domingo, 20 de abril de 2014

Do carnaval ao Mundial

PERFIL/MÁRCIO VICTOR / VOCALISTA E PERCUSSIONISTA » Do carnaval ao Mundial Cantor do sucesso Lepo lepo sonha em ver sua canção na comemoração de gols do Brasil


Ana Clara Brant
Estado de Minas: 20/04/2014



Conhecido como vocalista do Psirico, Márcio Victor já tocou com Caetano Veloso, Marisa Monte, Gloria Stefan e como tenor Luciano Pavarotti (Fred Pontes/Divulgação)
Conhecido como vocalista do Psirico, Márcio Victor já tocou com Caetano Veloso, Marisa Monte, Gloria Stefan e como tenor Luciano Pavarotti

Em menos de uma semana, a banda Psirico e seu líder Márcio Victor, de 34 anos, estiveram três vezes em Minas Gerais (Itaúna, Contagem e Sete Lagoas), estado que concentra pelo menos 80% dos shows da banda baiana. Essa relação forte com os mineiros é cultivada com muito carinho e nasceu quando eles se apresentaram pela primeira vez no Axé Brasil, em 2009. O grupo chegou a morar um mês num hotel da capital mineira, e Márcio conta que sente muita saudade daquele tempo. “Botamos fogo no hotel, de tanta festa que fizemos. A gente tocava, cantava. Os outros hóspedes participavam. Para você ter ideia, um dia fizemos uma legítima moqueca baiana dentro de um dos quartos e tinha até norte-americano comendo. Era um auê, mas sempre com muito respeito, sem fazer muita zoeira e sem atrapalhar a rotina. Não tivemos nenhuma reclamação”, assegura o artista, com o típico jeitinho baiano.

O vocalista conta que a parceria com a mineirada foi construída de grão em grão e não foi à toa que o Psirico chegou a ser eleito três vezes a melhor banda e o melhor show do Axé Brasil. No ano passado, durante o festival realizado no Mineirão, eles foram obrigados a interromper a apresentação já na segunda música, porque o contrato com o estádio prevê encerramento à meia-noite e como o Psi – como é afetuosamente chamado pelos fãs – já tinha ultrapassado 20 minutos do horário, decidiu retornar no dia seguinte para terminar o show. “O Mineirão inteiro pediu para a gente voltar e não teve como não atender. Não era justo. São anos de parceria com esse público. No começo da nossa carreira fizemos muitos eventos em festas de faculdades no interior e em escolas. Minas não é apenas mais um estado que a gente faz. É especial, assim como a Bahia. E sem falar que adoro a comida, o beijo das mineiras (risos). É de Deus, beijo perfeito”, diz.

Foi só depois de pôr o pé na estrada que Márcio Victor e os demais companheiros se deram conta do sucesso que o hit do carnaval Lepo lepo se transformou. É claro que, pela quantidade de entrevistas e programas que têm participado desde o fim da folia, eles imaginam o estrondo. Mas é no contato com o povo e nos shows que a coisa muda de figura. “Desde o começo de março, ficamos gravando no Rio e em São Paulo, dando entrevistas, aparecendo em programas de TV, mas só agora tivemos mesmo acesso à fama que o Lepo lepo proporcionou. E é uma coisa de louco! A gente está sendo muito assediado, não para de dar autógrafo, tirar fotos. A música só vem crescendo e deixou de ser o hit do carnaval e se prepara para ser o hit da Copa”, acredita Márcio Victor.

Na Copa O CD oficial da Fifa, que será lançado pela Sony Music em maio, terá Lepo lepo como uma das faixas e, pelo contato que Márcio Victor tem com alguns jogadores da Seleção, como Neymar, Daniel Alves e Jô, a canção-chiclete tem tudo para embalar o Brasil durante a comemoração nos jogos do Mundial. “Antes mesmo de a música estourar eles já dançavam o Lepo lepo em algumas partidas, não só da Seleção como dos times em que jogam. E como faço parte de um grupo de WhatsApp (aplicativo de troca de mensagens pelo celular) com eles, alguns já manifestaram essa vontade de torná-la a música do Brasil na Copa”, avisa o artista, que é torcedor do Bahia.

Quando o Psirico surgiu no ano 2000, com mistura de pagode, arrocha e axé, a marca registrada de Márcio Victor era o uso de um megafone durante suas apresentações, com o típico ruído de sirene que o aparelho produz. Hoje, o grupo abriu mão dessa parafernália, mas o cantor lembra daqueles bons tempos com ternura. “O megafone era uma forma de mostrar que a gente queria ser diferente, mas como não tínhamos muito recursos para plug-ins e para produzir efeitos tecnológicos, a solução era fazer isso utilizando a voz. Era a nossa maneira criativa de ser moderno. A gente sempre procurou inovar”, afirma.


