sexta-feira, 15 de março de 2013

Editoriais FolhaSP

folha de são paulo

Excesso de ambição
Recuo do PSD na intenção de aderir ao governo Dilma reflete uma superlotação no governismo e a busca de cacife para gastar em 2014
Num movimento um tanto surpreendente, o líder do PSD, Gilberto Kassab, comunicou à presidente Dilma Rousseff que seu partido conservará a independência em relação ao governo federal pelo menos até 2014. Esperava-se, e para logo, o embarque da quarta maior sigla do Congresso na nau governista.
O PSD é o rebento mais recente e caricato da massa amorfa em que se transformou a política nacional. Explorou uma brecha na norma de fidelidade partidária, arrebanhou parlamentares e governantes mal servidos em todo o país e granjeou seu principal ativo: tempo de propaganda eleitoral na TV e no rádio proporcional à bancada na Câmara dos Deputados.
A plataforma do PSD é o governismo, a disposição de servir a qualquer partido no poder, em qualquer esfera, a despeito de ideologia ou rusgas do passado. Não se trata, porém, de uma disposição abstrata. É preciso retribuição.
Eis o ponto no qual, ao que parece, emperraram as negociações com o Planalto. A presidente oferecia um ministério de impacto reduzido, ainda por implantar, dedicado à pequena empresa. Talvez a retribuição fosse pouca para convencer os companheiros do PSD a vestir a camisa oficial da situação.
Para traçar uma parábola com a economia nacional, há descompasso entre a oferta finita de ministérios e outras regalias federais, de um lado, e, do outro, a demanda voraz por esses ativos políticos, incrementada pela classe emergente dos governistas do PSD.
Há limites de acomodação partidária até para uma máquina bizantina como a administração federal, com 39 ministérios, 20 mil cargos de confiança, estatais e autarquias espalhadas pelo país.
Não há mais vagas no camarote VIP da administração Rousseff. Talvez por isso surja, de uma parte relegada à periferia do governismo, um protomovimento de oposição à presidente Dilma e ao consórcio PT-PMDB.
Encabeçado pelo PSB do governador Eduardo Campos, um satélite ensaia desgarrar-se do centro de gravidade palaciano. Passa, se não a encorajar atitudes como a ambiguidade de Kassab, pelo menos a valorizar seu passe em negociações futuras com o petismo.
Decerto esse movimento não se atrita apenas com o Planalto. Eduardo Campos já disputa uma raia da competição política, no empresariado e na opinião pública, muito próxima da utilizada pelo PSDB e pelo seu virtual candidato a presidente, o senador Aécio Neves.
A lamentar, apenas o fato de essas disputas de bastidores não se traduzirem num choque transparente de programas para governar e desenvolver o Brasil.

    Federação desarticulada
    Uma reunião de governadores, realizada anteontem em Brasília, engatou uma contramarcha na votação da medida provisória 599, que unifica as alíquotas interestaduais do ICMS em 4%. Miopia e interesses locais, assim, devem retirar da pauta do Congresso a principal iniciativa para acabar com a guerra fiscal e a insegurança sobre as regras desse imposto.
    Segundo o Ministério da Fazenda, 20 dos 27 Estados seriam beneficiados. Os perdedores contariam com um fundo de R$ 296 bilhões, para compensações por quebra de receitas ao longo de 20 anos.
    As resistências mais fortes partem de Estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Eles querem preservar o arbítrio sobre o imposto para poder distribuir incentivos fiscais e, com isso, atrair empresas sediadas em outras unidades da Federação -política que a literatura econômica batizou como a de "empobrecer o seu vizinho".
    Esse lobby omite que o suposto direito de definir a alíquota do ICMS à revelia do Conselho Nacional de Política Fazendária foi julgado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Alguns Estados chegaram ao ponto de isentar importações para atrair outras receitas a suas fronteiras, o que barateia produtos estrangeiros e traz prejuízo direto às empresas brasileiras -prática em boa hora banida.
    A unificação das alíquotas do ICMS nos termos propostos pelo Planalto é apenas mais um capítulo da disputa irracional pelo bolo da arrecadação federal. Os governadores, paroquial e compreensivelmente, só têm olhos para as reformas que lhes tragam receita.
    Além do ICMS, a lista inclui a redistribuição dos royalties do petróleo e as regras de partilha do Fundo de Participação dos Estados. Neste caso último caso, nem a determinação do Supremo de que novos critérios de rateio fossem votados pelo Congresso até o final de 2012 foi acatada.
    A escalada do conflito do petróleo, com a derrubada do veto presidencial à redistribuição das receitas, atesta o estrago causado pela omissão do Planalto. A questão federativa é importante demais para ser relegada ao oportunismo dos governadores e das bancadas estaduais no Congresso.
    O correto seria considerar em conjunto todos o ganhos e perdas das várias pendências e promover, por mais difícil que pareça, um encontro de contas combinado com ampla reforma tributária e fiscal.
    A União detém o trunfo de refinanciar dívidas estaduais a taxas mais baixas. Mas, se não se articular no Parlamento, pode perder a chance de usá-lo pelo bem comum.

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