segunda-feira, 31 de março de 2014

Religião será a principal bandeira do PSC

Valor Econômico - 31/03/2014
César Felício

A candidatura presidencial do pastor Everaldo Pereira (PSC) tem potencial para atingir até 10% dos votos, na avaliação de cientistas políticos dedicados ao mercado eleitoral. Pastor da Assembleia de Deus, a maior denominação pentecostal do país, Everaldo está com 3% de intenção de voto na última pesquisa Ibope, divulgada nesta quinta-feira, e poderá se tornar o primeiro candidato a presidente na história do Brasil a usar a religião como sua principal bandeira.

"Ele tem um teto de 8% a 10%, caso faça uma campanha muito eficaz e não seja alvo de denúncias", disse o cientista político Antonio Lavareda, da MCI. Lavareda estimou o potencial com base no histórico das eleições de 2002 e 2010. Na primeira, o governador do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho, disputou a presidência pelo PSB e teve 18% dos votos. Na segunda, a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva concorreu pelo PV e conseguiu 19%. Ambos são evangélicos, mas não fizeram dessa condição o elemento central de suas campanhas.

"Tanto em um caso como em outro, pode-se afirmar que pelo menos metade do que conseguiram foi um voto de afinidade, dado pela população evangélica. O resto foi por terem outros atributos que o pastor Everaldo não possui", comentou Lavareda. O cientista político pondera que Everaldo poderá ter peso em um segundo turno, mas não será o elemento determinante para que a eleição presidencial não se resolva já em outubro. "Um conjunto de outros fatores, como o potencial de crescimento dos candidatos mais fortes de oposição e a avaliação de governo da presidente Dilma Rousseff devem ser mais importantes para definir o segundo turno".

O Brasil conta com 22% da população evangélica, de acordo com o censo de 2010. Destes, cerca de 13% são pentecostais e 5% não têm uma identidade definida, frequentando diversas denominações. Apenas 4% pertencem às igrejas tradicionais, como luteranos, batistas, metodistas e presbiterianos.

É um segmento com peso cada vez maior: em 1991, dois anos depois da primeira eleição presidencial da redemocratização, apenas 9% dos brasileiros eram protestantes. Em 19 anos, a população católica caiu de 83% para 65% e a dos não-religiosos passou de 5% para 8%. Entre os pentecostais, a Assembleia de Deus representava 48%, contando há quatro anos com 12,3 milhões de fiéis.

Igrejas evangélicas começaram a se organizar para disputar o poder em 1986, nas eleições para a Assembleia Nacional Constituinte. Em 1989, houve um ensaio mal sucedido para a presidência: a candidatura de Armando Correa, do extinto PMB, que se retirou da eleição para apoiar o empresário Silvio Santos, manobra anulada pelo TSE dias antes da eleição. Em 2002, na eleição estadual em São Paulo, o então vereador paulistano Carlos Apolinário, do PGT, lançou-se para o governo estadual por uma coligação chamada "São Paulo nas mãos de Deus". Teve 3,6% e ficou em quarto lugar.

"O segmento evangélico era muito menor. Estamos diante da primeira microcandidatura confessional para presidente que não é traço nas pesquisas", disse o cientista político Marcos Coimbra, do Instituto Vox Populi, que é conservador sobre a autonomia de voto de Pereira. " Ele só consegue este percentual porque se apresenta como 'pastor' na corrida eleitoral. O PSC não acrescenta nada e a pessoa física dele também não. A bancada evangélica apresenta uma agenda centrada em questões de valores individuais, como as relacionadas com aborto, drogas e casamento homossexual, que nunca foi motivadora de voto majoritário", diz.

No Legislativo, a bancada evangélica conta hoje com 73 deputados federais e dois senadores. Sua candidatura mais competitiva a um governo estadual é no Rio de Janeiro, onde o senador Marcelo Crivella (PRB), da Igreja Universal, deve disputar o cargo pela segunda vez. No ano passado, a bancada foi marcada pelo estilo estridente do deputado Marco Feliciano (PSC-SP), que foi presidente da Comissão de Direitos Humanos.

A tendência dos candidatos evangélicos a cargo majoritário é só adotar este modelo quando disputam em situação pouco competitiva. Se a intenção é entrar para ganhar, suavizam o discurso. Feliciano chegou a se lançar candidato ao Senado em dezembro, mas no mês passado anunciou em redes sociais que irá disputar novamente a Câmara. Alegou que não tinha condições de obter nove milhões de votos, o que estimou como necessário para ganhar. Disse que vai esperar 2018, quando são duas vagas para o Senado por estado.

"A debilidade central é que parte do eleitorado sensibilizado pela plataforma conservadora é católica e tende a rejeitar um candidato evangélico. Desta maneira, os evangélicos não têm como se aproveitar do espaço que existe no Brasil para o conservadorismo, a não ser que fiquem confinados às eleições proporcionais", comentou o pesquisador César Romero Jacob, da PUC do Rio de Janeiro.

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