terça-feira, 19 de março de 2013

A arte dos ninhos - Maria Esther Maciel


Estado de Minas: 19/03/2013 


Sempre tive certo fascínio por ninhos de pássaros. Tanto pelo que são quanto pelo que representam enquanto espaços de recolhimento, abrigo e criação. Além disso, podem ser verdadeiras obras de arte, dependendo do requinte com que são construídos pelas aves.

Encontrei, há poucos dias, um livro magnífico sobre ninhos, intitulado Berços da vida – Ninhos de aves brasileiras, com textos e fotos de Dante Buzzetti e Silvestre Silva, numa belíssima edição da Terceiro Nome. A capa já nos oferece uma pequena amostra do que vem dentro: a foto de um elaborado ninho de beija-flor. Mas só na página 99 surge a descrição desse ninho, construído pelo beija-flor balança-rabo-canela. É feito de raízes entrelaçadas, fibras vegetais e folhas secas envolvidas em delicadas teias de aranha, e fica geralmente dependurado na folha de uma palmeira ou de um filodendro. O jogo de cores – formado pelo verde da folha, o marrom das raízes e o branco transparente das teias – faz do ninho um elegante poema visual em forma de cone. A foto traz ainda um beija-flor em estado de aparente imobilidade, mas com as asas em movimento, alimentando os filhotes com o bico. Pela descrição, essa espécie faz parte dos chamados beija-flores das sombras, que habitam espaços de pouca luz no fundo da mata. Aliás, já ouvi dizer que o beija-flor é o único pássaro capaz de voar em marcha a ré. E já repararam como bate as asas com rapidez? Mas como nem tudo é perfeito, ele não consegue andar no chão, pois tem as patas frágeis e curtas.

Pelo que se vê no livro, os ninhos dessa ave variam de acordo com a espécie. E, só no Brasil, há mais de 80 espécies. Uma das fotos mostra o beija-flor rabo-branco-de-garganta-rajada, conhecido por enfeitar o ninho com um líquen vermelho que, sob o efeito do calor, tinge os ovos de um tom rosado. Logo depois, vem a imagem do beija-flor-de-fronte-violeta, que prefere criar ninhos em arbustos baixos e forrá-los com paina. Já o beija-flor-preto reveste a parte externa do ninho com liquens cinzentos para camuflá-lo, e o besourinho-de-bico-vermelho faz o ninho sob barrancos, à margem de estradas ou riachos. Mais adiante, vê-se a imagem de um pequeno ninho feito de cascas e líquens, com dois filhotes dentro, ambos à espera de comida. É do beija-flor verde. Lindo.

Diferentes espécies de beija-flor e outras aves brasileiras estão na obra. Os ninhos são de diferentes tamanhos, cores e texturas. Cada um com sua beleza própria. Há também fotos que mostram ninhos com ovos. Mas, pelo visto, nenhum ovo se compara aos da perdiz, de cor arroxeada, e aos do macuco, que são azuis. Se bem que existem os da saíra-diamante, de cor lilás. Parece que têm esse tom graças a um fungo arroxeado que a ave usa para tramar o ninho.

O livro mostra, do início ao fim, como os pássaros conhecem e dominam várias técnicas da escultura, da arquitetura e da costura. Sabem colar, tecer, escavar e entalhar, como poucos humanos. Valem-se, para isso, dos mais distintos materiais extraídos da natureza. E podem nos ensinar muito sobre a arte e a vida.

Se hoje pudesse começar um novo ofício, acho que me tornaria fotógrafa, só para ir em busca de ninhos. De preferência, nos lugares mais difíceis. Ou impossíveis

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