sexta-feira, 19 de julho de 2013

Carlos Herculano Lopes-Três por quatro‏


Estado de Minas : 19/07/2013 


Para renovar a carteira de identidade, que se encontrava aos frangalhos, o homem resolveu tirar uma nova foto, pois na do antigo documento, por razões óbvias, ele estava irreconhecível – ainda com os cabelos pretos, sem rugas e aquela cara de garoto, que há muito havia perdido. Ao comentar com sua mulher, ela disse: “Vá ao Foto Zatz. Quando criança, ia lá com meu pai. Eles são ótimos”.

Sugestão acatada, pois, além de ter gostado da ideia, não é homem de contrariar a esposa, lá se foi ele para a velha loja da esquina de Rua Tamoios com Avenida Afonso Pena, onde, já não sabe há quantos anos, tirara alguns retratos, como se dizia. Para o ritual ficar completo, deu um pulo no Nice: pediu um café forte, ainda passado em coador de pano, e se encontrou com um velho conhecido, o Marco Antônio. Bateram papo, falaram da vida e ele seguiu, com as energias renovadas.

“Para que você quer a foto?”, perguntou a atendente, moça de sorriso aberto, que parecia estar de bem com a vida. “Para a nova carteira de identidade. A minha está muito velha”, ele respondeu. Ao que ela emendou, como devia fazer dezenas de vezes ao dia: “Então, tem de ser três por quatro”. Preço combinado, encaminhou-o para o estúdio, onde um rapaz moreno, já a postos, esperava-o com a máquina num tripé, modelo antigo, que há tempos o homem não via. Depois de cumprimentá-lo, pediu, com a segurança de quem entende do ofício, que se sentasse ereto na cadeira, olhasse fixamente para a câmera, fechasse a boca. Daí a pouco, fez a primeira foto.

 Depois de examinar o negativo, do qual não gostou – “essa expressão tá séria demais, não precisa de tanto”–, aquele rapaz sugeriu outra tentativa, e a ela se seguiram mais algumas. Durante o intervalo, no qual engrenaram uma conversa, ele contou ao homem que tinha 31 anos, vários deles trabalhando como fotógrafo, profissão da qual gostava muito. “Só aqui no Zatz estou há um tempão”, disse, para emendar, com orgulho, que a casa fizera 78 anos e talvez fosse a mais antiga do ramo em Belo Horizonte. “É possível que sim; tinha também o Elias”, respondeu o homem, enquanto aguardava para ver se as novas tentativas tinham dado certo.

Nos minutos seguintes, quando o moço, gentilmente, passou a lhe mostrar os três negativos selecionados, o homem perguntou, sem querer acreditar: “E essas rugas no meu pescoço, não tem jeito de tirá-las?”. “Ah, meu amigo, só se a gente der uns retoques, mas vai demorar muito e fica mais caro. Se você quiser, a gente faz”, respondeu. Conformado com a sorte, só restou a ele esperar os 15 minutos necessários para que as fotos fossem reveladas antes de ir ao Posto Uai, na Praça Sete, em busca da nova identidade. Mas essa é outra história, para a semana que vem. 

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