terça-feira, 12 de agosto de 2014

Novo exame de alergia‏

Novo exame de alergia
Teste usa células fluorescentes para acusar, por meio de amostra de sangue, o contato com alérgenos
Isabela de Oliveira
Estado de Minas: 12/08/2014



     Por acaso, em 1859, um pouco de pólen caiu perto do rosto do homeopata britânico Charles Barkley, conhecido pelas crises de rinite que sofria. A reação o fez perceber que o pó poderia ser o agente por trás do incômodo recorrente. O experimento acidental foi o primeiro de muitos que, em 1865, culminariam no primeiro teste cutâneo para alergias. Apesar dos avanços de diagnóstico, o exame de pele permanece o mais popular na identificação do problema. Agora, pesquisadores da Suíça propõem uma técnica muito mais moderna, rápida e barata. Células brilhantes acusam a existência de reações alérgicas em amostra de sangue colhida do paciente.

    As abordagens atuais para encontrar o gatilho das crises alérgicas podem ser, basicamente, divididas em duas categorias: in vivo e in vitro. A primeira consiste em inocular pequena quantidade de um alérgeno específico na pele. Se a pessoa for sensível a ele, apresentará vermelhidão e edema na região após mais ou menos 20 minutos. Os exames in vitro detectam, no soro sanguíneo, os níveis de Imunoglobulina E (IgE) – anticorpo que indica uma reação alérgica.

       A proposta dos pesquisadores do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique, na Suíça, é uma versão aprimorada dos testes no tubo de ensaio. O diferencial está no fato de os cientistas se valerem da biologia sintética para desenvolver o sistema de diagnóstico. Nele, células brilhantes identificam o IgE, acusando, assim, a presença do anticorpo e das histaminas, moléculas liberadas pelo próprio IgE durante uma crise de alergia.

      “Em busca de conveniência, economia e resultados rápidos, relacionamos a presença dos alérgenos à expressão de um marcador fluorescente que nos permitiu criar as células brilhantes”, conta o autor sênior do estudo, Martin Fussenegger.

Longe do pólen Em experimentos para testar a eficácia do método, amostras de sangue humano foram expostas a alérgenos, como pólen e ácaros. Em seguida, adicionaram-se as células que poderiam ficar fluorescentes. Os resultados, até agora, são promissores: quando as histaminas estavam presentes no sangue, indicando uma resposta alérgica, as estruturas modificadas brilharam. Os resultados foram detalhados na revista Nature Communications.

      Em vários pacientes, o método proporcionou resultados semelhantes aos do teste cutâneo, mas sem expô-los ao desconforto das aplicações na pele. “Nosso teste é mais rápido e confiável. Também será mais barato. A maioria dos exames de rotina, é feita com amostras de sangue. Agora, essas amostras também poderão ser usadas para detectar alergias”, defende Fussenegger. Há a possibilidade de usar o novo método para detectar outros tipos de moléculas, podendo ainda servir de base para testes que investiguem a ação de drogas terapêuticas.

     Alexandre Ayres, alergista do Hospital Universitário de Brasília (Hub), comenta que a ideia de identificar o IgE para detectar alergias é conhecimento antigo. Entretanto, o método desenvolvido pelos suíços é o que chama atenção. Ayres pondera que testes in vitro podem apresentar falhas e falsos resultados. Ainda assim, atendem bem aos pacientes que não toleram os exames de pele.
      “No teste cutâneo, o médico aplica uma gotinha do agente suspeito na pessoa. Se existe o anticorpo, aparece uma bolinha vermelha que varia de tamanho, podendo ser pequena, média, grande ou muito grande. Isso quantifica a reação. Porém, algumas pessoas estão tão machucadas que é impossível fazer esse tipo de diagnóstico”, detalha. Há ainda as pessoas que ingerem medicamentos que podem apresentar reações potencialmente fatais à aplicação do alérgeno.

Análise completa Ayres alerta que ambos os testes, cutâneo e de sangue, indicam se há sensibilidade a um agente específico. Só depois do resultado, o médico realmente cogita a existência da doença, podendo passar para a segunda etapa do diagnóstico, que é investigar o que pode estar causando o desconforto. “Se o paciente vai ao meu consultório com espirros e coriza e o teste acusa sensibilidade a fezes de baratas, pergunto se existem os insetos na residência dele, se os sintomas pioram quando ele está lá e, assim, desenvolvemos o tratamento”, conta.

Tanto Ayres quanto Fussenegger destacam que cada vez mais gente procura exames que detectem reações alérgicas. A progressão tem sido observada há mais ou menos 50 anos, quando os países iniciaram o forte processo de industrialização e melhora de renda. (veja em Saiba mais). “Existe a chamada teoria da higiene, que preconiza que pessoas que vivem em regiões menos desenvolvidas têm mais contato com alérgenos e patógenos. Portanto, criam tolerância a eles. É como se fosse uma vacina”, explica o especialista do HUB.

    Ayres diz que, diante dessa necessidade, todas as melhorias nos tratamentos atuais são bem-vindas. “A ciência e a medicina estão sempre avançando. Esse exame pode trazer mais agilidade aos médicos. É o que vemos com o de HIV. Antes, eram complicados o testes e o diagnóstico demorava até 20 dias para sair. Agora, não temos mais isso. Muitos lugares, como os centros de testagem e aconselhamento, podem fazer o teste e oferecer o resultado na hora.”


saiba mais

influência econômicas

 A hipótese da higiene foi proposta pelo epidemiologista David Stracham em 1989. Sugere que infecções durante a infância diminuem as chances de a pessoa desenvolver doenças alérgicas e que o estilo de vida ocidentalizado aumenta a incidência de alergias e doenças autoimunes. Isso ocorre porque a exposição aos micro-organismos fortalece o sistema imunológico. Assim, o corpo aprende a se defender apenas contra ameaças graves. As crianças nascidas em países ricos, portanto, são mais suscetíveis às enfermidades por serem criadas em ambientes em que o contato com os patógenos é menor. Em abril de 2013, pesquisadores do St. Luke's-Roosevelt Hospital Center, em Nova York (EUA) encontraram evidências de que garotos imigrantes sofrem menos com alergias do que os nascidos
lá. Entretanto, após uma
década vivendo no país, a
proteção desaparece.






Comum entre brasileiros

Dados da pesquisa Alergias na América Latina, o primeiro esforço internacional para descrever alergias nasais em indivíduos de 4 anos ou mais, revela que 31 milhões de brasileiros já foram diagnosticadas com o problema. Quase dois terços dos adultos pesquisados (59%) sofriam de rinite alérgica sazonal ou intermitente. Outros 39% relataram sintomas durante todo o ano, 57% dos adultos e 63% das crianças foram diagnosticados por meio de testes de pele e sangue.  

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