segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Como age o inimigo - Bruna Sensêve‏

Síntese de proteínas do citomegalovírus é desvendada. Isso ajudará a entender por que micro-organismo causa doenças em algumas pessoas e em outras não 

Bruna Sensêve
Estado de Minas: 26/11/2012 
Acredita-se que cerca de 95% da população mundial, se não toda ela, esteja infectada com o citomegalovírus humano. Na maioria das pessoas, ele permanece incubado no interior das células e não se manifesta. Em uma parte dos casos, contudo, o micro-organismo pode levar a malformação de fetos ou aproveitar um período de enfraquecimento do sistema imunológico da pessoa e se manifestar em forma de doenças que atingem o aparelho digestivo, o sistema nervoso central e a retina, por exemplo. Agora, descobertas sobre a capacidade de codificação do vírus para a produção de proteínas, relatadas em artigo publicado na edição da revista Science, podem explicar por que ele se manifesta em determinados momentos e como manipula as células humanas durante a infecção.

O genoma do citomegalovírus humano foi sequenciado há 20 anos, mas seu proteoma, ou seja, o conjunto completo de proteínas expressas pelos genes, ainda não era compreendido. O principal mistério estava em grandes fitas de RNA mensageiro (RNAm) – responsável por traduzir e levar a “receita” contida no DNA para que os ribossomos localizados no citoplasma produzam proteínas, expressando as características contidas no material genético. Até então, os cientistas não sabiam se essas fitas eram capazes de produzir proteínas ou quais seriam seus produtos e funções no organismo humano. “O genoma de um vírus é apenas um ponto de partida. Entender quais proteínas são codificadas por aquele genoma é que nos permite começar a pensar sobre o que o vírus faz e como podemos interferir nele”, enfatiza o coautor do estudo Jonathan Weissman. 

O grupo de pesquisadores da Universidade da Califórnia e do Instituto de Pesquisa Scripps, nos Estados Unidos, e do Instituto Max Planck, na Alemanha, do qual Weissman faz parte, utilizou uma combinação de técnicas e equipamentos de última geração para mapear as posições dos ribossomos, produtores de proteínas, enquanto atuavam na tradução das grandes fitas de RNAm. Foram escolhidos três períodos específicos de infecção. Em laboratório, células humanas foram infectadas e analisadas durante cinco horas (período precoce imediato), 24 horas (período precoce) e 72 horas (período tardio), após o início do processo.

Surpreendentemente, os cientistas observaram que em cada período, das longas fitas de RNAm, eram produzidas proteínas menores e diferentes. Antes dessa descoberta, imaginava-se que de uma fita de RNAm era gerada uma específica proteína e de tamanho correspondente: uma fita longa geraria uma única grande proteína. A descoberta, no entanto, conseguiu identificar centenas de proteínas não conhecidas anteriormente e também demonstrou que uma codificação extremamente complexa, possivelmente, presente em outros vírus com características similares de longas sequências de RNAm.

Possibilidades Os achados da equipe, chefiada por Noam Stern-Ginossar, devem ajudar a desvendar a manifestação do vírus no ser humano, além de possibilitar o desenvolvimento de novas drogas para o tratamento e a inibição do processo viral. O estudo também abre uma perspectiva para entender como o vírus controla seu ciclo replicativo. Futuramente, ao analisar as proteínas encontradas, é possível que uma delas seja capaz de controlar a latência do vírus, por exemplo, e drogas que inibem essa ação possam ser desenvolvidas. 

Para a professora do Departamento de Virologia do Instituto de Microbiologia Paulo Goes, da UFRJ, Luciana Jesus da Costa, o fator que mais chama a atenção é a característica do citomegalovírus humano de gerar várias pequenas proteínas a partir de uma única longa fita de RNAm. “Esse fator definitivamente aumenta a capacidade de codificação de um genoma para uma dimensão quase infinita. Descobriram especificamente no citomegalovírus humano, mas a pesquisa abre um campo vastíssimo para que isso aconteça em outros vírus”, diz.

PALAVRA DE ESPECIALISTA » Estudo de grande impacto 


Eurico Arruda, Presidente da Sociedade brasileira de Virologia

“O impacto dessa descoberta é tremendo. Eles descobriram que no meio dessas sequências longas de RNAm existem sequências mais curtas que são traduzidas em pequenas proteínas, diferenciadas dependendo do tempo de infecção. Com o tempo, é muito provável que essas proteínas estejam relacionadas ao controle da latência do vírus. Ele está presente em 95% ou 100% das pessoas, de forma latente. Quando o indivíduo fica imunossuprimido, o vírus sai dessa latência e aparece na forma de doenças. Qual o controle que faz com que ele saia ou deixe de sair? Essas proteínas variam de acordo com o tempo e, a partir disso, ele cria uma possibilidade que ainda não foi explorada, que é a participação das pequenas proteínas traduzidas em pequenas porções.”

Fotografias de vírus 
Publicação: 26/11/2012 04:00
Cientistas do Instituto de Pesquisa Scripps, nos Estados Unidos, e do Conselho Superior de Investigações Científicas, na Espanha, apresentam, em dois artigos publicados na versão on-line da Science Express, a descrição do maquinário de replicação do vírus da influenza (gripe). Os pesquisadores utilizaram técnicas de biologia molecular de ponta e microscopia eletrônica para “enxergar” um dos complexos essenciais de proteínas do vírus em detalhes inéditos. A descoberta significará um grande avanço para a compreensão de como o vírus responsável pela doença se multiplica dentro das células infectadas.

No núcleo de qualquer vírus da gripe, repousam oito pequenas máquinas moleculares que são vitais para a capacidade de o vírus sobreviver e se espalhar em seus hospedeiros, as ribononucleoproteínas (RNP). Elas são um composto que combina tanto ácido ribonucleico (RNA) e proteína contendo, no caso da influenza, o material genético do vírus junto a uma enzima especial de que ele necessita para fazer cópias de si mesmo. Esse mecanismo molecular que executa a replicação do vírus e sua transcrição é essencial para a capacidade de evoluir rapidamente no organismo hospedeiro. 

Os pesquisadores utilizaram microscópios eletrônicos para fazer imagens de alta resolução e gerar fotos das RNP do influenza no momento em que estavam se replicando. As fotografias permitiram à equipe montar o modelo mais completo já conhecido das RNP da influenza, sua estrutura e funções. Os dados obtidos pela equipe do pesquisador Ian Wilson destacam principalmente a vulnerabilidade do vírus, o que deve ajudar no desenvolvimento de medicamentos. (BS)

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