quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Tendências/Debates

folha de são paulo

CAMILA ASANO
Dilma: esperava-se mais na política externa
Decepciona a postura com o Irã ou a Síria. Nas visitas a outros países, Dilma não deveria falar só de ciência ou comércio, mas também de direitos humanos
Há pouco mais de dois anos, Dilma Rousseff assumia a presidência prometendo uma política externa diferente.
Passada a primeira metade do mandato, parte dessa expectativa se confirmou. Mas se, por um lado, a gestão Dilma trouxe mudanças, por outro reforçou antigos problemas, trouxe outros novos.
Uma preocupante fragilidade da política externa atual está na delicada área dos direitos humanos -começando na Síria, a mais sangrenta guerra civil em andamento hoje no mundo, com cerca de 70 mil mortos.
Desde o início, Dilma foi inflexivelmente contra qualquer operação que envolvesse a intervenção militar, mas foi incapaz também de apontar qualquer outra saída alternativa concreta, em uma política majoritariamente dubitativa diante de um dos regimes mais cruéis e sangrentos do mundo.
Recentemente, o Brasil se ausentou da lista de 57 países de diferentes regiões do mundo que solicitaram ao Conselho de Segurança da ONU que enviasse o caso ao Tribunal Penal Internacional.
Essa mesma posição relutante, falsamente confortável, também é vista no Irã -país que mais executa prisioneiros no mundo, em números per capita, e também um dos que mais prende jornalistas.
Em novembro do ano passado, Dilma instruiu a missão brasileira na ONU a se abster na votação de uma resolução que condenava violações de direitos humanos cometidas pelo regime iraniano, embora o Itamaraty tivesse apoiado, assim que Dilma assumiu a presidência, a criação de um relator das Nações Unidas ao país para documentar os recorrentes abusos.
Questionado pela Conectas -a organização envia regularmente cartas cobrando o governo, inclusive com uso da Lei de Acesso à Informação-, o Itamaraty diz que as questões de direitos humanos devem ser tratadas nos foros adequados, para evitar o risco de politização. Assim vem sendo justificada a recusa da presidente ou mesmo do chanceler de tratar de violações patentes nos países que são visitados por eles.
Contraditório é que, quando confrontada pelo "foro adequado" da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos, como no caso Belo Monte, Dilma não apenas retirou o embaixador brasileiro ante o organismo como suspendeu temporariamente as contribuições financeiras. O governo também não levantou o tom de voz diante de ataques frontais desferidos pelo Equador e a Venezuela contra uma das instâncias que mais lutou pelo respeito aos direitos humanos na América Latina durante os sombrios anos de ditadura militar.
Não há dúvidas que a política externa precisa ser mais e melhor discutida. Mas, para isso, é necessário que haja informação sobre as posições internacionais do país e canais regulares abertos. Passos tímidos foram dados, apesar da Lei de Acesso a Informação já vigorar há nove meses, por exemplo.
Em espaços multilaterais como o Conselho de Direitos Humanos da ONU -que contará com a presença do ministro Patriota na sessão que se inicia segunda e marca a volta do Brasil ao órgão como membro-, espera-se uma liderança responsável do Brasil. Em Cuba ou nos EUA, no Haiti ou no Paraguai, a presidente deve falar não apenas de comércio e ciência quando realiza uma visita oficial, mas também da importância de que todos os países do globo defendam de maneira intransigente os direitos humanos em seus próprios territórios e fora deles.
Não por se tratar de uma opção pessoal da presidente, mas porque ela está a serviço de uma Constituição -que, em seu artigo 4, inciso II, determina a prevalência dos direitos humanos nas relações internacionais.
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Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

    JOSÉ PIMENTEL
    Competitividade federativa
    O Congresso, em 2013, deve dar bons passos na distribuição justa de recursos entre os entes federativos. É preciso que todos sejam solidários neste caminho
    As questões relacionadas ao pacto federativo são naturalmente sensíveis e potencialmente indutoras de grandes disputas. Mas é dado o momento em que a unidade nacional deve prevalecer sobre os demais interesses.
    É legítimo que nenhum Estado ou município aceite qualquer perda de receita. Mas é preciso desarmar os espíritos para que possamos construir o novo -algo que traga benefícios para todos, tornando mais justa a distribuição de recursos públicos e a atração de investimento privado.
    Refiro-me à definição dos critérios para distribuição do Fundo de Participação dos Estados (FPE), ao ICMS com alíquota única de 4% nas operações interestaduais e às decisões sobre a distribuição e aplicação de recursos provenientes dos royalties do petróleo.
    Há mais de 15 anos se ouve falar da necessidade de realizar uma ampla reforma tributária, envolvendo União, Estados e municípios. Em 2003, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviou proposta ao Congresso, mas, devido à resistência dos Estados, a emenda constitucional 42 reformou apenas os aspectos tributários federais. E essa mudança foi essencial para o país! O maior exemplo é o Simples Nacional, que já congrega mais de 7 milhões de micro e pequenas empresas, além de 2,7 milhões de empreendedores individuais.
    Agora, vivemos uma efervescência. A presidenta Dilma Rousseff resolveu enfrentar os problemas federativos, um a um, mas sempre com o olhar voltado para a justiça tributária, o equilíbrio fiscal e as novas oportunidades que se abrem para o desenvolvimento local, regional e de todo o país.
    No ano passado, resolvemos a disputa dos Estados pela importação de mercadorias em seus portos -uma prática danosa ao conjunto da federação. Também aprovamos no Senado a proposta de emenda constitucional que modifica a forma de tributação do comércio eletrônico para permitir que parte do ICMS seja devido ao Estado de destino da mercadoria.
    É inegável que estamos avançando, mas 2013 nos reserva passos maiores. De imediato, o Senado debate a proposta de alíquota única de 4% de ICMS nas operações comerciais e prestações entre estados, numa transição prevista até 2025. Estamos criando dois fundos importantes: um deles para compensar as unidades da federação que registrarem perda de recursos, com previsão de repasse de até R$ 8 bilhões anuais. O outro é o fundo de desenvolvimento regional, com investimentos estimados em R$ 294 bilhões, em 20 anos, por meio de créditos bancários e transferências aos Estados e ao Distrito Federal.
    Com isso, pretende-se estabelecer uma nova fórmula de desenvolvimento para as cinco regiões. É importante lembrar que os estados permanecem com sua autonomia para definir a alíquota interna de ICMS.
    Também estão na ordem do dia os novos critérios de distribuição dos recursos do FPE, cuja aprovação deve ocorrer até junho. Quanto aos royalties do petróleo, precisamos votar a vinculação de recursos para a educação e equacionar o problema que envolve estados confrontantes e não confrontantes.
    Somos uma federação onde todos os Estados e municípios devem compartilhar os frutos do desenvolvimento econômico e social. Mas para serem competitivos, é preciso retirar os obstáculos e caminhar de forma harmônica, solidária e empreendedora.
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