quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

EDitoriais FolhaSP

folha de são paulo

Medicina especial
Médicos não nascem prontos, precisam ser treinados. E, como lidam com um dos bens mais preciosos de cada indivíduo, a própria saúde, garantir que sua formação seja adequada torna-se de relevante interesse social.
Uma fase vital no treinamento do médico é a residência. É nesse período -em geral, de dois a cinco anos- que ele aprende a pôr em prática a formação teórica recebida nos seis anos da graduação. Aí também ele desenvolve a capacidade de reconhecer os casos graves em situações do mundo real e, se for um cirurgião, adquire a confiança necessária para operar.
Lamentavelmente, faltam vagas de residência em todo o país. Em especial nas regiões mais afastadas dos grandes centros.
Dados compilados no estudo "Demografia Médica no Brasil - 2", encomendado pelo Conselho Federal de Medicina e coordenado por Mário Scheffer, mostram que é alto o número de profissionais que não cursaram residência médica nem obtiveram título de especialista através de prova específica. Nessa categoria de "generalistas" estão mais de 180 mil dos 388 mil médicos que atuam no país, ou 46%.
É preciso, porém, relativizar essa cifra. O número inclui tanto profissionais jovens, que ainda não tiveram tempo de concluir sua formação, quanto aqueles mais velhos, sobreviventes de tempos em que a especialização não era considerada importante.
Se considerado somente o universo de médicos com idade entre 30 e 60 anos, o índice de generalistas cai para pouco mais de um terço. Verifica-se ainda que nas faixas etárias imediatamente posteriores aos 30 anos cresce a proporção dos titulados, o que aponta tendência de paulatina redução na quantidade de médicos com formação menos completa.
Outro problema grave é o da distribuição desses profissionais com melhor qualificação. Eles chegam a 2,69 por mil habitantes em Brasília (a unidade federativa com mais titulados), mas são apenas 0,26 por mil no Maranhão.
O caminho correto, ao contrário do que cogita o governo, não é abrir escolas e residências médicas a torto e a direito nas áreas mais carentes. Outros dados do levantamento sugerem que o médico só fixa moradia onde encontra uma combinação de salário, condições de trabalho e perspectivas futuras que considere adequada.
A carência de profissionais não será resolvida com decretos e golpes de marketing. É preciso investir em todos os elos da rede de capacitação de profissionais de saúde.

    EDITORIAIS
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    Impasse italiano
    Resultados de eleições dificultam formação de maioria no Parlamento e levam intranquilidade aos mercados financeiros
    A volta à cena de Silvio Berlusconi e a expressiva votação do ator e comediante Beppe Grillo indicam que a volatilidade, mais que nunca, se tornou a principal característica da política italiana.
    Se a dificuldade de formar coalizões majoritárias no Parlamento não constitui novidade na história do país, assiste-se agora a uma situação ímpar. O desprestígio habitual de partidos e lideranças foi ainda mais erodido pela grave crise da economia na zona do euro.
    Ao cobrar medidas austeras e impopulares, a situação da economia corrói a popularidade de qualquer governante e propicia a venda de ilusões efêmeras e niilismo político no mercado do voto.
    Com efeito, o atual primeiro-ministro italiano, Mario Monti, o preferido dos empresários, do mercado financeiro e da União Europeia, é a mais recente vítima da política de ajuste fiscal que tem combalido governos de variadas tendências ideológicas no continente. Como previsto, ficou em quarto lugar.
    Já Berlusconi, substituído por Monti em meio a denúncias de corrupção, escândalos sexuais e descontrole financeiro, ressurgiu em seu conhecido papel de líder personalista, autoritário e conservador, que seduziu a classe média italiana em anos anteriores. Com 29,1% dos votos na Câmara, por pouco não bateu o primeiro colocado, Pier Luigi Bersani, do Partido Democrático (ex-comunista), de centro-esquerda, que teve 29,5%.
    O "cavaliere" (cavaleiro), como o ex-premiê é conhecido em seu país, também surpreendeu no Senado. Segundo projeções, ainda pode obter o maior número de cadeiras.
    Também notável foi o desempenho de Grillo, com uma plataforma de rejeição aos políticos tradicionais. Seu Movimento Cinco Estrelas (M5S) alcançou cerca de 25% dos votos em cada uma das Casas.
    Embora Bersani tenha conquistado maioria na Câmara e possa fazê-lo no Senado, dificilmente conseguirá formar uma aliança majoritária no Parlamento. O líder de centro-esquerda, como seria de esperar, já rechaçou a hipótese de uma composição com Berlusconi.
    Seu intuito, segundo um representante da coalizão, seria montar um governo "de mudança" -o que sugere tratativas com Grillo. As primeiras reações do ator, entretanto, foram no mínimo ambíguas.
    Os próximos dias ou semanas deverão ser marcados por conversas e tentativas de entendimento. Não é improvável, devido às dificuldades, que ao final do processo um novo pleito seja convocado.
    Nessa hipótese, Monti ganharia um breve período extra como primeiro-ministro. Politicamente desgastado, teria ao menos a vantagem de manter provisoriamente os mercados menos intranquilos.

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