quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Kenneth Maxwell

folha de são paulo
'Quintalismo'
O secretário de Estado dos EUA, John Kerry, visitou Brasília nesta semana. Não queria conversar com a imprensa, mas o Itamaraty insistiu para que ele participasse, com o chanceler Antonio Patriota, de uma entrevista coletiva.
Kerry não tratou, em suas declarações iniciais, da questão da espionagem norte-americana. Patriota, porém, o fez. Ele disse que o Brasil e os EUA estavam enfrentando "uma nova espécie de desafio relacionado às escutas telefônicas. E, caso esses desafios não sejam resolvidos de forma satisfatória, corremos o risco de lançar a sombra da desconfiança sobre o nosso mundo".
Não surpreende que o primeiro tópico mencionado pelos jornalistas tenha sido a revelação, por Edward Snowden, de uma imensa operação de espionagem da NSA (Agência de Segurança Nacional dos EUA) que tratava o Brasil como prioridade e incluía espionagem sobre a missão brasileira na ONU e a embaixada em Washington.
As revelações de Snowden foram feitas por intermédio de Glenn Greenwald, advogado e colunista do jornal "The Guardian", que vive com seu parceiro brasileiro, David Michael Miranda, no Rio de Janeiro.
A resposta de Kerry foi dizer que "a coleta de inteligência" pelos EUA "positivamente ajudou ao proteger nossas nações contra diversas ameaças".
Ele disse que a espionagem era conduzida "sob as leis norte-americanas". Não foi uma resposta muito reconfortante. Kerry não tratou da extrema promiscuidade dos serviços de informação norte-americanos ao compartilhar dados secretos com milhares de agentes e prestadores de serviços.
Kerry fez parte do Comitê de Relações Exteriores do Senado dos EUA, mais recentemente como presidente. Em suas audiências de confirmação, ele se referiu à América Latina como "o quintal" dos EUA --uma expressão nada feliz.
Ele foi a Brasília para discutir a visita da presidente Dilma Rousseff aos EUA em outubro e um novo "relacionamento estratégico" entre os dois países. Há muita coisa na agenda, especialmente um potencial acordo para a compra de caças, que tem a Boeing como um dos principais candidatos, e o apoio dos EUA a uma cadeira permanente do Brasil no Conselho de Segurança da ONU.
Mas o Brasil, no momento, não tem condições (políticas) de comprometer entre US$ 4,3 bilhões e US$ 8,2 bilhões na compra do Boeing F/A-18 Super Hornet, e os EUA não demonstraram interesse em apoiar as já antigas aspirações brasileiras na ONU.
Como diria Harold Macmillan quando perguntado sobre o maior desafio para um estadista: "Os acontecimentos, meu caro". Os acontecimentos se combinaram para fazer da visita da presidente Rousseff aos EUA uma ocasião singularmente inoportuna.

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