sexta-feira, 26 de abril de 2013

Editoriais Folha SP

folha de são paulo

Conflito anunciado
Tensão entre Poderes leva comissão da Câmara a tentar limitar alcance do STF; de seu lado, corte interfere em tramitação de lei partidária
Presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) agiu bem ao suspender, até segunda ordem, um projeto que poderia transformar a tensão entre o Legislativo e o Judiciário em efetiva crise institucional, com graves prejuízos para o país.
O atrito entre membros do Congresso e do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não diminuiu --ao contrário, aumentou.
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara acabara de aprovar (com a presença de apenas 21 de seus 68 integrantes) uma proposta de emenda constitucional que tenderia a limitar inexplicavelmente as atribuições do Supremo.
O projeto, do deputado Nazareno Fonteles (PT-PI), tirava do STF o poder de dar a última palavra quanto à constitucionalidade das leis aprovadas pelo Congresso. Tal papel, a mais básica função de uma corte constitucional, é uma garantia indeclinável para o bom andamento de uma democracia.
Ao decidir se uma norma aprovada pelo Congresso concorda ou não com a Constituição, o STF aplica um dos freios e contrapesos que, em conjunto, garantem o equilíbrio entre os Poderes da República.
Aos membros da CCJ pareceu chegado o momento de enfraquecer essa prerrogativa. Caso o Supremo suspendesse alguma lei, por julgá-la inconstitucional, caberia ao Legislativo endossar ou desautorizar a decisão --reduzindo o STF, na prática, a uma espécie de consultoria jurídica de luxo.
Aprovado pela CCJ com o apoio de dois réus do mensalão (os petistas José Genoino e João Paulo Cunha), o projeto carregava evidente potencial deletério. Teria ainda de passar, é certo, pelo crivo do plenário e, depois, pelo Senado.
Com isso, o clima entre o Legislativo e o Supremo já estava bastante anuviado. Logo depois, o ministro Gilmar Mendes enxergou sinais de casuísmo --e tem razão-- no projeto da Câmara que dificulta a criação de novos partidos para concorrer nas eleições de 2014.
Sem análise pormenorizada do mérito, mas já adiantando sua opinião, Mendes interrompeu a tramitação da manobra antes de seu exame pelo Senado. A liminar, que não deixa de ser estranha em vista de a lei ainda estar em tramitação, será avaliada pelo plenário do STF.
Embora o primeiro golpe contra a autonomia de outro Poder, desta feita, tenha partido da Câmara, Henrique Alves e Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, reagiram duramente à decisão de Mendes. Afirmaram, com certo exagero, que o STF se intromete nos assuntos do Legislativo.
Menos mal que Alves tenha se comprometido a congelar a tramitação da PEC desequilibrada. Se é ruim assistir a essa disputa retórica, seria péssimo vê-la afetar seriamente os pilares da República.


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De volta ao papel
Diante das inúmeras dificuldades para aprovar obras imobiliárias na cidade de São Paulo, a informatização do sistema, realizada no ano passado, parecia uma iniciativa capaz de trazer maior agilidade e transparência aos procedimentos burocráticos.
Não eram pequenos os obstáculos no caminho de quem pretendia reformar ou construir imóveis na capital paulista. Dependendo do projeto, duas dezenas de etapas precisariam ser cumpridas, com visitas pessoais a mais de cinco repartições. Qualquer alteração poderia levar o processo todo de volta à estaca zero.
Essa trilha longa e tortuosa, pavimentada com pilhas de papel e dificilmente percorrida em menos de um ano, foi substituída, em setembro, pela via digital. Contava-se que a mudança reduziria a demora a três meses --a ideia era que todos os passos pudessem ser dados por meio de computadores em rede.
Saudada como um avanço necessário, a medida ficou longe de ter o impacto previsto. O sistema eletrônico travou, bloqueando o trâmite de mais de 2.600 pedidos. Em seis meses, apenas dois processos novos foram finalizados.
O desdobramento adverso não chega a constituir surpresa. Orçado em cerca de R$ 14 milhões, o sistema por computador foi implantado às pressas, sem o adequado treinamento dos servidores e sem a devida realização de testes.
Tratava-se, ao que tudo indica, de resposta precipitada do então prefeito Gilberto Kassab (PSD) à suspeita de que havia um esquema de corrupção no setor de alvarás.
Conforme esta Folha revelou em maio de 2012, Hussain Aref Saab, ex-diretor Departamento de Aprovação de Edificações, comprou 106 imóveis, num total de R$ 50 milhões, de 2005 a 2012. Sua renda mensal declarada era de R$ 20 mil.
Embora as falhas do sistema digital não sejam recentes --erros foram identificados logo após o lançamento do novo formato--, só agora o prefeito Fernando Haddad (PT) decidiu tomar providências.
Ontem, mesmo dia em que a Folha publicou reportagem sobre a paralisia do sistema eletrônico, a prefeitura anunciou que a aprovação das licenças voltará a ser feita em papel, até que os problemas da via digital estejam resolvidos.
Já se passaram seis meses desde a transição de gestão. A demora para solucionar esse gargalo é injustificável. O mercado imobiliário movimenta R$ 15 bilhões ao ano só em unidades novas --não é difícil perceber quanto esse setor é estratégico para a cidade.

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