depois, ele se redimiu da frase.
                    E, ainda outro, uma certa nostalgia da Ipanema dos anos 1950, expressa na frase dita em 1974: "Ipanema era só felicidade". Significa que a Ipanema pós-1960 deixou de ser feliz? E como ficam os que moram lá até hoje e têm a sua felicidade particular? E o que os moradores originais de Ipanema --um areal quase virgem em 1920-- achariam da Ipanema de Vinicius?
                    Por fim, sua categórica afirmação, "As feias que me perdoem, mas beleza é fundamental". Vinicius casou-se nove vezes e nem todas as suas mulheres eram bonitas. Mas, como o poeta as achava lindas, talvez o conceito continue valendo

                    Fernando Rodrigues

                    folha de são paulo
                    Errar na política é fatal
                    BRASÍLIA - Presidentes podem errar em muitas áreas. Adotar prioridades equivocadas na educação e na saúde. Decretar moratória da dívida externa sem saber como consertar a economia. Usar dinheiro de sobras de campanha. Comprar deputados para aprovar uma emenda constitucional. Autorizar um esquema de pagamento de propinas mensais.
                    Só há uma área na qual um presidente da República não pode derrapar: na política. Se o manejo político vai para o brejo, é difícil mi- tigar os estragos produzidos por outros tropeços.
                    Mas política não é uma ciência exata. É impossível saber quando o governante esgotou a sua taxa aceitável de barbeiragens. Em geral, percebe-se a degeneração só depois de a situação já estar irreversível.
                    O processo do impeachment de Fernando Collor, em 1992, foi um exemplo clássico de péssima administração política. Não se entenda aqui "administração política" como comprar congressistas e mergulhar na fisiologia. Trata-se de exercer a arte da grande política. Conversar, saber ouvir. Às vezes, do outro lado da mesa, pode estar alguém com interesses heterodoxos. Ainda assim, é preciso buscar algum ponto de convergência dentro dos padrões da legalidade e da decência.
                    No caso da administração Dil- ma Rousseff, é nítida a dificuldade para gerenciar a política. Impressiona o número de aliados, petistas ou não, que hoje festejam o inferno astral da presidente.
                    Ela já chegou ao limite ou ainda há tempo para reparar os estragos? Não há resposta para essa pergunta. Múltiplos aspectos devem ser considerados. Por exemplo, ninguém sabe se o mau humor atual dos agentes econômicos é passageiro ou se veio para ficar.
                    Tudo considerado, Dilma está perigosamente perto da taxa máxima de erros na política. Mas ela e todos nós só saberemos se o governo deu "perda total" no início de 2014.
                    fernando.rodrigues@grupofolha.com.br

                      Na transmissão dos protestos, surge um novo tipo de jornalismo por Ronaldo Bressane‏



                      Edição 82 > _esquina > Julho de 2013


                      Guerra dos memes

                      Na transmissão dos protestos, surge um novo tipo de jornalismo
                      por Ronaldo Bressane
                      À uma da manhã de 18 de junho, um painel da Coca-Cola com centenas de latas vazias ardia em chamas na avenida Paulista, em São Paulo. Do lado esquerdo da peça, o fogo avançava sobre a mensagem publicitária: “Vamos juntos colorir o Brasil.” Do outro lado, um catador recolhia as latas arrancadas do painel, ao lado do novo slogan rabiscado sobre o fundo vermelho: “queima copa.” Além do agente da reciclagem e do fogo vândalo, a cena guardava um protagonista oculto: o repórter ninja que documentou tudo.
                      Mas não se tratava de um guerreiro oriental: a expressão designa o coletivo de mídia Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação, ou simplesmente NINJA. Naquela noite, Filipe Peçanha, integrante do grupo, era o único jor-nalista a cobrir ao vivo o protesto na esquina da Paulista com a rua da Consolação.
                      A transmissão via internet alcançou 80 mil acessos, o equivalente a pouco mais de 1 ponto no Ibope. Nenhum canal de tevê mostrava em tempo real o tumulto das manifestações. Os protestos haviam começado pacificamente na Sé, se convulsionaram no ataque ao prédio da prefeitura e terminaram sob bom-bas da polícia na Paulista.
                      Peçanha tem 24 anos e nasceu em Machado (MG), mas é conhecido como Carioca – culpa de uma temporada em que viveu entre Petrópolis e Teresópolis. Enquanto cobria outra manifestação na Paulista, alguns dias depois, ele se lembrou de como registrou a imagem do painel queimando, que se alastrou pelas redes sociais. Carioca viu uns quinze manifestantes brigando com seguranças junto ao painel publicitário. “Derrubaram o gradil e veio a polícia, que caiu de cassetete em cima de todo mundo. Eles se dispersaram e, nos vinte minutos que se passaram até uma viatura chegar, alguém meteu fogo”, contou.
                      Carioca disse que percebeu o gesto como “uma conquista do movimento”. Em vez de vandalismo, ele preferiu enxergar na cena um reflexo do “caos sígnico” que varreu as ruas brasileiras nos idos de junho. “Quando os caras atacam um signo de poder econômico que ocupava o espaço público, fazem um sequestro do simbólico”, avaliou. “Mas o poder segue vivo, como se vê no catador pegando as latinhas.”
                       
