sábado, 9 de fevereiro de 2013

Editoriais FolhaSP

folha de são paulo

Improviso e faz de conta
O governo reitera sua disposição para o excesso de criatividade na gestão das contas públicas.
Enviou ao Congresso um projeto para alterar a Lei de Diretrizes Orçamentárias que autoriza reduzir em mais R$ 20 bilhões a meta de superavit primário (economia destinada a pagar a despesa de juros). A nova folga assim obtida se refere a desonerações de impostos.
Além disso, o Planalto já havia lançado mão do desconto de R$ 45,2 bilhões em despesas do Programa de Aceleração do Crescimento. A redução total no esforço para conter gastos governamentais, portanto, é de R$ 65,2 bilhões.
Se toda essa folga contábil for utilizada, a meta atual de superavit primário cairia de R$ 155,9 bilhões (3,1% do PIB) para R$ 90,7 bilhões (1,8% do PIB).
A equipe da presidente Dilma Rousseff, com isso, só faz acentuar a insegurança quanto a seu real compromisso com uma gestão austera das finanças governamentais -não bastasse o vexame do final de 2012, com os malabarismos contábeis de última hora para atingir a meta compromissada.
Beira o surrealismo econômico classificar esse desconto adicional como investimento, pois boa parte do valor a ser abatido proviria de desonerações à indústria de bens de consumo. E a justificativa de que um saldo de 1,8% do PIB permitiria reduzir mais a dívida líquida (que já caíra a 35% do PIB no final do ano), apesar de procedente, faz tábula rasa dos riscos advindos da erosão na credibilidade do governo.
Muitos analistas argumentam que o indicador a vigiar é a dívida bruta (que abrange o passivo de todos os entes de governo, como o BNDES), hoje próxima a 59% do PIB. E ela tem crescido.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, alega que seria pior uma redução explícita da meta, em lugar dos subterfúgios encontrados, pois isso diminuiria a margem de manobra do Executivo quanto ao Orçamento e estimularia no Congresso a tentação de criar novas despesas permanentes. Esta é a única justificativa minimamente razoável para a medida.
Isso só ocorre, contudo, porque a gestão orçamentária está fora do controle da sociedade, que deveria ser exercido por meio de um Congresso responsável e investido dessa função. Hoje, o Orçamento votado é autorizativo, não mandatório, o que contribui para um jogo de faz de conta: o Legislativo aprova uma Lei Orçamentária ficcional, e o Executivo finge que a cumpre.
Soa como ingenuidade, porém, esperar do Congresso que emerja de sua irrelevância na matéria, para além de reivindicar mais espaço para as emendas paroquiais dos parlamentares, e do Planalto que abandone o improviso arbitrário.


EDITORIAIS
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Palavra final
Presidente da Câmara dá declarações dúbias sobre cassação de mensaleiros, mas já parece apostar no alongamento dos prazos
O novo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), mostrou-se nos últimos dias um político sinuoso como poucos. Após declarar três vezes que o Legislativo daria a última palavra sobre a cassação dos parlamentares condenados no julgamento do mensalão, parece ter voltado atrás.
Na saída de um encontro com o ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal, Alves afirmou que "não há hipótese de não cumprir a decisão". Como se sabe, a corte havia determinado a perda dos mandatos dos deputados João Paulo Cunha (PT-SP), José Genoino (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT).
A decisão do STF deu início a um deletério embate com o Legislativo. No entender desta Folha, cabem aos representantes eleitos pelo povo a prerrogativa e a responsabilidade do ato final de cassação, como estipula o artigo 55 da Constituição -pelo qual somente o Congresso pode cassar mandatos de deputados condenados.
O episódio desdobrou-se em trocas de invectivas entre o então presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), e ministros do Supremo, o que instilou temores de uma crise institucional entre os dois Poderes. Um cenário em que todos perderiam, a começar pela democracia, que passou vitoriosa por vários testes desde a ditadura militar.
A dubiedade de Henrique Alves explica-se pela inusitada resistência a sua campanha para presidir a Câmara. Investido no cargo, mudou de tática -parece agora apostar no alongamento dos trâmites.
A Câmara só poderá agir quando o processo estiver encerrado, sem mais recursos a julgar. Estima-se que o prazo para a conclusão seja de cerca de sete meses, embora não haja garantias disso.
Caberia então à Mesa da Câmara declarar a perda dos mandatos, formalizando a decisão do STF. Não faltarão ao presidente da Casa e à base parlamentar governista, entretanto, ideias e oportunidades para esticar prazos, com recurso a expedientes burocráticos, e dar sobrevida parlamentar aos condenados. Seria uma forma de insubordinação branca, inaceitável.
A conveniência política, no entanto, ditará a marcha dos acontecimentos. Não interessa à presidente Dilma Rousseff e a seus aliados, por certo, que o governo seja premido por um confito entre Legislativo e Judiciário, com a partida da reeleição já iniciada.
Para o bem do país e das instituições, uma decisão expedita e madura da Câmara, em obediência ao Supremo, é o caminho a seguir.

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