quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Eduardo Almeida Reis-Banhos‏


Banhos 

A escritora britânica Sarah Bakewell deu-nos livro delicioso sobre o filósofo Michel Eyquem de Montaigne
 
 
Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 18/12/2013 




O assunto banho é recorrente nestas bem traçadas, o que se explica: é de importância fundamental, o que não impediu que cavalheiros ilustres fossem inimigos do limpamento diário ou, quando menos, semanal. Nolan Bushnell, testemunha ocular e olfativa, disse: “É a pura verdade o que se diz sobre sua excentricidade. Steve Jobs não gostava de tomar banho. Cheirava mal”. Auguste de Saint-Hilaire, nascido Augustin François César Prouvençal de Saint-Hilaire (1779–1853), passou anos de sobrecasaca e botas de montaria viajando pelo interior do Brasil, escreveu livros maravilhosos e não me lembro de ter lido uma só referência aos banhos que talvez tomasse. A escritora britânica Sarah Bakewell deu-nos livro delicioso sobre o filósofo Michel Eyquem de Montaigne, com perguntas instigantes como a da página 166: “Poderíamos concluir que Montaigne tivesse pênis pequeno?”. Napoleão Bonaparte formava no time dos maldotados, mas o nosso assunto é banho, motivo pelo qual informo que o imperador da França não gostava que a imperatriz Joséphine de Beauharnais se lavasse antes de ir ao leito. Essa do tamanho do pinto foi novidade, mas o livro de Sarah é tão extraordinário, a começar pela figura admirável do biografado, que justifica a indagação da biógrafa. As portas da torre do castelo da família, onde Montaigne trabalhava, tinham e têm 1,50m de altura. Já estavam lá quando o gênio herdou a propriedade de seu pai.

Montaigne, a exemplo de Gandhi e tantos outros biografados, também é suposto de ter tido ligação homoafetiva com Étienne de La Boétie, que morreu da peste provocada pelo Bacillus pestis, transmitido ao homem pela pulga do rato. Onde havia afinidade e mútua admiração intelectual, o pessoal viram orgulho gay, como diz o doutor honoris causa que vocês elegeram. Étienne era casado; Montaigne casou-se e teve sete filhas, das quais só uma sobreviveu. Dimensões penianas à parte, o livro de Sarah é fantástico e nos dá boa noção da França do século 16. Já existissem as armas atuais e não restaria um só francês, do tanto que se apunhalavam e se arcabuzavam católicos e protestantes, facções cristãs. E cortavam as gargantas e queimavam uns aos outros. Se o sujeito não morresse do Bacillus pestis, não escapava do punhal. O rei Henrique III foi apunhalado por um frade, que recebeu sentado numa privada. Diz a autora que era muito comum, naquele tempo, ser recebido por um rei assentado na privada. Henrique III tomava banhos e usava talheres à mesa. Henrique IV, que também morreria apunhalado (fora da privada), andava sujo “como homem” e cheirava a carne estragada. Amanhã tem mais.

Petismo

Referi-me a determinada filósofa petista como “aquele bagulho”, quando poderia ter dito que é um canhão, um breve contra a luxúria. Não citei o nome do bagulho supondo que existam duas ou três filósofas do PT, como aquela ilustre senhora do conselho relaxa de goza. Houve leitores que, para minha surpresa, se abespinharam com a referência. Nunca imaginei que, a esta altura do campeonato, o philosopho tivesse leitores petistas, mas, pelo visto, tinha e tem. Pior que isso: não acham que a imbecil seja um bagulho. Vejo nos jornais que, depois da prisão de alguns mensaleiros, parece ter aumentado o número de inscrições no PT. Fato perfeitamente explicável, pois em 1841 Charles Mackay, no livro Extraordinary popular delusions and madness of crowds, já dizia “da admiração popular pelos grandes ladrões”. Repito: em 1841.

A existência de petistas em dezembro de 2013 é justificada: “Uma das lições mais tristes da história é a seguinte: se formos enganados por muito tempo, a nossa tendência é rejeitar qualquer evidência do logro. Já não nos interessamos em descobrir a verdade. O engano nos aprisionou. É simplesmente doloroso demais admitir, mesmo para nós mesmos, que fomos enganados. Se deixamos que um charlatão tenha poder sobre nós, quase nunca conseguimos recuperar nossa independência. Por isso, os antigos logros tendem a persistir, enquanto surgem outros novos”. Vale notar que a referência ao livro de Mackay, na parte que diz da admiração popular pelos grandes ladrões, e a explicação sobre a tendência quase universal de rejeitar as evidências do logro, são de autoria de um dos maiores QIs jamais vistos, o de Carl Sagan, no livro O Mundo assombrado pelos demônios. Portanto, é perfeitamente explicável a corrida para inscrição no PT, mesmo considerando que os seus maiores ladrões ainda não entraram na lista dos presos. Quanto ao aprisionamento, por muito tempo, pelo charlatanismo do Cara, que faz o velho petista rejeitar a evidência do logro, também explica muita coisa. Em rigor, só não encontro explicação para a coluna Tiro e Queda contar com tantos leitores petistas.

O mundo é uma bola


18 de dezembro de 1906: Aquidauana, então no Mato Grosso, hoje no Mato Grosso do Sul, foi elevada a distrito. Morei lá perto (uma hora de voo em teco-teco) e atribuo àquela temporada o meu afastamento da cinefilia. Fartei-me de ir ao cinema aquidauanense quando só exibiam dois rolos de um filme de três. Em língua guaicuru Aquidauana significa “rio estreito”. Hoje é o Dia do Museólogo.

Ruminanças

“Hoje, se o gênio não se fingir de imbecil, não arranja emprego.” (Nelson Rodrigues, 1912–1980).

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