                      cobertura engajada e em tempo real de questões sociais é a marca do NINJA. O grupo atua há um ano e meio e funciona como uma espécie de braço audiovisual do Circuito Fora do Eixo – rede de coletivos catalisados pela figura magnética do ativista Pablo Capilé. A iniciativa nasceu de uma série de discussões políticas que levou à criação da Póstv, canal audiovisual de transmissão ao vivo pela internet. O primeiro tema abordado pelo NINJA foi a Cracolândia do Centro paulistano. Depois disso, o coletivo esteve presente nas marchas da maconha, em blocos de rua e eventos como o “Existe Amor em SP”. Sua missão mais ambiciosa foi o envio de dois correspondentes a Mato Grosso do Sul, para conferir se de fato os índios guarani-kaiowá estavam prestes a praticar suicídio coletivo.
                      O líder natural do NINJA é o carioca Bruno Torturra, de 34 anos, que foi repórter, colunista e diretor da revista Trip por dez anos. Seu texto inventivo, povoado de trocadilhos e imagens bizarras, fornece a alta octanagem política e conceitual que move o coletivo. Enquanto caminhava pela Paulista fechada e vazia, à espera da próxima manifestação, Torturra explicou que o ativismo não funciona se for movido pela raiva, e que por isso defende transmissões bem-humoradas. “A disputa política não pode ser feita com medo ou dedos em riste”, argumentou. “Não é assim que se fecundam mentes. Tem que ser com humor.”
                      O NINJA se vale da facilidade com que as bandeiras sociais circulam na internet para impulsionar sua cobertura. “A rede e a rua se fundiram”, explicou Torturra. “A guerra agora é memética, de imaginários.” O jornalista se referia aos memes, nome dado aos vídeos, fotos, montagens e frases de efeito que se espalham de forma viral pelas redes. Originalmente, o conceito de meme foi proposto pelo biólogo Richard Dawkins como um análogo cultural dos genes. Assim como a seleção natural favorece a transmissão de alguns traços biológicos, a inteligência coletiva da internet define quais memes sobreviverão: “Passe livre”, “Vamos colorir o Brasil”, “Queima Copa”.
                       
                      responsável por criar o “imaginário NINJA” é o fotógrafo e designer Rafael Vilela, que os colegas chamam de Pira (“Por ter morado em Piracicaba e também por ser meio pirado”). É ele quem edita fotos e vídeos e atualiza a página no Facebook com as imagens clicadas numa Canon 6D. Naquela noite, Pira estava publicando fotos do ato contra o deputado Marco Feliciano na praça Roosevelt. Dez minutos depois de postada, uma imagem já tinha sido curtida 400 vezes e compartilhada outras 200.
                      Enquanto postava as fotos, Pira disse que ativismo e comunicação são inseparáveis. “Por isso entramos em lugares que a mídia convencional não vai. Damos voz direta aos personagens, sem intermediários”, explicou. Com os protestos, foram parar inclusive na mídia convencional, entrevistados por revistas e jornais brasileiros, pelo New York Times, peloWashington Post e pela rede árabe de tevê Al Jazeera.
                      Para as situações de rua, um ninja tem dois kits: o individual e o de equipe. No primeiro, um celular com internet, um laptop funcionando e outros que servem como bateria, todos leva-dos numa mochila. O segundo consiste num carrinho rosa-choque carregado com duas câmeras, mesa de corte, microfones, gerador e caixas de som. Tudo da Apple e comprado coletivamente (menos o carrinho, apropriado de um supermercado), com o dinheiro captado pelo Fora do Eixo nos festivais de música que promove pelo Brasil – e nos editais de cultura de que participam.
                      Para praticar jornalismo colaborativo, é preciso compartilhar existências. À exceção de Torturra, o núcleo duro – que incluiainda o cinegrafista cuiabano Thiago Dezan – mora todo ele na Casa Fora do Eixo, no bairro do Cambuci. “A vida coletiva faz com que você nunca fique em zona de conforto”, defendeu Pira. “Como estamos sempre em bandos, criamos canais o tempo todo”, explicou Carioca. “Somos mais porosos ao que acontece. Um ninja nunca está sozinho”, concluiu, pouco antes de se dissolver na multidão.