sábado, 19 de abril de 2014

Revolução - Eduardo Almeida Reis

Em verdade vos digo: duro é sair do Google e voltar ao texto que você estava escrevendo, porque o mundo high-class é muito divertido


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 19/04/2014


Pouquíssimas coisas mudaram tanto o mundo quanto o Google, onde você encontra fatos e fotos de divulgação inimaginável há 15 anos. Traições, testes de paternidade, ménage à trois a montões, coisas que a gente sabia muito por alto surgem agora impressas: um espanto! No reino das celebridades, então, o negócio é de horrorizar e “faz parte”. A senhora Narcisa Tamborindeguy, socialite, escritora e advogada nascida no RJ, diz que sem escândalo não é high. E o Collins diz que high é alto.

Entre as pessoas de high-class, de high-level, os escândalos repercutem no Google com detalhes que horrorizam, o que não quer dizer que inexistam nas classes menos favorecidas. Há programas de tevê especializados no assunto.

E o certo é que dei com este velho costado no Google digitando o apelido de conhecida socialite, que foi casada com um presidente deste país grande e bobo. Só agora fiquei sabendo que apanhava tanto de sua excelência que chegou a ficar surda de um ouvido. A dois ambos, depois disso, casaram-se uma porção de vezes e tiveram uma penca de filhos. Passa um pouco das dez da noite e hoje acordei às quatro e vinte da manhã. Vou dormir. Prometo retomar o assunto descansado, com toda a cautela do mundo.

Voltei para explicar que digitei o nome da socialite porque fui vizinho, na roça fluminense, do irmão dela e de um dos seus maridos. Uma vez no Google high-level, o próprio buscador leva o intrometido consulente aos outros casos e o xeretar faz que você leia o resto, mesmo que não conheça os envolvidos. Em verdade vos digo: duro é sair do Google e voltar ao texto que você estava escrevendo, porque o mundo high-class é muito divertido.


Injustiça
Município que faz divisas com Muquem do São Francisco, Oliveira dos Brejinhos e Paratinga – Ibotirama, que em tupi significa flor promissora, de mbotyra (flor) e rama (promissor, futuro), teria tudo para se transformar em destino turístico internacional, não fosse a implicância da indústria do turismo mundial com os maravilhosos destinos brasileiros. Basta lembrar que a indústria, em sua implicância, considera Paris melhor destino turístico do que Belo Horizonte, e Florença melhor que Contagem.

As virtudes ibotiramenses não impediram, contudo, que a Justiça baiana cometesse tremenda injustiça ao condenar o senhor Paulo Alberto Magalhães a 12 anos de prisão, em regime fechado, pelo fato de enfiar 31 agulhas de costura no corpinho de um enteado de dois anos.

Paulo Alberto não negou o trabalho feito no corpo do enteado em 2009, mas disse que agiu por ordem do senhor Ogum. O senhor Ogum, como sabe o leitor, é orixá masculino estreitamente ligado a Exu, a quem mitos nigerianos atribuem a comunicação da metalurgia do ferro aos homens, com o que estes dominaram a natureza; manifesta-se na forma de um guerreiro.

Releva notar que Paulo Alberto, devoto de Ogum, teve o carinho de dopar o enteado com vinho para que o guri não sentisse dor ou incômodo durante o enfiar de cada agulha. Cumprindo ordens do orixá, o mínimo que se poderia esperar de uma Justiça realmente justa seria a condenação dos dois, de Ogum e do padrasto, aos 12 anos em regime fechado. É por essas e outras que a população brasileira anda fazendo justiça com as próprias mãos nos episódios que a imprensa resolveu chamar de barbárie.

No Oiapoque ao Chuí, pilhados em flagrante, ladrões, estupradores e homicidas vêm sendo amarrados aos postes e espancados neste ano da Copa das Copas, não raras vezes mortos a pontapés, socos ou golpes de lutas marciais.

Barbárie... concordo: qualidade, condição ou estado de bárbaro; barbarismo, selvageria. Mas cabe a pergunta: se o Estado nada faz, ou prende e solta em seguida, como devem proceder os bárbaros cidadãos que trabalham, pagam impostos e não cometem crimes, quando são roubados, estuprados e ameaçados de morte pelos bandidos?


O mundo é uma bola
19 de abril de 1506: massacre de judeus em Lisboa, também conhecido como Pogrom de Lisboa ou Matança da Páscoa. Uma multidão perseguiu, torturou e matou cerca de 3.000 judeus acusados de causarem a seca, a fome e a peste que assolavam o país. O pogrom aconteceu antes do início da Inquisição e nove anos depois da conversão forçada dos judeus em Portugal, em 1497, durante o reinado de Dom Manuel I, o Venturoso.

Expulsos em 1492 pelos reis católicos da Espanha, cerca de 90 mil judeus se refugiaram em Portugal, onde Manuel I se mostrou mais tolerante com eles. Pressionado pela Espanha, contudo, Portugal também exigiu que se convertessem a partir de 1497 para não serem mais humilhados e mortos em público.

Dia 19 de abril de 1506, um domingo, no Convento de São Domingos de Lisboa, quando os fiéis rezavam pelo fim da seca e da peste, alguém julgou ter visto no altar o rosto de Cristo iluminado, fenômeno que só poderia ser interpretado como milagre. Um cristão-novo, que participava da missa, tentou explicar que se tratava do reflexo de uma luz, mas foi calado e espancado pelos fiéis até morrer. O resto dá para imaginar. Hoje é o Dia do Exército Brasileiro e o Dia do Índio (no continente americano).


Ruminanças
 “Quem mata o tempo não é um assassino: é um suicida” (Millôr Fernandes, 1924-2012).

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