quinta-feira, 20 de junho de 2013

E-mails revelam divergências em programa de bolsas

folha de são paulo
Presidentes de agências federais de pesquisa trocam acusações de inflar números do Ciência sem Fronteiras
Correspondência entre dirigentes da Capes e do CNPq mostra ameaça de 'jogo de empurra' entre os dois órgãos
TAI NALONDE BRASÍLIA
Uma troca de e-mails entre os presidentes das duas principais entidades de fomento à pesquisa do governo federal em abril passado revela troca de acusações sobre fragilidades no Ciência sem Fronteiras, programa de bolsas de estudo no exterior.
Folha teve acesso a correspondências entre o presidente do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), Glaucius Oliva, e o da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), Jorge Guimarães, mostrando divergências na condução do programa, acusações de inflar números e ameaças de sabotagem.
A reportagem apurou que o clima beligerante entre os órgãos continua. Os dirigentes negam haver crise no programa.
A veracidade dos e-mails, que chegaram à reportagem por meio de correspondência apócrifa, foi atestada pelos dois dirigentes. Eles, porém, não quiseram se manifestar sobre a troca de acusações.
Lançado em 2011, o Ciência sem Fronteiras tem como objetivo enviar 101 mil bolsistas para o exterior até 2015. A meta é considerada irrealista, reservadamente, por envolvidos em sua execução.
Folha apurou que foi aventada, em reunião com o ministro Aloizio Mercadante (Educação), a possibilidade de fundir as agências para cuidar do problema. A opção foi descartada por ora.
OS E-MAILS
A correspondência começou em 6 de abril com a discussão sobre mandados de segurança contra o CNPq, impetrados por pelo menos 60 estudantes que pediam acesso às bolsas no exterior.
Segundo Oliva, os candidatos são de áreas de humanas, consideradas como "baixa prioridade" para o Ciência sem Fronteiras --o programa se concentra nas áreas de exatas e tecnologia.
A informação foi levada à cúpula do programa, que trocou acusações.
Jorge Guimarães, presidente da Capes, escreve que está "preocupado" com a falta de de uniformidade nos procedimentos das duas agências quanto à concessão das bolsas e que "está pensando" em sugerir que o ministro Aloizio Mercadante deixe o Ciência sem Fronteiras só nas mãos do CNPq. "Tem sido muito difícil esse dia a dia."
Segundo Guimarães, uma das grandes diferenças entre as agências é o conceito de bolsa concedida. "Só consideramos concedida a bolsa quando o bolsista recebe a passagem e confirma o voo."
Oliva discorda. "Você acha que deveríamos contabilizar os estudantes somente quando eles emitirem a passagem? Neste caso jamais teríamos chegado ao final de 2012 com as 22 mil bolsas concedidas."
Oliva também considera "inaceitável" centralizar o Ciência sem Fronteiras no CNPq, agência que ele dirige.
"Espero que esse assunto (...) seja encerrado aqui. Aliás, levá-lo ao ministro Mercadante seria um golpe inaceitável e injusto, comigo e com o CNPq, pois é evidente que o ministro não aceitará e vai simplesmente vir para cima de mim, pessoalmente, me responsabilizando por não cuidar do Ciência sem Fronteiras como deveria."
No fim de abril, a Folha revelou que o programa incluía em sua contabilidade bolsistas regulares da Capes, mas o governo negou tratar-se de uma maquiagem.

OUTRO LADO
Dirigentes negam atritos na gestão do Ciência sem Fronteiras
DE BRASÍLIAApesar de atestar o conteúdo dos e-mails, tanto Glaucius Oliva, do CNPq, quanto Jorge Guimarães, da Capes, afirmam que não há crise no gerenciamento do Ciência sem Fronteiras.
"O sucesso nacional e internacional do programa, como atestado pela esmagadora maioria dos bolsistas contemplados e pelos parceiros universitários no exterior, demonstra que estamos no caminho certo na gestão do programa", diz Oliva, que recebeu o apoio de Guimarães.
Eles dizem que "são amigos próximos há 20 anos" e que se tratam com "total franqueza e transparência". Os dois se recusaram a comentar o que chamaram de "ilações" expostas pelos e-mails.
"Não há qualquer chance de haver jogo de empurra entre as agências", disse Oliva.

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