segunda-feira, 13 de maio de 2013

Lei da televisão por assinatura criou safra de canais nacionais nanicos e fartos de assinantes

folha de são paulo

Tv dentro da tv
Lei da televisão por assinatura criou safra de canais nacionais nanicos e fartos de assinantes
FERNANDA REISDE SÃO PAULOKEILA JIMENEZCOLUNISTA DA FOLHA
Parte da safra de canais nacionais surgida após a aprovação da nova lei da TV paga (lei 12.485/11), o Curta!, assim como seus pares, nasceu com estrutura enxuta, mas dentro da programação de operadoras com milhões de assinantes.
O Curta! tem 15 pessoas na equipe, que trabalha freneticamente em sua sede, no Rio.
A regra, segundo o diretor Júlio Worcman, é: ninguém tem uma só função. Programadores são também apresentadores. E editores atualizam páginas em redes sociais e atendem à imprensa.
Mesmo escondido no número 113 da Net, o canal caiu no gosto dos cinéfilos com uma programação de curtas e longas nacionais dificilmente exibidos na TV.
No Curta! não se vê sucessos de bilheteria do momento, mas pode-se topar com documentários da década de 1970 --como "Meu Nome É Gal"-- e curtas dos anos 1980.
Criado com investimento de R$ 2,4 milhões para licenças de exibição de conteúdo e de "mais um tanto", nas palavras de Worcman, em equipamento, o canal estreou em novembro do ano passado.
O empreendimento tem um braço na internet: o site Porta Curtas, que reúne quase 8.000 curtas desde 2002.
Questionado sobre a audiência do canal, Worcman ri e devolve: "Você é quem poderia me dizer". Sem acesso aos dados do Ibope ("Nem vi os preços ainda", diz), ele monitora a repercussão dos programas nas redes sociais.
A nova lei da TV paga determina que, a cada seis canais estrangeiros (como Fox e Disney), pacotes de TV disponibilizem um canal brasileiro que exiba, em horário nobre, três horas e meia semanais de conteúdo nacional qualificado (leia ao lado).
BOOM DE BRASILEIRO
Com esta nova demanda das operadoras, houve um boom de canais brasileiros deste tipo credenciados pela Ancine (Agência Nacional do Cinema).
No polo oposto do cardápio de canais criados na esteira da nova lei está o Arte 1.
O canal de artes e cultura do Grupo Bandeirantes só saiu do papel --com investimento de R$ 10 milhões e apenas 30 pessoas na equipe-- anos após a sua concepção inicial. Foi assediado por operadoras de TV paga, mas nenhuma acenava com espaço definitivo na grade. Após a aprovação da lei, a emissora entrou na Net e na Sky.
"Alcançamos a marca de 10 milhões de assinantes, número que superou, e muito, as expectativas. Imaginávamos algo em torno de 2 milhões de assinantes no primeiro ano do canal", conta o diretor-geral, Rogério Gallo.
"Estamos nesse momento envolvidos em apresentações comerciais para grandes clientes e agências e a receptividade tem sido excelente."
Para Gallo, a classificação de "canal qualificado" foi o pulo do gato do Arte 1. "Se ficássemos nos pacotes premium' das operadoras teríamos, com sorte, 200 mil assinantes", estima.
OUTROS CANAIS
A lei da TV paga deu o empurrão que faltava para outros canais. Cícero Aragon, diretor dos canais Music e Prime Box Brazil, diz que a ideia de uma emissora voltada para o cinema nacional da última década é de 2005.
"Na época, o mercado não era receptivo à iniciativa, e a gente aguardou o momento de isso acontecer", diz.
O Prime Box Brazil dedica-se a longas metragens nacionais produzidos a partir dos anos 2000. O Music Box, por sua vez, alterna shows brasileiros com videoclipes.
"Pelas redes sociais e pelos movimentos de agências de publicidade interessadas, entramos no radar", avalia.
Outro que entrou no ar já com 1,2 milhão de assinantes foi o canal dedicado à pesca, Fish TV. "O mercado brasileiro de pesca esportiva é gigantesco e agora somos procurados pelas operadoras", diz o diretor Luiz Motta.
No caminho inverso está a TV Climatempo. O canal de meteorologia nasceu com 500 mil assinantes. Logo, foi para a Sky, pulando para 5 milhões de assinantes.
Em agosto de 2012, a Ancine negou à TV o carimbo de canal qualificado e, com isso, ela foi desligado da Sky, que alegou precisar do espaço no satélite para outros canais qualificados.
O Climatempo brigou na Justiça, mas não conseguiu reverter a decisão. Desde então, o canal demitiu 70% dos 100 funcionários e ameaça fechar.


