quinta-feira, 20 de junho de 2013

Eduardo Almeida Reis - Mentiras‏

Difícil é convencer sua mulher de que ela está bem, quando aparece com o primeiro vestido entre os oito que vai experimentar, antes de sair para uma festa 


Eduardo Almeida Reis

Estado de Minas: 20/06/2013 

Minto adoidado; no bom sentido, naturalmente. Elogio textos que me mandam, acho bonitas todas as namoradas que me são apresentadas pelos amigos, mentiras que não fazem mal a ninguém. Mentirosos patológicos, geralmente nos autoelogios, podem ser divertidos.

Tive um patrão assim. Burro não era, nem analfabeto, mas mentia sem parar. Pior que isso: exigia meu testemunho de empregado para as lorotas que espalhava. Mais de uma vez, quando chegamos à cidade distante da empresa rural hora e meia de jipe, só o patrão e o seu assessor, ele contava das onças imensas que avistamos pelo caminho, com o seguinte refrão: “Não foi, Eduardo?”. E o Eduardinho, morrendo de rir do potoqueiro, confirmava o encontro com o felino de grande porte.

Mentirinhas sociais são normais e louváveis. Difícil é convencer sua mulher de que ela está bem, quando aparece com o primeiro vestido entre os oito que vai experimentar, antes de sair para uma festa. Ao perguntar: “Estou bem assim?”, não adianta o deus do lar afirmar que está ótima, porque há sete vestidos na lista de espera para experimentação e consulta.

A moda masculina, agora, é a gola da camisa polo virada para cima. Já foi moda nos anos 70 e voltou com a corda toda: aprendi na tevê. Escrevo na véspera de um almoço com a família e já decidi: Lacoste de gola virada para cima.

Aprendi, também, que a camisa polo foi invenção de René Lacoste, o tenista número 1 do mundo nos anos de 1926 e 1927, que levantava a gola para proteger o pescoço das queimaduras solares. Depois, fundou a Lacoste, aquela dos jacarezinhos. Morreu em outubro de 1996 sem tempo de conhecer as diversas “lacostes” que tenho com os jacarés costurados nos mais diversos lugares. Furou com charuto, jacaré para esconder o buraquinho, que não vou jogar a camisa fora.

Coisa curiosa: evito fumar charutos com as camisas Lacoste originais de fábrica, que somam sete, porque são caras, bonitas e não merecem buraquinhos feitos pelos charutos.

O imenso Abgar Renault escreveu: “Há pessoas que não mentem, mas possuem várias verdades para o mesmo fato”. Conheço inúmeras pessoas assim e o leitor conhece outras tantas. Se a mentira é social, tudo bem; o diabo é que os mentirosos sociais são raros e não abundam como abunda a pita, grande erva rosulada da família das agaváceas.


Supimpa!
Sabemos que de pretensão e água benta cada um toma a que quer, ditado com diversas redações. Também sabemos que, neste país grande e bobo, o substantivo masculino escritor se amontoa nos passeios e mesmo nas ruas sem calçadas, motivo pelo qual tantos patrícios se intitulam ou são intitulados escritores, podendo mesmo ser eleitos para a Academia Brasileira de Letras.

É, portanto, uma surpresa da melhor supimpitude encontrar um texto divertido, bem escrito e com ensinança, como aquele publicado na primeira página do nosso caderno Direito e Justiça, edição de 15 de março. Com a agravante de ser da lavra de um doutor em direito comercial pela USP, quando se sabe que o direito comercial é chatíssimo e os advogados, condição primeira para o cavalheiro se tornar mestre e doutor em direito, geralmente escrevem mal, tantos são os números das páginas e os títulos dos livros de Pierre Marie Nicolas Léon Duguit, Rudolf von Ihering, Pontes de Miranda e outros, que fazem questão de citar como se os tivessem lido.

Perdi a conta das vezes que entrevistei Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, autor de um monte, mas um monte mesmo, de livros nos campos da matemática, sociologia, psicologia, política, poesia, filosofia e sobretudo direito, obras publicadas em português, alemão, francês, espanhol e italiano. Oitentão, achava tempo de jantar fora todos os dias e curtir seu uisquinho. Entrevistei-o sobre os mais diversos assuntos, ele sempre muito educado e simpático encerrando a entrevista com a seguinte recomendação: “Não se esqueça de dizer que sou da Academia de Ciências do Vaticano”. Criada no século 15, é a mais antiga instituição científica do mundo. O jovem repórter atendia o pedido e o secretário de redação, invariavelmente, cortava a referência à pontifícia Academia, que tinha 29 Prêmios Nobel até 2003.

Cuidemos, agora, do jovem que escreve muito bem: Leonardo Netto Parentoni, procurador federal, autor do texto “Spam na tela dos outros é colírio”. A começar pelo título, em que spam pode ser pimenta, e colírio, que se aplica no olho, pode ser refresco, o texto é divertidíssimo, instrutivo, nota dez. Permito-me sugerir à coordenadora Isabella Souto que convide o procurador para escrever sempre: o jovem doutor nasceu para esse mister, que parece fácil, mas não é.


O mundo é uma bola
20 de junho de 1890: a França é a primeira nação europeia a reconhecer a República brasileira, chamada República Velha, mil vezes pior que o Império e um milhão de vezes melhor que a atual República, ainda outro dia presidida pelo muriciense José Renan Vasconcelos Calheiros. Em 1960, independência do Mali e do Senegal, como se adiantasse alguma coisa.

Hoje é o Dia Nacional do Revendedor e o Dia do Vigilante.

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