sexta-feira, 29 de agosto de 2014

O difícil desarmamento nuclear

O difícil desarmamento nuclear
Sérgio Duarte Embaixador, ex-alto representante das Nações Unidas para assuntos de desarmamento
Estado de Minas: 29/08/2014


Desde julho de 1945, quando o primeiro engenho nuclear explosivo foi detonado no deserto de Nevada, nos Estados Unidos, os países possuidores de armas nucleares realizaram mais de 2 mil explosões experimentais dessas armas, das quais pouco mais de 500 na atmosfera e a maior parte das restantes no subsolo. Somente em 1963, porém, foi possível proscrever os ensaios atmosféricos, por meio do Tratado de Proibição Parcial de Ensaios Nucleares, assinado originalmente pelos Estados Unidos, União Soviética e Reino Unido.

A comunidade internacional passou a empenhar-se em lograr a proibição desses ensaios em todos os ambientes, com o apoio de diversas organizações da sociedade civil. As negociações foram concluídas com êxito em 1996, com o endosso da Assembleia Geral das Nações Unidas e a abertura do Tratado Abrangente de Proscrição de Ensaios Nucleares (conhecido pela signa em inglês CTBT) à assinatura dos estados.

Entre os 196 estados-membros das Nações Unidas, 183 já assinaram e ratificaram o CTBT, inclusive o Brasil, que foi um dos primeiros a fazê-lo. O Congresso Nacional concluiu o procedimento de ratificação em 1998. No entanto, para que o tratado possa entrar em vigor, tornando-se norma juridicamente vinculante de direito internacional, é necessária ainda a ratificação por parte de oito estados nominalmente mencionados no texto do instrumento: Egito, China, Estados Unidos, Índia, Irã, Israel, Paquistão e Coreia do Norte.

Os países possuidores de armas atômicas (exceto a Coreia do Norte) vêm-se abstendo voluntariamente de realizar ensaios subterrâneos com explosivos nucleares. No entanto, na ausência da ratificação por parte desses oito países, nada garante que não venham a romper essa moratória caso julguem necessário para seus planos de modernização e ampliação dos arsenais atômicos.

Em 2009, a Assembleia Geral das Nações Unidas decidiu designar 29 de agosto como o Dia Internacional contra os Ensaios Nucleares. Na sede da ONU e em diversas organizações internacionais ocorrem numerosas atividades destinadas a promover a entrada em vigor do Tratado Abrangente de Proibição de Ensaios Nucleares.

O CTBT foi o último instrumento internacional importante no campo do desarmamento e não proliferação de armas nucleares a ser negociado com êxito pela comunidade internacional. De 1996 até hoje não ocorreram progressos significativos no sentido de realização dos compromissos multilaterais existentes.

O Secretariado Técnico instituído pelo tratado para a verificação do cumprimento das obrigações nele contidas, com sede em Viena, tem um sofisticado sistema de detecção e análise de abalos sísmicos e outros sinais, capaz de diferenciar entre fenômenos naturais e explosões atômicas subterrâneas. Esse sistema tem sido utilizado recentemente para alertar tempestivamente a ocorrência de terremotos e tsunamis. Um grupo de personalidades internacionais, criado pelo diretor-executivo daquele órgão, vem procurando promover a entrada em vigor do CTBT mediante ação junto a governos e à opinião pública mundial.

Enquanto aqueles oito países não tomarem as medidas internas para a ratificação do CTBT, a humanidade continuará a correr o risco de novo ciclo da corrida armamentista nuclear, com consequências imprevisíveis para as relações entre os estados e para a paz e segurança internacionais. A plena vigência do Tratado Abrangente de Proibição de Ensaios Nucleares constituirá vigorosa demonstração da vontade da comunidade internacional de levar adiante, decisivamente, os esforços de desarmamento e a não proliferação de armas nucleares.

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