terça-feira, 9 de abril de 2013

Minha história - Adriana Silveira

folha de são paulo

O tempo não para
Mãe de aluna assassinada em chacina de Realengo, divide sua vida entre ajudar parentes de outras vítimas e criar filho mais velho
RESUMO A máxima de que "o tempo voa" não se aplica a Adriana Silveira, 42, que há dois anos perdeu sua filha, Luiza, 14, quando Wellington de Oliveira, então com 23 anos, invadiu a escola municipal Tasso da Silveira, em Realengo, zona norte Rio, matou a tiros 12 crianças e deixou outras 12 feridas. Ela transformou sua dor em luta. Criou e preside a Associação Anjos de Realengo, que reúne parentes das vítimas da chacina.
(...) Depoimento a
LUCAS VETTORAZZODO RIOO tempo não passou rápido para mim. Eu ainda vivo aquele dia 7 de abril de 2011, até porque estou muito envolvida com as famílias e as crianças. Quando me dei conta de que já fazem dois anos, percebi que nem vi esse tempo passar. Você para no tempo mesmo.
A associação [Anjos de Realengo] surgiu três dias depois do massacre [na escola municipal Tasso da Silveira, em Realengo, zona norte do Rio]. Um serve de muleta para o outro. Quando um está caído, o outro ajuda a se levantar. Somos 50 pessoas.
Começamos com as famílias de quem perdeu suas crianças e logo vieram as famílias das sobreviventes.
Desde então eu não parei um só dia. Tinha que arrumar uma forma de continuar viva. Olhar para o que tinha acontecido seria muito difícil, eu não ia aguentar.
Meu marido e meu pai infartaram na época da morte da Luiza. Eu levantava tendo que tocar uma associação, ir ao hospital ver meu marido e depois visitar meu pai em casa. Hoje, eles estão caminhando.
Foi uma luta muito grande. Só não desisti da vida por causa do meu outro filho, Carlos Roberto, hoje com 18 anos. Eu falei para ele: "por tua irmã eu morri e por você eu vou ter que ressuscitar".
ERROS
Não aceito quando as autoridades dizem para mim que "foi um louco que invadiu a escola e matou todo mundo". Aquelas crianças estavam no lugar certo, fazendo a coisa certa. As autoridades erraram com ele [o atirador, que sofreu bullying na infância], comigo e com as demais famílias. E continuam errando. Não houve mudança. Ele apertou o gatilho, mas as autoridades são as maiores culpadas.
Fizeram uma reforma grande na escola, mas crianças morreram para o prédio estar daquele jeito hoje. Os estudantes continuam sem ter segurança.
O que mudou mesmo foi a minha vida, a de quem perdeu seus filhos.
Com um trabalho bem feito, é possível reduzir a violência e o bullying nas escolas. Queremos fonoaudiólogos e psicólogos diariamente para identificar crianças com problemas, para encaminhá-las para tratamento médico antes que o mal cresça da forma que cresceu com a pessoa que tirou a vida da minha filha naquela escola.
Queremos também um guarda municipal desarmado dentro de cada escola para que ele possa, por exemplo, apartar uma briga entre alunos ou resolver pequenas desavenças.
ÚLTIMO DIA
O dia do massacre seria o último da Luiza no colégio. Ela tinha repetido de ano e não queria mais continuar lá.
Naquele dia, quando a acordei, senti algo muito ruim, tremi dos pés à cabeça, sem saber o porquê.
Senti que ela não queria ir, mas disse: "Filha, hoje vai ser seu último dia".
Pedi que ela me ligasse da escola para avisar quando visse a diretora. Eu iria lá para conversar com ela. Bastava dar um toque que eu iria, nem precisava falar comigo. E o telefone tocou. Eram 8h16, mas ela estava ligando para pedir socorro. Saí de casa porque deduzi que era sobre a diretora.
Depois soube que quando ela tentava nos ligar, ele atirou nela. No caminho, vi que as ruas estavam agitadas, tinha helicóptero voando. Perguntei a um conhecido o que estava acontecendo. Ele disse: "Um louco entrou na escola e saiu matando todo mundo".

    FRASES
    "Tinha que arrumar uma forma de continuar viva. Olhar para o que tinha acontecido seria muito difícil, eu não ia aguentar"
    "Aquelas crianças estavam no lugar certo, fazendo a coisa certa. As autoridades erraram com ele [o atirador, que sofreu bullying na infância], comigo e com as demais famílias"
    "O dia do massacre seria o último da Luiza no colégio. Ela tinha repetido de ano e não queria mais continuar lá"
    "Soube que quando ela tentava ligar para mim, ele [Wellington de Oliveira] atirou nela"
    ADRIANA SILVEIRA, 42
    presidente da Associação Anjos de Realengo e mãe de Luiza, morta na chacina

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