sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Carlos Herculano Lopes-O namorado da filha‏

Estado de Minas: 13/12/2013 


Dois homens, dois estranhos, o motorista e o passageiro estavam em um táxi, que rodava vagarosamente num final de tarde chuvosa em Belo Horizonte, rumo ao Bairro Palmares, onde o último ia visitar a mãe. Há muitos dias não se encontrava com ela. O trânsito, nem é preciso dizer, continuava um horror na Cristiano Machado, por onde passavam na hora em que o motorista, até então em silêncio, virou-se para o passageiro, quando um dos sinais fechou, e perguntou: “Por acaso você tem filhos?”.

Surpreendido com a pergunta, o homem, depois de ficar uns instantes em silêncio, respondeu: “Não, não tenho filhos”. “Sorte sua, meu amigo”, disse o motorista, que sem esperar a réplica emendou: “Pois estou preocupado com a minha filha. Ela ainda não tem 16 anos e está começando a namorar”.

“Mas o que tem isso, você não acha normal?”, disse o passageiro, sem nenhuma convicção, e pedindo a Deus para que o assunto não fosse adiante. “Normal, você acha mesmo, uma menina desta idade já estar namorando?”, emendou o outro, enquanto a chuva, que não dava tréguas, tornava o trânsito totalmente caótico. “São os tempos, meu caro. O mundo hoje está assim”, comentou o passageiro, repetindo o chavão.

E foram indo. Na esquina da Cristiano Machado com Jacuí, tudo parou. O guarda, que tentava controlar a situação, estava totalmente perdido. “E o pior não é isso. É que ela disse à minha mulher que, no sábado, o tal namorado vai lá em casa...”, prosseguiu o motorista. “Já é um sinal positivo, pelo menos o menino está mostrando que tem boas intenções”, falou o passageiro, sem a irritação inicial.

Alguns minutos depois, começaram novamente a rodar e o assunto continuou: “Tô pensando uma coisa, amigo, e quero ver se você concorda”, disse o motorista. “Vamos lá, se eu puder ajudar...”, retrucou o interlocutor, que, àquelas alturas, estava começando a gostar da conversa. “Acho que vou mandar minha filha dizer ao rapaz que, se quiser me conhecer, tem de trazer o pai para pedir o namoro.”

“O quê? Um menino de 17 anos levar o pai? Você não acha que está sendo muito rígido?”, interveio o passageiro, ao que o motorista, sem lhe dar tempo, disparou, enquanto disparava também a buzina: “Comigo foi assim quando conheci a mãe dela e quero que com ela seja a mesma coisa, não estou certo?”.

Haviam avançado bastante, estavam quase chegando num dos primeiros viadutos que levam nomes de escritores, quando o passageiro, depois de ouvir em silêncio, deu sua opinião, já envolvido com o assunto: “Acho não amigo, e tem mais uma coisa, se me permitir”. “Pode falar”, disse o motorista. “Se eu fosse você, além de receber o rapaz numa boa, também conversaria com sua filha sobre sexo...”. “Sobre o quê? Falar com a Maíra sobre sexo? Você ficou louco?”, indignou-se o pai, quase parando o carro no acostamento.

“É isso mesmo amigo, os tempos mudaram, não são como na nossa época...”, afirmou o passageiro, ao que o motorista, se recompondo, respondeu, mais calmo: “Como vou tocar num assunto deste com a menina? Só se a mãe dela... ”. “Sei lá, mas se fosse vocês, dava um jeito, antes que tenham alguma surpresa...”. Mas aí, quando o papo começava a tomar novos rumos, chegaram ao fim da corrida.

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