sexta-feira, 3 de maio de 2013

Eduardo Almeida Reis - Implicância‏

Com o passar dos anos, somos assaltados em casa, nas ruas, nos shoppings, nos bancos, nos restaurantes 


Eduardo Almeida Reis

Estado de Minas: 03/05/2013 

Revolta-me a implicância da mídia com ilustrados homens públicos. Ainda outro dia, todo mundo criticou o excelentíssimo senhor secretário de Segurança Pública da Bahia pelo sábio conselho que deu aos baianos: levar no bolso um só cartão de crédito e dinheiro suficiente para não irritar o ladrão. Ora, bolas, até parece que o secretário me ouviu: só levo um cartão, que tenho desde os anos 1970, e dinheiro suficiente para deixar o ladrão contentíssimo. Tudo preso com elásticos, que os belo-horizontinos chamam gominhas. O leitor de Tiro e Queda sabe que moramos num país de donatos, como também sabe que donato, regionalismo brasileiro na linguagem dos delinquentes, significava dono ou morador de casa que foi ou está para ser assaltada. Com o passar dos anos, somos assaltados em casa, nas ruas, nos shoppings, nos bancos, nos restaurantes. Portanto, como recomenda o secretário baiano, é de todo conveniente não irritar o ladrão levando pouco dinheiro. Levando muito há outro risco: o de o ladrão querer mais, ou o leitor já viu sujeito rico se contentar com o que tem?

Implicância também imperdoável foi com a nomeação do sociólogo Wellington Moreira Franco para ministro-chefe da Secretaria de Aviação Civil. Wellington sempre foi respeitado político piauiense. Daí a dizer-se que não sabe distinguir um aeroplano de um gambá – marsupial do gênero Didelphis, os maiores da família dos didelfiídeos, com três espécies, encontrados do Sul do Canadá à Argentina, com até 50cm de comprimento, cauda preênsil, longa e quase inteiramente nua, com a parte distal branca, pelagem cinza, preta ou avermelhada e fêmeas com marsúpio bem desenvolvido – vai uma distância que não posso percorrer.

Aposto que o novo ministro-chefe já viajou de avião. Sei que ele não é nenhum Oleg Antonov, Willy Messerschmitt ou Reuben Hollis Fleet. Cacei e pesquei com mr. Fleet no Pantanal, lá se vão séculos. O projetista do Convair sabia tudo de aviação. Num voo pantaneiro de uma hora esboçou avião de plástico, ideal, segundo nos disse, para voar e hangarar nas condições pantaneiras. O Houaiss e o Volp não têm o verbo hangarar. Problema deles, não meu, que sempre ouvi pilotos dizendo que suas aeronaves estavam hangaradas. Fleet foi deixado o dia inteiro, com água pelo peito, caçando patos com o bugre Nurba, um índio cadiuéu. Nurba não falava uma palavra de inglês e Reuben Fleet, que não falava o cadiuéu de Nurba, só dava duas ou três palavras em português. No final da tarde, quando os pescamos numa lagoa com metro e meio de água, tanto o bugre dizia que o engenheiro aeronáutico era muito inteligente, como Fleet elogiava a inteligência do velho cadiuéu. Devem ter conversado por gestos ou em grego clássico.


Importância
O leitor já deve ter notado que todo mundo se considera muito importante. É raro encontrar cavalheiro ou dama que tenha consciência de suas limitações. Pensando bem, pelas nossas ópticas somos importantíssimos, mas só no que nos diz respeito; no contexto mundial, cada um de nós é subnitrato de pó de bosta, mas vai convencer alguém de sua desimportância. Outro mal de que padecemos é achar que estamos resolvendo todos os problemas da humanidade, quando não conseguimos resolver os nossos problemas. Tempos atrás, tive um problema com um chefe de portaria, importantíssimo como todo chefe de portaria. Tê-lo-ia demitido se procurasse o dono da empresa, muito meu amigo, mas achei melhor deixar o pobre coitado para lá. Dentro de alguns anos, se continuar no emprego, ele vai se aposentar como chefe de portaria. Desejo que seja feliz.

Em rigor, além do guardinha da esquina, não existe gente que se considere mais importante do que os condutores de veículos automotores. Choferes, cinesíforos, condutores, motoristas de ambos os sexos, ou dos 11 sexos que o psiquiatra Pamplona da Costa alinha em seu livro, se acham importantíssimos, buzinam, xingam, brigam e se matam no trânsito. Morro de rir dos imbecis que ficam furiosos quando, dirigindo, deixo um carro entrar à frente do meu. O condutor do veículo que vem atrás fica uma onça, porque perde seis ou sete metros no engarrafamento em que nos metemos. Se soubesse o prazer que me dá com a sua fúria, cuidaria de buzinar mais, piscar os faróis, abanar o braço para fora do seu carro.


O mundo é uma bola
3 de maio de 1494: Cristóvão Colombo descobre a Jamaica, hoje uma nação insular no Mar do Caribe, com 10.991 km2, onde nascem recordistas de 100 e 200 metros rasos e onde foi desenvolvida a raça leiteira bovina jamaica hope. Em 1902, primeiro jogo de futebol no Brasil: Mackenzie 2 x 1 Germânia. A Copa do Mundo vem aí e há estádios novos ameaçando ruir com ventos de 60km/h, pouco mais que uma brisa. Em 2002, o euro se torna moeda definitivamente confirmada nos países da União Europeia, decisão relativa, porque há diversos países prometendo cair fora da moeda que me trouxe da Bélgica lenços e meias da melhor supimpitude. Hoje é o Dia do Solo, do Taquígrafo, que tentei ser, e do Sertanejo, geralmente gente boa, ressalvada sua música.


Ruminanças
“Todas as mulheres deviam ter catorze anos.” (Nelson Rodrigues, 1912-1980).

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