quarta-feira, 8 de maio de 2013

Marcos Tryjo e Rui Falcão no Tendências/Debates

folha de são paulo

MARCOS TROYJO
TENDÊNCIAS/DEBATES
O significado da vitória na OMC
Em vez de aumentar a competitividade, o Brasil optou por uma política externa que gera simpatia, mas pouco fluxo de comércio
A eleição do diplomata Roberto Azevêdo à direção-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC) representa uma grande vitória do Brasil. A questão, no entanto, é como transformá-la numa vitória para o Brasil.
Globalmente, o discurso brasileiro tem soado mais alto do que suas conquistas econômicas. Sua ideia de reputação está entrelaçada com a tarefa de atualização da ONU. Tornar-se membro permanente do Conselho de Segurança. Fortalecer o comércio multilateral mediante a OMC. O Brasil parece saber o que quer para o mundo. Não necessariamente o que quer do mundo.
Do ponto de vista das relações internacionais, revela-se a falta de um projeto brasileiro sofisticado em termos de influência e prosperidade. No Brasil, cuja expansão econômica atrofiou-se há mais de dois anos, colhemos o resultado de preferências por políticas externas com bases ideológicas e ênfase em afinidades políticas. Pouca atenção ao pragmatismo econômico, ao estabelecimento de acordos de livre comércio e à promoção comercial bilateral.
Fortalecer a cooperação Sul-Sul tem sido prioridade. As diversas geometrias promovidas pelo Brasil na América Latina, seja usando o Mercosul, a União de Nações Sul-Americanas ou a Comunidade de Estados Latinoamericanos e Caribenhos, rendem abundantes discursos sobre um mundo mais equânime, mas poucos resultados econômicos tangíveis.
Em vez de promover reformas microeconômicas internas e estabelecer robustas agências de negócios nas cidades globais da América do Norte, Europa ou Ásia, os estrategistas brasileiros julgaram de maior impacto para suas ambições multilaterais abrir postos diplomáticos em cidades como Baku, Belmopã, Basse-Terre, Castries, Conacri, Cotonou, Cartum, Gaborone, Malabo, Nouakchott e Uagadugu. Isso angaria simpatia e votos na OMC e outros fóruns, mas pouco fluxo de comércio.
Muitos acreditam que a baixa participação do Brasil no comércio mundial (pouco mais de 1% de tudo que se compra e vende no mundo) e do comércio exterior no Brasil (em torno de 20% do PIB) é fruto do protecionismo dos países mais ricos. Tal injustiça só poderia ser corrigida mediante negociações em tabuleiros como a OMC. E sem dúvida as negociações globais "governo a governo" são importantes.
Mas centrar a inserção comercial na busca de um "final feliz" para as negociações multilaterais nos faz perder foco. É como se um país desejasse tornar-se potência do futebol mundial colocando o cerne de sua estratégia em bons representantes na sede da Fifa.
Não se pode afirmar que acordos multilaterais tenham sido responsáveis pela decolagem rumo ao crescimento de qualquer país nos últimos 30 anos. Coreia do Sul, China e Chile acresceram suas rendas nacionais sem negociações multilaterais como principal elemento de sua estratégia. Eles buscaram fortalecer suas capacidades internas de competir e abriram mercados para seus produtos. Ou seja, cuidaram primeiro de seu interesse nacional.
Mega-acordos comerciais como a Aliança Transatlântica (EUA e Europa) ou a Parceria Transpacífica (que envolve parceiros da Américas do Norte e do Sul, Ásia e Oceania) ou mesmo a metamorfose em curso na economia chinesa serão mais delineadores da "reglobalização" do que a OMC.
No entanto, longe de irrelevante, ter um excelente profissional brasileiro à frente do mais representativo organismo do comércio internacional é motivo de celebração e orgulho. O risco é enxergarmos na vitória na OMC a legitimação da insular política comercial brasileira dos últimos anos.
O Brasil tem não apenas de contribuir para a definição da geografia do comércio no século 21, mas, sobretudo, tem de definir o lugar que deseja ocupar em tal mapa.

    RUI FALCÃO
    TENDÊNCIAS/DEBATES
    Por uma reforma política debatida nas ruas
    O financiamento público exclusivo quebra a conhecida simbiose entre doação privada e as contrapartidas de certos políticos
    A história tem mostrado que o PT é um partido que luta pelo que acredita. E a luta tem sido boa para nós. Há 20 anos, quem apostaria em um operário, sem diploma universitário, presidente da República? E, com toda a carga de preconceito que enfrentamos, na eleição de uma mulher como presidenta? No caso da reforma política não será diferente.
    Já está nas ruas uma campanha nacional em busca do apoio da sociedade. Com 1,5 milhão de assinaturas de aprovação à nossa proposta, sustentaremos um projeto de lei de iniciativa popular.
    Não aceitamos que a reforma política se limite à coincidência de datas das eleições. E temos a convicção de que essa é a hora para um movimento mais amplo.
    A coleta de assinaturas permitirá dialogar com a população e mostrar que sem partidos políticos autênticos sofre a democracia. A campanha possibilitará fortalecer o compromisso da sociedade com a gestão da coisa pública, que começa no momento do voto.
    O PT tem credibilidade, porque, apesar de todas as campanhas feitas contra nós, as pesquisas mostram que não perdemos a confiança das pessoas. Quando se fala em partido, fala-se em PT -- mesmo com a tentativa de se colocar todos na vala comum.
    É fundamental a aprovação do financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais, que é a base da nossa proposta de reforma. Trata-se do melhor meio para acabar com a influência do poder econômico, que dificulta o exercício pleno da soberania popular por meio do voto livre. Ajuda, também, no combate à corrupção, ao quebrar a conhecida simbiose entre doação privada de campanha e as contrapartidas de certos políticos, após a eleição, à custa dos cofres públicos.
    Existe ainda um efeito colateral benéfico do financiamento público exclusivo: o barateamento das campanhas eleitorais. Sim, porque os recursos serão finitos, cada partido com a sua fatia.
    Nossa campanha propõe um avanço: a obrigatoriedade das listas partidárias, elaboradas democraticamente pelos partidos, com a paridade de gênero, alternando homens e mulheres. As listas vinculam o voto a programas partidários e não apenas a pessoas. E a paridade garantirá uma maior participação das mulheres na política, corrigindo uma grave distorção: elas são maioria na sociedade, mas têm presença ainda irrisória na política.
    Para garantir uma reforma política ampla, propomos a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte específica. Quem for eleito exclusivamente para aquele fim não ficará apegado à preocupação de alterar o sistema político eleitoral, visto que seu mandato se esgotará ao término da Constituinte.
    E ainda será possível corrigir uma distorção gritante no Congresso, onde há uma subrepresentação de alguns Estados. Na democracia representativa, é preciso vigorar o princípio de uma pessoa, um voto.
    O PT nunca se curvou ao senso comum. Nunca desertou do bom combate, por mais ingente que parecesse. Foi com esse espírito que saímos às ruas pelas Diretas-Já. Foi com esse espírito que promovemos, em dez anos de governo, transformações profundas para melhorar a vida de milhões de brasileiros e brasileiras. E com esse espírito venceremos o discurso fácil de que a reforma política é impossível.

      Nenhum comentário:

      Postar um comentário