terça-feira, 7 de maio de 2013

Todo o poder aos parentes -Alice Maciel, Isabella Souto e Juliana Cipriani‏

Prefeitos do interior de Minas aproveitam brechas da legislação e nomeiam mulheres, filhos e irmãos para ocupar cargos de primeiro escalão na administração municipal 


Alice Maciel, Isabella Souto e Juliana Cipriani

Estado de Minas: 07/05/2013 

Amparados por uma brecha na Súmula 13 do Supremo Tribunal Federal – aprovada para coibir o nepotismo no serviço público –, prefeitos mineiros estão garantindo emprego para seus parentes no primeiro escalão da administração. São mulheres, filhos, irmãos, tios e sobrinhos ocupando cargos de secretário municipal, o mais alto posto entre aqueles de livre escolha do prefeito. Eles têm a seu favor o fato de o texto da súmula do STF não vedar expressamente a nomeação de familiares do prefeito, governador e presidente da República para secretários municipais, estaduais e ministros. E se baseiam ainda em algumas decisões judiciais posteriores que liberaram as contratações pelos chefes do Executivo.

Para o promotor do Patrimônio Público, João Medeiros, o volume de parentes em cargos de primeiro escalão é resultado da falta de uma lei vedando o nepotismo integralmente, e de uma súmula mal redigida, que gera uma série de interpretações. “Mas nada impede que o promotor entre com uma ação (questionando a contratação de parentes), independentemente da súmula. O que permeia a atuação do Ministério Público não é a Súmula 13, mas se a situação concreta viola princípios da administração pública”, argumentou o promotor.

Os casos de nepotismo em Minas estão espalhados por cidades de todas as regiões do estado, independentemente do tamanho e de qual partido é o prefeito. Em Uberlândia, no Triângulo, a mulher do prefeito Gilmar Machado (PT) é secretária de Governo. Com um salário de R$ 12,5 mil, Rosângela Paniago ocupa o principal posto da administração, responsável por coordenar todas as demais secretarias na segunda maior cidade do estado. Para Machado, não há nenhum dilema moral nem ilegalidade na nomeação, já que ela está qualificada para a função. Ainda segundo Gilmar Machado, se tivesse alguma irregularidade na contratação, o Ministério Público já teria acionado a administração. “Se não tivesse condições, aí sim teria problema. Ela tem competência, formação superior, especialização em gestão e dirigiu instituições reconhecidas na cidade”, afirmou Machado.

Na vizinha Uberaba, o nepotismo está sendo investigado pelo Ministério Público, que abriu cinco inquéritos para apurar as denúncias de contratações que seriam irregulares. Segundo o promotor José Carlos Fernandes, na quinta-feira os servidores da prefeitura começam a ser ouvidos. “Temos denúncias e estamos comprovando a existência de parentes de vereadores trabalhando em cargos sem concurso público na prefeitura”, afirma o promotor, que conta que a investigação já levou ao cancelamento de uma nomeação na cidade.

Mulheres Em Dom Bosco, na Região Noroeste, o prefeito João Paulo da Silva (PSB), orientado por assessores, nomeou a esposa, Eliane Tiago Pereira, como secretária de Ação Social da cidade. “O pessoal me falou que ela poderia ser minha secretária e achei que ela serviria mesmo. Desde que a lei permita, acho que é como nomear qualquer pessoa para trabalhar”, afirmou João Paulo.

Já Carlos Vinício de Carvalho Soares (PR), prefeito de Frei Inocêncio, no Rio Doce, também nomeou a mulher, Luciana Cabral Carvalho, mas para a Secretaria de Obras e Saúde. Além dela, o tio do prefeito, Joviano Augusto de Carvalho Soares, figura na administração como secretário de Finanças. O prefeito foi procurado pela reportagem para comentar o assunto, mas não foi localizado.

Na cidade de Ouro Branco, na Região Central, a prefeita Maria Aparecida Junqueira Ramos (PSD) contratou o sobrinho Raimundo Junqueira Campos Neto como secretário de Governo. “Mas foi só um parente, que é da minha confiança e competente”, alegou a prefeita. Em Matozinhos, na Região Metropolitana de BH, Joyce Graziele é a responsável pela Secretaria de Desenvolvimento Social, cargo dado pelo seu pai, o prefeito Antônio Divino de Souza (PMDB). A Secretaria de Obras de Bom Sucesso, no Centro-Oeste mineiro, foi entregue a Fabrício Martins de Barros, irmão da prefeita Cláudia Barros (PT).  A reportagem conversou com as assessorias dos dois prefeitos, mas até o fechamento desta edição não houve retorno das ligações.

