segunda-feira, 15 de julho de 2013

Editoriais FolhaSP

folha de são paulo
O preço do pedágio
A julgar pelas propostas em estudo, o governo não sabe bem como resolver o problema que criou para si ao anunciar que, em 2013, não haveria aumento na tarifa dos pedágios de estradas federais.
Por força de contrato, as concessionárias podem reajustar esse preço uma vez por ano para repor perdas com a inflação. Diante das manifestações de junho, porém, o governo achou que faria bem em suspender a majoração.
Dizer que a bondade tem efeito publicitário é tão óbvio quanto lembrar que ela tem um custo. Sem ignorar o peso do primeiro desses truísmos, o governo parece amenizar a importância do segundo. Até agora não se sabe como as concessionárias serão compensadas pelo valor que deixarão de arrecadar --o reajuste das tarifas seria da ordem de 6,5%.
Cogitou-se, primeiro, usar verbas do Tesouro para restituir a diferença às empresas privadas que administram as estradas, ampliando gastos correntes. Em outras palavras, o pedágio, que por definição deve ser pago pelos usuários das rodovias, seria subsidiado com recursos de todos os contribuintes.
Aventou-se, em seguida, a hipótese de ampliar o prazo dos contratos em vigor. Seria um contrassenso, já que concessões feitas nos anos 1990 foram pensadas à luz de um contexto econômico mais incerto --e, por isso, têm taxas de retorno mais elevadas.
Ambas as ideias parecem perder força. Segundo afirmou o ministro dos Transportes, César Borges, em entrevista ao "Valor Econômico", ganha peso uma terceira opção. Não menos extravagante, permitiria às empresas reduzir investimentos nas estradas para contrabalançar o deficit na arrecadação.
Ou seja, as empresas deixariam de fazer algumas obras de melhoria, como se a qualidade superior do serviço não fosse exatamente o que se espera das concessões.
Diante da dificuldade de encontrar uma saída, não se descarta nem mesmo que o governo federal volte atrás em sua decisão. Embora já anunciado, o cancelamento do reajuste dos pedágios, se de fato ocorrer, somente será sacramentado em agosto --quando ocorreriam os primeiros aumentos.
Em qualquer dos casos, sobrará para o governo um saldo negativo: se não pelo custo de recuar na sua promessa, pela evidência de que cláusulas contratuais podem ser acochambradas para evitar desgaste político. Tanto pior que isso ocorra às vésperas de importantes licitações de estradas, portos, ferrovias e aeroportos.
    EDITORIAIS
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    Mudança franciscana
    Papa altera normas penais do Vaticano, mas efeitos concretos devem ser maiores na questão da corrupção do que no combate à pedofilia
    Em sua primeira homilia dirigida ao episcopado italiano na Basílica de São Pedro, em maio, o papa Francisco falou sobre a vigilância que os membros da Igreja Católica deveriam manter diante de seduções materiais e mundanas.
    O discurso foi interpretado como um alerta ao corpo eclesiástico, abalado pelos recentes escândalos de pedofilia, de irregularidades na gestão do Banco do Vaticano e de vazamento de informações confidenciais do papa Bento 16.
    Na semana passada, Francisco foi além do discurso. O papa aprovou uma reforma das leis penais do Estado do Vaticano, aumentando o rigor contra infrações sexuais e financeiras e transformando em delito a divulgação não autorizada de informações. A nova legislação entrará em vigor a partir de setembro deste ano.
    Até as mudanças, a Santa Sé baseava suas normas penais na legislação italiana para o tema que vigorava no fim do século 19. Qualquer crime contra menor de idade era genericamente definido como abuso, e os crimes sexuais entravam na categoria dos atentados aos bons costumes. As penas iam de três a dez anos de prisão.
    Agora foram criadas classificações específicas para as diferentes infrações: venda, prostituição, recrutamento, violência sexual, atos sexuais e produção ou posse de pornografia. As sanções previstas vão de cinco a dez anos de de prisão, com multa de até 150 mil euros.
    A mudança legal dá continuidade à reforma iniciada por Bento 16, hoje papa emérito, que procura tornar o sistema da igreja mais transparente e condizente com as convenções e tratados em vigor na comunidade internacional --muitos deles ratificados pelo Vaticano.
    O diretor da ONG americana Rede de Sobreviventes de Abusos de Padres, porém, reagiu com ceticismo ao afirmar que novas regras não são a solução para o problema da pedofilia. Na opinião de David Clohessy, é preciso que as autoridades eclesiásticas --a começar pelo papa-- apliquem duras punições aos infratores, um poder que sempre possuíram, mas que não tiveram disposição para usar.
    Além disso, a alteração refere-se apenas às normas de Estado do Vaticano, não às de Direito canônico, válido para toda a igreja. Padres que cometam crimes sexuais continuarão sendo julgados segundo as leis dos países em que atuam, como não poderia ser diferente, e sob normas eclesiásticas que seguem inalteradas.
    Não se pode negar o impacto simbólico das novas normas, mas seus efeitos concretos deverão ser mais sentidos em aspectos que interessam à direção do Vaticano --como corrupção e lavagem de dinheiro-- do que no combate à sensível chaga social da pedofilia.

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