quarta-feira, 20 de novembro de 2013

FERNANDO BRANT » Jango‏

Quando houve o plebiscito para se restabelecer o presidencialismo também me entusiasmei


Estado de Minas: 20/11/2013



Era semana santa. Estava em Diamantina, depois de alguns anos de ausência. As mesmas pedras capistranas em que corria atrás de bola até meus 9 anos estavam lá. As mesmas igrejas, a mesma paisagem, o mesmo povo simples. Diferente era, bares abertos na sexta-feira, o bispo dom Sigaud abençoando (será?) os frequentadores dos botequins. Tinha nas mãos uma inofensiva Coca-Cola, mas também fui atingido pelos gestos episcopais. Meu irmão, estudante com índole de líder, agitava o seminário religioso com discurso inflamado contra o golpe que se anunciava.

Acompanhava os fatos nacionais e tinha uma impressão positiva da ação e das falas do gaúcho João Goulart. Sabia das prometidas reformas de base, que dividiam o país. Era um assunto essencial nos intervalos das aulas do Colégio Estadual. Lia os jornais de casa e assistira pela tevê ao comício do dia 13 de março, no Rio de Janeiro, quando uma multidão aplaudiu os oradores que defendiam as mudanças a serem feitas na estrutura do Brasil.

Já simpatizara, antes, com o jingle cantado por Jorge Goulart na eleição de 1960: “Na hora de votar eu vou jangar, eu vou jangar, é o Jango, é o Jango, é o Jango Goulart”. Quando houve o plebiscito para se restabelecer o presidencialismo também me entusiasmei, mesmo não tendo ainda o direito de votar (sem saber, naquele tempo, que só participaria de eleições nacionais quase 30 anos mais tarde). Torci e cantei: “Vou fazer um xis no quadrinho ao lado da palavra não, parlamentarismo não, o povo tem razão, vou fazer um não”. Em outras circunstâncias, outra realidade e mais conhecimento, iria votar no parlamentarismo já em tempos de democracia reconquistada.

Agora que o restos mortais de João Goulart chegam a Brasília, 37 anos depois de sua suspeita morte no exílio, e que seu papel em nossa história é oficialmente reconhecido, lembro-me de um texto que escrevi para o filme Jango, de meu amigo Sílvio Tendler .
Sinto que vale a pena recordar:
“Os acontecimentos daqueles dias ainda estão claros na memória:
fechado no escuro do quarto
querendo fugir do mundo
que me chegava pelo rádio
eu, pouco mais que um
menino, chorava como se fosse morte, a viagem-fuga do
presidente Jango.
Os anos passados, a maturidade
e a visão diária da injustiça e do ódio da opressão e do medo
vieram confirmar meus
sentimentos.
Em nome da verdade e da
história eu, adulto, reafirmo o menino: as lágrimas derramadas em 1964 continuam justas”.

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