domingo, 21 de outubro de 2012

"Salve Jorge" leva moradores do Alemão para sua favela ficcional




Habitantes da comunidade carioca serão consultores e atores na nova novela das 21h da Globo
Nova trama de Glória Perez, reúne cenas reais e gravadas que reconstituem ocupação do complexo em 2010

FABIO BRISOLLA

DO RIO

Com uma voz estridente que ecoa pelas vielas do Complexo do Alemão, a vendedora Adriana de Souza, 34, canta aos berros suas próprias versões dos funks mais tocados nas rádios cariocas.
Costuma alterar as letras para encaixar a palavra "empadinha" e assim chamar a atenção da clientela.
Figura conhecida nas favelas do Alemão, na zona norte do Rio, Adriana vai vender suas empadinhas também na próxima novela das 21h da Globo, "Salve Jorge", que estreia amanhã.
Um núcleo da história, criada pela autora Gloria Perez, será ambientado em uma versão do Complexo do Alemão. Como a intenção é misturar realidade e ficção, moradores estão sendo escalados para participações especiais em algumas cenas.
Adriana já fez parte de uma gravação na favela cenográfica construída no Projac (sede dos estúdios da emissora em Jacarepaguá).
"Levei meu isopor, minha roupa de vendedora, e fiquei anunciando as empadas como no Alemão de verdade", disse Adriana, que usa um jaleco branco com a identificação "a moça da empadinha".
Com base em mais de mil fotos do Alemão feitas pela equipe de produção da novela, a cenógrafa Erika Lovisi recriou, em 1.800 m², casas e barracos, lojas e botecos, becos e ruas que remetem às favelas daquela região.
"Não é uma reprodução do Alemão, não replicamos pontos específicos. Mas criamos uma favela com as características que encontramos por lá", explicou Lovisi, que ergueu no Projac 14 prédios com dois ou três andares.
"Uma característica marcante do Alemão é a verticalidade", justifica.
Na nova trama de Gloria Perez, a protagonista Morena (interpretada pela atriz Nanda Costa) é uma moradora da região. Mãe solteira, ela luta para criar o filho, com a ajuda dos pais.
Um dos momentos mais emblemáticos da história recente do Rio -a ocupação do Complexo do Alemão por polícias e pelas Forças Armadas- é o ponto de partida para a aproximação entre a mocinha e o mocinho da trama -ele, Théo (Rodrigo Lombardi), é capitão da cavalaria do Exército.
Formado por 13 comunidades, o Complexo do Alemão era o quartel-general da facção criminosa Comando Vermelho. Imagens reais somadas a cenas de ficção vão reconstituir a ocupação das favelas, em novembro de 2010.
"Eu me emocionei com o resgate de uma parcela da população que vivia amedrontada, sob o domínio de leis paralelas, e quis dar visibilidade a ela. Por isso, situei a protagonista, a trama central, neste universo", disse Glória Perez, em entrevista no lançamento da novela.
O jornal "A Voz da Comunidade", feito por jovens do Alemão, também está na trama. "A Glória criou um personagem que será um repórter do 'A Voz da Comunidade'. Mas eu também vou participar, sendo eu mesmo, fazendo o mesmo trabalho da minha vida real", disse René Silva, 18, o criador do jornal.
Espécie de consultor da autora nos assuntos relacionados às favelas da região, René Silva ganhou fama ao narrar, via Twitter, a ocupação do complexo. "Eles já gravaram cenas em vários pontos do complexo. Os moradores estão ansiosos para ver como vai ser a favela da novela", conta o rapaz.
CONFRATERNIZAÇÃO
Durante a preparação de "Salve Jorge", a direção da novela organizou um encontro da equipe, incluindo o elenco, com os moradores.
Na lista, além de René e Adriana da empadinha, estava a professora de balé Rita Serpa, 50, uma mulher de cabelos ruivos e olhos azuis, que gesticula sem parar e circula com desenvoltura pelas ruas do Alemão cumprimentando moradores pelo nome.
Há 32 anos ela ensina balé clássico a crianças e adolescentes da região.
"Cheguei aqui antes de existir tráfico de drogas, acompanhei todas as mudanças ao longo do tempo", disse Rita, fundadora da ONG Projeto Luar.
"Minha foto já apareceu em uma das chamadas da novela. Todo mundo viu."
A foto faz parte de um seleção de 25 imagens produzidas por fotógrafos da própria Globo para a exposição "Guerreiros da Vida Real", que será inaugurada hoje, a partir das 16h30, na estação Bonsucesso do teleférico que cruza as favelas do Alemão.
Seguindo a linha de temas sociais recorrentes em suas tramas, Glória Perez vai abordar também o tráfico internacional de mulheres.
Um dos ambientes onde ocorrem as ações desse núcleo será a Turquia, repetindo modelo de "Caminho das Índias" (2009) e "O Clone" (2001), novelas da autora ambientadas na Índia e no Marrocos.
"Salve Jorge", dirigida por Marcos Schechtman, traz ainda, no elenco de 90 pessoas, as atrizes Flávia Alessandra, Cláudia Raia e Carolina Dieckmann -essa, numa curta participação especial, inadvertidamente revelada por Vera Fischer, também no elenco, na festa de lançamento da trama.
Ao ser entrevistada, Fischer contou que o personagem de Dieckmann sofre um estupro e, alguns capítulos adiante, morre. "Ela é uma bocudinha", divertiu-se Dieckmann ao saber que a amiga havia revelado uma das surpresas do início da trama.

FRASES
"Não é uma reprodução do Alemão. Criamos uma favela com as características que encontramos por lá"
ERIKA LOVISI
cenógrafa da novela
"É muito parecido, as barracas, a ladeira, os bares. Tem muita coisa igual"
ADRIANA DE SOUZA
vendedora de empadas no Alemão
"Eu me emocionei com o resgate de uma parcela da população que estava vivendo amedrontada, sob o domínio de leis paralelas, e quis dar visibilidade a ela. Por isso, situei a trama nesse universo"
GLÓRIA PEREZ
autora de "Salve Jorge"

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