sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Delação mais premiada - Editoriais FolhaSP

folha de são paulo
Delação mais premiada
Deputados distritais aprovaram uma lei que estabelece a oferta de prêmio em dinheiro a quem denunciar casos de corrupção no governo do Distrito Federal. Os delatores, que poderão levar 10% do valor que for recuperado, não podem ser autores nem coautores do crime.
A polêmica medida está agora nas mãos do governador do DF, Agnelo Queiroz (PT), que pode sancioná-la ou vetá-la.
O diploma entra na categoria das chamadas leis de delação premiada, mas, diferentemente dos dispositivos federais, que beneficiam com diminuição de pena criminosos arrependidos, pretende estimular a denúncia por pessoas que não tiveram participação no delito. Difícil não lembrar do famoso "reward" (recompensa) que encimava os cartazes de "procurado" no velho oeste americano.
Talvez por ser relativamente nova no Brasil, a filosofia da delação premiada ainda causa incômodo. No que diz respeito às normas que favorecem bandidos penitentes, a origem do desconforto é clara: elas incentivam a traição, conduta tão negativa que provoca repúdio mesmo quando ocorre entre criminosos e em benefício da sociedade.
A lei brasiliense conta com mecanismo mais sutil. Como o delator não pertenceria à quadrilha, não se pode falar em traição. A ideia, ainda assim, é perturbadora.
Em tese, qualquer pessoa que tome conhecimento de um crime tem o dever moral de denunciá-lo às autoridades competentes --se se tratar de servidor público, há ainda um dever legal. Ao colocar uma etiqueta de preço num ato que deveria ser automático, a regra de alguma forma rebaixa a cidadania.
Exercícios teóricos sobre comportamentos éticos, porém, funcionam melhor nos manuais de filosofia do que na prática. No mundo real, delatar um crime envolve riscos. No mínimo, de ser tachado de alcaguete. Na pior das hipóteses, a própria vida é ameaçada.
Sem estímulos palpáveis, como recompensas em dinheiro ou vantagens processuais, a maioria tende a optar pela mais confortável inércia --ou pela denúncia anônima, expediente com frequência contestado nos tribunais.
Para combater com mais eficiência os múltiplos e variados esquemas de corrupção e o crime organizado, a sociedade precisa reconhecer que, dentro de certos limites, determinadas medidas pragmáticas constituem um avanço.
Se bem regulamentada, a recompensa pode representar importante ferramenta --e impulsos morais automáticos não deveriam impedi-la.
    EDITORIAIS
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    Celebração inflacionada
    Alta de preços em julho é a menor em três anos e Dilma comemora resultado, mas governo está longe de fazer a economia deslanchar
    Compreende-se que a presidente Dilma Rousseff tenha comemorado o recuo da inflação em julho. Foi, afinal, o primeiro resultado expressivo desde março, quando a taxa acumulada em 12 meses superou o limite de tolerância definido pelo Conselho Monetário Nacional.
    Para Dilma, houve um "estardalhaço" com a alta dos preços nos meses anteriores, mas a inflação estaria "bastante sob controle", a julgar pelos dados mais recentes.
    Há certo otimismo nas declarações presidenciais. Sim, a alta do IPCA em julho, de 0,03%, foi a menor variação mensal em três anos. Além disso, é verdade que, considerados os últimos 12 meses, o índice caiu para 6,27% --abaixo, portanto, do teto da meta, de 6,5%.
    Não se pode ignorar, porém, que para a desaceleração contribuíram fatores episódicos. O congelamento das tarifas de ônibus e metrô teve grande impacto no mês e respondeu por ao menos 0,10% da redução. A queda do preço dos alimentos também ajudou.
    Permanece, no entanto, o principal fator estrutural de pressão inflacionária: os serviços continuam a subir no ritmo de 8,5% ao ano, em decorrência da indexação de contratos e do mercado de trabalho ainda aquecido.
    Outros aspectos também merecem consideração. Um deles é a desvalorização cambial. Com a queda do real diante do dólar, produtos importados --ou compostos de peças fabricadas no exterior-- ficarão mais caros. Se a expectativa de recuperação da economia americana ganhar corpo, esse quadro deve se agravar.
    Tudo somado, pouco mudou, a despeito de julho, no duplo descompasso observado na economia brasileira. Enquanto a alta dos preços convive com um crescimento pífio do PIB, a inflação não se coaduna com o padrão internacional.
    Por ironia, se há um fator a mitigar o risco inflacionário, é justamente a fraqueza da atividade econômica doméstica. A tênue expectativa de recuperação que vigorou no primeiro semestre foi desfeita pela alta de juros internos e externos, pelo câmbio desvalorizado, pela queda abrupta da confiança das famílias e das empresas e pela lenta elevação do desemprego.
    Dado o ambiente de incerteza, a estratégia mais prudente do Banco Central, no curto prazo, parece ser manter a alta dos juros, a fim de consolidar a trajetória de queda dos preços, que ora se iniciou. Mas isso pouco adiantará se o governo não der um basta na prática de manipular as contas públicas.
    Se conseguir recuperar a confiança do setor privado na economia brasileira, a presidente Dilma Rousseff --e todo o país-- terá, de fato, bons motivos para comemorar. Mas essa tarefa, infelizmente, é mais árdua, e a margem de manobra do governo é cada vez menor.

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