quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Descoberta substância ligada ao sono exagerado - Paloma Oliveto‏

Proteína pode agir como sonífero natural e causar a hipersônia, doença que leva pessoa a dormir por mais de 20 horas seguidas 

Paloma Oliveto
Estado de Minas: 22/11/2012 

Dormir pelo menos oito horas por dia é o sonho dos insones e, ao mesmo tempo, o pesadelo de quem sofre de hipersônia, uma condição na qual o paciente sente dificuldade para se manter acordado. Seja na escola ou no trabalho, a pessoa pode cochilar e ficar assim por bastante tempo. Estima-se que os pacientes passem até 75 horas semanais adormecidos e, apesar disso, se sentem extremamente cansados quando despertam. O problema afeta a vida social e a produtividade, além de representar um risco, já que, mesmo dirigindo, pegar no sono pode ser inevitável.

Embora não se saiba bem o que provoca a hipersônia, algumas condições como lesões cerebrais e doenças neurológicas podem desencadear o distúrbio. Nesses casos, tratá-las melhora a qualidade de vida dos pacientes. A forma idiopática da doença, porém, não tem causa conhecida e resiste a qualquer estratégia, o que transforma os pacientes em escravos do sono. Agora, uma equipe de pesquisadores da Universidade de Emory (EUA) descobriu uma substância no cérebro que age como um sonífero natural, impedindo que essas pessoas se mantenham acordadas.

“Imaginamos que, dado o estupor ou a profunda sonolência dos pacientes, havia algo em atividade (no cérebro), forçando-os a dormir”, explica David B. Rye, professor de neurologia e diretor do centro de pesquisa do Programa de Saúde do Sono de Emory. Ele faz analogia a um carro que, mesmo com gasolina, não consegue acelerar – nem a anfetamina, droga sintética que estimula a atividade cerebral, ajuda os pacientes a dormir menos. “É como se o freio estivesse travado, precisando ser liberado”, compara. 

As suspeitas recaíram sobre o Gaba, neurotransmissor considerado o principal inibidor do sistema nervoso central. Ele diminui o estado de excitação e provoca uma sedação natural – algumas drogas como álcool e tranquilizantes potencializam seu efeito, deixando a pessoa mais sonolenta. Isso fez os pesquisadores imaginarem que alguma substância presente no cérebro teria ação semelhante, impedindo a mediação do Gaba e, consequentemente, deixando os pacientes eternamente sedados. Restava saber qual era esse vilão.

Para encontrá-lo, os pesquisadores investigaram o líquido cerebrospinal de voluntários diagnosticados com hipersônia idiopática e de voluntários saudáveis. Esse fluido circula do cérebro à medula espinhal carregando resíduos das reações químicas cerebrais. O estudo mostrou que no caso dos que sofrem de hipersônia, uma molécula – provavelmente um peptídeo – age de forma muito parecida a medicamentos como Diazepam, Midazolam e Zolpidem. Esses ansiolíticos deixam as pessoas sonolentas, pois diminuem a excitação do sistema nervoso central. A molécula, ainda não identificada, estaria fazendo a mesma coisa, aumentando o potencial de ação do Gaba.

Remédio em teste Existe, contudo, um antídoto para o problema. Os pesquisadores testaram um medicamento já existente, o Flumazenil, usado para tratar overdose provocada por tranquilizantes e para acordar  quem não consegue despertar depois de uma anestesia. Sete voluntários foram tratados com o medicamento, que mostrou eficácia. É a primeira vez que essa forma do distúrbio, cuja origem pode ser genética, responde a algum tipo de tratamento.
De acordo com David Rye, um dos entraves é encontrar uma companhia farmacêutica disposta a investir nesse mercado. “Na América do Norte, há uma companhia que produz o medicamento, e são apenas 50g de Flumazenil por ano.  Só uma paciente nossa precisa ingerir em um ano 12g.”

 Diagnosticada em 2009 com hipersônia idiopática severa, a estudante de artes Anne (nome fictício, a pedido da entrevistada), de 22 anos, diz que está desesperada com a falta de tratamento para seu caso. A jovem, que participa do Experience Project, organização dos EUA que oferece ajuda a pessoas que sofrem algum tipo de distúrbio neurológico ou mental, afirma que se sente uma “Bela Adormecida esperando pelo final feliz”. Ela já tomou dois medicamentos contra o problema que foram ineficazes. “Da segunda vez, o remédio parou de funcionar e eu simplesmente não conseguia me concentrar. Fiquei desempregada e, um dia, cheguei a dormir 22 horas seguidas, acordei por meia hora e voltei a dormir.”
Poul Jennum, pesquisador da Universidade de Copenhague e autor do mais completo estudo sobre as consequências econômicas do distúrbio, constatou que 47% dos pacientes precisam de algum suporte financeiro do governo. “A falta de tratamento faz da hipersônia um dos mais graves distúrbios do sono. Além da alta taxa de internação hospitalar, descobrimos que o desemprego é 30% maior quando a doença não é tratada”, conta Jennum.

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