quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Marina Colasanti -Mala suerte‏

Marina Colasanti - marinacolasanti.s@gmail.com


Estado de Minas: 12/12/2013 





Uma mala de mulher, bem arrumada, é como uma peça de relojoaria suíça em que tudo se encaixa, tudo serve ao seu fim, e nada sobra. Para viagens internacionais, minha estratégia sempre foi implacável e milimétrica, traçada no papel bem antes de chegar ao armário. Mas tem se revelado inútil. As malas tão bem concebidas não chegam.

Fui a Cuba no mês passado e a mala só me alcançou dois dias depois da chegada, quando já estava quase na hora de voltar. Não era só eu a desnuda do congresso, havia gente esperando há cinco dias, repetindo a cada noite a rotina humilhante de lavar e pendurar no banheiro a mesma camisa, a mesma roupa íntima. Teríamos fundado o Movimento dos sem Mala se não acreditássemos tratar-se de uma casualidade. Nefanda, é certo, mas eventual.

Talvez não fosse. Viajei a semana passada para a Feira de Guadalajara e novamente a mala não chegou. Dessa vez soube antes mesmo de chegar ao meu destino porque, depois de longa espera, não a vi surgir na esteira do aeroporto do México. Hora de dar queixa no balcão de malas extraviadas, embora fosse também hora de trocar de terminal e pegar outro voo até Guadalajara.

O senhor do balcão, funcionário minucioso, quis anotar tudo sobre a minha mala, cor, feitio e conteúdo. Perguntou como era a roupa que continha, inquiriu sobre cor e feitio, quis saber se os sapatos eram de salto alto ou baixo, qual o nome dos remédios que levava. Temi que se tornasse mais pessoal. Afinal, penalizado porque eu lhe mostrava o relógio e o horário da passagem, sugeriu que para chegar mais rapidamente eu fosse de cadeira de rodas, empurrada por seu jovem assistente e sem ter que parar na barreira alfandegária. Sem desconfiar do entusiasmo do assistente, concordei. E eis que me vi como em uma cena de comédia, senhora antes distinta agora empurrada pelo aeroporto em velocidade de Fórmula 1, cabelos ao vento, ameaçando de colisão senhores e criancinhas.

Não perdi a conexão, perdi a mala. E mais uma vez tive que sair em busca de uma farmácia e à procura de uma roupa que me servisse, a mais simples e mais conveniente para qualquer ocasião. À tarde, participei de uma mesa-redonda e no dia seguinte, com o mesmo traje todo preto, fiz minha conferência. Um corvo, mas limpinha.

Novamente, não era só eu a sem mala. Porém, enquanto a minha amiga, estupenda professora vinda da Espanha, recebeu sua mala no hotel, eu, hóspede do mesmo hotel, recebi um recado informando que deveria ir recolher a minha no aeroporto. Por que essa diferença? Porque, ao contrário das malas vindas da Europa, as provenientes da América do Sul têm que ser abertas – suspeita-se imediatamente que contenham drogas – na presença do proprietário.

E fui eu para o aeroporto, uma hora de chão. Lá chegando, recebi sem delongas e sem explicações minha mala, já aberta, cadeado quebrado, fechada com um lacre plástico.

Pensei que fosse dose suficiente para duas viagens. Estava sendo modesta. Pois se é verdade que a minha mala não se extraviou na volta, é verdade também que ao abri-la, já em casa, verifiquei que o lacre de plástico havia sido rompido, a mala havia sido aberta e revirada a nécessaire. O que os ladrões do Galeão procuravam? Perfume, suponho, pois junto com o meu havia chegado um voo vindo de Paris.

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