quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Tendências/Debates

FOLHA DE SÃO PAULO

EDINHO SILVA
Os desafios do modo petista de governar
O PT não deve adotar uma postura defensiva. Mesmo sendo brutalmente atacado, conseguiu resultado histórico nas eleições municipais
As eleições municipais de 2012 foram um marco para o Partido dos Trabalhadores, que, mesmo num momento politicamente conturbado, conseguiu vencer em 68 cidades paulistas, inclusive na capital. Elegemos 55 vices e 675 vereadores em 382 cidades. Governamos 45% do total da população do Estado de São Paulo. É o melhor resultado eleitoral da nossa história.
Esse resultado consolida a relação do PT com a sociedade brasileira e paulista. Mesmo o partido sendo brutalmente atacado devido ao julgamento da ação penal 470, os eleitores falaram em alto e bom tom que têm identidade com o nosso projeto.
É um equívoco adotarmos uma postura defensiva no atual debate da conjuntura. O PT é o partido que construiu um modelo de governo que inovou as políticas públicas no Brasil. Esse modelo teve início nas cidades onde administramos e sempre adotou princípios éticos e de zelo com o dinheiro público.
Somos os protagonistas na adoção da transparência na prestação de contas e na execução orçamentária. Muitas das diretrizes do modo petista de governar transpuseram as fronteiras petistas e contagiaram a cultura administrativa e da governança, independente da coloração partidária.
O modo petista de governar tem identidade: é impossível um governo liderado pelo PT, que tenha inspiração na nossa história, não se estruturar na democracia direta, não dialogar com os oprimidos -no sentido mais amplo do conceito de opressão-, não ter a sensibilidade no enfrentamento às injustiças históricas e no combate a todas as formas e expressões de misérias.
Por mais que um governo liderado pelo PT possa ser amplo na capacidade de diálogo com toda a sociedade -e temos que perseguir governos de expressão democrática-, jamais podemos esquecer qual é a nossa missão histórica: nascemos e nos construímos sonhando com uma sociedade justa, igualitária e que radicalize a democracia. Portanto, que torne sujeitos nas relações de poder aqueles que sempre foram subjugados.
O grande desafio do modo petista de governar é visualizar as novas demandas históricas. O século 21 nos coloca o desafio de prepararmos as nossas cidades para que elas sejam capazes de ser palco da produção de riquezas sem dizimar os recursos naturais e sem segregar socialmente. Tem que ser prioridade a busca da sustentabilidade. Não a sustentabilidade como clichê do politicamente correto, mas, sim, como uma nova forma de organização da produção e distribuição de riquezas.
Outro desafio para o PT é ser o interlocutor de propostas que expressem as aspirações da nossa juventude. Os jovens são vítimas de todas as expressões de violência, morrem nas periferias do sistema; quando não são pobres e negros, também "morrem" com a incapacidade de sonhar e de acreditar em novo modelo de sociedade.
Mais que um discurso eleitoral, o modo petista de governar cria a identidade de um projeto nos municípios brasileiros. Persegui-lo deve ser a prioridade dos (das) nossos (nossas) chefes do Executivo nos municípios e dos nossos vereadores e vereadoras nas Câmaras Municipais.
O PT, ao longo da sua história, formulou novos paradigmas para as políticas públicas. Provou, liderando a coalizão nos governos Lula e Dilma, que é possível construir um grande país com programas inovadores e arrojados, sem perder de vista a responsabilidade administrativa.
Vamos olhar para a nossa história e seguir com passos firmes na busca do nosso futuro. Afinal: "Uma cidade parece pequena se comparada com um país, mas é na minha, na sua cidade que se começa a ser feliz".
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Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

    GERSON TEIXEIRA
    Os rumos da "Reforma Agrária"
    Nos últimos dois anos, foram desapropriados apenas 130 mil hectares; desempenho tão pífio que, desde 1985, só rivaliza com o período Collor
    Na década de 1990, as organizações dos trabalhadores do campo combateram, com êxito, a implantação, no Brasil, das estratégias do Banco Mundial para as áreas rurais da América Latina, centradas na chamada reforma agrária de mercado. No auge do neoliberalismo, pretendia-se delegar ao mercado o poder regulatório sobre a questão agrária brasileira.
    Restou que os instrumentos de compra e venda de terra ficaram nas franjas institucionais. Tanto que, de 1995 a 2002, a desapropriação de grandes propriedades alcançou 10,3 milhões de hectares contra 4,3 milhões nos oito anos seguintes.
    Assim, em termos de "obtenção de terras privadas para a política de assentamentos" (grifei), "bons tempos" os anos de 1990! Afinal, por força das lutas sociais, as desapropriações, com as insuficiências e anomalias conhecidas, foram preservadas, e as restritas operações de compra e venda de terras continham uma réstia redistributiva, pois transferiam para os camponeses frações de grandes propriedades.
    Hoje, percebemos sinais em sentido oposto. Terras da União sob o controle dos assentados poderão vir a ser transferidas para as grandes propriedades. É o desfecho esperado da proposta de emancipação dos assentamentos abandonados pelos poderes públicos.
    Sugerida pela entidade máxima do agronegócio, a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), a emancipação traduziria a sensibilidade social da sua presidente pela "libertação dos assentados". O alvo real: a expectativa de apropriação, pelo agronegócio, de milhões de hectares dos assentados, a exemplo do que ambicionam com as suas lutas pela subtração dos territórios indígenas, quilombolas e das áreas protegidas em geral.
    Entre as medidas do "pacote da CNA", supostamente acolhido pelo governo, constariam também a regularização "de ofício" dos imóveis localizados às margens das rodovias federais na Amazônia, o que equivaleria ao "carnaval do grilo". E, ainda, a facilitação da ratificação dos títulos das propriedades nas faixas de fronteiras indevidamente emitidos pelos Estados.
    Nos últimos dois anos, foram desapropriados apenas 130 mil hectares; desempenho tão pífio que, desde 1985, só rivaliza com o período Collor. Comenta-se que tal desempenho resultou da imposição, pela Casa Civil, do limite de R$ 100 mil por família nos projetos de assentamentos. O equívoco do limite deve-se à sua forma irrefletida. Até as cercas dos latifúndios sabem que a desapropriação gera enormes ganhos indevidos aos seus donos, graças à persistência de legislações lenientes e jurisprudências duvidosas.
    Exemplo: enquanto a taxa Selic, na atualidade, é de 7,25% aa e a inflação, menor ainda, os juros compensatórios, indevidamente aplicados sobre os valores da desapropriação contestados em juízo, são de 12% aa. Então, em vez de se extinguir anomalias da espécie, opta-se por um corte arbitrário que inviabiliza de vez a desapropriação.
    Mas, esse é apenas um detalhe de uma mudança essencial. Efetivadas as medidas anunciadas, a política agrária terá "evoluído" do seu tradicional perfil restrito de contenção de conflitos sociais em proteção ao latifúndio/agronegócio para um estágio de funcionalidade direta às necessidades da própria expansão do agronegócio. Transição equivalente ocorre com a política ambiental.
    Em suma, a sedução e a rendição política aos quase US$ 100 bilhões gerados pelas exportações do agronegócio poderão levar o Brasil a cenários sombrios de um "abismo agrário-ambiental". A presidente Dilma Rousseff, que vem enfrentando com coragem interesses econômicos poderosos em defesa do povo brasileiro, haverá de rever esses rumos desastrosos das políticas agrária e ambiental.
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    Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

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