terça-feira, 9 de abril de 2013

Energia do futuro - Marcela Ulhoa‏

Uso de microalgas na fabricação de biocombustíveis em escala industrial é tema de estudo nos EUA. Entre as diversas vantagens está a de não ocupar terras que possam produzir alimentos 


Marcela Ulhoa


Estado de Minas - 09/04/2013


Brasília – Com aproximadamente 3 mil espécies sob estudo, as algas são promessas de uma energia cada vez mais sustentável. Além de não precisar de terras férteis para serem cultivadas e, portanto, não brigar por espaço com a produção de alimentos, elas crescem em tanques cuja água nem precisa ser potável. Isso sem contar que os organismos fotossintéticos utilizam o dióxido de carbono como fonte de alimento, podendo ser acoplados a um sistema poluente para diminuir os gases de efeito estufa. Com tantas vantagens, a utilização de microalgas para a produção de biocombustíveis é um dos temas de destaque do 245º Encontro Nacional da Sociedade Americana de Química, que começou domingo nos Estados Unidos.

Apesar dos conhecidos benefícios, a matéria-prima ainda não é usada em escala industrial na matriz energética devido à dificuldade de extrair os lipídios, a celulose e os demais produtos de suas células. A complicação vem principalmente de seu tamanho, que pode se limitar a poucas centenas de micrômetros. Para contornar essas barreiras, pesquisadores da Universidade do Texas investigaram um tipo específico de microalgas já usadas na fabricação de vinagre. Ao isolar os genes da Acetobacter xylinum, eles conseguiram criar uma alga transgênica capaz de produzir e excretar naturalmente a nanocelulose, um nobre biomaterial com uma série de importantes aplicações.
“Se conseguirmos concluir as etapas finais do estudo, teremos cumprido um dos mais importantes potenciais de transformações agrícolas até o momento”, afirma R. Malcolm Brown, um dos autores da pesquisa, apresentada no encontro da Sociedade Americana de Química. Segundo ele, a descoberta inaugura a segurança da existência de espécies que produzem nanocelulose de forma abundante e barata. “A A. xylinum pode se tornar matéria-prima para a produção sustentável de biocombustíveis e de muitos outros produtos. Além de produzir nanocelulose, as algas absorvem o dióxido de carbono, o principal gás de efeito estufa associado ao aquecimento global”, pondera Brown.
A nanocelulose é como se fosse um polissacarídeo, uma celulose, mas de cadeia pequena. De acordo com Bruno Brasil, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) –  Agroenergia, hoje ela pode ser obtida a partir da celulose de plantas. Bastam alguns processos químicos para quebrar os açúcares maiores em estruturas menores. “Se você quebrá-la totalmente, ela vai acabar virando glicose. A nanocelulose seria um intermediário entre a glicose, a unidade menor, e a celulose, que é o açúcar completo”, explica. Brasil ressalta que, atualmente, o processo mais caro na produção de etanol de segunda geração é justamente converter a celulose em açúcares que podem ser fermentados para a produção de álcool, que normalmente são a glicose ou a sacarose.

“A cana-de-açúcar já produz sacarose direto. A levedura transforma o caldo em etanol. Na segunda geração, você tem que pegar a celulose e quebrá-la em um açúcar de cadeia pequena para fazer o etanol”, detalha. Para o especialista, o ponto forte do estudo norte-americano foi combinar as vantagens da alga, que seria considerada uma terceira geração de produção de biocombustível, para produzir etanol em um processo parecido ao de segunda geração, mas usando, em vez da celulose, a nanocelulose, que é rapidamente fermentada por uma levedura para produzir etanol.

Rapidez Donato Aranda, professor da Escola de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador do GreenTec, Laboratório de Tecnologias Verdes da UFRJ, pondera que extrair produtos como lipídios e celulose da célula da alga não é tarefa trivial. “Quando você trabalha com soja ou dendê, existem prensas que ajudam a extrair o óleo. No caso das algas, como elas são unicelulares e muito pequenas, essa técnica não é efetiva”, explica. O avanço que o estudo norte-americano traz, portanto, é encontrar uma alga que, além de sintetizar a celulose de cadeia curta, também a secreta naturalmente. “Isso facilita muito, porque você não precisa tirar de dentro da célula a nanocelulose, a própria alga a coloca para fora”, acrescenta Aranda.

O pesquisador da UFRJ ressalta que a grande vantagem do uso da microalga para produzir biocombustível é a rapidez dos resultados. “Se você planta soja hoje, você consegue colher depois de 100 dias. No dendê é bem pior, demora três anos para começar a frutificar o dendenzal. No caso das microalgas, eu tenho como começar uma produção e colher em poucas semanas”, salienta. O crescimento das algas é muito rápido, sendo possível triplicar a biomassa da planta a cada 24 horas.

Bruno Brasil, da Embrapa Agroenergia, reforça ainda que a área para cultivo de microalga é infinitamente menor do que as culturas tradicionais de soja ou cana-de-açúcar. “Segundo um dado de 2008, para atender a demanda dos Estados Unidos por energia à base de soja você precisaria de um território três vezes maior do que o tamanho do país. Agora, se você fizer isso com alga, gastaria somente 4% do território”, exemplifica. Apesar de o Brasil ter uma vocação para ser produtor de microalgas, pois tem luz solar em abundância, Aranda reclama dos ainda escassos investimentos na área, que ficam muito atrás dos recursos das pesquisas norte-americanas.

Seminário
Itajubá, no Sul de Minas, recebe a partir de segunda-feira, 15, o seminário internacional Ceurer – Avanços em conversão de energia, uso de resíudos e energias de resíduos. O evento será realizado na Universidade Federal de Itajubá e terá a participação de especialistas brasileiros e estrangeiros, que compartilharão suas experiências e pesquisas sobre o desenvolvimento de tecnologias para a conversão de energias.



Gastronomia tem espaço em encontro sobre química



Vai até quinta-feira a 245ª edição do Encontro Nacional da Sociedade Americana de Química, a maior sociedade científica do mundo. Este ano, o evento ocorre na cidade de Nova Orleans, famosa por sua gastronomia e por ser um centro global da industria energética. Os pontos fortes da cidade marcam, inclusive, as duas principais linhas de temas abordados na conferência, que acabou sendo chamada de Chef. A palavra, além de remeter aos profissionais da cozinha, serve de sigla em inglês para Química da energia e dos alimentos.
O esperado é que mais de 14 mil pessoas participem do evento. Pelo menos nove prêmios Nobel apresentarão seus trabalhos durante a semana. Entre eles estão Robert Grubbs e Richard Schrock, conhecidos por desenvolver uma nova forma de fazer plásticos e medicamentos que revolucionou a chamada “química verde”. A programação envolve ainda trabalhos que vão da astronomia à zoologia, passando por medicina, aquecimento global, eletrônica, mundo dos negócios e, claro, pela busca de novas fontes de energia sustentáveis e formas mais saudáveis de alimentos. São mais de 12 mil apresentações, que incluem títulos como A química do bar e Biocombustíveis e energia sustentável.

SABOR DOS ALIMENTOS Um dos destaques é a pesquisa sobre a química nos sabores dos alimentos, que busca entender se é tudo uma questão de prazer ou algo muito além das sensações. Ainda na área gastronômica, o ambiente da cozinha é descrito como um verdadeiro laboratório. O futuro do sistema de produção de comida também será debatido.
Com mais de 163 mil membros, a Sociedade Americana de Química é uma organização sem fins lucrativos e líder global no fornecimento de acesso a pesquisas relacionadas à química por meio de revistas, jornais e
conferências científicas.

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