Farra Situação mais emblemática do poder dos parentes pode ser vista em Juatuba, na Região Central. Além de o prefeito Pedro Firmino Magesty (PMDB) ter nomeado o irmão, Paulo Firmino Magesty, para a Secretaria de Meio Ambiente, ele garantiu trabalho aos familiares de dois vereadores. O presidente da Câmara, Luiz Carlos Fiedler, foi agraciado com a nomeação do seu filho, Tiago Emílio, como secretário de Esportes. Outro vereador que também tem parente no primeiro escalão é Kellissander Saliba Santos. Seu irmão, Islander Saliba Santos, foi contemplado com a Secretaria de Educação.

E a farra não para por aí. Os dois filhos da vice-prefeita, Valeria Aparecida dos Santos (PMDB) – que são concursados da prefeitura –, foram nomeados em cargos de confiança. Luiz Carlos dos Santos ganhou um cargo de gratificação na Secretaria de Comunicação e Carlos Antônio dos Santos passou a trabalhar no gabinete do prefeito. Pedro Firmino justificou que a lei não impede a nomeação de parentes em primeiro escalão. Ele afirmou que todos os familiares foram nomeados por terem experiência e competência.”

Argumento semelhante foi usado pelo prefeito de Brumadinho, na Região Central, Antônio Brandão (PSDB), que nomeou a sobrinha Sandra Brandão para a Secretaria de Governo. “A lei me permite nomear minha sobrinha como agente político. Ela é uma pessoa de minha confiança e tem competência”, observou, acrescentando que Sandra é formada em administração.

O QUE DIZ A SÚMULA 13

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta, em qualquer dos poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição federal.

Pelo texto, estão vetados
» Pai, mãe, avô (ó) e bisavô (ó) – linha reta ascendente
» Filho (a), neto (a), bisneto (a) – linha reta descendente
» Tio (a), irmão (ã), sobrinho (a) – linha colateral
» Sogro (a), avô (ó), bisavô (ó) e tio (a) do cônjuge e/ou companheiro (a), cunhado (a), filho (a) do cunhado (a), genro e nora – afinidade
» São parentes civilmente: filho (a) adotado, enteado (a), filho (a) e neto (a) do enteado (a)

A Súmula 13 foi editada em 2008 pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) com o objetivo de coibir a contratação de parentes no serviço público brasileiro. No entanto, o texto nada disse sobre a indicação de parentes para o primeiro escalão do governo. Por isso mesmo, há decisões divergentes no órgão: em 2011, o atual presidente do STF, Joaquim Barbosa, deferiu uma liminar em ação proposta pelo Ministério Público do Rio de Janeiro para afastar o irmão do prefeito de Queimados, na Baixada Fluminense, da Secretaria de Educação. O ministro Carlos Ayres Britto, que se aposentou no ano passado, autorizou a permanência da irmã do prefeito de Paty dos Alferes, também no Rio, no cargo de secretária de Educação, Esporte e Lazer. 

 Veto à lei antinepotismo
Simone Lima
Publicação: 07/05/2013 04:00
A nomeação de dois filhos do vice-prefeito de Formiga, no Centro-Oeste de Minas, para o cargo de secretário tem causado polêmica na cidade. Informada pela própria promotoria de Justiça local de que só haveria irregularidade na nomeação se existisse uma lei proibindo tais contratações, a Câmara Municipal tratou de votar um projeto neste sentido. Mesmo sendo aprovada por unanimidade, a proposta foi vetada pelo prefeito Moacir Ribeiro (PMDB). Agora, o Legislativo vai criar uma comissão para analisar o veto do Executivo.

No início de março, vereadores de Formiga procuraram o Ministério Público, pedindo que o órgão investigasse a nomeação de Débora Montarroios Neto Almeida, como secretária de Desenvolvimento Humano, e de Bruno Montarroios Neto Almeida, como secretário de Desenvolvimento Econômico. Os dois são filhos do vice-prefeito, Eduardo Brás (PSDB), e, para o Legislativo, as contratações seriam um típico caso de nepotismo. No entanto, o promotor do patrimônio público, Marco Aurélio Rodrigues, informou que, naquele momento, nada poderia ser feito.

O vereador Arnaldo Gontijo de Freitas (PSL) foi um dos parlamentares que procuraram o MP para denunciar as contratações. Ele garante não ter ficado nem um pouco surpreso com o veto do Executivo, mas afirma que, se depender da Câmara, essa briga está longe de chegar ao fim. “Vamos continuar lutando pela moralidade da política em Formiga. Agora, o presidente da Casa vai formar uma comissão. Vamos tentar derrubar esse veto e promulgar a lei. Inclusive, a própria população tem nos cobrado a aprovação desse projeto”, declara.

Para o vice-prefeito, o Legislativo está fazendo confusão. Eduardo Brás alega que não há nenhuma ilegalidade na nomeação de seus dois filhos. “O próprio Supremo Tribunal Federal definiu o que pode ou não ser considerado nepotismo. Não temos como aprovar uma lei municipal que vai contra uma determinação federal. Não existe esse problema que eles querem levantar”, diz. 

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