OPINIÃO
Cinema é um território quase inexplorado nos canais de TV paga
INÁCIO ARAUJOCRÍTICO DA FOLHAPor incrível que pareça, dada a imensa quantidade de canais de TV paga existente, o cinema ainda é um território inexplorado.
É também, por isso mesmo, uma imensa brecha pela qual poderão se infiltrar os canais surgidos em decorrência da nova legislação.
O primeiro a se manifestar fortemente foi o Curta!. Desencavou uma série de filmes brasileiros que estavam na prateleira.
Trouxe séries de documentários sobre a Segunda Guerra Mundial e, ainda, restituiu ao espectador de TV os magníficos curtas chaplinianos. Há curtas brasileiros na programação também.
O certo, indiscutível, é que o espectador de TV paga convive hoje com um repertório a rigor diminuto de filmes reprisados uma quantidade quase infinita de vezes (caso de filmes como "Melhor É Impossível", "A Máfia Volta ao Divã", "Tropa de Elite 2" etc.).
Primeiro, eles são exibidos nos canais lançadores (como Telecines ou HBOs) e depois vão para os de segunda linha (Warner, Universal etc.).
Passemos pela assombrosa falta de imaginação dessa programação.
Há filmes argentinos e chilenos, portugueses e espanhóis, franceses e alemães, turcos e russos. Há o mundo inteiro a explorar e um século de filmes, ou, vá lá, pelo menos uns 80 anos de cinema sonoro.
Certo, muitos deles pertencem a acervos como o do TCM, que está se especializando em mostrar filmes em Panavision ou Cinemascope na tela plana, isto é: mostra mais ou menos metade do enquadramento original do filme. Ou seja, ainda: mostra outro filme que não aquele filmado.
Quanto ao Brasil, bastaria consultar o acervo da Cinemateca Brasileira (e outras cinematecas) para saber o que existe disponível, consultar os proprietários dos direitos e sair em busca do material.
Coisas que o Canal Brasil faz dentro de seus limites, que não são tão largos.
Mesmo para quem não queira explorar profundamente a história dessa arte, existe hoje uma produção mundial diversificada, tanto em filmes como em séries e em documentários. Quem correr atrás dificilmente não encontrará o seu público.
O Curta! saiu na frente e vai afirmando sua originalidade, mas o que ainda não falta é campo aberto.

    CRÍTICA ARTE 1
    Canal dedicado à arte tem filmes, concertos e drinks com Aperol
    MARCOS AUGUSTO GONÇALVESCOLUNISTA DA FOLHANa expansão fragmentada do universo midiático, provocada pelo big-bang das novas tecnologias, multiplicam-se nichos de interesses em portais, sites, blogs, redes sociais e canais de televisão.
    O canal Arte 1 é um desses novos astros em formação.
    Seu público-alvo é a galera da cultura. Ele se apresenta como "o primeiro canal brasileiro com programação de 24 horas dedicada à arte e à cultura". Entre seus garotos-propaganda estão Antunes Filho, Zé Celso, Seu Jorge, Arthur Nestrovski, Arnaldo Antunes, Ruy Ohtake e Isaac Karabtchevsky.
    Inaugurado em março, procura transitar por uma faixa um pouco mais exigente e especializada, sem descuidar de temas como comida, drinks, moda e decoração.
    Assim, pode-se assistir ao "Rocco e Seus Irmãos", de Visconti, ou a uma apresentação de Dudamel Rodríguez, e depois, em ritmo de Amaury Jr., acompanhar receitas de drinks com Aperol do dono de uma casa noturna.
    Mas a programação, de maneira geral, é interessante. O canal tem boas atrações, que recobrem o amplo espectro das artes e espetáculos --dança, cinema, música erudita e popular, teatro, artes plásticas, arquitetura etc. As pautas são com frequência legais (por exemplo, como diretores de cinema representam a passagem do tempo em seus filmes) e informativas.
    Na contramão, a linguagem não é das mais imaginosas, a marca vocal sustentada pela voz de Salomão Schwartzman é duvidosa e falta um mínimo de perspectiva crítica. Mas dá tranquilo para colocar nos favoritos.

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