terça-feira, 20 de agosto de 2013

Comissão pretende confrontar coronel Ustra com vítima de tortura

folha de são paulo
Acusado de crimes de lesa-humanidade, Brilhante Ustra comandou DOI-Codi de São Paulo no auge da repressão
No 1º depoimento, em maio, oficial defendeu ditadura militar, negou crimes e afirmou que apenas cumpria ordens
LUCAS FERRAZDE SÃO PAULOA Comissão Nacional da Verdade quer um novo depoimento do coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, 81, símbolo da tortura na ditadura militar (1964-1985).
O anúncio foi feito ontem por uma das integrantes do grupo, Rosa Cardoso, que participou em São Paulo de audiência conjunta com a Comissão Estadual da Verdade.
Oficial que comandou o DOI-Codi de São Paulo de 1970 a 1974, auge da repressão, Ustra é acusado de vários crimes de lesa-humanidade. Ontem, Rosa o chamou de "macabro herói tropical".
O coronel é o primeiro --e até agora único-- militar declarado torturador pela Justiça brasileira.
Ele prestou depoimento à Comissão da Verdade, em Brasília, em maio deste ano. Defendeu a ditadura, negou os crimes e afirmou que somente cumpria ordens.
A audiência foi criticada sobretudo pela passividade dos integrantes da comissão.
O resultado foi insatisfatório, reconheceu Rosa Cardoso. "Não tínhamos experiência, e à época ficou decidido não confrontá-lo com testemunhas para não se transformar numa sessão longa. Agora devemos fazer isso", afirmou, citando como exemplo as audiências que ocorreram no Rio na semana passada.
Além de acareações, o grupo quer usar novos documentos do período para inquirir o coronel sobre sessões de torturas e mortes no DOI-Codi --no período que Ustra chefiou o centro, a comissão contou 502 casos de maus-tratos e mais de 40 mortes.
Ontem, familiares de desaparecidos apresentaram informações sobre episódios --todos eles já conhecidos-- que teriam tido a participação direta de Ustra.
A ex-presa política Amélia Teles disse ter sido torturada pelo coronel, ao lado do companheiro e da irmã grávida. Também foram entregues papéis sobre o assassinato de Luiz Eduardo Merlino, em 1971, morte que embasou uma das condenações do coronel na Justiça.
Indagada sobre o motivo de a comissão voltar a Ustra, e não buscar generais ou outros oficiais da cúpula militar também suspeitos de crimes, Rosa Cardoso afirmou que é preciso focar os "símbolos da ditadura".
"Pegar os símbolos é importante para que a sociedade saiba o que aconteceu, podemos ter uma repercussão três vezes maior", disse.
Ustra nega os crimes. A mulher dele, Joseíta Ustra, afirmou à reportagem que não teria como localizar ontem o advogado Paulo Esteves, que fala pelo cliente.
DESFALCADA
Esta será a última semana de Rosa Cardoso como coordenadora da comissão. Ela disse que soube pelos jornais que José Carlos Dias foi designado para ocupar o posto.
Ela nega crise no grupo. Afirmou apenas que há "visões políticas diferenciadas".
Há dois meses a comissão atua com dois integrantes a menos. Gilson Dipp saiu por questões médicas. Cláudio Fonteles, a última baixa, por discordância política.
A presidente Dilma prometeu para breve, mas ainda não anunciou os substitutos.
    RAIO-X CARLOS ALBERTO BRILHANTE USTRA
    Idade: 81 anos
    Ocupação: coronel reformado do Exército
    ATUAÇÃO
    Chefiou, de 1970 a 1974, o DOI-Codi de São Paulo, um dos principais centros de repressão do Exército durante a ditadura
    ACUSAÇÕES
    Ter comandado torturas em presos políticos e torturado pessoalmente algumas vítimas
    502 PESSOAS
    Foram torturadas no DOI-Codi no período em que o órgão esteve sob o comando de Ustra, segundo levantamento do projeto "Brasil Nunca Mais"
    ENFRENTA NA JUSTIÇA
    2 ações cíveis e
    3 denúncias criminais
    CONDENAÇÕES
    - Em 2008, ele se tornou o primeiro militar a ser declarado pela Justiça como torturador do regime, em ação movida pela família Teles; Ustra recorre
    - Em 2012, foi o primeiro agente da ditadura condenado a pagar indenização a parentes de uma vítima da repressão, no caso do jornalista Luiz Eduardo Merlino; Ustra recorre
    O QUE ELE DIZ
    Nega ter comandado ou praticado tortura

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