quinta-feira, 1 de maio de 2014

Copidesquei II - Eduardo Almeida Reis

Estado de Minas: 01/05/2014 



Continuação e conclusão do imenso e lúcido editorial do Jornal de Angola: “Intelectuais de todas as épocas cuidaram dela com o mesmo desvelo que se tratam as preciosidades. Queremos a Língua Portuguesa que brota da gramática e da sua matriz latina. Os jornalistas da Imprensa conhecem melhor do que ninguém esta realidade: quem fala, não pensa na gramática nem quer saber de regras ou de matrizes. Quem fala quer ser compreendido. Por isso, quando fazemos uma entrevista, por razões éticas, mas também técnicas, somos obrigados a fazer a conversão, o câmbio, da linguagem coloquial para a linguagem jornalística escrita. É certo que muitos se esquecem deste aspecto, mas fazem mal. Numa entrevista até é preciso levar aos destinatários particularidades da linguagem gestual do entrevistado.

Ninguém mais do que os jornalistas gostava que a Língua Portuguesa não tivesse acentos ou consoantes mudas. O nosso trabalho ficava muito facilitado se pudéssemos construir a mensagem informativa com base no português falado ou pronunciado. Mas se alguma vez isso acontecer, estamos a destruir essa preciosidade que herdamos inteira e sem mácula. Nestas coisas não pode haver facilidades e muito menos negócios. E também não podemos demagogicamente descer ao nível dos que não dominam corretamente o português.

Neste aspecto, como em tudo na vida, os que sabem mais têm o dever sagrado de passar a sua sabedoria para os que sabem menos. Nunca descer ao seu nível. Porque é batota! Na verdade nunca estarão a esse nível e vão sempre aproveitar-se social e economicamente por saberem mais. O Prêmio Nobel da Literatura, Dario Fo, tem um texto fabuloso sobre este tema e que representou com a sua trupe em fábricas, escolas, ruas e praças. O que ele defende é muito simples: o patrão é patrão porque sabe mais palavras do que o operário!

Os falantes da Língua Portuguesa, que sabem menos, têm de ser ajudados a saber mais. E quando souberem o suficiente vão escrever corretamente em português. Falar é outra coisa. O português falado em Angola tem características específicas e varia de província para província. Tem uma beleza única e uma riqueza inestimável para os angolanos, mas também para todos os falantes. Tal como o português que é falado no Alentejo, em Salvador da Bahia ou em Inhambane tem características únicas.

Todos devemos preservar essas diferenças e dá-las a conhecer no espaço da CPLP. A escrita é ‘contaminada’ pela linguagem coloquial, mas as regras gramaticais, não. Se o étimo latino impõe uma grafia, não é aceitável que, através de um qualquer acordo, ela seja simplesmente ignorada. Nada o justifica. Se queremos que o português seja uma língua de trabalho na ONU, devemos, antes do mais, respeitar a sua matriz e não pô-la a reboque do difícil comércio das palavras".

Trabalho
E aí, caro, preclaro e estimabilíssimo leitor: já está curtindo este novo feriadão? Amanhã é sexta-feira, dia perfeito para enforcar, e hoje o brasileiro comemora o Dia do Trabalho sem trabalhar, mas não tem nada, não: mês que vem começa a Copa das Copas. Estradas, aeroportos, escolas, saneamento, energia elétrica, água, hospitais ficam para depois ou para as calendas gregas, que significam “dia que jamais chegará”.

Trabalhar vem do latim tripalium “instrumento de tortura”, e trabalho é derivação regressiva de trabalhar, mas os nossos patrícios não precisavam levar a etimologia muito a sério, mesmo porque podemos fazer aquilo que nos agrada, sinônimo de nunca trabalhar na vida. A descoberta não é minha, mas de Confúcio, que viveu séculos antes de Cristo.

Ninguém é obrigado a trabalhar como Sísifo, que, segundo lenda grega, foi um rei condenado a rolar interminavelmente uma pedra encosta acima. Houaiss inclui farfúncia na sinonímia de trabalho e o diabo do Google tem 1.800 entradas para farfúncia, que não encontro no Aulete/digital, mas há fruncia no Chile: “Situación complicada y molesta”, tipo terremoto. Preocupa-me sobremaneira a fruncia montes-clarense, cidade onde tenho bons amigos. Que diabo haverá com o solo de Montes Claros?

Para ficar nos conformes da mania brasileira de amedalhar, este país grande e bobo, por decreto de agosto de 1950, criou a Ordem do Mérito do Trabalho, como se houvesse mérito numa atividade que não é mais do que obrigação. Ordem que tem anexa a medalha do Mérito da Segurança do Trabalho, que não deve ser observada nos estádios da Copa, tantos são os patrícios que despencam dos andaimes.

O mundo é uma bola

1º de maio de 880: inaugurada em Constantinopla a Igreja Nova, que serviria de modelo para as futuras igrejas ortodoxas. Em 1500, Pedro Álvares Cabral, em nome do Reino de Portugal, toma posse da Ilha de Vera Cruz, hoje Brasil. Em 1625, a armada luso-espanhola da Jornada dos Vassalos reconquista Salvador, Bahia, aos holandeses. Em 1834, abolição da escravatura nas colônias inglesas. Em 1948, criação da República Democrática Popular da Coreia (Coreia do Norte) com Kim Il-sung como presidente, avô do menino gorducho que lá está. Hoje é o Dia da Literatura Brasileira.

Ruminanças

“O trabalho só espanta as almas fracas” (Luis XIV, 1638-1715).

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