segunda-feira, 8 de abril de 2013

Editoriais FolhaSP

folha de são paulo

Chá, por favor
Rua da União, rua da Aurora, rua da Saudade. "Como eram bonitos os nomes das ruas da minha infância", escreveu o poeta Manuel Bandeira em "Evocação do Recife". Acrescentou temer que a rua do Sol "hoje se chame do dr. Fulano de Tal".
"Viaduto do Chá" pode não ser um nome tão inspirador quanto os das velhas ruas recifenses. Diga-se também que Mário Covas não é um "Fulano de Tal" como os desdenhados por Manuel Bandeira. Cassado pelo AI-5 em 1969, quando era líder da oposição ao regime militar na Câmara dos Deputados, retornou à política dez anos depois.
Tornou-se prefeito e governador de São Paulo, sem recorrer às nauseantes reviravoltas ideológicas e ao oportunismo que se tornaram a regra da política brasileira. Merece as muitas homenagens que já recebeu.
Levam seu nome o Rodoanel, obra iniciada sob sua administração; um hospital em Santo André e outro em Marília; uma área verde na avenida Paulista, além de diversas escolas, instituições e logradouros em várias partes do país.
A memória de Mário Covas não depende, portanto, de alteração no nome do viaduto do Chá. O lugar, aliás, continuará a ser chamado como sempre foi.
Eis que os autores da proposta de mudança -que corre na Câmara Municipal, com o apoio da maioria dos vereadores- optaram por uma fórmula híbrida. Haveria, se aprovado o infeliz projeto, um viaduto do Chá Prefeito Mário Covas.
O método resulta em puro congestionamento verbal. Disseminado o estilo, as consequências seriam incontroláveis. Seria o caso de termos uma "rua da Consolação Paulo Maluf"? Ou, para ir mais longe, uma avenida Jacu-Pêssego Ernesto Che Guevara? Uma Brasília Juscelino Kubitschek?
Abandone-se, antes que seja tarde, esse tipo de palimpsesto onomástico, de recapeamento toponímico. A proposta, se cabe o mau trocadilho, deve ser demolida.

    Retorno interditado
    Licitações de estradas e aeroportos talvez saiam do atoleiro agora que o governo renuncia a tabelar a taxa de rentabilidade do investidor
    A presidente Dilma Rousseff desperdiçou seu tempo e o do país enquanto resistiu à evidência de que o governo não dispunha de recursos para executar obras de infraestrutura, tais como as de aeroportos -os quais concedeu à iniciativa privada a contragosto.
    Perdeu mais tempo ao se aferrar à ideia de que o governo pode controlar preços ou lucros e determinar investimentos das empresas. Tal atitude ficou outra vez evidente na proposta oficial de concessão de rodovias federais.
    O governo anunciou em janeiro que limitaria a níveis baixos a rentabilidade oferecida para as concessões de rodovias a serem leiloadas neste ano. As empresas recusaram o negócio.
    Para melhorar a proposta, em março o governo prometia reduzir ainda mais o custo dos empréstimos dos bancos oficiais para as futuras concessionárias, aumentar o prazo da concessão e rever estimativas de gastos e receitas. A greve branca das empresas continuou.
    Agora o governo recua. Promete rever a taxa de rentabilidade. Desde o anúncio do plano, em agosto, até a publicação das novas regras, terá passado quase um ano.
    A teimosia oficial era contraproducente. O governo pode estipular uma taxa razoável de rentabilidade, dadas as condições iniciais e estimadas de preços (pedágio), custos (obras, administração e juros) e faturamento das empresas (tráfego de veículos). Várias dessas definições vão pautar o cumprimento e as eventuais renegociações dos contratos.
    No entanto, excetuada a hipótese de conluio, preços e rentabilidade serão, na prática, definidos em leilão: empresas que calculam ser mais eficientes oferecerão tarifas menores de pedágio.
    Estipular uma taxa de retorno baixa demais afasta interessados e diminui a concorrência, que é o objetivo básico do leilão: simular, para um caso de monopólio natural (uma rodovia), as condições de um mercado competitivo.
    Além do mais, ao oferecer financiamento subsidiado a fim de compensar a baixa rentabilidade, o governo esconde e assume custos que deveriam estar transparentes na tarifa de pedágio.
    Caso os benefícios sociais da obra sejam altos, mas o interesse privado na sua execução seja pequeno, cabe o subsídio -que deve ser explicitado no Orçamento. Nem parece ser esse o caso das rodovias. O governo quer criar uma modicidade tarifária artificial.
    Desde o início do programa federal de concessões de rodovias, em 1993, melhorou a qualidade dos contratos, da regulação e do ambiente econômico brasileiro (embora o monitoramento de contratos e empresas ainda seja falho).
    Tais fatores já permitiram queda nas tarifas de pedágios. Não há como forçar diminuição adicional de preços e rentabilidade sem reduzir a quantidade de investimento. De modo similar, empresas recusam-se a vender a preços baixos por tabela.
    Numa hipótese extremada, mesmo que o preço do pedágio fosse tão alto quanto o das concessões paulistas ou o das primeiras concessões federais, uma estrada com pedágios caros ainda é melhor que estrada nenhuma. Melhor, ao menos, que os caminhos de lama por onde escoa a duras penas a riqueza da agricultura nacional.

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