domingo, 27 de abril de 2014

Ganhar roubado não é mais gostoso - João Dewet Moreira de Carvalho

Ganhar roubado não é mais gostoso
João Dewet Moreira de Carvalho - Engenheiro-agrônomo em Nanuque-MG
Estado de Minas: 27/04/2014


Xenofonte, ao escrever o livro Ciropédia, conta a história do rei Ciro, descrevendo o uso das práticas esportivas da época na formação dos jovens medo-persas. Talvez tal costume até já fosse norma corriqueira de outros povos mais antigos que, infelizmente, não deixaram tais práticas registradas. No tempo dos gregos, cujo milagre existencial ainda hoje inquieta e fascina os historiadores, o esporte teve lugar de relevância na cultura da sociedade como formador do caráter do cidadão grego.

O esporte sempre teve um apelo muito forte no imaginário humano, especialmente no das crianças, adolescentes e jovens, que são seres ainda em processo de construção e afirmação de valores. Tem sido, portanto, usado mundialmente na educação do ser humano como fator agregador de qualidades como fortalecimento físico, disciplina mental, perseverança na luta, respeito pelo adversário e pelas regras que regem a modalidade esportiva, fatores indispensáveis na formação do caráter de quem o pratica. O uso dos esportes pelos educadores tem contribuído, desde então, de forma ímpar na formação do indivíduo do amanhã, ao melhor capacitá-lo, transferindo para a vivência diária tais valores, que resultarão num cidadão apto à vida em sociedade.

Hoje, é indiscutível a influência que exercem sobre a juventude, ainda em formação, os ídolos dos esportes, que são elevados à condição de heróis, na maioria das vezes, nacionalmente, sendo, então, inquestionável sua influência no vestir, no falar e, principalmente, no agir.

Infelizmente, no Brasil, com a base da formação do seu povo respaldada no nefasto critério de apadrinhamento, que não leva em conta a capacidade profissional do indivíduo nem sua ética, a expressão herói chega a receber designações que às vezes beiram o absurdo, trazendo em si efeitos deletérios à sociedade. Isso é mais grave quando se sabe da influência que tais modelos de herói, que deveriam nortear a juventude do país, desempenham. Na verdade, efeito contrário, fato que pode ser recentemente constatado quando o goleiro de certo time de futebol, com torcedores espalhados por todo o Brasil, ao final de uma partida, cujo resultado vergonhosamente duvidoso lhe garantiu o título do campeonato estadual, disse ao ser entrevistado: “Ganhar roubado é mais gostoso”.

Imaginem a repercussão de desastrada declaração e sua influência na mente da juventude que se espelha em tais ídolos. Pior ainda foi o fato de tamanha desfaçatez ter sido defendida em parte por inúmeros comentaristas e analistas de esporte, tanto nos canais de televisão como em várias emissoras de rádio, como algo normal, coisas do futebol. Vale lembrar que os mesmos valores praticados dentro dos campos de futebol são refletidos por todos os cantos do país, inclusive no Congresso Nacional. É difícil acreditar que alimentar o mal e suas práticas poderá resultar em benefícios para a sociedade.

Não deveria se dar maior valor midiático aos ídolos que agregam exemplos mais dignos aos menores em vez dos que defendem o roubo, a mentira e o assassinato como algo a ser praticado? Se a luta dos pais e pedagogos com a presente geração de adultos foi relativamente perdida, não caberia a responsabilidade de pelo menos cuidar melhor da formação das próximas gerações de cidadãos brasileiros, condenando enfaticamente procedimentos que levem ao desvirtuamento dos dignos valores humanos?

Que tipo de sociedade será construída ao se partir de valores que enaltecem o roubo como algo bom e cuja prática o torna mais gostoso? Será que já não basta o lamentável charco de corrupção e descrédito que envolve todas as instituições do país? Não seria a hora de se dar um basta em tudo isso? Afinal, o brasileiro ainda tem o direito de se orgulhar do seu país.

Nenhum comentário:

Postar um comentário