Três perguntas para...
Márcio Victor
Cantor

1) Qual a razão desse sucesso tão arrebatador de Lepo lepo?
O povo está fazendo acontecer. A música já tem um ano de lançada e continua crescendo. É primeiro lugar nas rádios do Brasil e em algumas lá fora também. Já temos até pedidos para gravar em espanhol. Ela bombou com várias versões na internet, como a da Dilma, que ficou famosa, e isso ajudou também. Somos uma banda do povão, que adora falar do gueto e da periferia. O Lepo lepo é um grito ao não capitalismo, porque fala da realidade de 90% dos brasileiros. Do cara que já foi despejado, que não tem carro, não tem teto, é a representação do povo. É uma coisa de Deus. Só ele explica esse sucesso.

2)Mas o que é o Lepo lepo. O que significa afinal?
Lepo lepo é uma expressão baiana para designar o namoro, o amor, mas não era muito divulgada. A letra não é minha (a composição é de Felipe Escandurras e Magno Santana), só dei a ideia do refrão. Conta a história de um amor de verdade. Porque se quer ficar comigo é porque não liga para essas coisas materiais. O que importa é o sentimento. E ela pegou por isso. E é uma música que não enjoa. Até porque música boa não enjoa.

3)Quais são seus projetos para este ano?
Vamos lançar pela Som Livre um DVD gravado em Salvador, com regravações de grandes sucessos nossos, incluindo o Lepo lepo, e participações de gente muito especial, como Ivete, Preta Gil, Aviões do Forró e Saulo Fernandes. Queremos mostrar para o Brasil a história do Psirico. E já estamos preparando outro DVD, para o fim do ano, que terá um formato diferente. Ele será gravado em estúdio e vai mostrar os bastidores, o outro lado. Também terá convidados bacanas, como Gusttavo Lima, Luan Santana e Emicida.

De pagode a Pavarotti
Ana Clara Brant

Márcio Victor nasceu no Engenho Velho de Brotas, um dos bairros mais populosos de Salvador, e já aos 3 anos começou a demonstrar interesse pela música, principalmente pelos instrumentos de percussão. Foi nessa época que virou o mascote do bloco afro Badauê, na capital baiana, sua família fazia parte da diretoria. Em seguida, foi tocar no Araketu e, aos 9, foi parar na Timbalada, grupo em que seu tio Ninha era o vocalista. Ali passou a chamar a atenção de um dos principais nomes da música popular brasileira, Carlinhos Brown, com quem viria a ser percussionista anos depois.

E não foi só com o criador da Timbalada que Márcio mostrou suas habilidades rítmicas. Caetano Veloso – que chamou o vocalista do Psirico de “gênio”–, Daniela Mercury, Marisa Monte, João Bosco, Ivete Sangalo e até renomados artistas internacionais, como o tenor Luciano Pavarotti e a cantora e compositora cubana Gloria Stefan, tiveram Márcio ao lado em shows e gravações. “Tenho orgulho de ter trabalhado com essas pessoas. E sou muito querido por eles, o que é muito gratificante, e eles por mim. Todos sempre foram muito generosos comigo, sempre me deram aulas de como conduzir a vida artística. Faço questão de ouvir os conselhos e às vezes sou chato também, porque pergunto muito, quero aprender o tempo todo. A gente não pode tirar os pés do chão. Cresci muito, mas não abro mão da minha verdade”, frisa.

Mesmo se destacando nos vocais do Psi, ele faz questão de produzir, fazer os arranjos e, claro, tocar percussão nos discos e nos shows da banda, além de participar de projetos de outros colegas. “Recentemente, toquei no disco do Sorriso Maroto. Comigo, é assim. Passo pelo pagode, MPB, Pavarotti. Sou um aprendiz de Carlinhos Brown, do Paulinho da Costa, da música retrô. E isso me dá essa facilidade de transitar por vários estilos, mas sem deixar a minha marca de lado. A percussão que a gente faz no Brasil é uma percussão no mundo”, analisa.

Com os artistas das Gerais ele não teve muitas oportunidades de se apresentar, mas assegura que conseguiu absorver muito da música que é feita por aqui. Quando esteve pela primeira vez no Axé Brasil, há cinco anos, prestou uma homenagem a Clara Nunes, interpretando Ê baiana e vestindo uma camisa com uma foto da cantora. “Foi a mulher que mais cantou a música afro, que tinha a cara da Bahia. Já ouvimos e tocamos muito Clube da Esquina, Pato Fu, Jota Quest, Skank e também os sertanejos, como César Menotti & Fabiano. A gente trouxe e absorveu isso em nosso repertório e quando estamos em Minas, principalmente em BH, é mais forte ainda. Queria muito repetir aquela experiência de passar um mês na capital”, diz o cantor, que só deve retornar a BH no Axé Brasil 2014, em agosto. “A vida é isso. Ter foco, ir em busca dos objetivos, mas sempre celebrar, extravasar e fazer o que se gosta”, resume.

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