sábado, 10 de agosto de 2013

Editoriais FolhaSP

folha de são paulo
Um STF diferente
Pela primeira vez na história, corte condena um senador da República; entendimento dos ministros pode alterar decisões sobre o mensalão
Consolida-se, aos poucos, a percepção de que os ministros do Supremo Tribunal Federal estão dispostos a modificar a imagem da corte perante a população e converter em exceção a regra da impunidade que sempre vigorou para os políticos brasileiros.
Há pouco mais de um mês, o STF mandou prender o deputado federal Natan Donadon (ex-PMDB-RO), condenado em 2010 por desvios cometidos nos anos 1990 na Assembleia Legislativa de Rondônia. Foi a primeira ordem de prisão expedida contra parlamentar desde a redemocratização do país.
Agora, pela primeira vez na história, o tribunal condenou um senador da República. Ivo Cassol (PP-RO) foi sentenciado a mais de quatro anos de prisão por crimes praticados quando foi prefeito de Rolim de Moura (RO), de 1997 a 2002.
De forma unânime, os ministros do Supremo entenderam que o parlamentar participou de um esquema de fraude a licitações do município, em benefício de empresas de seu interesse.
O senador, que se declara inocente, poderá recorrer em liberdade. Se a decisão for mantida, ele cumprirá sua pena em regime semiaberto --pelo qual deve recolher-se ao presídio somente à noite.
Como ambos os processos têm mais de dez anos de tramitação nos escaninhos do Judiciário, é difícil não ver, na opção por analisá-los neste momento, alguma influência das manifestações de junho. Seria injusto com o tribunal, no entanto, deixar de assinalar que, do ponto de vista do STF, o divisor de águas localiza-se no julgamento do mensalão.
Há duas novidades, porém, no que respeita à ação penal 470. Por 6 votos a 4, o STF estabeleceu que cabe ao Congresso, e não ao Judiciário, decidir se Ivo Cassol deverá perder seu mandato de senador.
Por força dos votos de Luís Roberto Barroso e Teori Zavascki, essa interpretação difere da que foi dada aos casos de congressistas condenados pelo mensalão --julgamento do qual os dois não participaram. Naquela ocasião, por 5 votos a 4, a corte arrogou para si a função de cassar os mandatos.
Desfaz-se, com o novo entendimento, esse desnecessário atrito entre Legislativo e Judiciário.
Para além da disputa a respeito de competência, os argumentos no caso do senador estimulam especulações sobre os recursos do mensalão, que devem ser discutidos a partir da semana que vem.
Os dois novos ministros, no julgamento de Cassol, se mostraram simpáticos a uma definição mais estreita do crime de formação de quadrilha. Acompanham, quanto a esse delito, colegas que votaram, no mensalão, contra a condenação de José Dirceu e Delúbio Soares.
Seus votos, em eventual reexame processual, podem livrar os petistas de cumprir penas inicialmente em regime fechado --medida que decerto teria impacto na opinião do público a respeito da corte.
Repete-se, com força renovada, a dificuldade de encontrar o ponto de equilíbrio entre a técnica jurídica e seus aspectos políticos --e não há como saber qual será a posição dos novos ministros.
O grito do museu
Embora estivesse previsto para este ano, o recente fechamento do Museu do Ipiranga, vinculado à USP, deu-se de modo abrupto, após uma vistoria técnica indicar riscos à integridade física dos visitantes e das peças ali abrigadas.
Além da recuperação da estrutura do prédio, que está comprometida, existe um projeto para implantar elevadores externos, ampliar os espaços destinados a exposições e construir novas áreas para manutenção do acervo --que reúne mais de 125 mil itens.
O Museu Paulista --este é seu nome oficial-- foi inaugurado em 7 de setembro de 1895 com o objetivo de ser um marco no local simbólico do grito do Ipiranga. O edifício, que foi só parcialmente construído, passou a abrigar um acervo eclético, com ênfase em ciências naturais, proveniente de coleções existentes na cidade.
A partir de 1917, o perfil científico oitocentista começou a dar lugar a um projeto de museu histórico, com vistas a realçar a presença de São Paulo nas comemorações do centenário da Independência.
É sem dúvida uma boa notícia que a sede do Ipiranga venha a ser, enfim, recuperada e ampliada, com um investimento, já anunciado pela USP, de R$ 21 milhões.
Lamenta-se, porém, que burocracia e negociações com órgãos de preservação do patrimônio tenham consumido tempo em demasia, enquanto o prédio se deteriorava. Além de anos de má preservação, contribuiu para os problemas o uso, pela administração, de área destinada a ventilar a edificação.
Tratando-se de instituição de grande interesse público, é preciso que a universidade forneça dados mais precisos sobre a reforma. Até aqui a direção do museu limitou-se a divulgar um comunicado, no qual não se estipulam prazos.
Sabe-se que a perspectiva é ter a sede remodelada para as festas do bicentenário da Independência --mas até lá ainda faltam nove anos. Não parece razoável que os paulistanos tenham de esperar tanto para receber de volta seu museu.
A USP promete divulgar oportunamente novas informações sobre o projeto e o cronograma das obras. Seria bom que tais esclarecimentos não tardassem.

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