sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Apagão de ambições‏

Apagão de ambições 
 
Sobrecarga do sistema elétrico expõe carências ainda graves, apesar de o quadro já ter sido pior
Estado de Minas : 07/02/2014


Durante décadas, desde os anos 1950, a primeira grande virtude do Brasil apresentada por funcionários do governo de turno em reuniões com empresários estrangeiros era a ampla disponibilidade de energia barata – argumento valorizado depois dos dois choques de petróleo, entre 1973 e 1979. As grandes usinas hidrelétricas construídas e em construção, sobretudo no período autoritário, davam respaldo ao que se via como trunfo imbatível num mundo sedento de energia.
Sem usinas como Itaipu e Tucuruí (as grandes) ou Ilha Solteira e Paulo Afonso (médias), não teríamos um parque industrial ainda dos mais diversificados do mundo e o país não ocuparia a 8º posição no ranking global da manufatura em 2012. Energia é o insumo crítico do desenvolvimento. Quem não a tem correndo livre pelos cursos d’água, e isso continua a riqueza potencial no Brasil, ou brotando do solo (petróleo, carvão, gás), só com muita inteligência acumulada pôde desenvolver-se, como Japão, Alemanha e Coréia do Sul.
Hoje, com a palavra apagão outra vez nas manchetes e hidrelétricas caçadas por lobbies ambientais – como se termoelétricas que suprem a falta de energia queimando óleo combustível, carvão mineral e gás emitissem aromas silvestres –, o assunto voltou à ordem do dia.
Os críticos acusam o governo de imprevidente, que reage lembrando o racionamento no período FHC. E todos emudecerão tão logo cheguem as águas de março fechando verão. E, como de outras vezes, sem que ninguém que importe à discussão fale do essencial: a necessidade de energia farta e acessível para o desenvolvimento do país.
Não é o óleo do pré-sal, cujo destino é gerar as divisas de que a economia se ressente, sobretudo se voltar a crescer pouco mais. Nem as termoelétricas, caras e poluentes, são solução. Elas entraram na matriz energética como um estepe para momentos de pico de consumo, depois do racionamento de nove meses até março de 2002.
Aos poucos, o provisório se tornou permanente, e é o que dá para contar em momentos de falha técnica nos linhões de transmissão ou picos de consumo, causas prováveis do apagão desta semana. É certo que a construção de hidrelétricas foi retomada, mas em ritmo lento, criminalizada por ambientalistas, acossada pelo Ministério Publico Federal, e sem a coesão anterior de que o progresso depende delas.

Milhagem do BC e BNDES
Desde o ocaso dos “barrageiros”, o presidente do Banco Central se tornou o personagem mais habitual em encontros com investidores, o que diz muito sobre a essência de nosso desenvolvimento. Aprecia-se mais nestes eventos exposições sobre a política monetária e fiscal (ambas conectadas ao estoque de dívida, representativa de eventos e situações passadas), que cenários de oportunidades no Brasil.
Isso mudou um pouco com a retomada dos projetos de infraestrutura, na pegada do roteiro de obras do PAC, e vem ganhando tração com as concessões ao capital privado de estradas, aeroportos, ferrovias, portos, que estão andando, apesar do tempo perdido e da descrença dos críticos. A milhagem de voos internacionais do presidente do BNDES já se rivaliza, se é que não supera, com a do colega do BC.

É pouco o que se faz
Não fossem tais investimentos estruturantes, ninguém estaria dando ouvidos aos cenários, normalmente oficiais, em que o país desponta com condições competitivas em relação às economias emergentes de um modo geral (afora a China, já potência industrial e financeira).
Mas o investimento público é baixo, cerca de 2% do PIB, menos que a metade da média investida por outros emergentes e abaixo do que é preciso para a produção não estacionar em gargalos – como as filas de caminhão de 50 km ou mais levando a safra agrícola aos portos, navios parados por mais de uma semana esperando cais para atracar, aeroportos congestionados, insegurança energética. Cada um desses gargalos tem solução, várias estão em curso. Mas falta muito mais.

Plantar antes de comer
O empresário Pedro Passos, presidente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial, sente falta de planejamento de longo prazo, um horizonte a orientar planos, projetos e investimentos. O governo fechado à discussão com o investidor de raiz, no sentido de que não visa o lucro rápido da arbitragem com juros e moedas, mas o resultado operacional, contribui para o sentimento de desalento.
Se o mercado pressiona por meta fiscal, o investidor em bens reais espera que o governo se posicione sobre os lobbies que emperram a geração de energia. Economistas sugerem moeda fraca, expediente que deprecia os salários. O investidor antenado fala de acesso a novas tecnologias. Uns tratam do prato para a boca. Outros do que plantar antes de comer. É um menu de opções. Falta escolher e levar à mesa.

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